Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01146/11
Data do Acordão:04/19/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
PENHORA DE CRÉDITO
CRÉDITO LITIGIOSO
SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Sumário:I – De acordo com o disposto no artº 224º, nº 1, alínea e) do CPPT, em vigor à data dos factos, negando o devedor a existência do crédito, no todo ou em parte, seria o mesmo considerado litigioso, na parte não reconhecida, e, como tal, seria posto à venda por três quartas partes do seu valor.
II – No caso de litigiosidade do crédito penhorado, podia também a Fazenda Pública promover a acção declaratória, suspendendo-se entretanto a execução se o executado não possuísse outros bens penhoráveis.
III – Deste modo, carece de fundamento legal a tese da Fazenda Pública de pretender que, mesmo negando o devedor a dívida, a execução deveria prosseguir contra ele uma vez que aquele crédito constava da contabilidade da executada.
Nº Convencional:JSTA00067545
Nº do Documento:SA22012041901146
Data de Entrada:12/19/2011
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:RECLAMAÇÃO
Objecto:DESP STA PROC1146/11
Decisão:INDEFERIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART224
CPC96 ART858
Jurisprudência Nacional:AC RP DE 2004/02/09 IN CJ N1 PAG181
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I. Por decisão do Relator, proferida ao abrigo do disposto nos artºs 700º, nº 1, alínea b) e 705º, ambos do CPC, foi julgado procedente o recurso interposto por A……, com os demais sinais nos autos, da decisão do Mmº Juiz do TAF de Viseu que julgou improcedente a oposição à execução fiscal contra si instaurada ao abrigo do disposto no artº 224º do CPPT.

E, deste modo, foi revogada a decisão recorrida e julgada procedente a oposição.

II. Veio agora a recorrida Fazenda Pública pedir que sobre aquela decisão recaia acórdão, por discordar do decidido pelo Relator.

III. No recurso da decisão recorrida o recorrente apresentou, para o efeito, alegações nas quais conclui:

a) O presente recurso vem interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, de 09 de Dezembro de 2008, proferida nos autos do processo n.° 382/06.OBEVIS, a qual indeferiu a Oposição à execução deduzida pelo Recorrente, A…….

b) Nos termos da douta sentença recorrida, foi a oposição indeferida, designadamente, por ali se entender que "a escrituração comercial faz fé, enquanto não for posta em causa e contraditada por outros meios probatórios com força superior, pelo que, verificada a existência do crédito penhorável, que o oponente não depositou, prosseguiu, contra si, o processo de execução fiscal", sendo consequentemente e no entender do Tribunal a quo a oposição deduzida improcedente.

c) Entende, o ora Recorrente, salvo o devido respeito, e melhor entendimento, que o Tribunal a quo, fez na sentença ora recorrida uma errada interpretação e aplicação do direito aos factos.

d) Havendo na douta sentença recorrida quer normas jurídicas que foram violadas quer erro na subsunção dos factos ao direito, os quais impunham outra decisão, na qual se conferisse provimento à Oposição deduzida.

e) Desde logo, e em primeiro lugar, há na douta sentença recorrida erro de julgamento, já que o Tribunal a quo, fazendo uma errada subsunção dos factos ao direito, desconsiderou as formalidades a que deve obedecer a penhora de créditos e que, in casu, não se encontravam preenchidas.

f) Com efeito, e conforme consta do probatório "Em 1/9/2005, o oponente deu entrada de um requerimento, no Serviço de Finanças da Feira-1, no qual declarou que a sociedade "B……, Lda", não era titular de qualquer crédito perante si, pelo que não iria proceder ao depósito de qualquer quantia".

g) Razão pela qual aquele (crédito) só poderia ser considerado como litigioso e como tal posto à venda, ou em alternativa, deduzida acção declaratória de modo a aferir da legalidade do crédito, sendo ilegal o prosseguimento da execução contra o Recorrente por aquele valor, nos termos do disposto na alínea e), do n.° 1, e do n.° 2, ambos do artigo 224.°, do CPPT.

h) Do disposto no artigo 224.°, do CPPT, resulta que compete ao (alegado) devedor declarar se o crédito existe, quais as garantias que o acompanham, a data em que se vence, bem como os restantes elementos que se revelem necessários à identificação do referido crédito.

i) Estipulando a lei que na falta dessa declaração se deverá considerar que o devedor reconhece a existência da obrigação nos termos estabelecidos na nomeação do crédito à penhora.

j) Sucede, porém, que nas situações em que o alegado devedor negue a existência do crédito e a DGCI - Exequente - mantenha a penhora, o crédito passa a considerar-se como litigioso,

k) Sendo nessa qualidade que será adjudicado ou transmitido.

l) Com efeito, a lei faz impender sobre o devedor do crédito penhorado - devedor do Executado - o ónus de declarar se o crédito existe ou não, sob pena de, nada dizendo, o mesmo ser reconhecido nos termos em que era indicado à penhora, ficando assim imediatamente assente no processo executivo e podendo ser como tal adjudicado ou vendido.

m) Sobre o alegado devedor do crédito objecto de penhora, recai o ónus de confirmar ou negar a existência do crédito, sendo que nas situações em que expressamente se nega a existência do crédito e, ainda assim, a exequente mantém a penhora, o crédito passa a ser considerado como litigioso e como tal será posto à venda por três quartas partes do seu valor, ou alternativamente, assiste à DGCI a possibilidade de promover a competente acção declaratória para reconhecimento desse crédito, caso em que se suspende entretanto a execução sobre esse bem até que seja proferida decisão sobre o litígio.

n) Sucede, pois, que sobre o alegado devedor a lei não faz impender o ónus de provar a inexistência do crédito perante a Exequente, cabendo-lhe apenas, e como se disse, o ónus de confirmar ou negar a existência do crédito.

o) Ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, quem tem o ónus de demonstrar, e provar, a existência do crédito é a Exequente - in casu, DGCI - no âmbito da competente acção declaratória.

p) Não logrando a DGCI fazer essa prova face à mera declaração de inexistência do crédito pelo terceiro devedor, o mesmo terá que ser posto à venda como crédito litigioso por três quartas partes do seu valor.

q) Atento o regime legal aplicável e a decisão do Tribunal a quo, sempre se haverá de concluir pela (evidente) violação do disposto no artigo 224.°, do CPPT.

r) Com efeito, o Tribunal a quo não se pronunciou sobre a falta de preenchimento das formalidades previstas naquele dispositivo, pese embora e conforme consta, aliás, da sentença recorrida seja da competência do "(...) Tribunal o conhecimento de todas as questões suscitadas pelas partes, e apenas destas, sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras (artigo 660°, n° 2, Código de Processo Civil, ex vi do artigo 2º, alínea e), do Código de Procedimento e de Processo Tributário)."

s) Com efeito, apesar de o aqui Recorrente ter negado a existência do alegado crédito, a DGCI considerou, unilateralmente, que esse crédito existia e dirigiu a execução contra o aqui Recorrente, com vista a cobrar o respectivo montante.

t) Tudo isto, quando à DGCI apenas assistia a possibilidade legal de considerar aquele crédito como litigioso ou interpor contra o ora Recorrente aquela que era a competente acção declaratória para reconhecimento do crédito.

u) Sobre nada disto se pronunciou o Tribunal a quo, desconsiderando o regime legal aplicável às formalidades da penhora de créditos, bastando-se com a (mera análise da) escrituração comercial.

v) Escrituração comercial essa que, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, foi posta em causa, quando o Recorrente informou a DGCI que o crédito não se verificava,

w) Sendo que, por outro lado, não era ao Recorrente a quem cabia contraditar essa escrituração, através de "outros meios probatórios com força superior", mas antes à DGCI provar que essa escrituração se encontrava correcta.

x) E, por outro lado, ainda, não competia à DGCI declarar como definitivamente certa e assente a existência do crédito nomeado à penhora, quando a declaração prestada pelo aqui Recorrente era no sentido de que aquele crédito não existia.

y) Face a todo o exposto, competia pois ao Tribunal a quo, verificar do preenchimento dos requisitos e formalidades previstos no artigo 224.°, n.° 1, alínea e) e n.° 2, do CPPT, de forma a aferir da legalidade do prosseguimento dos autos de execução contra o aqui Recorrente. O que, in casu, não fez.

z) Por outro lado, ainda, e conforme resulta do mesmo dispositivo - artigo 224.°, do CPPT - na redacção vigente à data dos factos, a penhora de créditos fazia-se através de auto em que intervinha o alegado devedor, tratando-se de um regime especial de penhora, ao qual não se aplicava o disposto no artigo 856.°, do Código de Processo Civil (CPC).

aa) Com efeito, a penhora de créditos prevista no artigo 224.°, do CPPT, não poderia ser efectivada por mera notificação postal, como sucedeu no caso em apreço, mas antes presencialmente.

bb) O que implica que a penhora de créditos na execução fiscal, no regime vigente à data dos factos, não consistia na mera notificação postal ao alegado devedor, mas na elaboração de um auto em que se observavam as regras das várias alíneas do n.° 1, do artigo 224.°, do CPPT.

cc) Trata-se, pois, de uma notificação pessoal, efectuada mediante diligência presencial, a que se aplicam as regras sobre citação pessoal, nos termos do n.° 5 e n.° 6, ambos do artigo 38 °, do CPPT.

dd) Ora, na situação dos presentes autos, e conforme melhor resulta da factualidade constante do probatório da Sentença recorrida, "O oponente foi notificado, por ofício datado de 19/8/2005, da penhora do crédito de € 2.229.041,26, relativo à executada "B……, Lda.", no âmbito do processo de execução fiscal n° 0094200401011898 e apensos, que deveria depositar no prazo de 30 dias a contar da penhora, sob pena de ser executado no próprio processo, nos termos do disposto nos artigos 224°, n° 1, alínea b), e 233°, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário".

ee) Ou seja, não se verificaram as formalidades do artigo 224.°, do CPPT, o que determina que nem sequer houve uma penhora legal do (alegado) crédito,

ff) Razão pela qual, nunca se poderia impor ao aqui Recorrente o respectivo depósito.

gg) Face ao exposto, a sentença recorrida ao considerar que houve penhora do crédito sub judice laborou em erro, violando também por esta via o disposto no artigo 224.°, do CPPT.

hh) Por tudo isto, a interpretação do Tribunal a quo é, salvo o devido respeito, errada, implicando uma evidente violação do disposto no artigo 224.°, do CPPT e uma também errada subsunção dos factos ao direito, os quais, como se disse, impunham outra decisão.

ii) Consequentemente e face ao exposto, deverá a decisão recorrida ser revogada e substituída por outra que faça quer uma correcta subsunção dos factos ao direito, quer uma correcta aplicação normativa.

C) - Do Pedido:
Termos em que deve o presente Recurso ser admitido e julgado procedente, nos termos expostos, anulando-se a Sentença recorrida, de 09 de Dezembro de 2008, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, com as necessárias consequências legais.

IV. O MºPº emitiu o parecer que consta de fls. 208, no qual defendeu a procedência do recurso com a consequente extinção da execução instaurada contra o recorrente.

V. Com interesse para a decisão foram dados como provados os seguintes factos:

1º) O oponente foi notificado, por ofício datado de 19/8/2005, da penhora do crédito de € 2.229.041,26, relativo à executada "B……, Ldª.", no âmbito do processo de execução fiscal n° 0094200401011898 e apensos, que deveria depositar no prazo de 30 dias a contar da penhora, sob pena de ser executado no próprio processo, nos termos do disposto nos artigos 224°, n° 1, alínea b), e 233°, alínea a), do Código de Procedimento e de Processo Tributário;

2º) Em 1/9/2005, o oponente deu entrada de um requerimento, no Serviço de Finanças da Feira - 1, no qual declarou que a sociedade "B……, Ldª.", não era titular de qualquer crédito perante si, pelo que não iria proceder ao depósito de qualquer quantia;

3º) No balancete analítico da referida sociedade, reportado a 30/9/2005, constava a existência de um crédito da sociedade em questão, em nome de A……, no montante de € 2.230.231,11, facto verificado pela inspecção tributária.

4º) A presente oposição deu entrada no Serviço de Finanças da Feira -1, em 21/2/2006.

5º) O oponente foi citado como executado em 17/1/2006.

VI. O Relator decidiu recurso louvando-se na seguinte argumentação:

“São duas as questões suscitadas pelo recorrente:
a) A da relevância da declaração de inexistência do crédito por parte do recorrente (conclusões das alíneas a) a y);
b) A da nulidade da penhora do crédito por ausência de cumprimento das formalidades previstas no artº 224º do CPPT, em vigor à data dos factos (conclusões das alíneas z) a ff)).

Desde já se dirá que não se tomará conhecimento da 2ª questão, uma vez que a mesma não foi apreciada na decisão recorrida, até porque nem sequer foi invocada na petição de oposição (v. fls. 11/16). Assim, configurando-se como questão nova e sendo certo que os recursos visam reapreciar as decisões dos tribunais de grau hierárquico inferior e não conhecer de novas questões suscitada pelas partes, este Tribunal não está legalmente vinculado a conhecer desta questão agora suscitada nas alegações.

Posto isto, vamos então conhecer da 1ª questão.

4.1. A decisão recorrida julgou improcedente a oposição por entender que, encontrando-se documentado no balancete analítico da sociedade em causa, reportado a 30.09.2005, o referido crédito, facto verificado pela inspecção tributária, era irrelevante a invocação de inexistência do crédito para efeitos do disposto no artº 224º do CPPT.
Isto porque “o oponente se limitou a negar a existência do crédito penhorado, sem ter demonstrado que o mesmo não existia ou já se tinha extinguido”
Por outro lado, a escrituração comercial faz fé, enquanto não for posta em causa e contraditada por outros meios probatórios de valor superior, pelo que, verificada a existência do crédito penhorável, teria a execução de prosseguir contra o oponente.

4.2. O recorrente, por sua vez, entende que, tendo negado a existência do crédito, este deveria passar a ser considerado como litigioso, nos termos do disposto no artº 224º do CPPT, sendo nessa qualidade adjudicado ou transmitido.
Com efeito, a lei faz impender sobre o devedor do crédito penhorado o ónus de declarar se este existe ou não, sob pena de, nada dizendo, o mesmo ser reconhecido nos termos em que era indicado à penhora.
Assim, quem tem o ónus de demonstrar e provar a existência do crédito é o exequente. Não sendo feita essa prova, perante a declaração de inexistência do crédito pelo terceiro devedor, o mesmo será posto à venda como litigioso por três quartas partes do seu valor.

4.3. O MºPº no parecer acima citado, comunga do entendimento do recorrente, argumentando da seguinte forma:
O recorrente foi notificado da penhora do crédito e informou o OEF de que o crédito não existia. Ora, a única consequência jurídica de tal declaração é o crédito ser considerado litigioso e, como tal deve ser posto à venda por três quartas partes do seu valor (artº 224º do CPPT). O recorrente não tem o ónus de provar que o crédito não existe, cabendo à Fazenda Pública a prova de que o crédito existe mediante a promoção da competente acção declarativa (artº 224º, nº 2 do CPPT).

Vejamos então.

5. O artº 224º do CPPT, em vigor à data dos factos, estabelecia o seguinte:
“1. A penhora de créditos será feita por meio de auto, nomeando-se depositário o devedor ou o seu legítimo representante, e com observância das seguintes regras:
a) Do auto constará se o devedor reconhece a obrigação, a data em que se vence, as garantias que a acompanham e quaisquer outras circunstâncias que possam interessar à execução;
b) O devedor, se reconhecer a obrigação imediata de pagar ou não houver prazo para o pagamento, depositará o crédito em operações de tesouraria, à ordem do órgão da execução fiscal, no prazo de 30 dias a contar da penhora, e, se o não fizer, será executado pela importância respectiva, no próprio processo;
c) Se reconhecer a obrigação de pagar, mas tiver a seu favor prazo de pagamento, aguardar-se-á o seu termo, observando-se seguidamente o disposto na alínea anterior;
d) O devedor será advertido na notificação de que não se exonera pagando directamente ao credor;
e) Se negar a obrigação, no todo ou em parte, será o crédito considerado litigioso, na parte não reconhecida, e, como tal, será posto à venda por três quartas partes do seu valor.
f) Inexistindo o crédito ou sendo o seu valor insuficiente para garantir a dívida exequenda e acrescido, o órgão da execução fiscal pode notificar o devedor da penhora de créditos futuros até àquele valor, mantendo-se válida a notificação por período não superior a um ano, sem prejuízo de renovação.
2. No caso de litigiosidade do crédito penhorado, pode também a Fazenda Pública promover a acção declaratória, suspendendo-se entretanto a execução se o executado não possuir outros bens penhoráveis”.

Temos então que, de acordo com a alínea e) supra, negada a obrigação (no todo ou em parte) o crédito era imediatamente considerado litigioso.

Assim, não era aplicável o disposto no artº 858º do CPC, que rezava assim:

“1– Se o devedor contestar a existência do crédito, são notificados o exequente e o executado para se pronunciarem, no prazo de 10 dias, devendo o exequente declarar se mantém a penhora ou desiste dela.
2 – Se o exequente mantiver a penhora, o crédito passa a considerar-se litigioso e como tal será adjudicado ou transmitido”.

Aquela norma (alínea e)), conforme salienta Jorge Lopes de Sousa-CPPT Anotado, 6ª edição, pág. 619, constituía uma especialidade do processo de execução fiscal em relação ao processo de execução comum, pois neste, no caso de o devedor contestar a existência do crédito, gera-se um incidente processual, procedendo-se à notificação do exequente e do executado para se pronunciarem, no prazo de 10 dias, devendo o exequente declarar se mantém a penhora ou desiste dela (artº. 858.°, n.2 1, do CPC). Só se o exequente mantiver a penhora, depois desse incidente, o crédito passa a considerar-se litigioso e como tal será adjudicado ou transmitido (n.º 2 do mesmo artº. 858º).

No processo de execução fiscal, o crédito passava a considerar-se litigioso, na parte não reconhecida, e, como tal, é posto à venda por três quartas partes do seu valor [artº. 224.°, nº 1, alínea e) citado]. Em alternativa à venda do crédito, a Fazenda Pública poderia promover acção declaratória, relativa ao crédito litigioso, nos termos do nº 2 deste artº. 224.°.

Sendo assim, e como bem se decidiu no Acórdão da Relação do Porto, de 09.02 2004- CJ, 1º, 181), contestando o devedor a existência do crédito penhorado nos autos, ao juiz da execução apenas cabe designar a conferência prevista no artº. 858.° do CPC e, se o devedor na conferência, insistir na contestação da dívida, caso o exequente mantenha a penhora ao Tribunal apenas resta considerar tal crédito como litigioso, não podendo na execução indagar-se da existência ou não desse crédito e, consequentemente, decidir-se sobre a sua existência ou não.

Então, ao órgão da execução fiscal, no caso concreto, apenas restava desistir daquele crédito, manter a execução e considerar aquele litigioso sendo posto à venda por três quartas partes do seu valor ou poderia ainda a Fazenda Pública promover acção declaratória, relativa ao crédito litigioso, nos termos do nº 2 deste artº. 224.°. do CPPT.

Em face do que ficou dito, a decisão recorrida não pode manter-se.

5. Nestes termos e pelo exposto, concede-se provimento ao recurso, revoga-se a decisão recorrida e julga-se procedente a oposição.

Sem custas”.

VII. Ora, conforme afirmado no despacho reclamado, o artº 224º, nº 1, alínea e) é claro ao estabelecer que, se o devedor negar a obrigação, no todo ou em parte, será o crédito considerado litigioso, na parte não reconhecida, e, como tal, será posto à venda por três quartas partes do seu valor.

Portanto, negada a obrigação, a lei nenhum dever impõe àquele, antes remetendo o exequente – neste caso a Fazenda Pública - para acção declaratória (nº 2) ou procedendo-se à venda por três quartas partes do seu valor.

Com o devido respeito em parte alguma da lei se colhe a tese da Fazenda Pública de pretender que o executado é credor de um terceiro, uma vez que, em seu entender, o crédito resulta da contabilidade do executado.
Como já se referiu, negando o pretenso devedor a existência da dívida, só em acção judicial a Fazenda Pública pode convencer da sua existência.

Pelo que ficou dito, o despacho reclamado, ao seguir este entendimento, julgou correctamente.

VIII. Nestes termos e pelo exposto, confirma-se a decisão sumária do Relator, concede-se provimento ao recurso, e, revogando-se a decisão recorrida, julga-se procedente a oposição.

Custas pela recorrida Fazenda Pública, neste STA e em 1ª instância.

Lisboa, 19 de Abril de 2012. – Valente Torrão (relator) – Francisco Rothes – Fernanda Maçãs.