Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0251/16
Data do Acordão:07/12/2016
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:VÍTOR GOMES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
ARTICULADO SUPERVENIENTE
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não se justifica a admissão do recurso de revista excepcional para apreciar questão de admissibilidade de articulados supervenientes que não coloca especiais dificuldades de interpretação ou aplicação da lei, nem se vislumbra, a seu propósito, divisão jurisprudencial ou doutrinal, e que foi objecto de decisão conforme das instâncias sem indícios de violação de regras lógicas ou de erro ostensivo ou aplicação insólita das normas pertinentes ou manifesta preterição de princípios processuais fundamentais.
Nº Convencional:JSTA000P20803
Nº do Documento:SA1201607120251
Data de Entrada:03/01/2016
Recorrente:A............ E OUTROS
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA AGRICULTURA E E.P. - ESTRADAS DE PORTUGAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo


1. A………… e B………… vêm interpor recurso, ao abrigo do art.º 150.º do CPTA, do acórdão de 22/10/2015 do Tribunal Central Administrativo Norte que manteve a decisão do TAF de Braga pela qual foi admitido o articulado superveniente apresentado pelo réu na acção que intentaram contra o Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território.

Para justificar a admissão da revista os recorrentes alegam e concluem:
a) A questão da admissão do articulado superveniente, sendo embora uma questão processual, tem, nas circunstâncias do caso, uma importância decisiva para a boa aplicação do direito, na medida em que, por essa via, é invocado um novo facto impeditivo do direito dos Autores, fora do condicionalismo processualmente admissível, que altera os termos em que a lide estava a ser discutida no plano do direito substantivo.
b) Sendo que a admissão do articulado superveniente põe igualmente em causa a igualdade substancial das partes no processo, no ponto em que o tribunal confere a uma das partes uma nova oportunidade para alegar um facto essencial num momento em que já se encontrava precludido o direito de alegação, agravando a posição processual da parte contrária,
c) Para além de que se trata de uma questão processual da maior importância, susceptível de poder colocar-se na generalidade dos processos, e que tem a ver com o âmbito aplicativo do artigo 506.º, n.º 2, do CPC (actual artigo 588.º) e com a distinção fundamental que, para esse efeito, se torna necessário fazer entre factos instrumentais e factos essenciais ou estruturais.
d) Tornando-se justificável, neste triplo condicionalismo, a admissão do recurso de revista
e) A possibilidade de virem a ser alegados supervenientemente novos factos constitutivos do direito que os autores se arrogam ou novos meios de defesa por parte dos réus só se coloca em relação factos essenciais ou factos estruturais, e não em relação a factos instrumentais ou probatórios.
f) Sendo que factos essenciais são os que concretizam e especificam os elementos da previsão normativa em que se funda a pretensão do autor e os que réu invoque como fundamento da sua defesa por impugnação ou excepção, e que sejam, por isso, indispensáveis à substanciação das situações jurídicas afirmadas e feitas valer em juízo pelas partes.
g) Ao contrário, os factos instrumentais destinam-se a realizar a prova indiciária dos factos essenciais, assumindo em exclusivo uma função probatória e não uma função de preenchimento e substanciação jurídico-material das pretensões e da defesa, pelo que não carecem de ser incluídos na base instrutória.
h) No caso vertente, o Réu pretende aditar à base instrutória, através de um articulado superveniente, os factos destinados a demonstrar o número global de passagens de veículos por ano no troço de auto-estrada relativamente aos anos de 2008, 2009, 2010 e 2011, tendo em vista fazer a prova indiciária de um outro facto, que é o de saber se se verificam mais de três milhões de passagens de veículos por ano, para efeito da classificação da via rodoviária em causa como uma “grande infraestrutura de transporte rodoviário”.
i) Ora, o facto que deveria e teria de ser qualificado como superveniente, para efeito da admissão do articulado superveniente, era justamente este facto essencial, que respeita à ocorrência de mais de três milhões de passagens de veículos por ano, e que permitia subsumir a situação que constituía o objecto da lide na alínea e) do artigo 11.º do Regulamento Geral do Ruído, e não na alínea b) desse artigo como alegavam os Autores.
j) Por outro lado, este facto essencial é um verdadeiro facto impeditivo do direito que os Autores se arrogam na acção, na medida em que é susceptível de obstar a que o seu direito se constitua validamente dentro da moldura substantiva que as partes tinham aceite nos articulados iniciais.
l) Daí que esse facto, tendo directo reflexo na decisão da causa, só pudesse ser alegado em articulado superveniente dentro das condições definidas no artigo 506.º, n.º 2, do CPC (o actual artigo 588.º), isto é, desde que o facto tivesse ocorrido posteriormente ao momento da apresentação do articulado inicial da parte (superveniência objectiva), ou desde que a parte só tivesse conhecimento do facto depois de findar o prazo de apresentação do articulado (superveniência subjectiva).
m) Sendo que, no caso de superveniência subjectiva, o articulado superveniente só pode ser admitido se a parte fizer a prova da superveniência, isto é, demonstrar que desconhecia a existência do facto, e que esse desconhecimento não lhe é imputável.
n) Ora, a auto-estrada em causa entrou em funcionamento em 2005, e, desde essa data, por obrigação contratual da concessionária, eram elaborados Relatórios de Monitorização de Ruído bianuais, que abrangeram, designadamente, os anos de 2006 e 2007, e, por obrigação funcional do Instituto de Infra-estruturas Rodoviárias, IP (InIR, IP), eram publicados relatórios de tráfego trimestrais e anuais, o que ocorreu, designadamente, em 2008.
o) Pelo que o facto essencial que se traduz na “verificação de mais de três milhões de passagens de veículos por ano” no troço em causa, destinado a demonstrar que a via é uma “grande infraestrutura rodoviária de transporte”, não é um facto objectivamente superveniente, visto que não se trata de um facto que tenha ocorrido posteriormente aos articulados normais, mas antes um facto que era já detectável e conhecido à data em que foi apresentada a contestação.
p) E, por outro lado, o Réu não pode invocar o desconhecimento, sem culpa, a existência do facto, não só porque, enquanto órgão governamental com a tutela da área de avaliação de impacte ambiental, tinha o especial dever de conhecer o volume efectivo de tráfego na A28, não só através dos Relatórios de Monitorização de Ruído elaborados pela concessionária, mas também por via da informação veiculada pelo InIR, IP, que era um organismo público que se encontrava sob a sua tutela e superintendência.
q) Tanto mais que o Réu juntou, como documento anexo à contestação, o Relatório de Monitorização de Ruído relativo a 2006, e declarou no n.º 13.º do articulado superveniente, que “a infraestrutura em causa era à data da interposição da presente acção, e continuou a ser, uma grande infraestrutura de transporte rodoviário”, declaração essa que corresponde à confissão de um facto que é desfavorável ao Réu, que tem força probatória plena de confissão judicial escrita (artigo 358.º, n.º 1, do Código Civil).
r) Devendo dizer-se, em todo o caso, que, nos termos do artigo 506.º, n.º 2, in fine, do CPC (a que corresponde o actual artigo 588.º, n.º 2), é à parte que apresenta o articulado superveniente que compete fazer a prova da superveniência subjectiva e, por isso, fazer a prova de que só teve conhecimento dos factos anteriores depois de findar o prazo da contestação.
s) Sendo que em caso de dúvida, em função desse ónus probatório, deve dar-se como não verificada a superveniência.
t) Nestes termos, o articulado superveniente não poderia ser admitido porque não preenche os requisitos de superveniência objectiva ou de superveniência subjectiva a que se refere o artigo 506.º, n.º 2, do CPC.
u) Por isso mesmo, o acórdão recorrido viola também o princípio da igualdade substancial das partes, consagrado no artigo 6.º do CPTA, como aforamento do princípio constitucional da igualdade ínsito no artigo 13.º da Constituição, na medida em que permite ao Réu a alegação de um novo facto impeditivo do direito que os autores se arrogam na acção (ainda que através de meros factos instrumentais), num momento em que se encontrava já precludida a possibilidade de o fazer.
v) Assim, as normas dos n.ºs 1 e 2 do artigo 506.º do CPC, na redacção anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que foram aplicadas na decisão recorrida, violam o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição, quando interpretadas no sentido de que a parte pode apresentar um articulado superveniente para alegar factos que, no plano normativo, não apresentam inovação por serem o mero desenvolvimento ou sequência de outros que já eram conhecidos e poderiam ter sido invocados na contestação.

2. As decisões proferidas pelos tribunais centrais administrativos em segundo grau de jurisdição não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário. Apenas consentem recurso nos termos do n.º 1 do art.º 150.º do CPTA, preceito que dispõe que das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, a título excepcional, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.
Para o efeito, constitui questão jurídica de importância fundamental aquela – que tanto pode incidir sobre direito substantivo como adjectivo – que apresente especial complexidade, seja porque a sua solução envolva a aplicação e concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, seja porque o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência, ou da doutrina. E, tem-se considerado de relevância social fundamental questão que apresente contornos indiciadores de que a solução pode corresponder a um paradigma ou contribuir para a elaboração de um padrão de apreciação de casos similares, ou que tenha particular repercussão na comunidade.
A admissão para uma melhor aplicação do direito justifica-se quando questões relevantes sejam tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória, com recurso a interpretações insólitas, ou por aplicação de critérios que aparentem erro ostensivo, de tal modo que seja manifesto que a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa é reclamada para dissipar dúvidas acerca da determinação, interpretação ou aplicação do quadro legal que regula certa situação.

3. O TCA Norte manteve a decisão do TAF de Braga de admissão do articulado superveniente, com a seguinte fundamentação:
“IV.II.I. A admissibilidade do articulado superveniente: a novidade da questão.
Defendem os autores que o número de passagens de veículos por ano no troço em apreço, a infra-estrutura rodoviária junto à qual se localizam as habitações dos autores, é uma questão nova cuja invocação ficou precludida por não ter sido apresentada com a contestação.
Mas sem razão.
Estes factos e a sua prova inserem-se na questão debatida nos articulados normais apresentados pelas partes, a petição inicial e a contestação, a saber, se o nível de ruído produzido pelos veículos em circulação neste troço, ultrapassam, ou não, os limites legais.
Esta questão assumiu uma vertente nova – não se trata de ter surgido uma questão diferente – quando o relatório pericial de 27.04.2012 veio alertar para os diferentes limites de som impostos por lei consoante se trate no caso, ou não, de uma grande infra-estrutura rodoviária e se trate de uma Zona Sensível ou de uma Zona Mista, assim classificada pela autarquia.
Tratando-se de zona sensível, os limites detectados ultrapassam os limites legalmente impostos, excepto tratando-se de uma grande infra-estrutura rodoviária, de acordo com o disposto no artigo 11º, n.º 1, da alínea c) do Regulamento Geral de Ruído, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 9/2007, de 17 de Janeiro.
Só perante esta posição não unívoca, ou seja, aberta a hipóteses diversas, assumida no relatório pericial, objectivamente surgiu a necessidade de apurar, em particular, se o troço em causa constituiu ou não uma “grande infra-estrutura” o que passa por saber se o número anual de passagens de veículos aí ultrapassa ou não, o número de três milhões.
Ainda no âmbito da mesma questão já debatida, saber se os níveis de ruído verificados no troço em causa ultrapassam ou não os limites legalmente impostos.
Não se verifica, pois, o suscitar de uma questão nova, ao contrário do defendido pelos autores.
Nem de matéria de excepção, mas antes de impugnação, dado os réus pretenderem, como estes novos factos, contraporem uma outra versão, de que os níveis de ruído produzido pela circulação de veículos junto à casa dos autores, não excede os limites legalmente impostos, ao contrário do que estes invocaram no articulado inicial – n.º 2, do artigo 487º do Código de Processo Civil.
[...]
IV.II.II. A superveniência dos factos.
Dispõe o artigo 506º do Código de Processo Civil, relativamente aos articulados supervenientes:
[…]
Importa, pois, averiguar, se os factos invocados no articulado superveniente são supervenientes de um ponto de vista objectivo e, apenas no caso negativo, se ao menos, são supervenientes de um ponto de vista subjectivo, face ao disposto no n.º 2 do preceito acabado de citar.
Vejamos.
Os factos cuja prova se pretende produzir reportam-se aos anos completos de 2008 a 2011, mais concretamente, quais os números anuais de passagens de veículos no troço da infra-estrutura rodoviária junto à qual se localizam as habitações dos autores durante esses anos.
Ora a contestação foi apresentada em 08.10.2008, data em que ainda não se tinha completado o ano de 2008 e portanto, nem sequer objectivamente se tinha verificado o facto relevante a ter em conta, o volume anual de passagens de viaturas no troço em apreço.
Isto sendo certo que a superveniência a que alude o citado preceito é relativa a factos e não a extrapolação de factos, como parecem pretender os autores em relação ao ano de 2008 (no que diz respeito aos anos seguintes é clara a sua superveniência em relação à contestação).
Ora a circulação anual de veículos no troço junto à residência dos autores é um facto que só se verifica, objectivamente, no final desse ano. Retirar o número de veículos em circulação nesse ano completo a partir do número de veículos em circulação nos nove primeiros meses, não é constatar um facto, é extrapolar esse facto a partir de outro.
Não se coloca sequer, portanto, a questão da superveniência subjectiva, pois esta questão só se coloca quando o facto não é objectivamente superveniente à apresentação do articulado normal, neste caso a contestação.
Cabe aqui também referir que no caso o momento processual relevante para avaliar a superveniência dos factos é o da apresentação da contestação, pois os outros dois momentos a que alude o n.º 3 do artigo 506º do Código de Processo Civil, a audiência preliminar e a audiência de julgamento não tiveram lugar.
Defendem os autores que o “momento processual a que se refere a alínea a) do n.º 3 do artigo 506º do Código de Processo Civil para efeito de apresentação de articulados supervenientes deve entender-se como sendo aquele em que há lugar ao saneamento do processo e à selecção da matéria de facto controvertida, seja essa actividade assegurada por via oral, através da audiência preliminar, ou por via escrita, através da prolação do despacho saneador.”
Simplesmente esta tese não tem um mínimo de correspondência com a letra da lei, o que a impede de a adoptar como solução interpretativa do preceito em análise – n.º 2 do artigo 9º do Código Civil.
Na verdade se o legislador quisesse aludir ao momento de fixação da matéria de facto como referência para a apresentação do articulado superveniente, tê-lo-ia feito de forma expressa e inequívoca e não mencionando uma fase processual em que se pode verificar ou não essa fixação da matéria de facto, a audiência preliminar.
Ora a audiência preliminar pura e simplesmente não teve lugar; para a audiência de julgamento ainda não foi (aquando da admissão do articulado) marcada data.
Em todo o caso sempre se dirá que só perante o desfecho, de conclusão aberta a hipóteses alternativas, do relatório pericial de 27.04.2012, os autores se viram confrontados com a necessidade de invocar que o troço em apreço é uma grande infra-estrutura rodoviária e provar os factos pertinentes, os números anuais de circulação de veículos nesse troço, entre 2008 e 2011.
Só a partir do final do ano de 2008, ou seja, depois de completo um ano, os autores estavam habilitados a saber se o número de veículos em circulação nesse troço ultrapassava os três milhões ou não e, portanto, só depois da apresentação da contestação (e tendo como limite a marcação da data para julgamento que não ocorreu) estavam em condições de o invocar e provar.
Conclui-se, como decidido, pela superveniência dos factos constantes do articulado inicial e da necessidade de os provar no articulado em causa.
Ao contrário do defendido pelos ora recorrentes, a admissão do articulado superveniente não viola, antes respeita, o disposto no artigo 506º, n.ºs 1, 2 e 4, do Código de Processo Civil, e o princípio da concentração da defesa que resulta do artigo 489º, n.º1, do Código de Processo Civil.
IV.II.III. O princípio da igualdade.
Defendem os autores que a decisão recorrida põe em causa o princípio da igualdade processual das partes previsto no artigo 3º do Código de Processo Civil, como concretização do princípio da igualdade consagrado no artigo 13º da Constituição, ao permitir ao réu a alegação de questão de facto nova num momento em que se encontrava precludida a possibilidade de o fazer; mais acrescentam que são inconstitucionais, por violação do princípio constitucional da igualdade, as normas dos n.ºs 1 e 2 do artigo 506º do Código de Processo Civil, quando interpretadas no sentido de que os factos instrumentais, ainda que supervenientes, podem ser deduzidos em articulado posterior para prova de factos essenciais que, sendo já conhecidos ou cognoscíveis pela parte a quem aproveitam, não foram alegados nos articulados normais.
Mas sem razão, face a tudo o que ficou dito.
Os factos em causa ocorreram posteriormente à apresentação da contestação e não se justificava a sua apresentação em momento anterior, como se expôs.
Em todo o caso, para se afirmar que houve violação do princípio da igualdade numa decisão judicial, é necessário que existam duas situações cujo tratamento possa ser comparado.
No caso não existe outra situação nos autos que possa ser comparada com a apresentação do articulado superveniente do réu.
Em particular os autores não apresentaram, pela sua banda, qualquer articulado superveniente, face aos resultados da perícia e que tenha sido rejeitado pelo tribunal.
E foi-lhes assegurado o contraditório em relação ao articulado superveniente apresentado pelo réu, mantendo-se assim o equilíbrio na posição processual das partes.”

4. A questão que se pretende ver apreciada no presente recurso respeita à admissibilidade de articulados supervenientes.

Argumentam os recorrentes que se trata de uma questão processual de maior importância, susceptível de poder colocar-se na generalidade dos processos, que tem a ver com o âmbito de aplicação do artigo 506.º, n.º 2 do CPC e com a distinção fundamental que se torna necessário fazer entre factos instrumentais e factos essenciais ou estruturais e que tem, nas circunstancias do caso, uma importância decisiva para a boa aplicação do direito, na medida em que com a invocação de um novo facto, fora do condicionalismo processualmente admissível altera-se os termos em que a lide estava a ser discutida no plano do direito substantivo. Referem, ainda, que a admissão do articulado põe em causa a igualdade substancial das partes no processo.

As questões processuais podem ser objecto do recurso excepcional e geralmente a sua solução, na medida em que seja clarificada a interpretação das normas pertinentes, interessa a quem não é parte na causa. Mas é sempre necessário que a questão processual se revista de relevância jurídica ou social ou que a admissão do recurso se revele claramente necessária para melhor aplicação do direito.

No caso, estamos perante uma questão processual cuja resposta é essencialmente dependente das particularidades do caso, em que não se colocam especiais dificuldades de interpretação ou aplicação da lei e não se vislumbra, a seu propósito, divisão jurisprudencial ou doutrinal, o que retira à decisão que o Supremo Tribunal Administrativo neste litígio viesse a proferir a virtualidade para extravasar do caso sujeito.

E igualmente não se justifica a admissão do recurso para melhor aplicação do direito, pois, independentemente de ser ou não acertada, a decisão concordante das instâncias não indicia uma situação de violação de regras lógicas ou de erro ostensivo ou aplicação insólita das normas pertinentes ou manifesta preterição de princípios processuais fundamentais que torne claramente necessária a intervenção do órgão de cúpula da jurisdição, num sistema que assenta em, apenas, dois graus de jurisdição. Aliás, a aquisição processual dos factos supervenientemente alegados não implica o reconhecimento da sua pertinência necessária para a decisão da causa.

5. Decisão
Pelo exposto, decide-se não admitir o recurso.
Custas pelos recorrentes.

Lisboa, 12 de Julho de 2016. – Vítor Gomes (relator) – Alberto Augusto OliveiraSão Pedro.