Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0547/10
Data do Acordão:07/14/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ACTO PRATICADO PELO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
PREJUÍZO IRREPARÁVEL
INCONSTITUCIONALIDADE MATERIAL
INCONSTITUCIONALIDADE ORGÂNICA
SUBIDA DA RECLAMAÇÃO
Sumário:I - A norma do n.º 3 do artigo 278.º do CPPT deve ser interpretada no sentido de que, em processo de execução fiscal, só há subida imediata da reclamação a tribunal dos actos do órgão de execução quando, sem ela, ocorram prejuízos irreparáveis que não sejam os inerentes a qualquer processo judicial de execução para cobrança de quantia certa.
II - Essa subida imediata da reclamação deve ser estendida a todas as situações em que a reclamação fique sem finalidade alguma por força da sua subida diferida, pois que essas situações também são susceptíveis de provocar um prejuízo irreparável.
III - Não tem subida imediata a reclamação da decisão do órgão da execução fiscal que determinou a instauração de execução fiscal e a citação da devedora que consta do título executivo.
IV - A norma do n.º 3 do artigo 278.º do CPPT não padece de inconstitucionalidade orgânica nem de inconstitucionalidade material por violação dos direitos consagrados no n.º 4 do artigo 268.º e no n.º 3 do artigo 103.º da CRP, ou do direito ao bom nome e à reputação, à imagem e à protecção legal contra qualquer forma de discriminação, consagrados no artigo 26.° n.º 1 da CRP.
V - O facto de o julgador ter lavrado «breves notas» sobre o mérito da reclamação não inquina a decisão de um erro de julgamento dotado de consequências jurídicas, pois esse obiter dictum constitui uma excrescência em relação ao silogismo judiciário que suporta a decisão de diferimento da subida da reclamação e de relegar a apreciação do seu mérito para momento posterior.
Nº Convencional:JSTA00066537
Nº do Documento:SA2201007140547
Data de Entrada:06/23/2010
Recorrente:A...
Recorrido 1:INST DA VINHA E DO VINHO
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF VISEU PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Área Temática 2:DIR CONST.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART188 N1 ART278 N3.
L 87-B/98 DE 1998/12/31 ART51.
LGT98 ART95 N1 N2 J ART103 N2.
CONST97 ART165 N1 I ART268 N4 ART103 N3.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC581/09 DE 2009/07/29.; AC STA PROC1017/08 DE 2009/01/21.; AC STA PROC1169/09 DE 2010/01/27.; AC STA PROC102/10 DE 2010/02/24.
Referência a Doutrina:GOMES CANOTILHO E OUTRO CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA 4ED PAG467.
Aditamento:
Texto Integral: 1. A…, LDª, com os demais sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal da decisão proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu que determinou a subida diferida da reclamação apresentada contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de Tondela que ordenou a instauração de processo de execução fiscal para cobrança de crédito do Instituto da Vinha e do Vinho e a citação daquela sociedade para essa execução.
Rematou as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões:
A) A douta sentença recorrida entendeu que o caso sub judice não integra uma situação de prejuízo irreparável e, em consequência, não determinou a subida imediata, com efeito suspensivo, da presente reclamação;
B) Todavia, a A… alegou e demonstrou factos que consubstanciam uma situação de prejuízo irreparável, nomeadamente alegou e discriminou que a relação activo/passivo da empresa apresenta um forte desequilíbrio no que respeita a valores de médio ou longo prazo, acentuando ainda mais, no que se refere a valores de curto prazo, com graves reflexos na sua tesouraria, bem como que, se as execuções que identificou no articulado de reclamação, incluindo o processo executivo sobre o qual corre a presente reclamação, derem lugar a penhoras, o desequilíbrio da relação activo/passivo aumentará, precipitando a empresa para o incumprimento imediato e generalizado das suas responsabilidades, pondo em causa a sua sobrevivência enquanto reunião de factores de produção, tendo como consequência inevitável a sua insolvência;
C) É certo que a A… coloca a verificação do prejuízo irreparável com a concretização da penhora de bens do seu património que, mais do que uma mera suposição, consubstancia uma real e previsível consequência processual.
D) Contudo, tal facto não obsta ao conhecimento imediato da presente reclamação, dado que resulta da melhor doutrina que o direito à tutela judicial efectiva não se restringe à possibilidade de reparação dos prejuízos provocados por uma actuação ilegal, exigindo antes que sejam evitados os próprios prejuízos (cf. Jorge Lopes de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, pág. 667).
E) A A… alega que a concretização da penhora de bens lhe irá provocar prejuízos na sua actividade, tais como o previsível aumento do desequilíbrio da relação activo/passivo e na precipitação da empresa para o incumprimento imediato e generalizado das suas responsabilidades, pondo em causa a sua sobrevivência e tendo como consequência inevitável a sua insolvência.
F) Da mesma forma, caso se avance para a penhora sobre os bens comercializados pela A… - o vinho armazenado - esta ficará impossibilitada de efectuar negócios jurídicos e a sua actividade comercial paralisará, o que conduzirá inevitavelmente à sua insolvência - um prejuízo irreparável.
G) Insolvência essa que pela sua própria natureza, como é do conhecimento comum, encerrará um prejuízo manifestamente elevado, de grau não imediatamente apreensível, que não é facilmente computável em termos monetários.
H) Pelo que, a presente reclamação é um daqueles casos de subida imediata, nos termos do artigo 278° do CPPT, sob pena de perder toda utilidade.
Sem prescindir:

I) A douta sentença a quo faz uma aplicação da norma contida no art. 278.° do CPPT na dimensão normativa segundo a qual haverá subida imediata quando, sem ela, ocorrerem prejuízos irreparáveis que não sejam os inerentes a qualquer execução, dimensão normativa essa que padece de inconstitucionalidade orgânica e material, inconstitucionalidade essa que aqui se invoca para os devidos efeitos.
J) Não poderá ainda proceder a tese defendida pelo Tribunal a quo, segundo a qual a nulidade arguida pela Recorrente, no que respeita ao despacho do órgão da execução fiscal ordenando a instauração da execução e a citação da executada, deveria ter sido invocada perante o órgão da execução fiscal e só da decisão proferida por este, caberia reclamação para o tribunal.
L) Na verdade, do artigo 276.° e 277.° do CPPT decorre precisamente o contrário.
Termos em que, deve o presente recurso proceder, revogando-se a sentença recorrida.

1.2. O Recorrido – INSTITUTO DA VINHA E DO VINHO – apresentou contra-alegações para defender a manutenção do julgado.

1.3. O Exm.º Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de que devia ser negado provimento ao recurso, com a seguinte argumentação:
«A jurisprudência deste Supremo Tribunal Administrativo tem vindo a entender que “só é completamente inútil a reclamação com subida diferida quando o prejuízo eventualmente decorrente daquela decisão não possa ser reparado» sendo que não preenche tal condicionalismo a reclamação do acto de instauração da execução fiscal com fundamento na sua ilegalidade Vide neste sentido os Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 23.05.2007, processo 374/07, e 9 de Agosto de 2006 - recurso n.° 0229/06, ambos in www.dgsi.pt..
Como se disse no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 23.05.2007, rec. 374/07 “a subida da reclamação após a penhora não a torna totalmente inútil, pelo contrário, pois, se deferida a reclamação, o acto processual em causa - a instauração da execução – será anulado, ficando esta sem efeito.

Claro que com os prejuízos inerentes mas (...) só a respectiva irreparabilidade é fundamento da subida imediata. A eventual ilegalidade da instauração da execução fiscal não leva, pois, necessária e automaticamente, à subida imediata da reclamação respectiva.”.

A interpretação correcta do regime de subida da reclamação previsto no artº 278° do CPPT é, aliás, a de que só haverá subida imediata quando, sem ela, ocorrerem prejuízos irreparáveis que não sejam os inerentes a qualquer execução.

E isto porque, a admitir-se que prejuízos omnipresentes na generalidade das execuções possam relevar para efeito de subida imediata da execução, chegar-se-ia à conclusão de que a subida imediata seria a regra, o que estaria em contradição como o n° 1 do artº 278° que adoptou a regra da subida diferida. Vide neste sentido Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário, anotado, 5ª edição, II vol. pág. 667.

Não procede também a invocada violação do princípio constitucional da tutela judicial efectiva.

Como sublinha Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário, Anotado, 5ª edição, II vol. pág. 667, “no âmbito da protecção constitucional garantida pelo direito à tutela judicial efectiva não se pode incluir protecção contra os inconvenientes próprios de qualquer processo judicial executivo, pois eles são inerentes ao próprio funcionamento do regime judiciário global relativo a tutela de direitos.”.

E muito menos procede a alegada inconstitucionalidade orgânica da dimensão normativa extraída do art.° 278°, n.º 3 do CPPT.

A norma do art.° 278°, n° 3 do CPPT só contenderia com o disposto nos arts. 95°, ns. 1 e 2 e 103° da Lei Geral Tributária nos casos em que a subida deferida fizesse perder qualquer utilidade à reclamação, o que se reconduziria à denegação da possibilidade prática de reclamação (e seria incompatível com o disposto nos aludidos normativos da Lei Geral Tributaria) Cf., neste sentido Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 21.01.2009, recurso 1017/08.

Mas não é isso que sucede como já vimos, no caso subjudice, em que está em causa uma reclamação do acto de instauração da execução fiscal, com fundamento na sua ilegalidade, pois que a subida da reclamação após a penhora não a torna totalmente irrelevante.».

1.4. Com dispensa dos vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, atenta a natureza urgente do processo, cumpre decidir.

* * *
2. Na decisão recorrida deu-se como assente a seguinte matéria de facto:
A) No dia 26 de Fevereiro de 2008 deu entrada no Serviço de Finanças de Tondela Certidão de dívida emitida pelo Instituto da Vinha e do Vinho acompanhada de ofício onde se solicitou a instauração de execução fiscal - cfr. fls. 4 a 7 dos autos, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o mesmo se dizendo dos demais documentos infra referidos;
B) Na mesma data foi proferido despacho com o seguinte teor "autue-se e faça-se conclusos" - vide despacho a fls. 4, in fine, lado direito;
C) O Chefe do Serviço de Finanças de Tondela, por despacho proferido em 12-03-2009, ordenou a citação da executada, ora Reclamante - cfr. fls. 9;
D) A ora Reclamante foi citada, pessoalmente, na pessoa do seu administrador B…, em 13/03/2009, para os termos da execução fiscal - vide fls. 10;
E) Em 23/03/2009, apresentou a presente reclamação no Serviço de Finanças de Tondela - cfr. fls. 11 e segs., 65 e 78;
F) Não foi efectuada a penhora ou a venda de bens da Reclamante.
G) De acordo com um balanço provisório realizado a 30-11-2007 (veja-se documento constante de fls. 21 a 23 que a Fazenda Pública não questionou), a ora reclamante tem:
- G1) um activo bruto de 89.538.950,20€ e um passivo exigível de 78.868.032,87 €;
- G2) um imobilizado líquido com o valor contabilístico de 1.224.767,58 €;
- G3) Stocks avaliados no valor de 28.274.635,36 €;
- G4) Créditos a receber, a médio e longo prazo, que totalizam o montante de 13.890.993,19 €;
- G5) Créditos a receber, a curto prazo, que totalizam o montante de 38.776.765,80 €;
- G6) Dívidas a terceiros, de médio e longo prazo, no total de 17.114.760,34 €, sendo 11.206.725,44 € a instituições bancárias;
- G7) Dívidas a terceiros, de curto prazo, no total de 61.634.183,72 €:
- a instituições de crédito no valor de 29.112.269,06 €;
- saldo da conta corrente de fornecedores no montante de 7.272.704,88 €;
- títulos a pagar a fornecedores no montante de 114.867,77 €;
- dívidas a accionistas no montante de 2.510.756,18 €;
- total de imobilizados de fornecedores no montante de 134.934,10 €;
- dívidas ao Estado e a outros entes públicos no montante de 13.163,32 €;
- outros credores no montante de 18.401.613,47 €.
H) Para além da execução a que esta Reclamação respeita pendem no Serviço de Finanças de Tondela outras execuções, dos anos de 2002 a 2008, que no seu conjunto atingem dívidas em montante superior a 27.000.000,00 €, não se encontrando nenhuma suspensa nos termos do artigo 169° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, veja-se certidão de fls.140 a 145;
I) Dívidas cuja validade/regularidade é questionada em processos de impugnação, oposição e ou reclamação de actos do Órgão de execução fiscal, idem anterior, observações a fls. 145.
* * *
3. O presente recurso vem interposto da decisão, proferida em 12 de Maio de 2010 pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, que julgou que não tinha subida imediata a tribunal a reclamação deduzida pela sociedade ora Recorrente contra o acto do Chefe do Serviço de Finanças de Tondela que determinou a instauração de processo de execução fiscal e a sua citação para essa execução.
Na verdade, segundo o julgador, a reclamação só pode subir a tribunal após a penhora de bens, por não se pode dar por verificado um prejuízo irreparável causado pela falta de apreciação imediata da reclamação. E, por isso, rematou com a decisão de remessa dos autos «ao órgão da execução fiscal com vista ao prosseguimento dos mesmos, devendo subir a este tribunal, se necessário, no momento processual supra referido.».
Todavia, o Mmº Juiz não quis deixar de expressar «umas breves notas» sobre o mérito da reclamação, mais precisamente no que toca à invocada nulidade da citação por desrespeito do prazo definido no artigo 188.º do CPPT, expressando a opinião de que «o prazo em causa deve ser entendido como meramente disciplinador», não determinado a nulidade ou a anulação do acto de citação que seja realizado fora desse prazo, além de que essa questão não deve ser suscitada directamente na reclamação dirigida ao tribunal, devendo ser arguida previamente perante o órgão da execução fiscal.
Neste contexto, e perante o teor das conclusões apresentadas pela Recorrente, são três as questões suscitadas no presente recurso. A saber: (i) erro de julgamento por errada interpretação da norma contida no artigo 278.º do CPPT no que toca à questão do momento da subida da reclamação a tribunal; (ii) inconstitucionalidade orgânica e material do artigo 278.º, n.º 3 do CPPT; (iii) erro no julgamento da questão da nulidade da citação.
3.1. A problemática acerca do momento da subida a tribunal de reclamação deduzida contra a decisão do órgão da execução fiscal que ordena a instauração de processo executivo e a citação da devedora já foi objecto de análise em diversos acórdãos desta Secção de Contencioso Tributário, designadamente nos que foram proferidos em 29/07/2009, em 21/01/2009, em 27/01/2010, e em 24/02/2010, nos processos nºs 589/09, 1017/08, 1169/09 e 102/10, respectivamente, e que incidiram sobre casos idênticos.
Não hesitamos em acompanhar a doutrina que neles foi sufragada – no sentido de que a interpretação correcta do regime de subida previsto no nº 3 do artigo 278.º do CPPT é a de que só há subida imediata da reclamação quando, sem ela, ocorrerem prejuízos irreparáveis que não sejam os inerentes a qualquer execução – dada a bondade da respectiva fundamentação e que a Recorrente bem conhece uma vez que também figurava como recorrente nesses processos.
Com efeito, o facto de se ter previsto no n.º 3 do artigo 278.º do CPPT a subida imediata da reclamação, como excepção à regra da subida diferida prevista no n.º 1, aponta claramente no sentido de se poderem apenas considerar como relevantes os prejuízos que não sejam os que estão associados normalmente a qualquer processo executivo, como os transtornos, incómodos ou inconvenientes próprios de qualquer processo judicial de execução.
Continua, porém, a Recorrente a defender que a instauração da execução com a sequente concretização da penhora de bens irá provocar prejuízos irreparáveis na sua actividade, pelo que se imporia a subida imediata da reclamação dado que a apreciação diferida acarretaria a perda do efeito útil da decisão.
Tal tese não pode, porém, obter acolhimento, mesmo à luz do entendimento jurisprudencial dominante, em que nos revemos, de que o «prejuízo irreparável» a que se refere o nº 3 do artigo 278.° do CPPT não deve restringir-se às situações aí enumeradas, devendo ser estendido a todos aqueles casos em que a regra da subida diferida faz perder toda e qualquer utilidade à reclamação, isto é, a todos aqueles casos em que a reclamação fique sem finalidade alguma por força da sua subida diferida ou em que a sua apreciação e decisão pelo tribunal, ainda que favorável ao recorrente, já não lhe possa aproveitar, situação que acarreta, igualmente, um prejuízo irreparável.
Como se deixou explicado no acórdão proferido pelo STA em 29/07/2009 no processo nº 589/09, deve «assegurar-se a subida imediata das reclamações sempre que, sem ela, elas percam toda a utilidade. Pois nos casos em que a subida diferida faz perder qualquer utilidade à reclamação a imposição desse regime de subida reconduz-se à denegação da possibilidade de reclamação, pois ela não terá qualquer efeito prático, o que seria incompatível com a Lei Geral Tributária e o referido sentido da lei de autorização legislativa (Lei n.º 87-B/98, de 31 de Dezembro), devendo, então, aceitar-se, em tais casos, a subida imediata. (…).
A predita inutilidade não pode todavia deixar de se relacionar com a irreparabilidade do prejuízo. Como refere o acórdão deste Tribunal de 9 de Agosto de 2006 - recurso n.º 0229/06, a inutilidade resultante da subida diferida da reclamação é noção a definir em presença da de prejuízo irreparável de que fala a lei.
É seguro que o legislador não quis impor a subida imediata de todas as reclamações cuja retenção pode originar prejuízos.
Não está em causa, pois, poupar o interessado a todo o prejuízo. Por isso se estabelece que as reclamações sobem imediatamente só quando a sua retenção seja susceptível de provocar um prejuízo irreparável.
Em súmula, a reclamação que não suba logo não perde todo o seu efeito útil, mesmo que não evite o prejuízo que se quer impedir, desde que seja possível repará-lo.
Ora, a jurisprudência tem interpretado de forma exigente o requisito da absoluta ou total inutilidade do recurso (reclamação), entendendo-se que a sua eventual retenção deverá ter um resultado irreversível, não bastando a mera inutilização de actos processuais, ainda que contrária ao princípio da economia processual, sem que aí se possa vislumbrar qualquer ofensa constitucional - cfr. Lebre de Freitas, Código de Processo Civil anotado, vol. 3, pp. 115/116, e jurisprudência aí citada.
Ora, não se vê que tal seja o caso dos autos. A subida da reclamação após a penhora não a torna totalmente inútil, pelo contrário, pois, se deferida a reclamação, o acto processual em causa - a instauração da execução -, será anulado, ficando esta sem efeito.
Claro que com os prejuízos inerentes mas, como se disse, só a respectiva irreparabilidade é fundamento da subida imediata.
A eventual ilegalidade da instauração da execução fiscal não leva, pois, necessária e automaticamente, à subida imediata da reclamação respectiva. (...)
Por outro lado, também se não vê em como a citação só por si possa provocar à executada prejuízos necessariamente irreparáveis ou como a subida diferida duma reclamação daquela fará com que esta perca toda a sua utilidade.
Em conclusão se dirá, pois, que a interpretação correcta do regime de subida previsto no artigo 278.º, n.º 3 do CPPT será a de que só haverá subida imediata quando, sem ela, ocorrerem prejuízos irreparáveis que não sejam os inerentes a qualquer execução.
Em suma, a lei não pretende poupar o interessado a todo e qualquer prejuízo, designadamente ao que é inerente ao próprio funcionamento do regime judiciário relativo à tutela de direitos, e, por isso, só impõe a subida imediata quando a retenção da reclamação seja susceptível de gerar um «prejuízo irreparável», o qual pode ocorrer sempre que a subida diferida faça perder toda a utilidade à reclamação.
Ora, a presente reclamação, tendo por objecto a decisão de mandar instaurar a execução e de mandar citar a Reclamante para os termos da execução, não perde o seu efeito útil pelo facto de ter subida diferida, isto é, após a penhora de bens, pois no caso de diferimento da reclamação aquela decisão será anulada, ficando sem efeito todos os actos processuais subsequentes, designadamente o acto de penhora.
Neste enquadramento, visto que a aplicação da regra geral da subida diferida não leva a que a presente reclamação fique sem finalidade alguma e visto que os prejuízos invocados se traduzem em danos inerente à instauração de qualquer processo judicial executivo, conclui-se que a decisão recorrida não padece do erro de julgamento que lhe é imputado no que concerne à interpretação do artigo 278.º do CPPT.
3.2. Sustenta, ainda, a Recorrente a inconstitucionalidade orgânica e material do artigo 278.º, n.º 3 do CPPT.
Quanto à inconstitucionalidade orgânica, afirma que ela resulta de a interpretação dada ao nº 3 do artigo 278.° do CPPT não observar a directiva resultante do artigo 51.º da Lei n.º 87-B/98, de 31 de Dezembro, que autorizou o Governo a aprovar o CPPT “no respeito pela compatibilização das suas normas com as da lei geral tributária”. Ao fim e ao cabo, o que sustenta é que o direito de reclamação para o juiz estava assegurado pela LGT relativamente a todos os actos lesivos praticados em processo de execução fiscal, sem limitação (artigos 95.º, nºs 1 e 2, alínea j) e 103.º, n.º 2), pelo que aquela norma do CPPT extravasaria do âmbito da referida lei de autorização legislativa e do âmbito de competência do Governo por se tratar de matéria que cabe na reserva de competência legislativa da Assembleia da República estabelecida pela alínea i) do n.º 1 do artigo 165.º da CRP.
Todavia, não lhe assiste razão, pois o aludido preceito do CPPT não coarcta o direito dos particulares à apreciação judicial de todos os actos lesivos praticados pela administração fiscal na execução, cingindo-se a delimitar um conjunto de situações em que essa apreciação é considerada prioritária e que devem, por isso, ser apreciadas imediatamente pelo tribunal. E nenhum daqueles preceitos da LGT estabelece que a impugnação dos actos lesivos praticados pelas autoridades da administração tributária no processo de execução fiscal têm de subir imediatamente a tribunal para apreciação.
Deste modo, e considerando que as reclamações podem ter por objecto quaisquer actos materiais de execução que sejam susceptíveis de afectar a esfera jurídica dos particulares, isto é, que tenham uma mera potencialidade lesiva, apenas sendo insusceptíveis de reclamação, pela sua natureza, os despachos de mero expediente e os proferidos no uso legal de um poder discricionário previstos no artigo 679.° do CPC, não há como afirmar a violação ou limitação do direito de reclamar de todos os actos lesivos praticados na execução fiscal.
Aliás, o Tribunal Constitucional já teve oportunidade de se pronunciar sobre esta matéria, no âmbito do recurso nº 338/2009, de 8 de Julho de 2009, em que também intervieram como partes os ora Recorrente e Recorrido, tendo deixado explicitado o seguinte:
«O artigo 95.º da LGT garante o direito de impugnação ou recurso, preceituando que o interessado tem direito de impugnar ou recorrer de todo o acto lesivo dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos segundo as formas de processo prescritas na lei (n.º 1) e indica, no elenco dos actos lesivos, os praticados na execução fiscal [n.º 2, alínea i)]. E o artigo 103.º estabelece que é garantido aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária, dando corpo à injunção de “consagrar o direito dos particulares de solicitar a intervenção do juiz no processo”, constante da alínea 19) do artigo 2.º da Lei n.º 41/98, de 4 de Agosto, através da qual foi concedida autorização ao Governo para aprovar a Lei Geral Tributária.
Porém, nenhum destes preceitos estabelece que a impugnação dos actos lesivos praticados pelas autoridades da administração tributária no processo de execução fiscal tem de subir imediatamente ao tribunal para apreciação. Essa é matéria que a LGT relega para as formas de processo prescritas na lei. Assim, não é possível ir buscar à directiva de que o Código compatibilize as suas normas com as da lei geral tributária o sentido de que o legislador autorizado estava vinculado a consagrar um regime de subida imediata de todas as reclamações de actos do órgão de execução fiscal.
Ora, a norma em causa não nega ao executado o direito de impugnar os actos lesivos praticados pela Administração nesse processo de execução. Limita-se a disciplinar os termos da impugnação, diferindo a apreciação daqueles que respeitem à fase anterior à penhora para o momento em que esta fase processual esteja concluída. É domínio não regulado nos preceitos da LGT que a recorrente indica - nem o Tribunal consegue vislumbrar que o seja em quaisquer outros - pelo que não pode dizer-se que essa norma contraria o mandato de compatibilização das soluções do Código com as dessa Lei.
Deste modo, saber se a solução do Código satisfaz as garantias de tutela jurisdicional efectiva contra actos lesivos praticados na execução fiscal será questão de constitucionalidade material, mas não de inobservância do sentido da lei de autorização legislativa, porque a remissão integrativa desta para a Lei Geral Tributária não é susceptível de interpretação como comportando uma directiva ao legislador autorizado quanto a este aspecto do regime da reclamação.
Assim, o recurso é claramente infundado quanto à inconstitucionalidade orgânica».
3.3. Quanto à invocada inconstitucionalidade material do nº 3 do artigo 278.°, ela resultaria da violação da garantia de impugnação de quaisquer actos administrativos lesivos, consagrada no n.º 4 do artigo 268.º da Constituição; da violação do direito de não pagar impostos cuja liquidação ou cobrança se não façam nos termos da lei, consagrado pelo n.º 3 do artigo 103.º da Constituição; e da violação dos direitos ao bom nome e à reputação, à imagem e à protecção legal contra qualquer forma de discriminação, todos consagrados no artigo 26.° n.° 1 da Constituição.
Esta matéria foi igualmente apreciada pelo Tribunal Constitucional no aludido acórdão, cuja fundamentação sufragamos e que, por isso, passamos a transcrever:
«A norma em causa não afasta a impugnabilidade de quaisquer actos lesivos da administração tributária praticados em processo de execução fiscal. O interessado pode submeter ao juiz toda e qualquer actuação do órgão de execução que tenha como lesiva dos seus direitos e interesses legítimos. O que da norma resulta é o condicionamento temporal da apreciação jurisdicional da impugnação, fazendo depender a intervenção imediata do tribunal da insusceptibilidade de reversão ou de reparação dos efeitos dos actos cuja legalidade se discuta.
Desse modo, importa saber se a subordinação da subida imediata da reclamação à condição de susceptibilidade de ocorrência de prejuízos irreparáveis tem justificação razoável e se o momento processual escolhido para a subida da reclamação quando aos actos anteriores à penhora é arbitrário. E, adianta -se, tem justificação e não é arbitrário. (…).
A fase inicial do procedimento executivo é ordenada de modo a obter o pagamento ou a possibilitar rapidamente a penhora ou a prestação de garantia que assegurem a satisfação do crédito exequendo. Processando-se a reclamação no próprio processo da execução fiscal [artigo 97.º, n.º 1, alínea n), do CPPT], a subida imediata da reclamação antes de completada a penhora ou garantida a quantia exequenda e acréscimos permitiria sucessivas paralisações dos actos de execução, afectando a pretendida celeridade do processo de execução fiscal. Especial celeridade, até no confronto com o processo de execução comum, que encontra justificação na natureza do crédito e na finalidade de arrecadação dos dinheiros públicos, em especial dos proporcionados pelo sistema fiscal que visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas e uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza (artigo 103.º da CRP), que sairiam frustrados se os actos definitórios das receitas não tivessem realização efectiva. Foi o equilíbrio entre os interesses do credor público e os interesses do executado ou de terceiro afectado por actos praticados no processo de execução que o legislador procurou alcançar ao congregar a regra da subida diferida da reclamação com a excepção para os casos de ilegalidades susceptíveis de causar prejuízos irreparáveis.
Esta conformação do regime de subida da reclamação, tal como resulta da interpretação adoptada pela decisão recorrida do regime instituído pelo artigo 278.º do CPPT, satisfaz as exigências de adequação, necessidade e justa medida, condicionando temporalmente mas não sacrificando a efectividade da tutela jurisdicional contra actos lesivos, que é ressalvada pela subida imediata da reclamação quando a subida diferida criar um deficit que não seja remediável pela anulação dos actos processuais entretanto praticados.
E não se torna lesivo dessa garantia pelo facto de, para este efeito, não serem considerados susceptíveis de integrar o conceito de prejuízos irreparáveis os efeitos coactivos ou desfavoráveis inerentes à própria instauração da execução e à convocação (mediante o acto de citação) para os termos do processo de execução fiscal. Eles são os mesmos de qualquer processo judicial executivo, não podendo considerar -se compreendidos no âmbito da protecção constitucional, como salienta o acórdão recorrido, os incómodos inerentes ao próprio funcionamento do regime global relativo à tutela dos direitos. Esses efeitos inevitáveis, resultantes para um dos sujeitos processuais do facto de o outro sujeito da relação accionar os meios de tutela jurisdicional a que também tem direito, só podem encontrar remédio nas sanções contra a litigiosidade abusiva ou imprudente e pela via de indemnização. Ora, mesmo que não se retire argumento da qualificação legal de tal processo como judicial (artigo 103.º, n.º 2, da LGT) porque o que se trata é de controlar a legalidade de actos da autoria de um órgão administrativo, seria manifestamente lesivo do interesse constitucionalmente legítimo que se pretende realizar através do processo de execução fiscal e do cometimento da prática de actos de natureza não jurisdicional nesse processo a órgãos da administração fiscal permitir a sua paralisação com fundamento em tais incómodos (…).
Deste modo, encontrando este regime de subida das reclamações fundamento constitucionalmente legitimado pelo interesse público, que ao legislador também é imposto proteger, de celeridade do processo de realização coerciva da dívida e não constituindo uma barreira ou constrangimento excessivos ao direito dos contribuintes a verem apreciadas em sede contenciosa as reclamações que deduzam dos actos praticados pelos órgãos de execução fiscal, não se considera violada a garantia de acesso aos tribunais para impugnação dos actos administrativos lesivos (artigo 268.º, n.º 4, da CRP).
5.2 - Alega, depois, a recorrente que a norma em apreciação conduz à violação do direito de não pagar impostos cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei (artigo 103.º, n.º 3, in fine, da CRP).
É arguição manifestamente destituída de fundamento.
Com efeito, a norma em causa, respeitando apenas ao momento de subida da reclamação e não ao seu conteúdo, não veda ao executado a possibilidade de discutir seja o que for. Se tiver razão, os actos praticados serão anulados e nada pagará.(...).
5.3 - Por último, invoca a recorrente a violação dos direitos ao bom nome e reputação, à imagem e à protecção contra quaisquer formas de discriminação, a todos reconhecidos pelo n.º 1 do artigo 26.º da Constituição.
Também quanto a este fundamento do recurso a improcedência é evidente e se encontra já nas considerações anteriores o princípio de resposta do Tribunal.
Com efeito, o objecto de recurso é a norma respeitante ao momento de subida da reclamação e não, em concreto, saber se efectivamente a instauração da execução é susceptível de afectar o crédito, a confiança ou a imagem de que na praça goze a recorrente. E esse conteúdo normativo é, por si, neutro relativamente a esses supostos efeitos lesivos, de que não é causa adequada.
Mesmo que se considere que, na medida em que não permita atalhá-los imediatamente, contribui para os efeitos prejudiciais ao executado decorrentes do acto da instauração da execução (necessidade de deduzir oposição, sujeição à penhora ou à prestação de garantia para obter efeito suspensivo), a norma em causa não infringe o n.º 1 do artigo 26.º da Constituição.
Desde logo, não se vislumbra qualquer nexo entre o diferimento da subida da reclamação e a protecção contra qualquer forma de discriminação.
E a recorrente também não fundamenta essa imputação. O regime é universal, aplicando-se a qualquer reclamante em processo de execução fiscal que não sofra prejuízo irreparável com a retenção, pelo que, sendo evidente a improcedência do fundamento seria ocioso entrar em mais detalhada explicação sobre o recorte jurídico e dogmático deste novo direito pessoal acrescentado pela Lei Constitucional n.º 1/97 (5.ª Revisão) ao elenco dos direitos fundamentais pessoais.
E também revela uma disfuncionalidade interpretativa patente, mais a mais tratando-se de uma pessoa colectiva, a alegação de que uma tal norma pode violar o direito à imagem. Como dizem Gomes Canotilho e Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, 4.ª ed., pág. 467, tem um conteúdo assaz rigoroso, abrangendo, primeiro, o direito de definir a sua própria auto-exposição, não sendo fotografado nem vendo o seu retrato exposto em público sem o seu consentimento e, depois, o direito de não o ver apresentado em forma gráfica ou montagem ofensiva e malevolamente distorcida. Além de ser direito insusceptível de ser lesado pela norma em causa, é direito incompatível com a natureza das pessoas colectivas, porque só é concebível relativamente a pessoas físicas (artigo 12.º, n.º 2, da CRP). A recorrente parece ter confundido o termo constitucional “imagem” com a reputação ou consideração no mundo dos negócios.
Por último, o direito ao bom nome e reputação, como referem os autores anteriormente citados, consiste essencialmente no direito a não ser ofendido ou lesado na sua honra, dignidade ou consideração social mediante imputação feita por outrem, bem como no direito a defender-se dessa ofensa e a obter a correspondente reparação. Este direito fundamental pessoal só em termos translatos assiste às pessoas colectivas, que têm credibilidade, prestígio e confiança e o direito à correspondente protecção, mas dificilmente se concebe que sejam dotadas de honra e dignidade pessoal.
De todo o modo, a instauração de um processo executivo não é, na generalidade das situações, susceptível de causar lesão irreparável do bom nome e reputação. A protecção do bom nome não pode excluir o direito do credor de instaurar um processo executivo com vista à cobrança do crédito a que o título o habilita, fazendo-se a compatibilização ou concordância prática entre os direitos em conflito através dos meios judiciais de reacção contra a pretensão ilegal do credor eventualmente completados pela indemnização dos danos decorrentes da actuação abusiva ou manifestamente imprudente. Meios esses que, neste aspecto, não sofrem diminuição essencial da eficácia de protecção pelo diferimento que resulta da norma.
Por tudo o exposto, conclui-se que a norma do n.º 3 do artigo 278.º do CPPT, interpretado no sentido de que, em processo de execução fiscal, só haverá subida imediata da reclamação dos actos do órgão de execução quando, sem ela, ocorram prejuízos irreparáveis que não sejam os inerentes a qualquer execução, não viola os artigos 165.º, n.º 1, alínea i), 103.º, n.ºs 2 e 3, e 26.º, n.º 1, da Constituição.».
3.3. Por fim, a Recorrente sustenta que o Mm.° Juiz a quo terá incorrido em erro ao não reconhecer, na decisão recorrida, que a violação do prazo para citação do executado, estabelecido no n.º 1 do artigo 188.° do CPPT, inquina de nulidade o correspondente processo executivo, tal como havia defendido em sede de petição inicial.
Todavia, o facto de o julgador, a dado passo, ter lavrado umas «breves notas» sobre o mérito da reclamação, mais precisamente sobre a invocada nulidade da citação por desrespeito do prazo definido no artigo 188.º do CPPT, não inquina a decisão recorrida de um erro de julgamento dotado de consequências, pois esse «obiter dictum» constitui uma excrescência em relação ao silogismo judiciário que motivou e estruturou a decisão proferida, decisão que é, indubitavelmente, a de aprazar a subida da reclamação para momento posterior à penhora e, consequentemente, de diferir a apreciação jurisdicional do mérito da reclamação para essa altura.
Essas «breves notas», ainda que incidam sobre o mérito da reclamação, não podem ser encaradas como o fruto do exercício de um poder decisório de que o juiz ainda dispusesse, pois, como vimos, ele decidiu, e bem, que não havia chegado o momento de apreciar o mérito da reclamação, relegando, assim, esse conhecimento para momento posterior. Por isso, consideramos que essas «notas» não têm uma verdadeira natureza decisória, antes se apresentando como uma excrescência inútil relativamente à pronúncia que a sentença contém e que é, unicamente, a de mandar remeter os autos «ao órgão da execução fiscal com vista ao prosseguimento dos mesmos, devendo subir a este tribunal, se necessário, no momento processual supra referido».
Não contendo a decisão recorrida uma pronúncia que se possa apelidar de decisória sobre a questão da nulidade da citação, pronúncia que só poderá ocorrer quando chegar o momento próprio da subida da reclamação a tribunal para apreciação do respectivo mérito, não podemos deixar de concluir pela irrelevância das conclusões da alegação do presente recurso que visam afrontar essa decisão fictícia; tal é o caso das conclusões I), J) e L).
Improcedem, desta forma, todas as conclusões do recurso.
* * *
4. Face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA em negar provimento ao recurso, confirmando a decisão que entendeu não conhecer, de imediato, do mérito da reclamação e que determinou a sua subida diferida nos termos do n.º 1 do artigo 278.º do CPPT.
Custas pela Recorrente, fixando-se a procuradoria em 1/6.
Lisboa, 14 de Julho de 2010. Dulce Neto (relatora) - Alfredo Madureira - Valente Torrão.