Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:086/15
Data do Acordão:02/16/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:VÍTOR GOMES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não se justifica admitir o recurso de revista para apreciar questões dependentes das circunstâncias do caso concreto, a que o acórdão recorrido deu resposta que não se afasta das soluções geralmente aceites em matéria de controlo jurisdicional dos actos administrativos sancionatórios, e que não assumem relevância social.
Nº Convencional:JSTA000P18623
Nº do Documento:SA120150216086
Data de Entrada:01/26/2015
Recorrente:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA
Recorrido 1:A............
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. O Ministério da Educação e Ciência recorre do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 06/11/2014, que confirmou a decisão do TAF de Coimbra que anulou o despacho da Directora Regional de Educação do Centro que aplicara a A…………, professora do ensino básico, a pena disciplinar de 250 euros de multa.
O recorrente pretende ver apreciada as seguintes questões, que considera de relevância jurídica e social fundamental e para as quais reclama clara necessidade de melhor aplicação do direito:
- Se os tribunais podem sindicar o acto da Administração que entendeu serem determinados factos constitutivos de infracção disciplinar, designadamente, sobre se a conduta da docente é antipedagógica;
- Se compete aos tribunais sindicar a pena aplicada pela Administração, sua proporcionalidade e adequação;
- Se no caso concreto foi violado princípio da proporcionalidade.

2. A recorrida sustenta que não estão verificados os fundamentos excepcionais de admissibilidade do recurso, porque o decidido está em conformidade com a jurisprudência do STA relativamente a todas as questões colocadas.

3. As decisões proferidas pelos tribunais centrais administrativos em segundo grau de jurisdição não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário. Apenas consentem recurso nos termos do n.º 1 do art.º 150.º do CPTA, preceito que dispõe que das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, a título excepcional, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.

4. Reduzindo os factos ao essencial, a conduta da docente disciplinarmente censurada consistiu em ter exposto perante a turma, no decurso de um teste de avaliação, uma tentativa de fraude de um aluno do 8.º ano de escolaridade, fazendo comentários jocosos, e ter posteriormente, durante actividades lectivas de outros professores, procurado esclarecer perante a turma acusações de que insultara o aluno.
O TCA considerou, em síntese final, que a conduta da arguida, mesmo que possa não ter sido a mais correcta, “não atingiu o limiar da indignidade disciplinarmente reprovável”, confirmando o acórdão do TAF na parte em que determina a anulação da decisão punitiva “por os factos provados não constituírem infracção disciplinar, devendo por isso ser arquivado o processo disciplinar”. Na decisão do TCA adere-se ao entendimento de que, no direito sancionatório, nomeadamente disciplinar, o tribunal controla não apenas a interpretação dos conceitos de direito e a existência material dos factos, mas ainda a adequação destes últimos às categorias legais ainda que imprecisamente definidos. Mas também se afirma no acórdão que a determinação concreta da pena dentro da moldura legal e a apreciação da oportunidade da sua aplicação escapa a este controlo jurisdicional, salvo por violação dos princípios legais, designadamente o da proporcionalidade.

Nos seus enunciados jurídicos fundamentais, o acórdão recorrido perfilha entendimento que não se afasta das soluções geralmente aceites em matéria de controlo jurisdicional dos actos administrativos sancionatórios, designadamente, quanto ao enquadramento dos factos na violação de deveres funcionais, quanto ao controlo da aplicação de sanções disciplinares que impliquem o preenchimento de conceitos jurídicos indeterminados e quanto à verificação do respeito pelos princípios estruturantes da actividade da Administração Pública. A decisão a que, na aplicação desses critérios jurídicos, o acórdão chegou depende, em grau elevado, do circunstancionalismo do caso concreto, não se vislumbrando que as questões que a entidade recorrente quer ver apreciadas possam conduzir ao estabelecimento de padrões de apreciação de casos semelhantes.
Por outro lado, estamos perante um episódio disciplinar que é objectivamente de reduzida gravidade, relativo ao modo de reacção imediata de um professor relativamente a uma tentativa de fraude de um aluno do ensino básico num vulgar teste de avaliação, que não parece questão de relevantes reflexos comunitários.
Nestas circunstâncias, perante a decisão conforme das instâncias e fundamentação da decisão recorrida, não se justifica excepção à regra de que os litígios no contencioso administrativo se esgotam em dois graus de jurisdição.

5. Decisão
Pelo exposto, decide-se não admitir o recurso e condenar o recorrente nas custas.

Lisboa, 16 de Fevereiro de 2015. – Vítor Gomes (relator) – Alberto Augusto Oliveira – São Pedro.