Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01108/12
Data do Acordão:11/07/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL
CASO DECIDIDO
SUSPENSÃO DE PRAZO
Sumário:Tendo a recorrente, notificada do despacho que havia indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia, optado por requerer ao órgão de execução fiscal que desse sem efeito o anterior pedido sobre o qual havia recaído o indeferimento, não conferindo a lei eficácia suspensiva ao referido requerimento nem relevância interruptiva ou suspensiva ao despacho que sobre tal requerimento venha a ser proferido, decorrido o prazo para o eventual exercício do direito de reclamar, nos termos do disposto nos arts. 276º e 277º do CPPT, ocorre caso decidido ou resolvido, com preclusão do uso da reclamação judicial.
Nº Convencional:JSTA00067914
Nº do Documento:SA22012110701108
Data de Entrada:10/23/2012
Recorrente:A..., LDA
Recorrido 1:INST DA VINHA E DO VINHO, I.P.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF VISEU
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - PROC ESPECIAL
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART277 N1.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0910/10 DE 2010/12/07; AC STA PROC037/12 DE 2012/02/29
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I-RELATÓRIO

1. A……, L.DA, com os sinais dos autos, reclamou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, do despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Tondela, proferido no âmbito do processo de execução fiscal n.º 2704201001007130, que indeferiu o pedido de dispensa de garantia.

1.1.A M.ma Juíza julgou verificada a excepção de intempestividade da Reclamação, absolvendo a Fazenda Pública do pedido.

2.Não se conformando com tal decisão, A……, L.DA, interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, apresentando as respectivas Alegações, com as seguintes Conclusões:
“A. O presente processo respeita a uma reclamação apresentada pela A……., LDA. (doravante “A……”) contra o indeferimento, por parte do Serviço de Finanças de Tondela, de um pedido de dispensa de prestação de garantia, formulado nos termos do preceituado nos artigos 52°, n.º 4, da Lei Geral Tributária e 169. ° e 170.° do CPPT.
B. Na sentença ora posta em crise, o Tribunal a quo considerou que o despacho que apreciou a questão relativa ao pedido de dispensa de prestação de garantia havia já transitado à data da apresentação da reclamação judicial que dá causa aos presentes autos, tendo julgado verificada nos autos, em consequência, a excepção da intempestividade.
C. A A…… não pode concordar com este entendimento, porquanto o despacho reclamado nos presentes autos não havia, na verdade, transitado à data da apresentação da respectiva petição de reclamação judicial.
D. Por uma questão de comodidade, e por forma a facilitar a compreensão da tempestividade da presente reclamação judicial que se explicará de seguida, faça-se, previamente, uma esquemática resenha temporal dos articulados/requerimentos relevantes apresentados pela A…… e decisões proferidas nos autos de execução subjacentes à presente reclamação judicial:
• 08.07.2010 - Citação da A…… para a execução fiscal subjacente aos presentes autos de reclamação judicial;
• 01.09.2010 - Apresentação, pela A……., de articulado de oposição à execução.
Neste articulado, apoiando-se em autorizada doutrina, a A…… peticiona a dispensa de prestação de garantia perante o Tribunal;
(cf. alínea B) dos factos provados e capitulo C) do articulado de oposição, junto aos autos com a petição de reclamação judicial como doc. n.° 5);
• 15.09.2010 - A A…… é notificada pelo OEF para prestar garantia nos autos de execução;
(cf. alínea D) dos factos provados e documento junto com a petição de reclamação sob o n.° 1);
• 30.09.2010 Por manifestamente não ter meios para prestar tal garantia e por a prestação da mesma lhe causar um prejuízo irreparável, a A……. apresentou, perante o órgão de execução fiscal, um pedido de dispensa de prestação dessa garantia;
(cf. alínea E) dos factos provados e documento junto com a petição de reclamação sob o n.º 2);
• 11.11.2010 — O OEF notifica a A……. da decisão de indeferimento desse pedido de dispensa de prestação de garantia;
(cf. alínea H) dos factos provados e documento junto com a petição de reclamação sob o n.° 3);
• 22.11.2010 — Apercebendo-se de que pendia no Tribunal a apreciação do pedido de dispensa de garantia anterior, formulado no articulado de oposição (cf. doc. 5), a A…… requereu ao OEF que desse sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado ulteriormente perante esse OEF, bem como a subjacente notificação recebida para prestar garantia;
(cf. alínea J) dos factos provados e documento que se juntou com a petição de reclamação sob o n.° 4);
• 14.01.2011 - O OEF notifica a A…… da decisão de indeferimento deste pedido para dar sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia que perante semelhante órgão foi apresentado, bem como a subjacente notificação para prestar garantia (cf. alínea M) dos factos provados e documentou que se juntou com a petição de reclamação sob o n.° 6);
• 24.01.2011 - Apresentação da petição de reclamação judicial que dá causa aos presentes autos.
• 09.05.2011 - A A…… é notificada do despacho proferido pelo Tribunal no âmbito do processo de oposição à execução fiscal subjacente aos presentes autos que, apreciando o pedido de dispensa de garantia formulado no articulado de oposição à execução, decide que o mesmo pedido deve ser dirigido ao órgão de execução fiscal (cf. cópia da notificação, que se juntou aos presentes autos com a resposta ao Parecer do MP como documento n.º 7).
E. Nos autos de execução fiscal subjacentes ao presente processo de reclamação judicial, a A…… deduziu, em 1 de Setembro de 2010, oposição a essa execução fiscal.
F. Nesse mesmo articulado, a A…… requereu ao Tribunal que a isentasse da prestação de garantia necessária para obter o efeito suspensivo da execução fiscal, pois a prestação de garantia acarretar-lhe-ia um prejuízo irreparável - cf. capítulo C) do articulado de oposição, junto aos autos com a petição de reclamação judicial como doc. n.° 5.
G. A A……., apoiada em autorizada doutrina (mormente, no Prof. Doutor Rui Duarte Morais, in A Execução Fiscal, 2. edição, Almedina, 2006), entendia que, nas situações de oposição à execução fiscal – em que a execução continua pendente, mas em que o processo a ela respeitante é enviado para o Tribunal (cf. art.° 208.º, n.º 1, do CPPT) – , o requerimento de isenção ou dispensa de prestação de garantia seria formulado perante o Tribunal, por este órgão ter competência para decidir da prestação de garantia, nos termos do disposto no artigo 103.º, n.° 4, do CPPT, aplicável directamente ao processo de oposição à execução por força da remissão do artigo 212.° do mesmo Código.
H. Este entendimento acabou por não ser acolhido naqueles autos de oposição, notificando a A….. dessa sua decisão no dia 9 de Maio de 2011 - cf. cópia da notificação recebida nos autos de oposição à execução fiscal em questão nos presentes autos, notificação que se juntou no presente processo com a resposta ao Parecer do MP como documento n.° 7.
I. No entretanto - enquanto pendia no Tribunal o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado em sede de oposição à execução fiscal -, o Serviço de Finanças de Tondela notificou a A……., em 15 de Setembro de 2010, para vir aos autos de execução prestar garantia.
J. Uma vez que a A……. manifestamente não tinha meios para prestar tal garantia e por a prestação da mesma lhe causar um prejuízo irreparável, apresentou, perante o órgão de execução fiscal, um pedido de dispensa de prestação dessa garantia.
K. Ao ser notificada da decisão do OEF relativa a esse pedido de dispensa de prestação de garantia, a A…… apercebeu-se que pendia já, perante o Tribunal, igual pedido.
L. O pedido de dispensa de prestação de garantia que pendia perante o Tribunal havia sido apresentado em data anterior — relembre-se que o pedido fora apresentado em 1 de Setembro de 2010, com o articulado de oposição à execução (cf. doc. 5 junto com a p.i.)
M. A decisão desse pedido de dispensa de prestação de garantia que pendia perante o Tribunal ainda não tinha sido notificada à A……. - relembre-se que a decisão do Tribunal relativa a tal pedido apenas foi notificada à A…… em 9 de Maio de 2011 (cf. cópia da notificação recebida nos autos de oposição à execução fiscal em questão nos presentes autos, notificação que se juntou no presente processo com a resposta ao Parecer do MP como documento n.° 7).
N. Em consequência, dentro do prazo para reclamar judicialmente do despacho de indeferimento da dispensa de garantia, a A……. requereu ao OEF que desse sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia que havia apresentado junto daquele Serviço em 30 de Setembro de 2010 e, igualmente, que desse sem efeito a notificação para prestar garantia cuja inutilidade resultava do facto de a sua dispensa já ter sido requerida, em data anterior, ao tribunal tributário. Isto porque: (i) o pedido de dispensa de prestação de garantia naqueles autos de execução já havia sido apresentado, em data anterior, perante o tribunal onde tramitavam os autos de oposição respectivos; (ii) esse pedido de dispensa apresentado perante o tribunal tributário se encontrava pendente de decisão nos respectivos autos; (iii) e porque, por isso, a notificação do Serviço de Finanças para a prestação de garantia naqueles autos, estava desprovida de qualquer utilidade.
O. O OEF acabou por indeferir tal petição apresentada pela A…….., não dando sem efeito a notificação expedida, nem o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado pela A……. (cf. alínea M) dos factos provados e documentou que se juntou com a petição de reclamação sob o n.° 6).
P. Caso o OEF tivesse sido dado sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia, apresentado em duplicado pela A…… perante o Serviço de Finanças, conforme a A……. requereu no documento n.° 4 junto com a p.i., o despacho de indeferimento desse pedido de dispensa, de que se reclama nos presentes autos, teria sido, consequentemente, anulado.
Q. Por esse motivo, atento o figurino normativo e processual que emerge da LGT e do CPPT, em particular da possibilidade de reclamação das decisões proferidas pelo OEF para o Tribunal, somente após a decisão do Senhor Chefe de Finanças sobre esse requerimento apresentado pela A……, é que se poderia lançar mão da reclamação para o Tribunal daquela decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia.
R. Até então, a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia não era definitiva, parecendo abusivo dela reclamar judicialmente, quando se havia peticionado ao OEF que desse sem efeito o pedido que originara aquela decisão.
S. O pedido dirigido ao OEF, em 22 de Novembro de 2010 (ou seja, dentro do prazo para reclamar judicialmente do indeferimento da dispensa de garantia), para dar sem efeito o requerimento de dispensa de prestação de garantia não era manifestamente infundado: a A…… havia, com efeito, apresentado já em data anterior (lembre-se: 1 de Setembro de 2010) tal pedido de dispensa de prestação de garantia no seu articulado de oposição à execução.
T. À data em que a A……. formulou tal pedido de dar sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado, em duplicado, perante o OEF, encontrava-se pendente no Tribunal, sem ter sido ainda apreciado, o mesmo pedido de dispensa de prestação de garantia.
U. Somente se o Chefe de Finanças mantivesse o despacho de indeferimento do pedido de dispensa na ordem jurídica - como o fez -, é que faria sentido - e seria processualmente aceite - reagir judicialmente dele, pela via da reclamação prevista nos art.°s 276.º e ss. do CPPT.
V. Caso se tivesse reagido ao despacho de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia na data que o Tribunal a quo defende aplicável na sentença ora posta em crise, manter-se-ia não apenas uma duplicação de pedidos de dispensa de prestação de garantia no mesmo processo de execução, como estaríamos perante o recurso indevido a um meio processual de reacção.
W. Apresentar a presente reclamação judicial de um despacho cuja anulação, sustentadamente, se havia requerido, aproximar-se-ia de um abuso de direito de reclamação e de um uso censurável de um meio processual de reacção, pois a A……. estaria a reclamar de um despacho que sabia não ser ainda definitivo e cuja anulação havia peticionado ao OEF! Se não fosse uso censurável, pelo menos, intempestivo, por prematuro.
X. A decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia ainda não era definitiva, pois estava dependente da decisão do Senhor Chefe de Finanças de dar ou não sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado, que subjazia a semelhante decisão de indeferimento. Até então, não podia — processual e legitimamente - a A…… reclamar judicialmente do despacho que indeferiu tal dispensa porque havia precisamente peticionado que fosse dado sem efeito esse pedido de dispensa!
Y. O Tribunal a quo, ao acolher a tese de intempestividade aventada nos autos pelo Digno Magistrado do Ministério Público no seu Parecer, parece pretender que a A……., ao mesmo tempo que peticionava, fundamentadamente, ao OEF que desse sem efeito o pedido de dispensa que lhe apresentara, tivesse reclamado judicialmente do indeferimento desse mesmo pedido de dispensa cuja anulação se encontrava a requerer.
Z. A A…… optou por não reagir judicialmente ao despacho do OEF que não deu sem efeito o seu pedido de dispensa porque, entre a data em que requereu ao OEF que desse sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia que lhe havia apresentado (22.11.2010) e a data em que foi notificada da decisão desse OEF de indeferimento de tal requerimento (14.01.2011), havia tomado conhecimento, noutros autos de oposição à execução de que era parte e que se mostravam em tudo semelhantes aos relativos aos presentes autos, da decisão proferida por este Venerando STA em 07.12.2010, considerando que «A competência para a decisão sobre a apreciação da garantia prestada ou do pedido de dispensa de prestação de garantia formulado no âmbito de oposição à execução fiscal, visando a suspensão desta, cabe ao órgão da execução fiscal e não ao tribunal.» - cf. acórdão deste STA, de 07.12.2010, proferido no proc. 0910/10.
AA. Tendo optado legitimamente por não reagir ao despacho do OEF em face do entendimento pugnado por este Venerando STA e tendo a A…… apresentado a reclamação judicial do despacho de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia dentro dos 10 dias posteriores à notificação da decisão que tornou tal despacho de indeferimento definitivo, foi cumprido o prazo previsto no artigo 277.º, n.° 1, do CPPT e, como tal, a presente reclamação judicial não pode senão revelar-se tempestiva.
Termos em que, deve o presente recurso proceder, revogando-se a sentença recorrida.
…”

3. Não foram apresentadas Contra-alegações:

4. O Digno Representante do Ministério Público, junto do STA, emitiu douto parecer, no sentido de que o recurso deve improceder.

5. Com dispensa de vistos, por o processo ser urgente, cumpre apreciar e decidir.


II- FUNDAMENTOS

1- DE FACTO
A Sentença, sob recurso, deu como provada a seguinte matéria:
“A)No SF de Tondela foi instaurada, contra a aqui reclamante, a execução fiscal n.° 2704201001007130, por dívidas provenientes da taxa de promoção devida ao Instituto da Vinha e do Vinho, I.P, pelos meses de Outubro a Dezembro de 2009, no montante de € 46.412,56;
B) A ora reclamante deduziu, 01/09/2010, oposição à execução fiscal mencionada em A. que core termos pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, sob o n.º 402/10.4BEVIS, no qual solicita a dispensa de prestação de garantia;
C) A reclamante apresentou também impugnação judicial das autoliquidações da taxa de promoção alegadamente devida ao IVV, processos de impugnação que se encontram ainda em curso no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu sob os números 27/10.4BEVIS e 143/10.2BEVIS;
D) A A……, aqui reclamante, foi notificada em 13/09/2010 pelo órgão de execução fiscal para prestar garantia nos autos de execução mencionados em A., no montante de € 60.490,94;
E) A reclamante deu entrada, em 30/09/2010, no Serviço de Finanças de Tondela petição pela qual a reclamante solicita a isenção da prestação de garantia para obter o efeito suspensivo dos autos de execução fiscal identificados na alínea A., com fundamento na inevitabilidade da ocorrência de um prejuízo irreparável, até à prolação de decisão judicial, transitada em julgado, que decida das ilegalidades invocadas em sede de impugnação judicial e de oposição à execução fiscal;
F) Em 18/10/2010 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças, no qual o seu projecto de decisão iria no sentido de indeferimento do pedido, tendo concedido o prazo de 10 dias para o exercício do direito de audição, previsto no art. 60.° da LGT;
G) Em 02/11/2010, a aqui reclamante exerceu o seu direito de audição, tendo procedido ao envio via CTT em 29/10/2010;
H) Em 08/11/2010 o Chefe de Finanças profere decisão a indeferir o pedido de dispensa de garantia, considerando que a reclamante, no exercício do direito de audição, nada acrescentou de novo ao processo;
I) O despacho mencionado na alínea imediatamente anterior foi notificado à reclamante em 11/11/2010;
J) Em 23/11/2010 a executada, aqui reclamante, apresentou um requerimento no SF a solicitar que fosse dado sem efeito o pedido de dispensa de garantia apresentado em 30/09/2010, sustentando o seu pedido no facto de estar pendente neste Tribunal um processo de Oposição aos autos identificados na al. A. onde é requerido ao Juiz do Tribunal a respectiva isenção de prestação de garantia;
K) Em 9/12/2010 foi proferido despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças a conceder o prazo de 10 dias para a reclamante exercer o direito de audição, visto que o projecto de decisão será no sentido do indeferimento;
L) Decorrido o prazo mencionado na alínea imediatamente anterior a reclamante nada disse ou requereu;
M) Em 13/01/2011 o Chefe do SF proferiu despacho a indeferir o requerido;
N) Em 25/01/2011 deu entrada no SF, via CTT, (sob registo em 24/11/2011) Reclamação dos Actos do Chefe nos termos do art. 276.° (ou seja a presente reclamação), pretendendo a anulação do despacho vindo de referir na alínea imediatamente anterior, com todas as consequências legais, nomeadamente com a dispensa de garantia e a suspensão do processo de execução fiscal mencionado na al. A.”

2- DE DIREITO

1. Resulta do probatório que a ora recorrente, citada no âmbito do processo de execução fiscal nº 2704201001007130, por dívidas provenientes da taxa de promoção devida ao Instituto da Vinha e do Vinho, I.P., no montante de € 46. 412, 56, deduziu reclamação à oposição fiscal, que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, na qual solicita a dispensa de prestação de garantia. Entretanto, em 30/9/2010, a ora recorrente deu entrada no Serviço de Finanças de Tondela de um pedido de isenção da prestação de garantia, com vista a obter o efeito suspensivo dos autos de execução fiscal, que foi indeferido em 8/11/2010 e cuja notificação ocorreu em 11/11/2010.
A executada, ora recorrente, em 23/11/2010, apresentou requerimento, no Serviço de Finanças, a solicitar que fosse dado sem efeito o pedido de dispensa de garantia apresentado em 30/9/2010, argumentando a fundamentar tal pedido o facto de se encontrar pendente apreciação de pedido idêntico, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, sobre o qual recaiu despacho de indeferimento em 13/1/2011.
Inconformada a recorrente apresentou, em 25 de Janeiro de 2011, reclamação, ao abrigo do disposto no art. 276º e ss., pedindo que fosse anulado o despacho do órgão de execução fiscal de 8/11/2010, com o consequente deferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia sustentando, entre o mais, que a mesma é tempestiva.
Por sentença proferida, em 31/8/2012, pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, o Mmº Juiz “a quo” deu como verificada a excepção peremptória da intempestividade da reclamação deduzida, ponderando, para tanto, entre o mais, o seguinte:
(…) consta dos factos provados, al. H., o despacho a indeferir a dispensa de garantia data de 08/11/2010, tendo sido notificado à reclamante em 11/11/2010, al. I. dos factos provados, e a presente reclamação foi apresentada em 24/01/2011, al. N. dos factos provados.
Sem necessidade de grandes considerações constata-se com relativa facilidade que o prazo de 10 dias, cujo início operou no dia 12/11/2010, o qual conta-se de forma contínua, suspendendo-se durante as férias judiciais e transferindo-se para o primeiro dia útil subsequente (artigos 103.º da LGT, 20.°/2 do CPPT e 144.° do CPC), encontra-se mais que esgotado aquando da apresentação da reclamação que ocorreu em 24/01/2011, nem valendo aqui a faculdade da apresentação do acto até ao terceiro dia útil seguinte ao termo do prazo, por tratar-se de um prazo processual.
(…)
Posto isto, o Tribunal considera verificada a excepção peremptória da intempestividade e em consequência vai absolver a FP do pedido, nos termos dos arts. 493°, n.°s 1 e 3, e 496.° do CPC, aplicáveis subsidiariamente ao processo judicial tributário (cf. art. 2°, alínea e), do CPPT)”.
(…)
Pelo exposto, julgo verificada a excepção peremptória de intempestividade da reclamação deduzida pela Reclamante e em consequência absolvo a Fazenda Pública do pedido”.
Contra este entendimento se insurge a ora recorrente, argumentando, entre o mais, que a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia que lhe foi notificado em 11/11/2010 só se tornou definitiva em 13/1/2011, com a notificação da decisão do órgão de execução fiscal que indeferiu o requerimento que havia apresentado para ser dado sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia. E como a recorrente deduziu reclamação judicial contra este último despacho dentro do prazo de 10 dias posteriores defende que a reclamação é tempestiva.
Em face do exposto, a questão central a decidir consiste em saber se o Mmº Juiz “a quo” incorreu em erro de julgamento ao considerar intempestiva a reclamação objecto do presente recurso.

2. Dispõe o n.° 1 do artigo 277,° do CPPT, sob a epígrafe, “Prazo e apresentação da reclamação”, que:
«1. A reclamação será apresentada no prazo de 10 dias após a notificação da decisão e indicará expressamente os fundamentos e conclusões.
1. A reclamação é apresentada no órgão da execução fiscal, que, no prazo de 10 dias, poderá ou não revogar o acto reclamado».
No caso em apreço, a recorrente notificada do despacho de indeferimento do pedido de isenção de prestação de garantia, em vez de apresentar reclamação do referido despacho no prazo de 10 dias, como estabelece o nº 1 do art. 277º do CPPT, optou por pedir ao órgão da execução fiscal que desse sem efeito precisamente o pedido de dispensa de prestação de garantia sobre o qual recaíra despacho de indeferimento.
Na óptica do recorrente, feito este segundo requerimento, aquele indeferimento não podia considerar-se definitivo, porquanto nele se dava conta ao órgão de execução fiscal da existência de anterior pedido de teor idêntico dirigido ao tribunal que estaria pendente e tornaria desprovido de utilidade o despacho a exigir a prestação de garantia.
Nesta sequência, no segundo requerimento pedia a recorrente que o órgão de execução desse sem efeito o pedido de dispensa de garantia, que havia apresentado em 30 de Setembro de 2010, bem como a notificação para aprestar garantia cuja inutilidade resultava do facto de a sua dispensa já ter sido requerida, em data anterior ao tribunal tributário.
Na verdade, para a recorrente, a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia ainda não podia considerar-se definitiva porque estava dependente “da decisão do Senhor Chefe de Finanças de dar ou não sem efeito o pedido de dispensa de prestação de garantia apresentado, que subjazia a semelhante decisão de indeferimento”, acrescentando que se o órgão da Administração Fiscal tivesse dado sem efeito o pedido de dispensa de garantia, então o despacho de indeferimento seria consequentemente anulado. E conclui, ainda, a recorrente que “(…) atento o figurino normativo e processual que emerge da LGT e do CPPT, em particular da possibilidade de reclamação das decisões proferidas pelo OEF para o Tribunal, somente após a decisão do Senhor Chefe de Finanças sobre esse requerimento apresentado pela A……, é que se poderia lançar mão da reclamação para o Tribunal daquela decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia” (ponto Q das Conclusões).
Com efeito, Até então, a decisão de indeferimento do pedido de dispensa de prestação de garantia não era definitiva, parecendo abusivo dela reclamar judicialmente, quando se havia peticionado ao OEF que desse sem efeito o pedido que originara aquela decisão”( ponto R das Conclusões).

3. Não obstante a recorrente aludir em abstracto ao quadro normativo e processual que emerge da LGT e do CPPT, a verdade é que não se vislumbra que a sua pretensão encontre fundamento legal.
Vejamos.
Em primeiro lugar, como bem observa o Mmº Juiz “a quo”, “Não pode a reclamante pedir ao OEF que dê sem efeito o seu pedido formulado em 30/09/2010, com o argumento de ter apresentado o mesmo pedido junto do Tribunal, quando a entidade competente para apreciar tal pedido é efectivamente o OEF, nos termos do n.° 1 do art. 170.° do CPPT”.
Com efeito, refere o mencionado preceito que “quando a garantia possa ser dispensada nos termos previstos na lei, deve o executado requerer a dispensa ao órgão da execução fiscal…”.
No mesmo sentido, pode ler-se, entre outros, no Acórdão deste Supremo Tribunal, de 7/12/2010, proc nº 910, que “A competência para a decisão sobre a apreciação da garantia prestada ou do pedido de dispensa de prestação de garantia formulado no âmbito de oposição à execução fiscal, visando a suspensão desta, cabe ao órgão da execução fiscal e não ao tribunal”.
Ora, se assim é, assiste razão ao Mmº Juiz “a quo” quando conclui que “(…) proferido despacho sobre a questão de fundo o qual apreciou o mérito - falta de reunião dos pressupostos para atribuição da dispensa de garantia, e tendo o mesmo transitado, não pode a reclamante pretender anular tal despacho com a construção jurídica apresentada nesta reclamação, pois efectivamente a pretensão da reclamante é a de anular o despacho proferido em 08/11/2010, por considerar, precisamente que reúne as condições para obter a suspensão da execução fiscal mediante a dispensa de prestação de garantia”.
E, na verdade, por mais que a recorrente tente argumentar no sentido de que a decisão de indeferimento proferida pelo órgão de execução fiscal não se pode considerar definitiva, não se vislumbra, como já fomos adiantando, fundamento legal para tal. É que uma vez proferida tal decisão, ela é apta a produzir imediatamente, tal como qualquer acto administrativo, os seus efeitos jurídicos, não tendo o requerimento apresentando pela Recorrente a virtualidade de suspender o prazo de 10 dias previsto no art. 277º do CPPT para dele reclamar. Por um lado, não se vislumbra que a lei confira a tal requerimento eficácia suspensiva e, por outro lado, a lei também não atribuiu relevância suspensiva ou interruptiva ao despacho que sobre aquele requerimento venha a ser proferido.
Assim, não sendo interposta reclamação ou pedida qualquer providência cautelar, que no caso nem sequer se vislumbra que alguma pudesse mostrar-se adequada, não existe mecanismo legal que impeça que, passado o prazo de 10 dias da reclamação judicial, o referido despacho de indeferimento se firme na ordem jurídica como caso decidido ou resolvido, tornando-se inopugnável.
O artificialismo da construção jurídica da recorrente é manifesto ao tentar transformar aquele despacho num “acto consequente anulável”.
Como ficou consignado no Acórdão deste Supremo Tribunal, de 29 de Fevereiro de 2012, proc nº 37/12, seguindo a melhor doutrina, “o acto consequente não pode ser identificado com qualquer acto cronologicamente posterior a outro acto administrativo que com ele tenha uma qualquer conexão, exigindo-se que se trate de um acto cuja prática ou sentido foram determinados pelo acto agora anulado ou revogado, e cuja manutenção é incompatível com a execução da decisão anulatória ou revogatória. Só quando se verificar esta incompatibilidade com a execução de sentença anulatória é que os actos consequentes se podem considerar nulos, directa e automaticamente: caso contrário, nem anuláveis são”.
Acontece que no caso em apreço não existe a conexão exigida quer pela doutrina quer pela jurisprudência entre acto administrativo pressuposto e acto administrativo consequente.
É óbvio que se o órgão da execução fiscal em face do segundo requerimento da recorrente a pedir que desse em efeito o primeiro pedido decidisse anulá-lo, estaríamos perante uma nova decisão, contrária ao sentido da primeira e que abriria a via judicial para a recorrente. No entanto, a verdade é que nem o órgão da execução fiscal estava obrigado a anular a sua anterior decisão, nem a lei prevê que a apresentação deste segundo pedido, como já foi dito, tenha efeito suspensivo do prazo de reclamação judicial. Assim sendo, o segundo despacho proferido pelo órgão de execução fiscal sempre teria de se considerar confirmativo do anterior e, por conseguinte, insusceptível de impugnação, por não ser lesivo.
Finalmente, a acolher-se a tese da recorrente, seria aceitar que os prazos de reclamação ficassem na livre disponibilidade dos contribuintes, o que é contrário à natureza pública e indisponível dos mesmos.
Numa situação idêntica em que, citado do despacho de reversão com a indicação de que poderia reclamar judicialmente do mesmo, nos termos do disposto no art. 276º e 277º do CPPT, o recorrente optou por se dirigir ao órgão da execução fiscal solicitando a revogação de tal despacho, o Supremo Tribunal Administrativo ponderou que “Optando o recorrente por se dirigir ao mesmo órgão da execução fiscal solicitando a revogação do despacho que havia decretado “a reversão” contra o depositário não atribuindo a lei a este requerimento relevância interruptiva ou suspensiva do prazo de reclamação daquele despacho, como não atribui a lei tal relevância ao despacho que sobre este requerimento venha a ser proferido, decorrido o prazo para o exercício do eventual direito de reclamar, ocorre caso julgado relativamente ao dito despacho pois que podia o ora recorrente do mesmo ter interposto reclamação nos termos do art. 276º do CPPT, no prazo de dez dias, por força do art. 277º do mesmo diploma legal” (cfr. o Acórdão de 17 de Agosto de 2005, proc nº 925/05).
Em face do exposto, aplicando a mencionada jurisprudência ao caso em análise, a recorrente, notificada do despacho que havia indeferido o pedido de dispensa de prestação de garantia, tendo optado por requerer ao órgão de execução fiscal que desse sem efeito o anterior pedido sobre o qual havia recaído o indeferimento, não conferindo a lei eficácia suspensiva ao referido requerimento nem relevância interruptiva ou suspensiva ao despacho que sobre tal requerimento venha a ser proferido, decorrido o prazo para o eventual exercício do direito de reclamar, nos termos do disposto nos arts. 276º e 277º do CPPT, ocorre caso decidido ou resolvido, com preclusão do uso da reclamação judicial.
Assim sendo, não assistindo razão à recorrente, a sentença recorrida que decidiu pela intempestividade da reclamação objecto do presente recurso deve ser mantida, julgando-se, em consequência, improcedente o recurso.


III-DECISÃO

Termos em que acordam, em conferência, os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, julgar improcedente o presente recurso.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 7 de Novembro de 2012. - Fernanda Maçãs (relatora) - Casimiro Gonçalves - Francisco Rothes.