Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0179/15.7BELRS
Data do Acordão:06/22/2022
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:GUSTAVO COURINHA
Descritores:VALOR
MAIS VALIAS
Sumário:Seja teleologicamente, seja por razões sistemáticas, é ilegal a extensão da restrição prevista no n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC às oscilações patrimoniais latentes verificadas à luz do artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC.
Nº Convencional:JSTA000P29590
Nº do Documento:SA2202206220179/15
Data de Entrada:12/19/2018
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:BANCO A............, S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


I – RELATÓRIO

I.1 Alegações
Fazenda Pública vem recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls. 585 a 658 do SITAF, que julgou procedente a impugnação judicial deduzida pelo Banco A…………, SA, melhor identificado nos autos, contra despacho de indeferimento proferido no âmbito do processo de reclamação graciosa relativo aos atos tributários de IRC respeitantes aos exercícios de 2010 e de 2011 e respetivos juros compensatórios.
Apresenta as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
a) Não se nos afigura relevante a consideração feita pela lei fiscal entre gastos e perdas a propósito das duas normas em apreciação (arts. 18º n.º 9 e 45º n.º 3 do CIRC), porquanto na noção de gastos e da enunciação, a título exemplificativo dos mesmos, descrita nas diversas alíneas do art. 23º do CIRC, se refere a gastos e perdas, pelo que a mera referência a perdas feita no n.º 3 do art. 45º do CIRC não permite a conclusão de que não pretende abranger tais gastos, sob pena de todos os gastos previstos no n.º 9 do art. 18º do CIRC se encontrarem excluídos daquela limitação de dedutibilidade, o que não foi notoriamente o pretendido pelo legislador fiscal ao mencionar tais perdas.
b) Dos parágrafos 76 e 77 da Estrutura Conceptual do SNC resulta que a definição de gastos engloba perdas e no CIRC, após as alterações preconizadas pelo Dec. Lei n.º 159/2009, os conceitos “custos e perdas” são simplesmente substituídos por “gastos” no CIRC (art. 8º n.º 2 al. f) do identificado diploma legal), pelo que o sentenciado viola lei expressa, padecendo de erro de julgamento.
c) O art. 45º n.º 3 do CIRC inclui todas as perdas relativas às partes de capital, quer a diferença entre as mais-valias e as menos-valias realizadas, quer outras perdas potenciais, como por exemplo, os gastos resultantes da aplicação do justo valor.
d) A decisão arbitral proferida pelo CAAD, no processo n.º 96/2016-T, de 26/10/2016, confirma este entendimento, ao ter afirmado “a perda é uma tipologia de gasto”, “a dedutibilidade daquela perda, que é, naturalmente, um gasto, deverá ser analisada à luz do artigo 45.º, n.º 3 do Código do IRC” e “as perdas decorrentes da redução do justo valor de instrumentos financeiros, designadamente partes de capital (…) cabem no âmbito do artigo 45.º, n.º 3 do Código do IRC, pelo que, nesse sentido, só deverão ser consideradas, para efeito do apuramento do lucro tributável, em metade do seu valor.”
e) Ainda sem conceder, as decisões proferidas pela jurisprudência arbitral (CAAD - processos n.ºs 87/2016–T, de 29/10/2016, e 25/2015-T, de 24/09/2015, e ainda o voto de vencido dado no processo n.º 30/2015-T, de 11/12/2015) defendem que se “sobrevaloriza a dicotomia dos termos “gastos” e “perdas””, pois “no processo de adaptação aos novos conceitos do SNC, é possível identificar diversas imprecisões terminológicas” e “se o legislador tivesse pretendido dar um tratamento diferente às perdas resultantes da aplicação do justo valor não poderia deixar de ter alterado a redação da norma em conformidade”.
f) A opção legislativa de manter quase doze anos o regime que resultava do art. 45º n.º 3 do CIRC teve na sua base “uma razão de interesse público…obter uma mais justa equilibrada repartição de encargos fiscais entre as diversas espécies de contribuintes”, sendo que “não viola o preceito constitucional um regime fiscal que se traduza numa menor ponderação, para efeitos tributários, de determinadas menos valias contabilizadas pelas empresas.”, conforme ficou decidido pelo Tribunal Constitucional acerca do art. 45º n.º 3 do CIRC (Acórdão n.º 85/2010).
g) Importa ainda ter presente que a manutenção desta norma legal durantes todos estes anos, decorre do facto do valor dado pelo mercado não pode ser considerado como imune a manipulações; o limite de 5% na detenção de participações previsto para consideração do justo valor, permite aplicação do preceito a avultados investimentos, com consequências imprevisíveis para as receitas fiscais, nomeadamente em período de crise financeira e bolsista; mantém-se situações, mesmo nos casos de aplicação de valores considerados objetivamente determinados no mercado, em que se aplica a solução de tratamento desigual dos resultados negativos e positivos previstos no art. 45º n.º 3 do CIRC, como seja o das situações de alienação em mercado regulamentado, em que as perdas se refletem no lucro tributável apenas no momento da realização, como nos casos de participação superior a 5% ou da opção pela não aplicação da NCRF 27 (conforme decisão arbitral dada no processo n.º 25/2015-T, de 24/09/2015).
h) Discorda-se ainda do sentenciado, por se afigurar que a opção pelo justo valor, com a consequente não aplicação da limitação prevista no art. 45º n.º 3 do CIRC, não afasta de forma alguma as razões de prevenção da fraude e evasão fiscal, que foram algumas das preocupações do legislador ao introduzir no ordenamento jurídico-fiscal o ex art. 42º n.º 3 (atual art. 45º) do CIRC, pela Lei n.º 32-B/2002, para além ser uma medida de moralização, neutralidade, alargamento da base tributável, ou seja, também uma medida de consolidação orçamental, e que as manteve ao alterar a redação daquele preceito através da Lei n.º 60-A/2005.
i) Conforme ficou melhor demonstrado nas alíneas 15) a 17) das alegações, e seguindo os entendimentos dos autores ali referidos, e a decisão lavrada pelo CAAD no proc. n.º 25/2015-T, a mensuração pelo justo valor revela incertezas, com reflexos na realidade económica, e com repercussões nas receitas fiscais, além de que a subjetividade inerente à contabilização pelo justo valor gera uma maior dificuldade do controlo da sua operacionalidade para efeitos fiscais.
j) O sentenciado não tomou em consideração a natureza dos ativos financeiros que estão na origem das perdas por justo valor, ou seja, desconsiderou o sentenciado que o regime legal previsto na al. a) do n.º 2 do art. 57º da Lei n.º 53-A/2006, veio permitir que uma concreta parte dos ativos das sociedades sejam mensurados ao justo valor, em oposição ao custo histórico, ou ao valor de aquisição, conforme vigorou até à entrada em vigor do referido regime legal.
k) Ou seja, até à ocorrência desta alteração legislativa, as perdas por justo valor não eram simplesmente aceites como custos fiscais, somente a partir daí veio admitir-se que as variações patrimoniais dos ativos e passivos financeiros mensurados pelo justo valor, nomeadamente, as perdas por justo valor, em participações inferiores a 5% do capital social, pudessem concorrer para a formação do lucro tributável.
l) Posteriormente, visando a adaptação do CIRC ao SNC, através do Dec. Lei n.º 159/2009, o art. 18º n.º 9 al. a) do CIRC, veio admitir-se que os ajustamentos resultantes da aplicação do justo valor sejam considerados ganhos por aumentos de justo valor ou perdas por redução do justo valor.
m) Contudo, afigura-se que o legislador, ao ter previsto sob a al. a) do n.º 9 do art. 18º do CIRC, que concorrem “para a formação do lucro tributável”, sem reservas ou limitações, os “rendimentos ou gastos” que “(...) respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor”, “desde que” sejam reconhecidos “através de resultados”; se tratem “de instrumentos do capital próprio”; “tenham um preço formado num mercado regulamentado”, e “o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5 % do respetivo capital social”, pretendeu pôr fim ao tratamento desigual das variações positivas e negativas, previsto no n.º 3 do art. 45.º do CIRC.
n) A interpretação, segundo a qual, as perdas por justo valor aqui em causa, se subsumem no âmbito de previsão do art. 45º n.º 3 do CIRC, preconiza, por um lado, um tratamento mais igualitário relativamente às mais e menos-valias, uma vez que, sob certas circunstâncias, estas contribuem para o apuramento do lucro tributável em apenas 50% do seu valor, e, por outro lado, concretiza um tratamento mais equitativo das perdas decorrentes de todas as operações que envolvem partes de capital, de forma, a não distinguir, apenas as resultantes de transmissão onerosa.
o) As variações negativas pelo justo valor apenas concorrem para o lucro tributável em 50% do seu valor, nos termos do art. 45º n.º 3 do CIRC, conforme alguma doutrina conhecedora do “thema” têm manifestado.
p) “Pela leitura daquele preceito, e dada a extensa abrangência do mesmo, somos levados a concluir que todas as perdas referentes a partes de capital, onde se incluem os activos financeiros ora em análise, apenas relevarão para efeitos fiscal em metade do seu valor.” (“O Justo Valor e o Código do IRC”, constante nas págs. 201 e 202 da Revista de Finanças Públicas e Direito Fiscal, Ano 3, Número 4, Inverno).
q) “Conforme referido acima, o actual CIRC prevê, na alínea a) do nº 9 do artigo 18º, o regime de tributação pela variação do justo valor, a acções cotadas, quando participadas em 5% ou menos e quando reconhecidas contabilisticamente ao justo valor por resultados. Com base neste normativo poder-se-ia concluir que, para aquelas acções, quer os ganhos decorrentes de aumentos de justo valor (seja no ano da venda, seja em anos anteriores), quer as perdas resultantes de descidas de justo valor, seriam consideradas fiscalmente. Não obstante, prevê o n.º 3 do artigo 45º que 50% dessas perdas de valor não serão aceites fiscalmente.” (Luísa Anacoreta Correia, Revista Revisores e Auditores, n.º 53, 2º Trimestre de 2011, págs. 34 e 35).
r) “O legislador, manteve, igualmente as condições em que se verificam limitações à dedutibilidade das menos-valias e outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital e outras componentes de capital próprio, constantes dos atuais artigos 23.º, n.ºs 3 a 5, e 45.º, n.º 3, todos do Código do IRC. Cabendo apenas salientar que parece resultar da redacção destas normas que estas limitações serão aplicáveis, inclusive, aos gastos que correspondam a ajustamentos de justo valor de partes de capital.
Ora, se no caso das normas do art.º 23.º tal não se nos afigura ter consequências dado que apenas se aplicam aos gastos suportados com a transmissão onerosa, o mesmo já não ocorre relativamente ao artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, pelo que eventuais perdas por reduções de justo valor em partes de capital e outros instrumentos de capital próprio apenas serão aceites em 50%.” (João Pedro Santos, “in” “Estudos em memória do Prof. Dr. J.L. Saldanha Sanches”, Vol. IV, págs. 818 e 819, Coimbra Editora).
s) “Note-se que as variações negativas de justo valor respeitante a partes de capital são dedutíveis apenas 50%, em face da redação abrangente do n.º 3 do art. 45º do CIRC; (…) A ratio da norma é a de introduzir um maior equilíbrio no tratamento quer dos rendimentos relativos a partes de capital (os dividendos podem beneficiar da dedução integral prevista no art. 51º e as mais-valias, desde que haja reinvestimento nas condições do art. 48º, contam apenas por 50%), quer as perdas.” (João Ricardo Catarino e Vasco Branco Guimarães “in” “Lições de Fiscalidade”, 2013, 2ª edição, pág. 261).
t) Em conclusão, a interpretação que deverá ser efetuada, a nosso ver, é no sentido de que, as perdas decorrentes da aplicação do justo valor às participações de capital de ativos financeiros detidos para negociação devem estar sujeitas à limitação do art. 45º n.º 3 do CIRC, pelo que, atento as razões alegadas e concluídas, afigura-se que esta parte do sentenciado de que se recorre sofre de erro de julgamento, e deve ser revogada.
u) O Recorrido, no exercício fiscal de 2010, registou simultaneamente para os ativos financeiros disponíveis para venda EDP e Redes Energéticas, perdas por imparidade e valorizações subsequentes ao reconhecimento, o que implica ajustamentos fiscais nos termos do art. 35º n.º 3 do CIRC, é que verificando-se variações positivas do ativo financeiro disponível para venda em imparidade, esta deixa de subsistir pelo montante correspondente àquelas, devendo, por isso, concorrer para a formação do lucro tributável na qualidade de um ganho em contraposição ao gasto que a constituição da imparidade representou.
v) De acordo com a IAS 39, parágrafos 58 e 69, e ainda presente o ponto 2 da Instrução n.º 7 do Banco de Portugal, se à data de cada balanço não existir prova objetiva de que os ativos financeiros disponíveis para venda estão em imparidade, a imparidade não se pode manter.
w) Estamos assim perante uma perda por imparidade que fiscalmente foi dedutível, contudo face à valorização dos títulos, deixou de subsistir na parte em que a mesma corresponde a uma redução da imparidade, sendo por consequência aplicável o art. 35º n.º 3 do CIRC, pelo que o decidido padece de erro de julgamento ao ter decidido de forma diferente.
x) O sentenciado anulou a correção relativa a “outras perdas relativas a partes de capital – Ativos financeiros disponíveis para venda – Exercício de 2010 (€ 2 217 949,50) e de 2011 (€ 618 552,20)”, remetendo para a anterior fundamentação através da qual concluiu não ser aplicável o art. 45º n.º 3 do CIRC, a qual não se aceita ser aplicável para concluir pela ilegalidade destas correções, porque “in casu” não está em causa a dicotomia entre perdas e gastos, pois aqui estamos de facto perante uma perda por imparidade e assim qualificada nos arts. 23º n.º 1 al. h) e 35º n.º 2 do CIRC, à qual é aplicável o art. 45º n.º do CIRC, por abarcar “…outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio”.
y) Os ativos disponíveis para venda não cumprem os requisitos do n.º 9 do art. 18º do CIRC, pelo que os seus ajustamentos de justo valor não vão a resultados, sendo os ganhos ou perdas reconhecidos diretamente no capital próprio, ou seja, não influenciam os resultados do exercício, funcionando aqui o princípio da realização; também não há aqui a exigência de um mercado regulado pelo que não pode ser afirmado, sem mais, que as variações do justo valor não dependem da vontade ou intervenção do sujeito passivo e, finalmente, ao contrário do parecer do ministério público a valorimetria das perdas por imparidade não é objetivamente fixada mas resulta de uma avaliação do próprio sujeito passivo, em cumprimento da Instrução do Banco de Portugal.
z) O sentenciado remeteu ainda para os arts. 35º e 37º do CIRC, embora deles não retirando qualquer conclusão decisória, não obstante as correções operadas também naqueles se tenha sustentado, defendendo-se nos relatórios de inspeção que o art. 45º n.º 3 do CIRC se aplica às perdas por imparidade em título e em participações financeiras das instituições de crédito, mesmo quando se faz depender a dedutibilidade fiscal das perdas por imparidade às normas impostas pelo Banco de Portugal e aos quantitativos impostos por aquela Instituição Reguladora.
aa) Quanto à aplicação “in casu” do art. 45º n.º 3 do CIRC, mantêm-se o supra concluído, acrescentando-se que, admitindo-se que as perdas por imparidade realizadas por entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal concorrem, negativamente, para a formação do lucro tributável do respetivo exercício, a mesma sofre limitações ficais nos termos do n.º 3 do art. 45º do CIRC, ou seja, embora a perda seja aceite nos termos do art. 35º n.º 2 do CIRC (e também nos termos do art. 23º n.º 1 al. h) do CIRC), a mesma tem ainda de passar pelo crivo do art. 45º do CIRC.
bb) Entre as duas normas indicadas (art. 35º n.º 2 e 45º n.º 3 do CIRC) não existe uma verdadeira relação de especialidade, pois a norma do art. 35º n.º 2 do CIRC não possui elementos típicos da norma geral, ínsita sob o art. 45º n.º 3 do CIRC, que respeita a “Encargos não dedutíveis para efeitos fiscais”, e daí a necessidade desta norma ser aplicada para averiguar da admissão fiscal da perda, pelo que, não tendo o sentenciado feito este enquadramento sofre de erro de julgamento.
cc) Requer-se que, nesta instância judicial superior, à semelhança do decidido em primeira instância, seja dispensado o pagamento do remanescente da taxa de justiça, na parte que exceda os € 275.000,00, atendendo a que a conduta da Fazenda Pública não se afigura merecedora de censura, na medida em que pugnou também neste recurso, de modo fundamentado, pela posição adotada, em conformidade com o direito processual aplicável, e sem utilizar qualquer meio que possa ser reputado de inútil, desadequado ou dilatório, além de não se afigura que venham a ser apresentados articulados ou alegações prolixas.

I.2 – Contra-alegações
Foram produzidas contra-alegações no âmbito da instância de recurso com o seguinte quadro conclusivo:
1.ª A douta sentença recorrida julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida contra o despacho de indeferimento proferido no âmbito do processo de reclamação graciosa relativo aos atos tributários de IRC respeitantes aos exercícios de 2010 e de 2011;
2.ª Inconformada, a Fazenda Pública recorreu;
a) Outras perdas relativas a partes de capital – Ativos financeiros disponíveis para negociação
3.ª A propósito da correção em epígrafe, o Tribunal Recorrido concluiu que o artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, não abarca os gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos do artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do mesmo código;
4.ª Refere o Tribunal que a compensação das variações patrimoniais positivas e negativas ocorre de forma a que a final apenas releve a diferença entre o valor de aquisição e o valor de venda, afastando-se o regime das mais-valias e menos-valias;
5.ª Para o Tribunal, nos instrumentos financeiros visados pelo artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do Código do IRC, não há qualquer incentivo à manipulação do resultado fiscal, nem sequer possibilidade, pois os ativos são avaliados por critérios objetivos, com um preço formado no mercado regulamentado;
6.ª A Fazenda Pública, ora Recorrente, não se conforma com o decidido e considera que o artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC não ressalva estes instrumentos, pelo que se aplica a todos os tipos de perdas de partes de capital;
7.ª A Recorrente refere ainda que também é possível ocorrer manipulação do resultado fiscal com a aplicação do justo valor.
8.ª Salvo o devido respeito, não assiste razão à Recorrente.
9.ª O artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC não abarca os ajustamentos de justo valor nos instrumentos visados pelo artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do mesmo código, como bem concluiu a sentença recorrida;
10.ª Se atendermos ao elemento literal e histórico de interpretação das normas relevantes, concluímos isso, desde logo:
11.ª O artigo 20.º do Código do IRC sempre previu, e prevê, a tributação das mais-valias realizadas;
12.ª Por sua vez, o artigo 21.º, n.º 1, alínea b), e o artigo 24.º, n.º 1, alínea b), estipulam que as mais-valias e as menos-valias latentes não concorrem para a formação do lucro tributável;
13.ª O artigo 46.º (Regime das mais-valias e das menos-valias) refere-se também às mais e menos-valias realizadas, mediante transmissão onerosa;
14.ª Todos estes normativos seguem o princípio da realização;
15.ª A LOE 2003 e a LOE 2006 introduziram a norma com um carácter assumidamente anti abusivo;
16.ª Depois de 2006, o artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, não sofreu quaisquer alterações, nem mesmo com a entrada em vigor do SNC, pelo que a adoção (limitada) do modelo do justo valor não introduziu qualquer novidade no artigo 45.º, n.º 3, o qual continua a pressupor uma perda efetiva, e não latente, ao abrigo do princípio da realização;
17.ª Não faz, portanto, sentido o que a Recorrente alega, quando refere que o objetivo do legislador foi o de conferir um “tratamento mais equitativo” às perdas decorrentes de partes de capital de forma a “não distinguir apenas as resultantes de transmissão onerosa” (cf. pág. 12 das alegações de recurso), porquanto sempre foi e sempre será pressuposto da aplicação daquele regime precisamente a realização de uma perda efetiva, mediante transmissão onerosa. Cumpre não olvidar que este preceito sempre foi (e é) uma manifestação da concretização do princípio da realização.
18.ª O Decreto-Lei n.º 159/2009 veio proceder a diversas alterações ao Código do IRC, designadamente, ao criar um regime especial de relevância fiscal dos ganhos e perdas apuradas em resultado da aplicação do modelo de justo valor [cf. artigo 20.º, n.º 1, alínea f) e artigo 23.º, n.º 2, alínea i)]. Assim sucedeu, como realça a sentença recorrida, “quer pela sua objectividade própria quer pela confessada intenção de aproximação da contabilidade à fiscalidade.” (cf. pág. 57 da sentença recorrida). Assim, no Código do IRC, o princípio da realização deixou de vigorar em exclusivo, para coexistir com o modelo do justo valor (adotado, porém, de forma limitada).
19.ª Em particular, o artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do CIRC, refere-se a instrumentos financeiros em mercado regulamentado, os quais, e só esses, constituem exceção ao princípio da realização;
20.ª Clarificou-se também que a esses instrumentos financeiros não se aplica o artigo 46.º do CIRC – regime das mais-valias e menos-valias (como bem refere a sentença recorrida, página 58);
21.ª O artigo 45.º, n.º 3, pressupõe a remoção do ativo do balanço (cf. FERREIRA e CARITA, em parecer junto aos autos) e com os ajustamentos de justo valor tal não sucede;
22.ª Tal como se esclarece, a título exemplificativo, na decisão arbitral proferida no processo n.º 231/2015, de 09.12.2015, as perdas distinguem-se, em regra, pela sua natureza não regular, não recorrente, e são, por isso, o resultado de fenómenos com um grau de ocasionalidade ou não repetibilidade bem superior “aqueles gastos que resultem do decurso das actividades correntes (ou ordinárias) da entidade” (cf. parágrafo §76 da Estrutura Conceptual do SNC);
23.ª Daí que a sentença recorrida, e alguma jurisprudência arbitral, refiram que o artigo 45.º, n.º 3, não visa tributar os gastos, mas sim as perdas;
24.ª Contrariamente ao alegado pela Recorrente, não se trata de uma imprecisão terminológica com a adaptação do CIRC ao SNC, pois o que se pretende esclarecer é que o artigo 45.º, n.º 3, que sempre visou, e continua a visar, a tributação de perdas efetivas, realizadas, mediante transmissão ou alienação de ativos (com a sua consequente remoção do balanço), ou seja, eventos extraordinários na vida do ativo, e não meras flutuações do seu valor, que ocorrem de forma corrente e ordinária;
25.ª Se o legislador não mexeu no artigo 45.º, n.º 3, do CIRC é porque quis manter inalterado o regime e nele não incluir os ajustamentos de justo valor;
26.ª Os ajustamentos são dedutíveis nos termos gerais [art. 23.º, n.º 2, alínea j)] mas não passam o crivo do artigo 45.º, n.º 3, ao contrário do que alega a Recorrente, porque o artigo 45.º, n.º 3, apenas se aplica ao regime das mais-valias e menos-valias (princípio da realização);
27.ª Também se atendermos ao elemento sistemático, chegamos a essa conclusão: desde logo, o artigo 23.º, n.º 1, alínea i), à data, previa a dedutibilidade dos gastos resultantes da aplicação do justo valor como regra geral;
28.ª Por sua vez, o artigo 18.º, n.º 9, no seu corpo, constitui uma exceção-comum àquela regra, donde resulta que não concorrem para a formação do lucro tributável os ajustamentos do justo valor;
29.ª De seguida, o artigo 18.º, n.º 9, alínea a), constitui uma exceção-particular à exceção comum, voltando a repor a regra geral, prevendo que os ajustamentos de valor daquele tipo específico de instrumentos financeiros concorrem para a formação do lucro tributável;
30.ª O artigo 45.º, n.º 3, constitui uma exceção à regra geral do artigo 23.º;
31.ª O artigo 45.º, n.º 3, é pré-existente ao artigo 18.º, n.º 9, alínea a) e não sofreu quaisquer alterações com a introdução deste último;
32.ª Pelo que o artigo 45.º, n.º 3, não pode derrogar a norma excepcional particular introduzida depois de si (cf. FERREIRA e CARITA, em parecer junto aos autos);
33.ª Também se atendermos ao elemento teleológico e à ratio legis dos artigos 45.º, n.º 3, e artigo 18.º, n.º 9, alínea a), chegamos a idêntica conclusão;
34.ª Como bem referiu a sentença recorrida, o objetivo do legislador com o artigo 45.º, n.º 3, foi o de evitar a manipulação do resultado fiscal pelo sujeito passivo através da gestão do momento e quantum da perda – prática impossível com os ajustamentos de justo valor;
35.ª A tributação do justo valor é integralmente substitutiva do regime das mais e menos-valias (cf. FERREIRA e CARITA, em parecer junto aos autos), porquanto antecipa temporalmente o reconhecimento do gasto com caráter definitivo e cumpre o objetivo da norma anti-abuso;
36.ª A tributação do justo valor pretende evitar correções fiscais aquando a realização do ativo – daí a norma anti-abuso não se aplicar;
37.ª Os ajustamentos de justo valor ocorrem independentemente da vontade do sujeito passivo;
38.ª Por isso, não faz sentido aplicar-lhe a limitação prevista para as menos-valias;
39.ª Acresce que é por razões de simetria que se explica a aceitação das menos-valias em apenas metade porquanto a tributação das mais-valias também é feita só pela metade (se reinvestidas, cf. artigo 48.º, n.º 4);
40.ª Quanto aos ajustamentos também deve haver simetria – os ganhos são tributados na totalidade, logo as perdas também o deverão ser (cf. artigo 18.º, n.º 9, alínea a), do CIRC);
41.ª Como refere a sentença recorrida, o artigo 18.º, n.º 9, alínea a), foi introduzido num contexto de aproximar a contabilidade da fiscalidade, reduzindo-se os custos de compliance e os custos administrativos. Neste tipo de instrumentos financeiros, um tratamento fiscal e contabilístico distintos implicaria elevadíssimos custos administrativos, razão pela qual se adotou o justo valor em pleno;
42.ª Por isso, não faz sentido aplicar o artigo 45.º, n.º 3, que é uma norma de correção fiscal, repondo essa disparidade;
43.ª Não colhe o argumento da Recorrente de que com o justo valor também são possíveis manipulações ao resultado fiscal, porquanto o abuso que se pretende prevenir aqui é muito específico (distorções significativas entre valor de aquisição e valor de venda) e o justo valor mitiga ou anula mesmo esse tipo de abuso;
44.ª E não falta quem advogue que o justo valor veio introduzir uma maior justiça fiscal e social (cf. JOSÉ AMORIM);
45.ª Note-se, ainda, que a mensuração pelo justo valor obedece a critérios rigorosos e exaustivamente regulamentados, designadamente, pela IFRS 13, nos termos da qual decorre e se realça desde logo que “O justo valor é uma medida de mercado, não uma medida específica para uma determinada entidade”;
46.ª Existem diversas decisões arbitrais que alinham no sentido aqui propugnado (cf. n.º 108/2013-T, n.º 776/2014-T, n.º 58/2015, n.º 30/2015-T, n.º 208/2015-T, n.º 396/2015-T, n.º 393/2016-T, n.º 437/2016-T, n.º 473/2015-T, n.º 531/2015-T, n.º 563/2015-T, n.º 89/2016-T e n.º 155/2017-T);
47.ª Na mesma linha de entendimento, também este Supremo Tribunal Administrativo se pronuncia sobre a ratio legis do preceito aqui em causa, afirmando que a norma, em qualquer das suas versões, integra uma medida anti-abuso, na medida em que o legislador terá pretendido evitar a manipulação do resultado fiscal (cf. acórdão de 17.02.2016, no processo n.º 1401/14, Relator FRANCISCO ROTHES);
48.ª E, muito recentemente, veio este douto tribunal (STA) proferir o seguinte entendimento sobre o tema: “(…) o legislador com a norma do artigo 18.º, n.º 9, al. a) (…) afastou o princípio da realização e aproximou, ainda mais, a regra fiscal à regra contabilística, atribuindo relevância fiscal à variação anual do valor dos instrumentos financeiros, com preço formado em mercado regulamentado, quando aplicadas as regras do Justo Valor, cfr. artigos 20.º, n.º 1, alínea f) e 23.º, n.º 1, alínea i) do CIRC. Do exposto resulta claramente, ao abrigo do disposto no artigo 9.º do CC, que a norma do artigo 45.º, n.º 3 do CIRC em análise, não se coaduna com a determinação – ao Justo Valor – do valor dos activos sujeitos a mercado regulado por entidades oficiais, porque a razão da sua existência, combate à evasão e elisão fiscal, não tem justificação no caso concreto, o valor dos activos – a posição financeira – acaba por ser “estranho” e alheio à vontade do contribuinte que, em última instância, nada releva para a valorização ou desvalorização do respectivo activo.” (cf. Acórdão do STA, proferido no processo n.º 0582/17, em 06.06.2018);
49.ª Não pode ser outro o entendimento que não a propugnado pelo Recorrido e acolhido na sentença, sob pena de violação do princípio da tributação pelo lucro real e do princípio da igualdade (cf. artigo 104.º, n.º 2, e artigo 13.º, ambos da CRP), porquanto os ganhos são tributados na totalidade, logo, igual tratamento devem receber as perdas (neste mesmo sentido, TOMÁS TAVARES e FERREIRA/CARITA, em parecer junto aos autos);
50.ª Por fim, tendo a correção sido suportado na Informação Vinculativa, proc. n.º 39/2011, e atento o disposto no artigo 68.º-A, n.º 2, da LGT, o entendimento da AT aí vertido não pode aplicar-se retroativamente ao exercício de 2010, pelo que quanto a este exercício sempre seria de anular a correção;
51.ª Em face de todo o exposto, bem andou a sentença recorrida ao anular a correção em apreço, devendo a mesma manter-se e ser julgado improcedente o recurso apresentado pela Fazenda Pública.
b) Das perdas por imparidade para menos-valias de títulos
52.ª A propósito da correção em epígrafe, o Tribunal Recorrido entendeu que a limitação prevista no artigo 35.º, n.º 3, do Código do IRC, reporta-se a provisões utilizadas quando anteriormente tenham sido aceites como fiscalmente dedutíveis, o que não é o caso dos autos;
53.ª A Recorrente imputa à sentença recorrida erro de julgamento porque considera que a valorização positiva de justo valor do título em imparidade origina uma reversão da imparidade, deixando de haver imparidade, logo, devendo concorrer para a formação do lucro tributável;
54.ª Salvo o devido respeito, não assiste razão à Recorrente;
55.ª As valorizações de títulos em imparidade não dão origem a reversão da imparidade;
56.ª No caso sub judice, “não deixaram de subsistir as condições objetivas” que determinaram a constituição das imparidades, elas mantêm-se e estão registadas no balanço e deverão manter-se até ao desreconhecimento do ativo;
57.ª As imparidades em causa foram constituídas no exercício corrente (2010), pelo que nunca a pretensa “reversão” podia ser tributada;
58.ª Por isso não faz sentido o que alega a Recorrente, de que estamos “perante perda por imparidade que foi fiscalmente dedutível” (cf. p. 22 das alegações de recurso);
59.ª A divergência entre a Recorrente e o Recorrido é uma de interpretação de direito, em que a Recorrente considera que toda e qualquer flutuação de valor deve ser proveito ou custo, o que contraria em absoluto o princípio da realização subjacente a todo o Código do IRC;
60.ª O artigo 35.º, n.º 3, do Código do IRC pressupõe a tributação de provisões anuladas / utilizadas quando anteriormente tenham sido aceites fiscalmente, como bem concluiu a sentença recorrida;
61.ª As meras flutuações de valor não têm relevância fiscal à luz do CIRC, nunca tiveram, nem têm agora, ao contrário do que alega a Recorrente (cf. p. 20 das alegações de recurso);
62.ª Aliás, o Decreto-Lei n.º 159/2009 não introduziu qualquer alteração ao artigo 35.º e desde há muito que as instituições de crédito estão obrigadas a constituir provisões para imparidades em participações financeiras;
63.ª O artigo 37.º, n.º 4, do Código do IRC, impõe um limite máximo de dedutibilidade que coincide com o limite mínimo imposto pelo Banco de Portugal, em consonância com a IAS 39;
64.ª O artigo 35.º, n.º 3, do Código do IRC, não é uma norma de correção fiscal e mantém o mesmo sentido que sempre teve, até porque não sofreu qualquer alteração;
65.ª Assim, o artigo 35.º, n.º 3, apenas funciona para tributar a provisão anulada/utilizada;
66.ª No caso concreto, nada disso ocorre, nem mesmo um excesso de imparidade, porquanto se observou o mínimo obrigatório imposto pelo Banco de Portugal, nem também a AT invocou tal;
67.ª Com o devido respeito, não faz sentido o alegado pela Recorrente de que “o legislador não acolheu os procedimentos contabilísticos decorrentes das novas normas”, logo, “verificando-se variações positivas do justo valor” devem as mesmas concorrer para a formação do lucro tributável (cf. página 20 das alegações de recurso). Ora, é precisamente porque o legislador do CIRC não adotou plenamente o modelo do justo valor que consagrou, no artigo 18.º, n.º 9, a sua irrelevância fiscal;
68.ª Após o reconhecimento inicial de um crédito este poderá ser classificado como com imparidade quando existe evidência objetiva de imparidade resultante de um ou mais eventos e quando estes tenham impacto que possa ser estimado de forma fiável. A perda por imparidade identificada é registada por contrapartida de resultados, sendo subsequentemente revertida por resultados caso se verifique uma redução do montante da perda estimada, num período posterior;
69.ª Assim, também não faz qualquer sentido o alegado pela Recorrente, de que a tributação ocorre “não obstante estarem relevadas em capitais próprios.” (cf. página 20 das alegações de recurso);
70.ª Em suma, as valorizações de justo valor em títulos financeiros não originam reversão da imparidade, pelo que não lhes é aplicável o n.º 3 do artigo 35.º que determina que apenas as provisões utilizadas / anuladas sejam objeto de tributação, e quando antes tenham sido aceites fiscalmente;
71.ª Em face do exposto, não havendo qualquer erro de julgamento, deve a sentença recorrida manter-se, sendo o recurso apresentado pela Recorrente julgado improcedente, também nesta parte.
c) Outras perdas relativas a partes de capital – Ativos financeiros disponíveis para venda
72.ª A propósito desta correção, entendeu o Tribunal Recorrido que no artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, não cabem as perdas por imparidade constituídas obrigatoriamente pelo Banco de Portugal;
73.ª Não se conformando, a Recorrente alega que a fundamentação anteriormente aduzida acerca da interpretação do artigo 45.º, n.º 3, não é subsumível à presente situação, pois os ativos disponíveis para venda não obedecem a um mercado regulamentado, sendo possível haver manipulação do resultado fiscal pelo sujeito passivo;
74.ª A título prévio, note-se que a remissão operada não o é para a fundamentação no seu todo, sendo percetível que tal remissão deve ser feita com as necessárias adaptações e com foco no princípio da realização. Assim, sendo certo que já não estamos a distinguir entre os ativos serem ou não reconhecidos em capitais próprios ou em resultados ou obedecerem ou não a um mercado regulamentado, mas trata-se, ainda assim, de respeitar o princípio da realização, consagrado no preceito sob análise.
75.ª Se atendermos ao elemento literal e histórico de interpretação da norma, constatamos que tanto a LOE 2003 como a LOE 2006 sempre focaram no conceito de “transmissão”, ou seja, o preceito não abrange menos-valias latentes, ainda não realizadas (assim também, TOMÁS TAVARES, obras citadas, NUNO OLIVEIRA GARCIA, op. cit., FERREIRA e CARITA, em parecer junto aos autos);
76.ª A dedutibilidade fiscal das perdas por imparidade encontra-se prevista no Código do IRC desde a sua redação original [no artigo 33.º, n.º 1, alínea d)] e depois no artigo 34.º, n.º 1, alínea d), com a renumeração conferida pelo Decreto-Lei n.º 159/2009. Este diploma apenas veio alterar a terminologia antiga “provisões” para a atual “perdas por imparidade”, a qual se manteve até hoje no atual artigo 35.º.
77.ª Considerando que a redação do artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, se manteve inalterada desde 2006, designadamente aquando da aprovação do Decreto-Lei n.º 159/2009, não é de aceitar uma nova interpretação da norma que altere o seu sentido, quando a sua letra permaneceu inalterada;
78.ª Na verdade, se durante o período em que os gastos previstos no atual n.º 2 do artigo 35.º do Código do IRC se designavam “provisões para menos-valias de títulos” os mesmos não tinham cabimento no n.º 3 do artigo 45.º do mesmo código, nem a administração tributária alguma vez levantou tal possibilidade, não é a mera alteração da sua denominação para “perdas por imparidade” que os torna subsumíveis ao regime previsto neste último normativo.
79.ª Se o legislador tivesse pretendido incluir no artigo 45.º, n.º 3, as perdas por imparidade do artigo 35.º, tê-lo-ia previsto expressamente;
80.ª Se atendermos ao elemento sistemático, constatamos que o artigo 35.º, n.º 2, do Código do IRC constitui uma norma especial, na medida em que confere dedutibilidade fiscal a determinadas perdas por imparidade constituídas obrigatoriamente pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal, designadamente, para menos-valias de títulos e de outras aplicações.
81.ª Contrariamente ao afirmado pela Recorrente, a dedutibilidade das perdas por imparidade para menos-valias de títulos e outras aplicações não decorre em termos gerais do artigo 23.º (cf. página 27 das alegações de recurso), nem mesmo do artigo 35.º, n.º 1, do Código do IRC, antes se trata de uma dedutibilidade especial, especificamente prevista para as instituições de crédito, tal como referiu, e bem, a sentença recorrida (cf. p. 72 da sentença);
82.ª Por seu turno, o artigo 37.º do mesmo código, impõe limites à dedutibilidade das perdas por imparidade previstas no n.º 2 do artigo 35.º, contendo regras especiais e excecionais, constituindo assim uma norma excecional / especial;
83.ª Por último, o artigo 45.º, n.º 3, como vimos, limita, em contradição com a regra geral do artigo 23.º, a dedutibilidade de certos gastos aí previstos, afigurando-se uma norma excecional;
84.ª Ora, não estando previstos no artigo 23.º as perdas por imparidade aqui em apreço, não podem as mesmas ser excecionadas pelo artigo 45.º, n.º 3;
85.ª Como já se referiu, o artigo 23.º do Código do IRC, regra geral, não prevê a dedutibilidade de menos-valias de títulos e outras aplicações, sendo essa dedutibilidade apenas prevista para as entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal;
86.ª O artigo 45.º, n.º 3, como norma que contradiz o artigo 23.º, não pode seguramente reportar-se a estes gastos específicos apenas previstos no artigo 35.º, n.º 2;
87.ª Ainda, as normas especiais dos artigos 35.º, n.º 2, e 37.º, não são prejudicadas pelo teor do artigo 45.º, n.º 3, ou seja, as regras especiais não são derrogadas pelas regras excecionais (cf. neste sentido, FERREIRA e CARITA no parecer junto aos autos, página 25 do doc. n.º 9);
88.ª Acresce que o artigo 37.º, o qual limita a dedutibilidade destes gastos previstos no artigo 35.º, n.º 2 (sendo a norma que a contradiz), determina um limite máximo à dedutibilidade fiscal, que coincide com o limite mínimo imposto pelas regras do Banco de Portugal. Ora, se esta norma do artigo 37.º já restringe o valor dedutível, fará sentido que exista uma outra norma que restrinja ainda mais?
89.ª Em face do exposto, não faz qualquer sentido, com o devido respeito, a afirmação da Recorrente de que o artigo 45.º/3 e o artigo 35.º/2 são normas “especiais em razão de diferentes critérios e em função de diferentes destinatários, o que significa que não existe, diretamente, entre elas uma relação de especialidade.” (cf. página 27 das alegações de recurso);
90.ª O artigo 35.º, n.º 2, é uma norma especial, visando um específico destinatário (as instituições de crédito);
91.ª O artigo 45.º, n.º 3, é uma regra excecional, visando os demais destinatários em geral;
92.ª Já o artigo 23.º é a regra geral de dedutibilidade de gastos, onde se prevê, entre outras, as perdas por imparidade;
93.ª O artigo 35.º, n.º 1, concretiza a dedutibilidade das perdas por imparidade e o artigo 35.º, n.º 2, prevê, para as instituições de crédito, uma dedutibilidade especial para as perdas por imparidade para menos-valias de títulos;
94.ª O artigo 45.º, n.º 3, exceciona a regra geral, limitando o valor dedutível dos gastos aí previstos, e só esses;
95.ª Também se atendermos ao elemento teleológico de interpretação, recordamos que o artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC visa censurar o apuramento de certas perdas em partes de capital, o que só faz sentido nos casos em que a vontade do sujeito passivo seja determinante do momento e do montante da perda;
96.ª A norma tem como objetivo evitar a manipulação do resultado fiscal pelo sujeito passivo e, contrariamente ao alegado pela Recorrente, esse desiderato verifica-se igualmente a propósito das imparidades em apreço, e não só relativamente aos ativos cuja valorimetria obedece a um mercado regulamentado (cf. página 25 das alegações de recurso);
97.ª Como se disse, cumpre não perder o foco de que esta norma é uma manifestação do princípio da realização, visando apenas restringir a dedutibilidade de perdas efetivas, nas quais é possível ao sujeito passivo manipular o momento e o montante da perda;
98.ª E contrariamente ao alegado pela Recorrente, nas imparidades em apreço não é possível à instituição de crédito manipular o quantum da perda aceite fiscalmente;
99.ª Com efeito, as imparidades sob análise são constituídas obrigatoriamente por força das normas constantes do Aviso n.º 3/95, do Banco de Portugal, o qual estabelece os correspondentes valores mínimos, sendo apenas esses os fiscalmente dedutíveis, conforme estabelecia o n.º 4 do artigo 37.º do Código do IRC na redação aplicável à data dos factos;
100.ª Assim, não se encontra, pois, preenchida a ratio legis do n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC no que respeita às perdas por imparidade previstas no n.º 2 do artigo 35.º do mesmo diploma legal, razão pela qual aquele preceito não se lhes aplica, sendo as mesmas fiscalmente dedutíveis na totalidade (assim também, exemplificativamente, decisão arbitral de 07.10.2014 proferida no âmbito do processo n.º 271/2014-T); 101.ª Em face do exposto, e interpretando o artigo 45.º, n.º 3, do Código do IRC, tendo presente a letra da lei e a sua evolução, o sistema jurídico em que se insere e a sua ratio legis, só se pode concluir que o mesmo não se aplica às provisões / imparidades constituídas pelas instituições de crédito em virtude das normas emanadas pelo Banco de Portugal, devendo a sentença recorrida manter-se, pois também assim concluiu, e ser julgado improcedente o recurso apresentado pela Recorrente.
102.ª Não pode ser outro o entendimento que não a propugnado pelo Recorrido e acolhido na sentença, sob pena de violação do princípio da igualdade (cf. artigo 13.º, da CRP), porquanto as provisões técnicas obrigatórias constituídas por imposição do Instituto de Seguros de Portugal pelas empresas de seguros previstas no artigo 39.º, n.º 1, alínea c) do Código do IRC, não são sujeitas pela administração tributária ao crivo do artigo 45.º, n.º 3;
103.ª Sucede que as aludidas provisões técnicas têm um regime equivalente ao das provisões/imparidades constituídas pelas instituições de crédito, ambas obrigatórias por imposição das normas das entidades supervisoras, razão pela qual não se descortina qualquer motivo para que exista um tratamento fiscal distinto entre umas e outras;
104.ª Sendo certo que o regime de ambas as provisões não sofreu qualquer alteração e continua a prever-se a dedutibilidade condicionada ao cumprimento dos limites mínimos impostos pelo regulador;
105.ª Em face do exposto, enferma o n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC, na redação aplicável à data dos factos, de inconstitucionalidade material por violação do artigo 13.º da CRP, na interpretação que lhe confere a administração tributária, o que desde já se invoca para todos os devidos efeitos, devendo ser desaplicada a referida norma e também com este fundamento ser julgado improcedente o recurso apresentado pela Recorrente;
106.ª Por fim, tendo a correção sido suportado na Informação Vinculativa, proc. n.º 1.706/12, e atento o disposto no artigo 68.º-A, n.º 2, da LGT, o entendimento da AT aí vertido não pode aplicar-se retroativamente, nem ao exercício de 2010, nem ao exercício de 2011, pelo que sempre seria de anular a correção;
107.ª Em face de todo o exposto, bem andou a sentença recorrida ao anular a correção em apreço, devendo a mesma manter-se e ser julgado improcedente o recurso apresentado pela Fazenda Pública.
108.ª Por todas as razões supra aduzidas, bem andou o Tribunal Recorrido ao julgar procedente a impugnação judicial e determinar a anulação do ato tributário impugnado, com a consequente restituição do imposto indevidamente pago, acrescido do pagamento de juros indemnizatórios;
109.ª Em face do exposto, deve julgar-se improcedente o recurso apresentado pela Fazenda Pública, mantendo-se a sentença recorrida, por não ocorrer qualquer erro de julgamento.

I.3 – Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo, veio o Ministério Público emitir parecer com o seguinte conteúdo:
“A representante da Fazenda Pública, inconformada com a sentença recorrida que julgou procedente a impugnação apresentada por Banco A…………, S.A. vem interpor recurso para o S.T.A. com conclusões, das quais é possível inferir se há erro no decidido quanto ao seguinte:
- se, quanto às participações de capital de ativos financeiros detidos para negociação as mesmas não englobam o conceito de “gastos” previsto no art. 23.º do C.I.R.C., não é de aplicar o critério do justo valor previsto no art. 18.º n.º 9 al. a) do C.I.R.C., nem é de sujeitar à limitação prevista no art. 45.º n.º 3 do C.I.R.C.;
-se quanto aos ativos financeiros disponíveis para venda por imparidade e ao reconhecimento dessas situação não é de aplicar o artigo 35.º n.º 3 do C.IR.C., nem sujeitá-los à limitação do art. 45.º n.º 3 do C.I.R.C..
Finalmente, coloca à apreciação se é de dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça por não se ter utilizado qualquer meio que possa ser reputado de inútil, desadequado ou dilatório, nem se prever a utilização de articulados ou alegações prolixas.
Vejamos.
As primeiras questões decorrem de alterações que foram introduzidas ao CIRC pelo Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13/7, nomeadamente, no que respeita aos artigos 23.º, 18.º n.º 9 al. a) e 35.º n.º 3.
Conforme se pode ler no preâmbulo desse Dec.-Lei pelas alterações pretendeu-se adaptar o CIRC ao SNC, estabelecendo-se ainda a aplicação do critério do justo valor à mensuração de ativos em mercado regulamentado.
No entanto, não foi afastado a de não dependência total do apuramento do lucro tributável das normas contabilísticas, conforme a doutrina e a jurisprudência têm considerando – assim, para além de Tomás Castro Tavares nas obras citadas pelo recorrido, José Casalta Nabais, em Direito Fiscal, 7.ª ed. Almedina, 2012, pág. 522.
Acresce que, quanto a instrumentos financeiros foi previsto no art. 18.º n.º 9 al. a) do C.I.R.C. que as variações patrimoniais só concorrem para a formação de lucro “através de resultados”, para o que não bastará que os ditos instrumentos tenham sido postos à negociação.
Por outro lado, no art. 35.º n.º 2 do C.I.R.C., foi previsto quanto às perdas por imparidades e outras correções estabelecidas pelo Banco de Portugal serem as mesmas dedutíveis; contudo, no seguinte n.º3, admitiu-se ainda o contrário, se for possível determinar que deixaram de se verificar as “situações objetivas que as determinaram”.
Ora, crê-se que quanto aos títulos disponíveis para venda não será possível proceder a tal enquadramento.
Aliás, no art. 45.º n.º 3 do C.I.R.C. prevê-se a tributação em metade do valor quanto à diferença de valores quanto a mais e menos-valias realizadas, bem como quanto a “outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes de capital próprio”.
Tendo tal disposição um caráter anti-abuso, importaria que resultasse justificada tal aplicação.
Sem tal não é possível a sua aplicação, conforme decidido no acórdão do S.T.A. de 6-6-2018, proferido no proc. n.º 0582/17, cujo sumário se reproduz para melhor elucidação:
- “A norma do artigo 45º, n.º 3 do CIRC não é aplicável quando ocorre a determinação – ao Justo Valor – do valor dos activos sujeitos a mercado regulado por entidades oficiais, porque a razão da sua existência, combate à evasão e elisão fiscal, não tem justificação, o valor dos activos – a posição financeira – acaba por ser “estranho” e alheio à vontade do contribuinte que, em última instância, nada releva para a valorização ou desvalorização do respectivo activo”.
Assim sendo de considerar, decorre a improcedência do recurso interposto a qualquer das invocadas situações.
Finalmente, há elementos no sentido de dispensar o pagamento de remanescente de taxa de justiça, mas apenas parcialmente, nos termos previstos no art. 6.º n.º 7 do R.C.P..
Com efeito, as alegações de recurso são prolixas, mas, não é elevada a complexidade das situações em análise e teve lugar a dispensa da inquirição de testemunhas.
Concluindo:
O recurso é de improceder.
Há elementos no sentido de dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça, mas apenas parcialmente.”

I.4 - Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.


II – FUNDAMENTAÇÃO

II.1 – De facto
A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto a fls. 585 e seguintes do SITAF:
A) O Impugnante é uma instituição financeira especializada que disponibiliza produtos de poupança, corretagem, custódia, gestão de patrimónios, serviços financeiros gerais e de pagamentos a clientes institucionais e a clientes particulares (cf. artigo 7º da pi, 5º da contestações e ponto II.3.2 do relatório dos SIT junto ao PA);
B) O Impugnante é uma entidade sujeita à supervisão do Banco de Portugal;
C) O Impugnante foi alvo de duas ações inspetivas externas de âmbito geral aos exercícios de 2010 e 2011, respetivamente, realizada pelos Serviços de Inspeção Tributária da Direção de Finanças de Lisboa da Autoridade Tributária e Aduaneira (cf. artigos 8º e 9º da pi e 2º da contestação);
D) A ação inspetiva respeitante ao exercício de 2010 teve início em Fevereiro de 2013;
E) A ação inspetiva respeitante ao exercício de 2011 teve início em 22 de Abril de 2013 (cf. ponto II.1 do RIT);
F) Na inspeção ao exercício de 2010, os Serviços de Inspeção Tributária (SIT) concluíram
a. Pela necessidade de correções à matéria tributável declarada no montante global de € 7 131 708,62 (cf. ponto 1.4 do relatório dos SIT, que faz fls. 639 a 686 do PA e que aqui se dá como integralmente reproduzido), das quais:
i. € 660 169,06, relativas a perdas por imparidades para menos-valias de títulos;
ii. € 2 217 949,50, referentes a outras perdas relativas a partes de capital – ativos financeiros disponíveis para venda;
iii. € 4 227 461,26, de outras perdas relativas a partes de capital – ativos financeiros disponíveis para negociação;
iv. € 26 128,80, referentes à criação de emprego para jovens;
b. E ainda pela correção ao cálculo do imposto, no montante de € 27 189,49, relativa ao benefício fiscal Sistema de Incentivos Fiscais à Investigação e Desenvolvimento Empresarial (SIFIDE);
G) Quanto ao exercício de 2011, os SIT concluíram por correções para mais à matéria tributável, no montante global de € 5 450 903,78 (cf. ponto 1.4 do relatório dos SIT, que faz fls. 381 a 428 do PA e que aqui se dá como integralmente reproduzido), dos quais:
a. € 618 552,20 de outras perdas relativas a partes de capital – ativos financeiros disponíveis para venda;
b. € 5 628 341,32 de outras perdas relativas a partes de capital – ativos financeiros disponíveis para negociação;
c. € 795 989,74 de mais-valias fiscais – partes de capital – ativos financeiros disponíveis para venda;
H) Do relatório elaborado pelos SIT em 2013.11.04,constante de fls. 639 a 678 do PA e que aqui se dá como integralmente reproduzido, transcreve-se:
(…)
lII.1- Correções à matéria tributável – IRC
III.1.1 - Perdas por imparidade para menos-valias de títulos (artigo 35.º n.º 3 do CIRC) -
€ 660.163,06-
Da análise ao Inventário de títulos e participações do Banco A…………, SA, elaborado de acordo com a Instrução n.º 35/2005 do Banco de Portugal, verificou-se que os títulos designados por ¯EDP - ELETRICIDADE DE PORTUGAL‖ e ¯REDES ENERGETICAS N,‖, classificados como ativos financeiros disponíveis para venda, evidenciavam, em simultâneo, perdas por imparidade constituídas no exercício, as quais se encontravam relevadas contabilisticamente na conta de gastos NCA ¯76301 -Instrumentos de capital emitidos por residentes‖ e valorizações subsequentes ao reconhecimento das perdas por imparidade, as quais foram registadas contabilística em Reservas de Reavaliação - Reservas resultantes da valorização ao justo valor (conta NICA #580).
De acordo com o Aviso nº 1/2005 do Banco de Portugal, as instituições sujeitas à sua devem elaborar as demonstrações financeiras em base individual e em base consolidada de acordo com as normas internacionais de contabilidade (NIC), tal como adotadas, em cada momento, por regulamento da União Europeia e, bem assim, com a estrutura conceptual para a apresentação e preparação de demonstrações financeiras que enquadra aquelas normas.
E, foi ao abrigo do disposto no parágrafo 69 da IAS 39 - Instrumentos Financeiros - Reconhecimento e Mensuração, onde se estabelece que ¯as perdas por imparidade reconhecidas nos resultados para um investimento num instrumento de capital próprio classificado com disponível para venda não devem ser revertidas por via de resultados", que o sujeito passivo reconheceu a reversão em causa, subsequente ao reconhecimento da perda por imparidade, na conta de capitais próprios (reservas).
Ainda que contabilisticamente as perdas por imparidade anteriormente constituídas não devam ser revertidas por contrapartida de resultados (ganhos e perdas), isto se estivermos na presença de um instrumento de capital próprio classificado como ¯ativo financeiro disponível para venda‖, importa aferir da eficácia fiscal desta norma contabilística, atento o facto de a imparidade ser um custo fiscalmente dedutível, aquando da sua constituição, nos termos do artigo 35º e 37.º do CIRC para efeitos de determinação do lucro tributável.
No preâmbulo do Decreto-Lei n.º 159/2009, de 13 de junho, o qual visou proceder â adaptação do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (CIRC), às normas internacionais de contabilidade adotadas pela União Europeia e ao Sistema de Normalização Contabilística refere-se:
* ¯Considerando que a estrutura atual do Código do IRC se mostra, em geral, adequada ao acolhimento do novo referencial contabilístico, manteve-se a estreita ligação entre contabilidade e fiscalidade
"A manutenção do modelo de dependência parcial determina, desde logo, que, sempre que não estejam estabelecidas regras fiscais próprias, se verifica o acolhimento do tratamento contabilístico decorrente das novas normas.", donde, facilmente se conclui que sempre que existam regras fiscais próprias, estas se sobrepõem ao normativo contabilístico.
Ora, por um lado, o nº 2 do artigo 35.º do CIRC prevê (i) a dedução para efeitos fiscais das perdas por imparidade e outras correções de valor contabilizadas no mesmo período de tributação ou em períodos de tributação anteriores, quando constituídas obrigatoriamente por força de normas emanadas pelo Banco de Portugal, de caráter genérico e abstrato, pelas entidades sujeitas à sua supervisão e pelas sucursais em Portugal de instituições de crédito e outras instituições financeiras com sede em outro Estado membro da União Europeia, destinadas à cobertura de risco específico de crédito e de risco-país e para menos-valias de títulos e de outras aplicações; e, por outro lado, o nº 3 do mesmo artigo determina que (ii) ¯As perdas por imparidade e outras correções de valor referidas nos números anteriores que não devam subsistir, por deixarem de se verificar as condições objetivas que as determinaram, consideram-se componentes positivas do lucro tributável do respetivo período de tributação".
Do estabelecido no nº 3, infere-se que o legislador não acolheu os procedimentos contabilísticos decorrentes das novas normas, pelo que, e em prejuízo destas, o resultado fiscal terá de ser determinado em observância daquela regra fiscal. Logo, verificando-se variações positivas do justo valor do instrumento financeiro em imparidade, esta deixa de subsistir pelo montante correspondente àquelas, devendo, por isso, concorrer para a formação do lucro tributável na qualidade de um ganho em contraposição ao gasto que a constituição da imparidade representou.
E não podia ser de outra forma, pois se tivermos em consideração um título em que os aumentos de valor (ajustamentos de justo valor positivos), registados em capitais próprios (¯Reservas de Reavaliação"), superem o evidenciado em perdas por imparidade, decorre, naturalmente, que aquele ativo financeiro não se encontra de facto em imparidade.
Ora, no caso em apreço, o sujeito passivo reconheceu para efeitos fiscais no exercício de 2010, imparidades para instrumentos de capital próprio, classificados como ativos disponíveis para venda, designados por ¯EDP - ELETRICIDADE DE PORTUGAL" e ¯REDES ENERGETICAS N ‖, no valor de € 3.775.141,95, conforme extrato de conta disponibilizado pelo Banco [Anexo 1 (1 fl.)] Porém, tendo-se verificado, ainda no mesmo exercício, alterações positivas do justo valor dos títulos em causa, e não obstante estarem relevadas em capitais próprios, as mesmas correspondem a uma redução da imparidade antes constituída - Anexo 2 (1 fl.).
Face a tudo o que antecede, tendo presente as regras fiscais supra explicitadas, procedeu-se à respetiva correção, nos termos do nº 3 do artigo 35.º do CIRC, a qual se consubstancia num acréscimo para efeitos de determinação do lucro tributável no valor de € 660.169,06.
O sujeito passivo, em sede de direito de audição, não se pronunciou sobre a correção proposta (cf. ponto IX.1.1).
III.1.2 - Outras perdas relativas a partes de capital - Ativos financeiros disponíveis para venda (n.º 3 do artigo 45º do CIRC)
-€2.217.949,50 -
O Banco A…………, SA possui uma carteira de investimentos, para os quais, em termos de reconhecimento e mensuração, utiliza as regras contabilísticas estabelecidas na IAS 39 ¯Instrumentos Financeiros - Reconhecimento e Mensuração‖ e na IAS 28 ¯Investimentos em Associadas‖.
No que concerne àqueles que qualifica como ¯Ativos Financeiros disponíveis para venda‖, relevados contabilisticamente na conta de balanço NCA ¯18 - Ativos financeiros disponíveis para venda‖ e os considerados ¯Investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos‖, registados na conta de balanço NCA ¯24 - Investimentos em filiais, associadas e empreendimentos conjuntos‖, de acordo com a nota 2 ¯Principais políticas contabilísticas‖ das Notas às Demonstrações Financeiras Individuais avalia regularmente se existe evidência objetiva de que um ativo financeiro, ou grupo de ativos financeiros, apresenta sinais de imparidade.
Para os ativos financeiros que apresentam sinais de imparidade, é determinado o respetivo valor recuperável, sendo as perdas por imparidade registadas por contrapartida de resultados. Desta forma, atende às recomendações contabilísticas da IAS 39 "Instrumentos Financeiros - Reconhecimento e Mensuração‖, para os Instrumentos Financeiros classificados como Ativos financeiros disponíveis para venda e da IAS 36 ¯Imparidade de Ativos para os Investimentos em Associadas‖ e às recomendações prudenciais estabelecidas na Instrução 7/2005, por força do disposto na alínea b) do número 1 do n.º 1,a do Aviso n.º 3/95, ambos do Banco de Portugal,
Neste sentido constituiu, no que se refere a Instrumentos de Capital — Partes de Capital classificados como ¯Ativos financeiros disponíveis para venda", no exercício de 2010, provisões para imparidades no valor de €4.678.907,70 - [montante correspondente ao saldo da conta de gastos NCA ¯76301 - Provisões para Imparidade - Ativos financeiros disponíveis para venda - Instrumentos de capital emitidos por residentes"] - e, relativamente aos ¯Investimentos em associadas‖, procedeu à transferência de ¯imparidades tributadas‖ para "imparidades aceites fiscalmente‖, no montante de € 417.160 - [através da dedução no Campo 775 do Quadro 07 - Apuramento do lucro tributável da Declaração de Rendimentos Modelo 22],
Em termos fiscais, as perdas/provisões por imparidade constituídas pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal encontram-se contempladas nos números 2 e 3 do artigo 35.º e no artigo 37.º, ambos do CIRC.
Atendendo a estes normativos, e considerando que os cumpria, o A………… tomou os valores em causa como fiscalmente dedutíveis.
Refira-se que no caso da transferência de imparidades tributadas para imparidades aceites fiscalmente, a provisão em causa já foi objeto de contabilização em exercícios anteriores, embora tivesse sido considerada pelo sujeito passivo como fiscalmente não dedutível. A reversão deste enquadramento fiscal, isto é, a sua aceitação como gasto para efeitos fiscais, no exercício de 2010, não se processa pelo registo de um gasto contabilístico, mas extra contabilisticamente através de um ajustamento (no presente caso, uma dedução) ao resultado líquido do exercício.
Quanto à provisão para imparidade dos Instrumentos de Capital - Partes de Capital classificados como ¯Ativos financeiros disponíveis para venda‖, importa salientar que, para efeitos fiscais, a mesma totaliza o valor de € 4.018.738,64 (€ 4.678.907,70 - € 660.169,06), devido à consideração da reversão para efeitos fiscais de perdas por imparidade constituídas no exercícios ou em exercícios anteriores, nos termos previstos no n.º 3 do artigo 35.º do CIRC e tal como explanada no ponto III — 1.1— Perdas por imparidade para menos-valias de títulos (artigo 35.º n.º 3 do CIRC) do presente documento.
Em síntese, o montante total das Perdas por Imparidade para efeitos fiscais ascendem a € 4.435.898,99, apuradas conforme Anexo 3 (1 fl.).
De facto, como referido anteriormente, fiscalmente as perdas/provisões por imparidade constituídas pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal encontram-se contempladas nos números 2 e 3 do artigo 35.º e no artigo 37.º, ambos do CIRC, onde, em termos gerais, se faz depender a dedutibilidade fiscal das perdas/provisões por imparidade, e do seu quantitativo, das normas impostas pelo Banco de Portugal e dos limites mínimos que este determina. Porém, o n.º 3 do artigo 45.º do CIRC prevê uma restrição quanto à dedutibilidade das perdas por imparidade relativas a partes de capital, as quais apenas concorrem para a formação do lucro tributável em metade do seu valor, estando aqui incluídas quer (i) a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, quer (ii) outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares.
Donde, estão incluídas nesta norma todas as perdas relativas a partes de capital (quer se trate da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas quer se trate de outros gastos/perdas potenciais, como, por exemplo, os gastos resultantes do reconhecimento de perdas por imparidade, não existindo, na letra da lei, nenhuma exceção para as perdas relativas a partes de capital das instituições de crédito).
De facto, se fosse intenção do legislador excluir do âmbito desta norma as perdas por imparidade em títulos e em participações financeiras das instituições de crédito, por certo tê-lo-ia dito expressamente, o que, é manifesto, não o fez. Não o tendo feito, resulta claro da letra da lei que estas perdas ficam sujeitas à restrição prevista no n.º 3 do artigo 45.º do CIRG.
Aliás, não se vislumbra qualquer motivo que justifique o seu afastamento, quando a pretensão do legislador foi a de limitar todas as perdas ou variações patrimoniais relativas a partes de capital1.
Donde, uma vez que o sujeito passivo não respeitou esta disposição legal (n.º 3 do artigo 45.º do CIRC), é efetuada a presente correção, a qual se traduz na não dedutibilidade de metade das perdas por imparidade relevantes para efeitos fiscais, e que totaliza o montante de € 2.217.949,50 (4.435.898,99 x 50%).
O sujeito passivo, em sede de direito de audição, não se pronunciou sobre a correção proposta (cf. ponto IX.1.2).
III.1.3 - Outras perdas relativas a partes de capital - Ativos financeiros disponíveis para negociação (n.º 3 do artigo 45.º do CIRC)
-€4.227.461,26 -
Da análise ao Inventário de títulos e participações do A…………, elaborado de acordo com a instrução n.º 35/2005 do Banco de Portugal, verificou-se a existência de partes de capital ¯ativos financeiros detidos para negociação‖.
Na nota 1 - Bases de apresentação das Notas às Demonstrações Financeiras individuais para os exercícios findos em 31 de dezembro de 2010 e 2009, é referido que no âmbito do disposto no Regulamento (CE) n.º 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de julho de 2002, na sua transposição para a legislação Portuguesa através do Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de fevereiro e do Aviso n.º 1/2005, do Banco de Portugal, as demonstrações financeiras do Banco A………… são preparadas de acordo com as Normas de Contabilidade Ajustadas (NCA), tal como definidas pelo Banco de Portugal.
As NCA traduzem-se na aplicação às demonstrações financeiras individuais das Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRS) tal como adotadas pela União Europeia, com exceção de algumas matérias reguladas pelo Banco de Portugal, como a imparidade do crédito a clientes.
Seguindo o recomendado na IAS 39 - instrumentos Financeiros - Reconhecimento e Mensuração, o banco classifica os seus ativos financeiros no momento da sua aquisição considerando a intenção que lhes está subjacente. Neste sentido, classifica como ¯ativos financeiros detidos para negociação" os adquiridos com o objetivo principal de serem transacionados no curto prazo, ou que são detidos como parte integrante de uma carteira de ativos, normalmente de títulos, em relação à qual existe evidência de atividades recentes conducentes à realização de ganhos de curto prazo, e os ativos financeiros designados no momento do seu reconhecimento inicial ao justo valor com variações reconhecidas em resultados (vide nota 2.4 das Notas às Demonstrações Financeiras Individuais). De referir que após o seu reconhecimento iniciai, os ativos financeiros detidos para negociação são valorizados ao justo valor, sendo as suas variações reconhecidas em resultados.
As variações do justo valor de partes de capital, encontram-se relevadas contabilisticamente nas seguintes contas NCA’s de ganhos e perdas:
#832001 - Ganhos em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por residentes - Instrumentos de Capital
#832011- Ganhos em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por não residentes - Instrumentos de Capital;
#692001 - Perdas em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por residentes - Instrumentos de Capital;
#692011 - Perdas em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por não residentes - Instrumentos de Capital.
A nível fiscal, os instrumentos financeiros em apreço (partes de capital) seguem a regra estabelecida na alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do CIRC, a qual estipula que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados, exceto quando respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que, tratando-se de instrumentos do capital próprio, tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5% do respetivo capital social. Isto é, só concorrem para a determinação do lucro tributável se se tratarem de instrumentos de capital próprio que tenham preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5% do respetivo capital social.
Neste sentido, importa referir que da análise efetuada, não se detetaram partes de capital que não tivessem o preço formado em mercado regulamentado, nem que o sujeito passivo detivesse uma participação superior a 5% do capital social, donde se conclui que as partes de capital classificados como ¯ativos financeiros detidos para negociação‖ cumprem os requisitos estabelecidos da alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do CIRC.
Contudo, o n.º 3 do artigo 45º do CIRC prevê uma restrição quanto à dedutibilidade das perdas relativas a partes de capital, as quais apenas concorrem para a formação do lucro tributável em metade do seu valor, estando aqui incluídas quer (i) a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, quer (ii) outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares.
Donde, estão incluídas nesta norma todas as perdas relativas a partes de capital, quer se trate da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas, quer se trate de outros gastos/perdas potenciais, como, por exemplo, os gastos resultantes do reconhecimento de perdas por imparidade, bem como, os gastos provenientes dos ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor para as partes capital em que se aplica o regime estabelecido na alínea a) do n.º 9 do artigo 18 º do CIRC.
De salientar, que relativamente a este tratamento fiscal, foi divulgado pela Autoridade Tributável o seguinte entendimento (processo n.º 39/2010 - Despacho de 2011-01-24 do Diretor Geral):
"1. O artigo 18 a, nº 9, alínea a) do Código do IRC (CIRC) estabelece que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor concorrem para a formação do lucro tributável quando respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que, sendo instrumentos de capital próprio, tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5% do respetivo capital social.
2. Contabilisticamente e fiscalmente estes ajustamentos resultantes da aplicação do justo valor são considerados ganhos por aumentos de justo valorou perdas por redução do justo valor.
(…)
5. No caso de ser apurada uma perda por redução do justo valor, o artigo 45º, n.º 3 do CIRC, estabelece que ¯...outras perdas ... relativas a partes de capital, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor."
6. Sendo as reduções de justo valor destas partes de capital qualificadas como perdas deverão ser consideradas, nos termos do referido artigo 45º, n.º 3, do CIRC, em 50% do seu valor.‖.
Face ao que antecede, e de forma a dar cumprimento ao estabelecido no n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, solicitou-se ao sujeito passivo a informação necessária (designadamente, os extratos de conta de ganhos e perdas anteriormente referidos) para se proceder ao apuramento das perdas, relevantes para efeitos fiscais, ocorridas, no exercício de 2010, em partes de capital. As perdas líquidas ocorridas no exercício em análise ascenderam a € 9,607.289,02, apuradas conforme Anexo 5 (1 fl.).
Importa, neste contexto, salientar que o sujeito passivo veio alegar que a maioria das ações detidas são para fazer cobertura económica a produtos estruturados/derivados (geralmente swaps, futuros ou opções) que os seus clientes subscrevem, pelo que as perdas obtidas em partes de capital encontram- se compensadas pelos ganhos obtidos nos derivados e vice-versa,
É certo que os instrumentos financeiros derivados em causa são mensurados, de acordo com o recomendado pela IAS 39 - Instrumentos Financeiros - Reconhecimentos e Mensuração, pelo seu justo valor, sendo o mesmo reavaliado numa base regular e os ganhos e perdas resultantes dessa reavaliação registados diretamente em resultados do exercício, e assim, o resultado líquido de exercício encontra-se influenciado, apenas, pelo valor líquido da cobertura económica realizada.
Porém, resulta claro que o legislador estabeleceu uma restrição na dedutibilidade das perdas relativas a partes de capital, independentemente do objetivo para o qual foram adquiridas, A não ser assim, o legislador teria contemplado de forma expressa essas realidades na letra da Lei.
Deste modo, para efeitos de aplicação do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, é irrelevante o facto das partes de capital estarem, ou não, associadas à cobertura de risco de instrumentos derivados contratados pelos clientes Do exposto, porque se lhe aplica a disciplina versada na alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do CIRC e o sujeito passivo não procedeu a qualquer regularização para efeitos de determinação do lucro tributável, procedeu-se à respetiva correção no valor de € 4.803.644,51 (9.607.289,02 x 50%) em cumprimento do preceituado no n.º 3 do artigo 45.º, igualmente, do CIRC.
Após o exercício do direito de audição, a correção inicialmente proposta de €4.803.644,51 foi parcialmente anulada em € 576.183,25 (cf. ponto IX.3).
III. 1.4 - Criação de emprego para jovens (artigo 19.º do EBF)
-€26.128,80-
No exercício de 2010 o Banco A………… considerou como benefício fiscal, no que concerne à criação de emprego para jovens, o valor de €317.890,71, conforme dedução ao lucro tributável no QQ7C234 da mod. 22,
De acordo com os esclarecimentos prestados, aquele montante respeita ao benefício fiscal aplicável aos contratos de trabalho sem termo celebrados entre 2006 e 2010, tendo apresentado para o efeito, em ficheiro informático, listagens detalhadas por funcionário. O sujeito passivo considerou como passível de majoração os valores suportados com remunerações e encargos para a segurança social contabilizados como custos do exercício.
De harmonia com o artigo 19.º nº 1 do EBF "... os encargos correspondentes à criação líquida de postos de trabalho (...) são considerados em 150% do respetivo montante, contabilizado como custo do exercício", com o limite da majoração anual, por posto de trabalho, de 14 vezes a retribuição mínima mensal garantida (n.º 3 do referido artigo).
Encontram-se abrangidos por este benefício os encargos suportados com trabalhadores jovens admitidos com contrato de trabalho por tempo indeterminado, considerando-se jovens aqueles com idade superior a 16 anos e inferior a 35 anos, aferida na data da celebração do contrato de trabalho, conforme o disposto no n.º 2 alínea a) da mesma norma.
Estabelece ainda o n.º 5 deste normativo que o benefício permanece por um período de cinco anos a contar do início da vigência do contrato de trabalho, pelo que este opera por um período efetivo de 1825 dias, o que implica que o mesmo poderá abranger seis exercícios sempre que a data de início do contrato não coincida com o início do ano fiscal. Consequentemente, o limite da majoração deverá ser, no primeiro e no último ano, proporcionai, respetivamente, ao tempo de serviço prestado e em falta para completar os cinco anos desde a data de admissão.
Por outro lado, quando em relação a determinado trabalhador cuja admissão tenha relevado para efeitos do artigo 19.º do EBF for resolvido o respetivo contrato de trabalho sem termo, com ou sem mútuo acordo, antes de decorrido o referido período de cinco anos contados do início da vigência desse contrato, verifica-se a extinção automática do benefício fiscal associado, com efeitos à data da resolução do contrato em apreço
O Banco A………… disponibilizou toda a informação necessária para a aferição dos pressupostos previstos na disposição legal em análise, de forma a comprovar o direito ao benefício e ao cálculo da correspondente majoração.
Analisado o cálculo do benefício fiscal, constatou-se, relativamente ao limite da majoração considerado, nas situações em que;
(i) o início da vigência do contrato de trabalho sem termo não coincide com o início do ano fiscal, no caso em apreço 1 de janeiro de 2010; e
(ii) ocorreu a resolução do contrato de trabalho sem termo antes do fim do ano de 2010, dentro do período dos 5 anos contados desde o início da sua vigência, extinguindo-se automaticamente o benefício fiscal não foi tida em consideração a proporcionalidade do tempo de serviço prestado no ano de 2010.
Desta forma, a majoração dos encargos correspondentes à criação de postos de trabalho no ano de 2010, identificados no Anexo 6 (3 fls.), ascende a € 291.761,92.
Face ao explanado, foi apurado um excesso de dedução a título de benefícios fiscais no montante total de € 26,128,80 que deverá ser revertido, em observância do disposto no artigo 19.º do EBF.
O sujeito passivo, em sede de direito de audição, não se pronunciou sobre a correção proposta (cf. ponto IX.1.4).
I) O relatório identificado na alínea anterior foi notificado à Impugnante em 2013.10.18 (cf. certidão de notificação a fls. 633 do PA);
J) Do relatório elaborado pelos SIT em 2013.10.11, relativo ao exercício de 2011, constante de fls. 381 a 422 do PA e que aqui se dá como integralmente reproduzido, transcreve-se:
IIl.1- Correções à matéria tributável - IRC
lII.1.1 - Outras perdas relativas a partes de capital - Ativos financeiros disponíveis para venda (nº 3 do artigo 45.º do CIRC)
-€618.552,20-
O Banco A…………, SA possui uma carteira de investimentos, para os quais em termos de reconhecimento e mensuração, utiliza as recomendações contabilísticas estabelecidas nas IAS 39 - Instrumentos Financeiros - Reconhecimento e Mensuração.
No que concerne àqueles que qualifica como ¯Ativos Financeiros disponíveis para venda", relevados contabilisticamente na conta de balanço NCA ¯18 — Ativos financeiros disponíveis para venda‖, de acordo com a nota 2 - Principais políticas contabilísticas das Notas às Demonstrações Financeiras Individuais avalia regularmente se existe evidência objetiva de que um ativo financeiro, ou grupo de ativos financeiros, apresenta sinais de imparidade. Para os ativos financeiros que apresentam sinais de imparidade, é determinado o respetivo valor recuperável, sendo as perdas por imparidade registadas por contrapartida de resultados. Desta forma, atende, às recomendações contabilísticas das IAS 39 - Instrumentos Financeiros - Reconhecimento e Mensuração e às recomendações prudenciais estabelecidas na Instrução 7/2005, por força do disposto na alínea b) do número 1 do n.º 1.º do Aviso n.º 3/95,ambos emitidas pelo Banco de Portugal,
Neste sentido, constituiu no que se refere a Instrumentos de Capital - Partes de Capital classificados como "Ativos financeiros disponíveis para venda", no exercício de 2011, provisões para imparidades no valor de € 1,790,106,79, o qual corresponde ao saldo da conta de gastos NCA "76301 - Provisões para imparidade - Ativos financeiros disponíveis para venda - Instrumentos de capital emitidos por residentes".
Em termos fiscais, as perdas/provisões por imparidade constituídas pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal encontram-se contempladas nos números 2 e 3 do artigo 35.º e no artigo 37.º, ambos do CIRC. Atendendo a estes normativos e considerando que os cumpria, o A………… tomou os valores em causa como fiscalmente dedutíveis. Desta forma, o montante das Perdas por Imparidade para efeitos fiscais ascendem a € 1,790,106,79, apuradas conforme Anexo 1 (1 fl.).
De facto, como referido anteriormente, fiscalmente as perdas/provisões por imparidade constituídas pelas entidades sujeitas à supervisão do Banco de Portugal encontram-se contempladas nos números 2 e 3 do artigo 35.º e no artigo 37.º, ambos do CIRC, onde, em termos gerais, se faz depender a dedutibilidade fiscal das perdas/provisões por imparidade às normas impostas pelo Banco de Portugal e o seu quantitativo aos limites mínimos que aquele determina.
Porém, o n.º 3 do artigo 45.º do CIRC prevê uma restrição quanto à dedutibilidade das perdas por imparidade relativas a partes de capital, as quais apenas concorrem para a formação do lucro tributável em metade do seu valor, estando aqui incluídas quer (i) a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, quer (ii) outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares.
Donde, estão incluídas nesta norma todas as perdas relativas a partes de capital (quer se trate da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas quer se trate de outros gastos/perdas potenciais, como, por exemplo, os gastos resultantes do reconhecimento de perdas por imparidade, não existindo, nenhuma exceção para as perdas relativas a partes de capital das instituições de crédito).
De facto, se fosse intenção do legislador excluir do âmbito desta norma as perdas por imparidade em títulos e em participações financeiras das instituições de crédito, por certo tê-lo-ia dito expressamente, o que, é manifesto, não o fez. Não o tendo feito, resulta claro da letra da lei que estas perdas ficam sujeitas à restrição prevista no n º 3 do artigo 45.º do CIRC,
Aliás, não se vislumbra qualquer motivo que justifique o seu afastamento, quando a pretensão do legislador foi a de limitar todas as perdas ou variações patrimoniais relativas a partes de capital.
Uma vez que o sujeito passivo não respeitou esta disposição legal (n.º 3 do artigo 45.º do CIRC), é efetuada a respetiva correção, a qual se traduz na não dedutibilidade de metade das perdas por imparidade relevantes para efeitos fiscais e que totaliza o montante de € 895.053,40 (€ 1.790.106,79 x 50%).2
Após o exercício do direito de audição, a correção inicialmente proposta de € 895.053,40 foi parcialmente anulada em € 276.501,20 (cf. ponto IX. 1.1).
III.1.2 - Outras perdas relativas a partes de capital - Ativos financeiros detidos para negociação (n.º 3 do artigo 45.º do CIRC) - -€5.628.341,32-
Da análise ao Inventário de títulos e participações do Banco A…………, SA, elaborado de acordo com a Instrução n.º 35/2005 do Banco de Portugal; verificou-se a existência de partes de capital, classificados como ¯ativos financeiros detidos para negociação".
Na nota 1 - Bases de apresentação das Notas às Demonstrações Financeiras Individuais é referido que no âmbito do disposto no Regulamento (CE) n.º 1606/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de julho de 2002, na sua transposição para a legislação Portuguesa através do Decreto-Lei n.º 35/2005, de 17 de fevereiro e do Aviso n.º 1/2005, do Banco de Portugal, as demonstrações financeiras do Banco A………… são preparadas de acordo com as Normas de Contabilidade Ajustadas (NCA), tal como definidas pelo Banco de Portugal.
As NCA traduzem-se na aplicação às demonstrações financeiras individuais das Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRS) tal como adotadas pela União Europeia, com exceção de algumas matérias reguladas pelo Banco de Portugal, como a imparidade do crédito a clientes.
Seguindo o recomendado na IAS 39 - Instrumentos Financeiros - Reconhecimento e Mensuração, o banco classifica os seus ativos financeiros no momento da sua aquisição considerando a intenção que lhes está subjacente. Neste sentido, classifica como ¯ativos financeiros detidos para negociação‖ os adquiridos com o objetivo principal de serem transacionados no curto prazo, ou que são detidos como parte integrante de uma carteira de ativos, normalmente de títulos, em relação à qual existe evidência de atividades recentes conducentes â realização de ganhos de curto prazo, e os ativos financeiros designados no momento do seu reconhecimento inicial ao justo valor com variações reconhecidas em resultados (vide nota 2.4 das Notas às Demonstrações Financeiras Individuais), De referir que após o seu reconhecimento inicial, os ativos financeiros detidos para negociação são valorizados ao justo valor, sendo as suas variações reconhecidas em resultados.
As variações do justo valor de partes de capital, instrumentos de capital de próprio encontram-se relevados contabilisticamente nas seguintes contas NCA’s de ganhos e perdas:
• #832001 - Ganhos em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por residentes - Instrumentos de Capital;
• #832011- Ganhos em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por não residentes - Instrumentos de Capital;
• #692001 - Perdas em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por residentes - Instrumentos de Capital;
#692011 - Perdas em ativos financeiros detidos para negociação - Títulos - Emitidos por não residentes - Instrumentos de Capital.
A nível fiscal, os instrumentos financeiros em apreço (partes de capital) seguem a regra estabelecida na alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do CIRC, a qual estipula que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados, exceto quando respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que, tratando-se de instrumentos do capital próprio, tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5% do respetivo capital sociai. Isto é, só concorrem para a determinação do lucro tributável se se tratarem de instrumentos de capital próprio que tenham preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5% do respetivo capital social.
Neste sentido, importa referir que da análise efetuada, não se detetaram partes de capital que não tivessem o preço formado em mercado regulamentado, nem que o sujeito passivo detivesse uma participação superior a 5% do capital social, donde se conclui que as partes de capital classificados como ¯ativos financeiros detidos para negociação‖ cumprem os requisitos estabelecidos da alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do GIRC.
Contudo, o n.º 3 do artigo 45.º do CIRC prevê uma restrição quanto à dedutibilidade das perdas relativas a partes de capital, as quais apenas concorrem para a formação do lucro tributável em metade do seu valor, estando aqui incluídas quer (i) a diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, quer (ii) outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares.
Donde, estão incluídas nesta norma todas as perdas relativas a partes de capital, quer se trate da diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas, quer se trate de outros gastos/perdas potenciais, como, por exemplo, os gastos resultantes do reconhecimento de perdas por imparidade, bem como, os gastos provenientes dos ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor para as partes capital em que se aplica o regime estabelecido na alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do CIRC.
De salientar, que relativamente a este tratamento fiscal, foi divulgado pela Autoridade Tributável o seguinte entendimento (processo n.º 3972010 - Despacho de 2011-01-24 do Diretor Geral):
"1. O artigo 18º, nº 9, alínea a) do Código do IRC (CIRC) estabelece que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor concorrem para a formação do lucro tributável quando respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que, sendo instrumentos de capital próprio, tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5% do respetivo capital social.
2. Contabilisticamente e fiscalmente estes ajustamentos resultantes da aplicação do justo valor são considerados ganhos por aumentos de justo valor ou perdas por redução do justo valor.
(...)
5. No caso de ser apurada uma perda por redução do justo valor, o artigo 45º, n.º 3 do CIRC, estabelece que "...outras perdas ... relativas a partes de capital, …concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor."
6. Sendo as reduções de justo valor destas partes de capital qualificadas como perdas deverão ser consideradas, nos termos do referido artigo 45º, n.º3, do CIRC, em 50% do seu valor.‖.
Face ao que antecede, e de forma a dar cumprimento ao estabelecido no n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, solicitou-se ao sujeito passivo a informação necessária (designadamente, os extratos de conta de ganhos e perdas anteriormente referidos) para se proceder ao apuramento das perdas, relevantes para efeitos fiscais, ocorridas, no exercício de 2011, em partes de capital. As perdas líquidas ocorridas no exercício em análise ascenderam a € 11.256.682,63, apuradas conforme Anexo 3 (1 fl.).
Importa, neste contexto, salientar que o sujeito passivo veio alegar que a maioria das ações detidas são para fazer cobertura económica a produtos estruturados/derivados (geralmente swaps, futuros ou opções) que os seus clientes subscrevem, pelo que as perdas obtidas em partes de capital encontram-se compensadas pelos ganhos obtidos nos derivados e vice-versa.
É certo que os instrumentos financeiros derivados em causa são mensurados, de acordo com o recomendado pela IAS 39 - Instrumentos Financeiros - Reconhecimentos e Mensuração, pelo seu justo valor, sendo o mesmo reavaliado numa base regular e os ganhos e perdas resultantes dessa reavaliação registados diretamente em resultados do exercício, e assim, o resultado líquido de exercício encontra-se influenciado, apenas, pelo valor líquido da cobertura económica realizada.
Porém, resulta claro que o legislador estabeleceu uma restrição na dedutibilidade das perdas relativas a partes de capital, independentemente do objetivo para o qual foram adquiridas. A não ser assim, o legislador teria contemplado de forma expressa essas realidades na letra da Lei.
Deste modo, para efeitos de aplicação do n.º 3 do artigo 45.º do CIRC, é irrelevante o facto das partes de capital estarem, ou não, associadas à cobertura de risco de instrumentos derivados contratados pelos clientes.
Do exposto, porque se lhe aplica a disciplina versada na alínea a) do n.º 9 do artigo 18.º do CIRC e o sujeito passivo não procedeu a qualquer regularização para efeitos de determinação do lucro tributável, procedeu-se à respetiva correção no valor de € 5.632.719,19 (11.256.682,63 x 50%) em cumprimento do preceituado no n.º 3 do artigo 45.º, igualmente, do CIRC.
Após o exercício do direito de audição, a correção inicialmente proposta de € 5.632.719,19 foi retificada em € 4.377,87 (cf. ponto IX. 1.2).
III.1.3 - Mais-valias Fiscais - Partes de Capital - Ativos financeiros disponíveis para venda (n.º 2 do artigo 46.º do CIRC) - (€ 795.989,74) -
Da validação efetuada às mais e menos-valias fiscais de partes de capital de ¯Ativos Financeiros classificados como Disponíveis para Venda", evidenciadas no mapa modelo 31 (Mapa das Mais-Valias e Menos-valias Fiscais) disponibilizado pelo sujeito passivo com o processo de documentação fiscal, de acordo com o que dispõe a Portaria n.º 92-A/2011, de 28 de fevereiro - Anexo 4 (1 fl.) verificou-se que, relativamente à alienação de partes de capital, foi declarada uma mais-valia fiscal no montante de €2.187.746,43 a qual, não existindo intenção de reinvestimento, foi considerada fiscalmente relevante (para efeitos de determinação do lucro tributável) na sua totalidade.
Conforme estabelecido no n.º 2 do artigo 46.º do CIRC as mais-valias e as menos-valias são dadas pela diferença entre o valor de realização, líquido dos encargos que lhe sejam inerentes, e o valor de aquisição deduzido das perdas por imparidade e outras correções de valor previstas no artigo 35.º.
Da análise efetuada verificou-se que relativamente às partes de capital designadas por ¯EDP AM‖, o sujeito passivo considerou como perdas por imparidade e outras correções de valor previstas no artigo 35.º do CIRC, o valor de € 1.484.812,82.
No entanto, decorrente da correção efetuada no exercício de 2010, ponto III.1.1 - Perdas por imparidade para menos-valias de títulos (n.º 3 do artigo 35.º do CIRC) do Relatório de Inspeção Tributária relativo ao exercício de 2010, o valor a considerar como perdas por imparidade e outras correções de valor previstas no artigo 35.º do CIRC ascende ao montante de €1.377.646,16, conforme demonstrado no Anexo 5 (1 fls.).
Neste sentido, procedeu-se ao reapuramento da mais-valia para efeitos fiscais da parte de capital designado por ¯EDP AM‖, nos termos estabelecidos no n.º 2 do artigo 46.º do CIRC, tendo a mesma ascendido a € 1.850.834,77 e não a € 1.958.001,43 como apurado pelo sujeito passivo. Resulta, desta situação, uma correção a favor do sujeito passivo, no valor de €107.166,66 (€ 1.958.001,43 - € 1.850.834,77), a qual é efetuada nos termos do n.º 2 do artigo 46.º conjugado com o estabelecido nos números 2 e 3 do artigo 35 º, ambos do CIRC. - Anexo 6 (1 fl.).
Após o exercido do direito de audição, a correção inicialmente proposta a favor do sujeito passivo de € 107.166,66 foi alterada para € 795.989,74 (cf. ponto IX.1.3)
K) O relatório identificado na alínea anterior foi notificado à Impugnante em 2013.10.18 (cf. certidão de notificação a fls. 375 do PA);
L) Em 2013.12.10, foi emitida a liquidação de IRC nº 20138310014872, do exercício de 2010, que o Impugnante juntou com a pi como documento nº 3, e que aqui se dá por integralmente reproduzida, com valor a pagar de € 2 147 236,94;
M) Com data de compensação de 2013.12.13, foi emitida a demonstração e acerto de contas que o Impugnante juntou com a pi como documento nº 3, e que aqui se dá por integralmente reproduzida, com valor a pagar de 2 287 647,95 e data limite de pagamento de 2014.02.10;
N) Em 2013.11.06, foi emitida a liquidação de IRC nº 20138310013905, do exercício de 2011, que o Impugnante juntou com a pi como documento nº 4, e que aqui se dá por integralmente reproduzida, com valor a pagar de € 316 886,98;
O) Com data de compensação de 2013.11.12, foi emitida a demonstração e acerto de contas que o Impugnante juntou com a pi como documento nº 4, e que aqui se dá por integralmente reproduzida, com valor a pagar de € 1 620 364,61 e data limite de pagamento de 2014.01.09;
P) Em 2013.12.18, o Impugnante satisfez na Tesouraria da Fazenda Pública € 2 095 384,98 (cf. doc. nº 5 junto com a pi);
Q) Em 2013.12.18, o Impugnante satisfez na Tesouraria da Fazenda Pública € 1 548 902,90 (cf. doc. nº 6 junto com a pi);
R) Em 2014.05.08, o Impugnante reclamou contra as liquidações de IRC dos exercícios de 2010 e 2011 (cf. fls. 362 e 4 a 45 do PA-RG);
S) Em 2014.11.17, o Diretor de Finanças Adjunto, em regime de substituição, na informação da Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa, exarou projeto de despacho de indeferimento constante de fls. 425 do PA-RG e que aqui se dá como integralmente reproduzido, e ordenou a notificação do Impugnante para exercício do direito de audição prévia; deste transcreve-se:
a. Concordo, pelo que com os fundamentos constantes da presente informação e respetivo parecer, considero que o pedido em apreço é de indeferir, nos termos propostos;
b. (…);
T) O projeto de despacho de indeferimento foi comunicado ao Impugnante por carta registada em 2014.11.19 (cf. fls. 430 a 431 do PA-RG);
U) Por despacho de 2014.12.29, constante de fls. 432 do PA-RG e que aqui se dá por integralmente reproduzido, exarado na informação nº REC 1116/14 de 2014.12.15, da Divisão de Justiça Administrativa da Direção de Finanças de Lisboa, a reclamação graciosa foi indeferida; deste transcreve-se:
a. Concordo, pelo que convolo em definitivo o projeto de decisão e, com os fundamentos constantes daquele, bem como a presente informação e respetivo parecer, indefiro o pedido;
b. Notifique-se;
c. (…);
V) Da informação de 2014.07.31, elaborada pelos Serviços de Inspeção Tributária, Departamento C, Divisão V, Equipa 54 da DFL, Direção de Finanças de Lisboa, transcreve-se:
a. (…);
b. Das razões que assistem ao reclamante
c. 3.1 - Relativamente às correções constantes da alínea c) do parágrafo 2.2.1 (exercício de 2010) e da alínea b) do parágrafo 2.2.2 (exercício de 2011), o sujeito passivo reclamante contesta a fundamentação de ambas alegando no seu articulado razões que se aplicam simultaneamente a estas, uma vez que as correções têm a mesma razão de ser.
d. 3.1.1 - A reclamante procede a um enquadramento prévio do ¯core business" da sua atividade económica, de modo a demonstrar o impacto negativo que a posição da AT quanto à aplicabilidade do nº3 do art.º 45º do CIRC às perdas relacionadas com variações de justo valor de partes de capital reconhecidas em resultados.
Salienta que, vingando tal interpretação, o exercício da atividade em causa deixa de ser rentável, não se justificando o seu prosseguimento.
e. 3.1.2 - O contribuinte reclamante define-se como um banco de investimento especializado, não cotado, a operar em todas as áreas de negócios abertas ao setor, tendo como clientes empresas, clientes institucionais e particulares. Faculta aos clientes serviços financeiros que se traduzem no acesso aos principais mercados mundiais de ações, opções e futuros, sendo este o seu principal ¯core business", e por isso a utilização do método do justo valor é fundamental para a gestão do risco dos ativos que compõem os produtos e soluções do reclamante, sendo estes contabilizados como ¯detidos para negociação ou detidos para venda‖. A detenção destes ativos releva para o contribuinte na medida em que estes sirvam de instrumentos de cobertura dos riscos que assume, contrabalançando as variações de sentido contrário verificadas em várias vertentes do exercido da sua atividade.
f. 3.1.3 - Esta carteira de ativos é fundamental para a Reclamante no desenvolvimento de quatro tipos operações:
i. - Operações com clientes/contrapartes: envolvem a mensuração ao justo valor através de resultados quer dos produtos indexados (ou derivados) com eles contratados quer dos ativos que lhes estão subjacentes. Implica ganhos e perdas que para o cliente são consideradas fiscalmente em 100%, enquanto para o Reclamante (e na aplicação da regra defendida pela AT) tais perdas são consideradas em 50%, ao passo que o ganho em 100%;
ii. Market Making/Liquidity Providing: através desta atividade de compra/venda de valores mobiliários, exercida ao abrigo de contrato celebrado entre um emitente e um intermediário financeiro, procura-se assegurar a liquidez e a estabilidade das cotações no mercado. As ordens de compras e vendas de ações, realizadas por conta da sociedade emitente expõem o Reclamante (na qualidade de intermediário financeiro) ao risco das flutuações, exposição esta que está acautelada por opções negociadas com o emitente. Tanto os instrumentos de cobertura como os ativos subjacentes são relevados na rubrica de Resultados de Ativos e Passivos Avaliados ao Justo Valor Através de Resultados, assumindo variações de sentido contrário, às quais a AT tem atribuído diferente relevância tributária.
iii. Arbitragem: operações com o intuito de explorar ineficiências do mercado e assimetrias de valorização entre os ativos relacionados, relevando também neste caso a mensuração ao justo valor através de resultados das perdas e ganhos relacionados com estes ativos.
iv. Trading; operações de curto prazo com vista a explorar oportunidades de valor em títulos que a cada momento e por variadas razões surgem e permitem ao Reclamante realizar mais-valias superiores àquelas que teria caso não as praticasse.
g. 3.1.4 - No seu entendimento, estas operações obedecem a normas contabilísticas e fiscais, normas estas foram pensadas e elaboradas ¯na lógica da igualdade horizontal do tratamento fiscal dos instrumentos financeiros;
h. 3.1.5 - Tece, nesta sequência, considerações acerca da evolução histórica e do sentido do princípio do justo valor, no fito de demonstrar que este modelo nasce da necessidade de adaptar a contabilidade à natureza e complexidade de certos ativos como são os instrumentos de capital, inseridos em mercados muito voláteis, mas que oferecem "garantias sólidas no que diz respeito à indicação do valor real dos ativos nele transacionados‖. A aplicação do modelo do justo valor evidencia um carácter antiabuso, pois que se destina a prevenir a evasão fiscal a que a aplicação do modelo da realização (de mais-valias ou menos-valias) poderia levar, permitindo ao sujeito passivo manipular o momento de alienação e a base tributável. Nesta sequência considera que a mensuração pelo justo valor deve ter como corolário ¯ a simetria de tratamento contabilístico e fiscal a conferir às valorizações dos ativos, sejam elas positivas ou negativas
i. 3.1.6 - Na sua ótica, a aplicação do n.º3 do art.º 45º teria como escopo desincentivar a manipulação de valores pelos quais as partes de capital eram vendidas, pretendendo também contrabalançar o regime de tributação de mais-valias previsto na anterior versão do art.º. 45º do CIRC (antes da Lei n.º 60- A/2005, 30/12), segundo o qual apenas metade de tais acréscimos patrimoniais seria tributada, contando que houvesse reinvestimento do valor realizado. Nesta senda, a expressão ¯outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares‖, que consta da disposição em análise, teria como ratio evitar que os ¯os sócios financiassem as sociedades através de prestações suplementares ou acessórias, abandonando as entradas de capital, numa tentativa de contornar a previsão do n º 3 do artigo 42º do CIRC‖. Não seria este o caso dos ativos da reclamante que ¯são mensurados de acordo com o critério do justo valor através de resultados, ou seja ao valor de mercado, em mercados regulamentados que indicam, quase ao segundo, o valor exato dos bens transacionados. Às finalidades apontadas àquele normativo acresceria a exigência de total simetria ínsita no critério do justo valor, dado que ¯uma vez efeito este padrão, [o legislador] não possui inteira liberdade de conformação (...) a tributação do justo valor tem de funcionar em total simetria, sob pena de violação dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva. A regra fiscal da valorização do justo valor tem de ser igual ã desvalorização do ativo. Se o justo valor é tributado (...) então o justo valor negativo merece um tratamento simétrico, assumindo-se como total custo do exercício"
j. 3.1.7 - Para o reclamante, a interpretação da lei vigente à data dos factos que deve vingar não se coaduna com a aplicabilidade simultânea do n.º3 do art.º 45º do CIRC. Deste modo, o nº 9 do art.º 18º do CIRC, ao prever as situações em que os ajustamentos de justo valor relevam para efeitos de tributação - adjuvado pelo art.º 20º, n.º1 al. f) e pelo art.º 23º n.º1, al. i), ambos do CIRC consagra legislativamente toda a regulamentação relevante para efeitos de tributação destas variações. Por outro lado, a inclusão de outras restrições ou nuances ao regime de tributação dos instrumentos financeiros reconhecidos ao justo valor mais não é, ao seu ver, ¯do que uma interpretação abusiva e inconstitucional da lei fiscal". A redação do atual nº3 do art.º 45º do CIRC tem raízes na redação introduzida pela Lei n.º 32-B/2002, de 30/12, que no primitivo n.º 3 do artº 42º do CIRC passou a desincentivar a manipulação da gestão do rendimento por parte do sujeito passivo através do critério da realização. O legislador privilegiou nesta mudança de paradigma ¯o combate à fraude e evasão fiscais e o alargamento da base tributável.
k. 3.1.8 - Estas considerações e outras despendidas supra sobre a aplicabilidade deste preceito à luz do critério do justo valor permitiriam, na ótica do reclamante, evitar qualquer fraude ou evasão, ¯visto que oferece constantemente a informação do valor real dos ativos, sem qualquer intervenção do sujeito passivo‖.
l. 3.1.9 - Salienta ainda que a interpretação deverá ter em conta que o legislador ¯afasta do regime regra das mais-valias, previsto no artigo 46º do CIRC, os ganhos ou perdas sofridas mediante a transmissão onerosa de instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor nos termos das alíneas a) e b) do nº 9 do art.º 18º do CIRC – cf. Art. 46º n.º 1 alínea b) do CIRC‖. E conclui que ¯ a lei quis conferir aos instrumentos reconhecidos pelo justo valor através de resultados um regime próprio, plasmado em normas especiais‖;
m. 3.1.10 - Por outro lado alega que o teor das anteriores redações dos artigos 23º e 24º do CIRC continua a influenciar o sentido da expressão ¯perdas‖ em muitas normas da versão vigente até à nova versão da Lei n.º 2/2014, permitindo concluir que gastos e perdas ¯são conceitos distintos, pelo que só as perdas em sentido estrito relevam para efeitos da aplicação do artigo 45º, n.º 3;
n. 3.1.11 - Por fim, a última linha de argumentação invoca a inconstitucionalidade material da interpretação do nº 3 do art. 45º do CIRC, defendida pela AT, por violação do princípio da legalidade da tributação (103º, nº 3 da CRP) e do princípio da tributação do rendimento real, consagrado no art. 104º, n.º 2 da Constituição, dado que a interpretação da AT levaria, na sua ótica, a ficcionar um rendimento que ¯o sujeito passivo (...) não tem nem nunca teve e [a] tributá-lo para, sem qualquer causa legítima, obter um acréscimo de receita fiscal’.
o. 3.2 - No que toca a correção referida na alínea a) do parágrafo 2.2.1, relativa ao exercício de 2010 e no valor de € 660.169,06, a reclamante demonstra a sua discordância relativamente à consideração deste montante relativo à dedução de imparidades de ações da REN e da EDP, classificadas como ativos financeiros disponíveis para venda; imparidades essa que, deixando de subsistir parcialmente por aumento de justo valor dos ativos em causa, foi objeto de correção por parte da AT com base no disposto no n.º 3 do art. 35º do CIRG.
p. 3.2.1 - Justifica a sua discordância com o facto de a situação em causa não preencher o conceito de ¯condições objetivas‖ determinantes da imparidade anteriormente reconhecida cujo desaparecimento determinaria a consideração da variação positiva de justo valor como componente positiva do lucro tributável. Socorre-se das normas contabilísticas aplicáveis, designadamente os parágrafos 59 e 61 da IAS 39 para afirmar que o mero aumento de justo valor verificado nos títulos da EDP e da REN foi tão ligeiro que, comparado às imparidades verificada anteriormente, não se pode dizer que exista fundamento para ¯determinar o seu abandono ou reversão‖. As imparidades foram obrigatoriamente constituídas ao abrigo das normas fiscais e contabilísticas em vigor, pois as ações da EDP e da REN ¯se mantiveram por dois anos consecutivos com uma cotação significativamente abaixo do seu custo de aquisição por parte do reclamante (...) o que se traduz objetivamente no facto de o Reclamante se encontrar em situação de não conseguir recuperar o investimento efetuado‖. E conclui; ¯ as tímidas subidas que se verificaram entre Novembro e Dezembro de 2010 só deveriam ser refletidas em mensurações subsequentes em reservas de justo valor, como foram‖.
q. 3.3 - Quanto às correções referenciadas na alínea b) do parágrafo 2.2.1 e na alínea a) do parágrafo 2.2.2, sendo a primeira relativa ao exercício de 2010 e no montante de 2.217.949,50€ e a última relativa ao exercício de 2011 e no montante de 618.552,20€, vem igualmente a Reclamante insurgir-se contra as mesmas na mesma lógica do referenciado nos parágrafos anteriores
r. 3.3.1 - Em 2010, a Reclamante constituiu imparidades no montante de 4.678.907,70€ às quais acrescia o montante de 417,16Q,35€, relativo a imparidades registadas em 2009 mas não deduzidas nesse ano, tendo sido deduzidas em 2010 com base na nova redação que entretanto entrara em vigor. No ano de 2011, constituiu igualmente imparidades relativas aos títulos da REN no valor de 1.790.106,79€. Estas imparidades foram desconsideradas parcialmente como custo fiscal pela AT com base no disposto no n.º 3 do art. 45º do CIRC. Assim, a Reclamante reitera, por remissão, os argumentos referidos nos parágrafos 3.1.5 a 3.1.11, o que por ora dispensa a repetição dos mesmos. Por conseguinte, defende a não aplicabilidade ao caso ¯sub judice‖ daquele normativo restritivo da dedução de "outras perdas ou variações patrimoniais negativas‖ para efeitos de determinação do lucro tributável.
s. 3.4 - Por fim, e por decorrência da não-aceitação da correção referida na alínea a) do parágrafo 2.2.1 relativa à não-aceitação de imparidade constituída em 2010 para ações da EDP, não poderia, por uma questão de coerência, aceitar a correção feita a seu favor e que resultou numa diminuição da mais- valia obtida com a alienação daquelas ações - redução de 1.958.001,43€ para 1.850.834,77€ -, tendo por base o disposto no n.º2 do art. 46º do CIRC.
t. 3.4.1 - Aproveita, aliás, esta discordância para salientar que a redação do preceito ínsito no n.º 2 do art.º 46º reafirma o seu entendimento de que as imparidades constituídas de acordo com as normas emanadas pelo Banco de Portugal não podem ser desconsideradas fiscalmente. Neste aspeto, defende que a redação da referida norma só faz alusão às depreciações e amortizações não aceites fiscalmente, vincando portanto a ideia de que, no que tange às imparidades e a outras correções de valor, estas serão sempre aceites da totalidade.
u. O Pedido
v. 3.5 - Tendo em atenção o acima exposto, vem o reclamante requerer a anulação dos atos tributários em questão por considerar que os mesmos padecem de vícios como sejam a violação de lei e inconstitucionalidade, com a consequente substituição dos mesmos por outros que acolham as razões por si alegadas.
w. C – Matéria de Facto
x. 4.1 - Relativamente às alegações sintetizadas nos pontos 3.1 a 3.1.11, não pode a AT concordar com as mesmas porquanto estas vão contra a interpretação que se julga mais apropriada da lei fiscal vigente às datas dos factos tributários em questão e que foi já manifestada ao sujeito passivo reclamante aquando da análise do seu direito de audição no relatório final de inspeção. É, aliás, esta a interpretação a que os serviços inspetivos estão vinculados na apreciação da questão suscitada e que está bem patente na informação n.º 1706/12, emitida peia Direção de Serviços do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, informação esta integrante dos anexos dos relatórios de inspeção. Em tudo o mais, estas alegações não trazem dados novos que justifiquem uma alteração de posição por parte da administração fiscal.
y. 4.1.1 - Antes de mais, convém ressaltar que toda e qualquer ponderação acerca da relevância fiscal das especificidades da atividade económico-financeira exercida pelo contribuinte reclamante no que toca à utilização de instrumentos de cobertura não pode ir além de considerações de iure constituendo. De facto, a utilização destes instrumentos não assume carácter legalmente censurável e têm uma lógica compreensível atento os riscos a que a entidade bancária reclamante ficaria exposta caso não fizesse uso dos mesmos. Tem portanto plena justificação o recurso aos mesmos no contexto da atividade em que se insere. Não se vislumbra na lei vigente à data dos factos qualquer particular referência por parte do legislador no sentido de afastar a aplicabilidade das normas que, relevando as variações positivas e negativas de justo valor das partes de capital levadas a resultados, limitassem a dedutibilidade das variações negativas correspondentes para efeitos de determinação do lucro tributável. Conhecendo o legislador a realidade dos diversos instrumentos de cobertura existentes, como se depreende do art. 49º do CIRC, a subsunção dos instrumentos de cobertura utilizados pelo Banco reclamante ao regime de limitação da dedutibilidade dos gastos relativos a variações de justo valor (45º, nº 3 do CIRC) deve ser empreendida pelo aplicador da lei. Tendo isto em conta, não pode, portanto, o intérprete extrair da lei um sentido que não tem a mínima correspondência na sua letra e será por esta via que as considerações subsequentes se irão pautar.
z. 4.1.2 - O reclamante, ao tecer as suas considerações acerca da evolução histórica e do sentido da aplicação do método do justo valor, fá-lo sem considerar o percurso que o legislador fiscal teve em mente ao plasmar na lei os desvios às consequências contabilísticas que daquele método poderiam decorrer. Neste contexto, as alterações operadas pelo diploma legal que procedeu à adaptação do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas ao SNC, e que incidiram basicamente no seu ajustamento às novas regras contabilísticas e à nova terminologia contabilística, em nada modificaram o modelo de dependência parcial da tributação das empresas em relação às regras contabilísticas. A justificação desta parcialidade reside nos interesses próprios que à fiscalidade cumpre prosseguir e que nem sempre são coincidentes com os da contabilidade. Enquanto esta tem como destinatários não apenas o Estado, mas simultaneamente os mercados, os sócios e o público em gerai, visando facultar informações para fins variados, aquela tem em vista uma relação bilateral (contribuinte-Estado) com vista a estabelecer regras que têm por finalidade corrigir eventuais distorções de mercado, obstruir o planeamento fiscal abusivo e acorrer às despesas públicas.
aa. 4.1.3 - No que toca aos instrumentos financeiros, a aproximação entre ambas (contabilidade e fiscalidade) dá-se, por via dos artº 20º e 23º, pois que a lei fiscal passou a aceitar também os rendimentos e gastos resultantes da aplicação do método da taxa de juro efetivo aos instrumentos financeiros valorizados ao custo amortizado, bem como aqueles resultantes da aplicação do justo valor, desde que, neste último caso, estejam verificados os requisitos do n.º 9 do art.º 18º do CIRC. Manteve, todavia, limitações à dedutibilidade das menos-valias e das outras perdas e variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital e componentes de capital próprio, nas quais se inserem os gastos/perdas relativas a variações de justo valor nas partes de capital. Se é verdade, como bem afirma o reclamante, que existe um intuito anti abuso decorrente da consagração do método do justo valor para a mensuração do valor das partes de capital a que se refere o n.º 9 do artº 18º do CIRC em detrimento do princípio da realização, certo também será que o legislador não está vinculado a extrair daqui todas as consequências que a assunção pura e simples daquele método poderia implicar. Daqui resulta ser o interesse em prevenir eventuais práticas de planeamento fiscal com o intuito de redução da base tributável uma justificação para o legislador limitar a dedutibilidade das ¯outras perdas e variações patrimoniais negativas. Mais não pode a administração fiscal, como entidade vinculada ao princípio da legalidade, fazer do que reconhecer aquele interesse na aplicação da lei que faz ao caso concreto, devendo abster-se de outros juízos que não cabem nas suas atribuições
bb. 4.1.4 - Nesta sequência, também as considerações da reclamante sintetizadas supra nos parágrafos 3.1.7 a 3.1.9 não podem ser aceites. Estas considerações de índole interpretativa procuram focar o tratamento fiscal a dispensar aos decréscimos de justo valor das partes de capital reconhecidas em resultados e a interpretação da norma ínsita no n.º 3 do art. 45º do CIRC. A própria inserção sistemática da norma que consagra a limitação da dedução das "outras perdas e variações patrimoniais negativas‖ (nº 3 do art. 45º) sugere que esta disposição será sempre aplicável às variações de justo valor das partes de capital. Deve-se notar que estes encargos resultantes das variações de justo valor em partes de capital não se enquadram de forma explícita em qualquer epígrafe das subsecções da Secção II do Capítulo III do Código, excetuando, claro está, a subsecção I referente às Regras Gerais. E assim, não estando o regime das variações negativas de justo valor previsto nas subsecções de carácter específico, natural será que a sua regulamentação seja retirada da subsecção que ostenta uma epígrafe de significado residual (Subsecção V - Regime de outros encargos). Note-se que esta última subsecção comporta não só normas referentes às diferenças negativas entre mais e menos valias reguladas igualmente na subsecção VII, como também não afasta na sua letra a sua aplicabilidade às perdas de justo valor em partes de capital levadas a resultado
cc. 4.1.5 - Aliás, a interpretação do sujeito passivo no sentido de afirmar que toda a regulamentação relevante para o caso se esgota no disposto nos preceitos dos n.º 9 do art.º 18º, al. f) do nº 1 do art.º 20º e al. i) do n.º 1 do art.º 23º, todos do CIRC, olvida a complexidade da questão e todas as relações de complementaridade e subsidiariedade que existem entre aquelas subsecções referidas no parágrafo anterior. Trata-se de uma interpretação seletiva e que vai contra a letra da lei, contra a sistemática do Código e contra os interesses prosseguidos pelo legislador (designadamente, o alargamento da base tributária).
dd. 4.1.6 - Por outro lado, a fundamentação da interpretação a conferir pela AT ao disposto no n.º 3 do art.º 45 permite demonstrar em parte as razões para o não acolhimento das alegações do reclamante e evidenciadas supra nos parágrafos 3.1.6 e 3.1.10 acerca do especial enfoque daquela disposição em relação às prestações suplementares e ao valor semântico a atribuir ao termo "perdasʺ constante deste preceito legal.
ee. 4.1.6.1 - Em nossa ótica, a interpretação que o reclamante faz do n.º 3 do art.º 45º do CIRC, na sua segunda parte, põe em causa a capacidade de expressão do legislador. Isto porque refere que a segunda parte daquele preceito tem como ratio evitar que os ¯os sócios financiassem as sociedades através de prestações suplementares ou acessórias, abandonando as entradas de capital, numa tentativa de contornar a previsão do n.º 3 do artigo 42º do CIRC'. Esta leitura parece-nos demasiado limitativa do valor intrínseco da norma. Afigura-se-nos mais correto vislumbrar aqui que o legislador, ao salientar in fine o caso das prestações suplementares, pretendeu exemplificar e assegurar que uma situação de fronteira como esta também caísse no âmbito deste preceito legal, preenchendo os seus conceitos de caráter mais amplos (¯outras perdas e variações patrimoniais negativas"). O que não significa que esta situação especial esgote toda a amplitude do conceito ¯perdas". Deste modo, não se compreenderia a utilização na mesma frase destes conceitos amplos seguidos de conceitos mais precisos que restringiriam os primeiros a uma única realidade. Por outras palavras, causaria estranheza ao intérprete um percurso em que o legislador, na redação daquela norma, limitasse a dedutibilidade não só às perdas relacionadas com a diferença negativa entre as mais e menos-valias, mas também a outras perdas e variações patrimoniais negativas, restringindo de seguida estas às prestações suplementares; um percurso descritivo deveras desnecessário, porquanto bastaria, fosse esta a intenção, omitir a referência a ¯outras perdas ou variações patrimoniais negativas" relativas a partes de capital. A ser como pretende o reclamante, inevitável seria concluir peia irrelevância de uma expressão formada por conceitos amplos, pois só estariam em causa as prestações suplementares no pensamento do legislador. E neste ponto estar-se-ia perante a utilização de uma má técnica legislativa, conclusão esta que se procura evitar tendo em atenção o disposto no n.º 3 do art.º 9º do Código Civil: "Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados. Ora, esta maneira de interpretar o normativo em questão não merece o acolhimento da AT, uma vez que implicaria o reconhecer uma técnica legislativa que não exprimiria da maneira mais correta o pensamento legislativo.
ff. 4.1.6.2 - Relativamente à defesa do caráter restritivo ao termo ¯perdas" defendido pelo Reclamante, cujas alegações estão sintetizadas supra no parágrafo 3.1.10, é determinante considerar a abordagem que o IASB (International Accounting Standard Board) faz deste termo na Estrutura Conceptual. O IASB atribui um caráter amplo a este termo, indicando que ¯as perdas representam outros itens que satisfaçam a definição de gastos e podem, ou não, surgir no decurso das atividades corrente da empresa (...) representam diminuições em benefícios económicos e como tai não são na sua natureza diferentes de outros gastos". Fica aqui patente uma formulação aberta para ¯as perdas‖ que inclui até mesmo as perdas potenciais. Tendo presente esta abordagem, e mesmo a utilização desta terminologia pelo Banco de Portugal no Anexo à Instrução n.º 23/2004 para se referir a ajustamentos negativos do justo valor, não se afigura correta a opção por uma leitura maís restritiva do alcance daquele termo, pelo que deve-se rejeitar as considerações do contribuinte no que se refere a este tópico, reiterando hic et nunc tudo o que já foi doutamente explanado na análise do direito de audição do contribuinte e que consta do relatório de inspeção ao ano de 2010 para o qual se remete desde já.
gg. 4.1.7 - Por fim, argumenta o reclamante que a interpretação da lei, designadamente do teor conjugado dos artigos 18º, n.º 9 e 45º, n.º 3 do CIRC, que a AT plasmou nos relatórios de inspeção, enferma de inconstitucionalidade material por violação do princípio da legalidade da tributação (103º n.º 3 da CRP) e do princípio da tributação do rendimento real, consagrado no art. 104º, nº 2 da Constituição. Cumpre aqui salientar que o princípio da tributação pelo rendimento real tem reflexo na tributação das pessoas coletivas através da determinação do seu lucro tributável, dependendo este diretamente de componentes referentes ao lucro contabilístico, e que não englobam necessariamente fluxos financeiros de/para o contribuinte (p. ex. provisões, amortizações, variações positivas de justo valor). Na base da determinação deste rendimento tributável estarão, em última análise, ajustamentos determinados por orientações de política fiscal. Quanto ao vício concretamente suscitado, a AT, como entidade administrativa que é, não se deve pronunciar acerca do teor das alegações em causa, porquanto a emissão de um juízo de constitucionalidade escapa ao seu âmbito de atuação. Acresce ainda, e a este propósito, ser desconhecida por parte da administração tributária (e não ter sido invocado pelo contribuinte) a existência de decisões de tribunais superiores que alinhem no sentido pugnado pelo contribuinte relativamente a esta questão, isto ponderado, não podem ser apreciadas neste ponto as alegações do reclamante.
hh. 4.1.8 - Assim, e remetendo-nos aos relatórios de inspeção, importa reiterar todas as considerações já despendidas relativamente a estas correções pela AT aquando da análise do direito de audição do contribuinte e que se dão aqui por reproduzidas para os devidos efeitos.
ii. 4.2 – No que toca aos argumentos formulados no parágrafo 3.2 e 3.2.1, em que o reclamante demonstra a sua discordância relativamente à correção incidente sobre a dedução de imparidades de ações da REN e da EDP, classificadas como ativos financeiros disponíveis para venda; imparidades essas que, deixando de subsistir parcialmente por aumento de justo valor dos ativos em causa, foi objeto de correção por parte da AT com base no disposto no nº 3 do art. 35º do CIRC.
jj. 4.2.1 - A AT não acolhe aqueles argumentos, porquanto considera estar preenchido o requisito formulado pelo nº 3 do art. 35º do CIRC: desaparecimento das ¯condições objetivas‖ que determinaram o reconhecimento de perdas por imparidades e outras correções de valor.
kk. 4.2.2 - Em primeiro lugar, o reclamante alega que o acréscimo de valor em causa tem uma reduzida dimensão, não passando de uma pequena oscilação de valor insuficiente para desreconhecer, ainda que parcialmente, uma imparidade. Ora, a este respeito, cumpre salientar antes de mais que não se partilha da visão sufragada pelo sujeito passivo no sentido de ser a variação positiva de justo valor em causa, no montante de 660.169,06€, um aumento tão ligeiro diante das perdas por imparidade registadas no exercício e que ascenderam a 3.775.141,95€, Ora, o valor da variação positiva representa 17,5% das perdas por imparidade registadas no mesmo exercício de 2010, não se tratando portanto de uma variação irrelevante na casa de um dígito percentual E ainda que assim não fosse, não se vislumbra na lei fiscal e no direito contabilístico um critério quantitativo para aferir da subsistência ou não das imparidades.
ll. 4.2.3 - Por outro lado, a expressão ¯condições objetivas‖ que o legislador consagrou na norma do n.º 3 do art.º. 35º do CIRC afigura-se apropriada para enquadrar situações materializadas em alterações de justo valor certificadas por um determinado mercado regulamentado. Considera-se ser este género de mercado um avaliador fidedigno das títulos em causa, espelhando nos valores que fixa a cada momento todos os condicionalismos influentes na realidade económico-financeira vigente. Deve-se ainda registar que a substância que esteve na constituição das perdas por imparidade em causa (no caso, a manutenção de uma situação de perda de justo valor dos títulos em causa), é a mesma que nos meses de Novembro e Dezembro de 2010, assumindo um movimento de sinal contrário, relevou para o reconhecimento dos ganhos em justo valor na conta de Reservas de Reavaliação - Reservas Resultantes da Valorização ao Justo Valor (conta NCA #580), tendo sempre um rasto objetivamente detetável e que não se pode desvalorizar para efeitos de aplicação do n.º 3 do art.º 35º do CIRC. Ou seja, a motivação económico-financeira que determinou a constituição da imparidade corresponde à motivação que esteve na base do movimento contrário de reconhecimento do aumento de justo valor dos títulos. Mais concretamente, a imparidade reconhecida anteriormente pelo reclamante mais não ê do que o acumular de perdas de justo valor, as quais, diminuindo, deveriam levar a uma reversão parcial das perdas por imparidade contabilizadas e fiscalmente aceites.
mm. 4.2.4 - Assim, e com base nestas considerações, não colhe os argumentos apresentados pelo reclamante, sendo de compreender a correção levada a cabo peia administração fiscal nos moldes que agora passamos a sintetizar. Os títulos EDP e REN, tendo sido classificados como ativos financeiros disponíveis para venda, registaram no mesmo exercício perdas por imparidades devidamente registadas na contabilidade em conta de gastos (conta NCA 76301) e valorizações subsequentes provenientes de aumento de justo valor e registadas contabilisticamente em reservas de reavaliação (conta NCA 580). O parágrafo 69 da IAS 39, aplicável à instituição em causa por via do Aviso n º1/2005 do Banco de Portugal, determina a não reversão por via de resultados das perdas por imparidades reconhecidas relativamente a estes ativos, tendo por isso o SP reconhecido as valorizações subsequentes na conta de capitais próprios (reservas), sem que no entanto tivesse relevado fiscalmente este aumento nos termos do n.º3 do art.º 35º do CIRC. O modelo de dependência parcial relativamente ã contabilidade estabelecido no CIRC impõe que, sempre que existam regras fiscais próprias, estas se sobrepõem ao normativo contabilístico. E assim é que, por se considerar verificados os pressupostos de aplicação do normativo do n.º 3 do art.º 35º do CIRC, conclui-se que o legislador não aderiu aos procedimentos contabilísticos decorrentes do parágrafo 69 da IAS 39, pois que deste preceito legal retira-se que, havendo variações positivas do justo valor de instrumento financeiro em imparidade, esta terá de ser ajustada em conformidade com aquelas, concorrendo, por conseguinte, para a formação do lucro tributável na qualidade de um ganho em contraposição ao gasto que a constituição de imparidade significou.
nn. Através dos argumentos referidos, por remissão, no parágrafo 3.3/3.3.1 e relativos às correções referidas supra nas alíneas alínea b) do parágrafo 2.2.1 e da alínea a) do parágrafo 2,2.2, vem o sujeito passivo reiterar argumentos já referidos em parágrafos anteriores a propósito das correções relacionadas com limitação da dedutibilidade das ¯perdas ou outras variações patrimoniais negativas relacionadas com as perdas de justo valor em partes de capital. Mutatis mutandis, estes argumentos seriam aplicáveis à desconsideração como custo fiscal de metade das imparidades constituídas nos anos de 2010 e 2011 para os ativos classificados como ¯Ativos Financeiros Disponíveis para Venda". Tendo os referidos argumentos focado as variações negativas de justo valor de partes de capital levadas a resultados e a limitação da sua dedutibilidade fiscal, o reclamante vem alegar que as justificações para não aceitar estas correções se repetem para fundamentar a sua não-aceitação relativa às correções das imparidades constituídas para os ativos ora em causa.
oo. 4.3.1 - Neste caso, também afigura-se-nos que as razões que levam a AT a defender a aplicabilidade do n.º 3 do art.º 45º do CIRC às variações negativas de justo valor, repetem-se igualmente para o caso de constituição de imparidades. A dedução destas também deverá ser limitada em metade dos seus montantes, não se vislumbrando motivos que afastem em termos substanciais este tipo de perdas daquelas relacionadas com as variações de justo valor. Assim, toda a fundamentação já devidamente explicitada em parágrafos anteriores e que tocam diversos pontos - como o sentido da aplicação do método do justo valor, a interpretação do nº 3 do art.º 45º do CIRC, as questões de terminologia (o sentido de ¯perdas") e a inconstitucionalidade suscitada - e que visavam a subsunção das variações negativas de justo valor de títulos ao disposto no nº 3 do art. 45º do CIRC devem ser estendidos às perdas decorrentes da constituição de imparidades. Deve, por isso, ser negado acolhimento à pretensão do SP, remetendo-nos aqui, para os devidos efeitos, ao disposto nos parágrafos 4.1.2 ao 4.1.8 deste parecer e que se dão aqui por reproduzidos com as necessárias adaptações.
pp. 4.4 - No que toca por fim à correção à matéria tributável favorável ao SP no montante de 795.989,74€ e que está referida na al. c) do parágrafo 2.2.2, a discordância da parte do sujeito passivo ocorre por uma questão de coerência com a posição assumida em relação à correção plasmada na alínea a) do parágrafo 2.2.1. E assim, tivesse havido aceitação dos argumentos lançados contra aquela correção, inevitável seria também proceder a uma correção em sentido inverso contra o contribuinte. Tendo em atenção este contexto e porque o cerne da discordância com a AT não se prende com esta correção, a justificação da manutenção desta correção emana diretamente do disposto nos parágrafos anteriores, designadamente dos parágrafos 4.2 a 4.2.4, os quais se dão aqui por inteiramente reproduzidos para os devidos efeitos legais.
qq. 4.5 - Não apresenta o reclamante quaisquer outros factos/elementos novos que devam ser tidos em consideração e que sejam suscetíveis de alterar as correções materializadas nos atos tributários ora em crise:
rr. (…);
W) O indeferimento da reclamação graciosa foi comunicado à mandatária da Impugnante por carta registada com aviso de receção assinado em 2014.12.31 (cf. fls. 443 a 445 do PA-RG);
X) Em 2015.01.14, a presente impugnação deu entrada neste Tribunal Tributário de Lisboa.

II.2 – De Direito
I. Vem a FAZENDA PÚBLICA recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, exarada a fls. 585 a 658 do SITAF, que julgou procedente a impugnação judicial interposta pelo Banco A…………, SA, ora Recorrida, anulou as liquidações adicionais de IRC, obtidas por duas acções inspectivas externas aos exercícios fiscais de 2010 e 2011, levadas a cabo pela Autoridade Tributária e Aduaneira da qual resultaram correcções à matéria tributável, com base no disposto no artigo 45.º, n.º 3 do CIRC, na redação à data dos factos.
Para decidir pela procedência da impugnação, o tribunal a quo, teve presente a natureza da entidade ora recorrida - instituição financeira especializada, sujeita aos poderes de supervisão do Banco de Portugal - concluindo que o acto de liquidação impugnado padece de erro sobre os pressupostos de direito, por errada interpretação e aplicação do disposto no artigo 45.º, n.º 3 do CIRC, na redacção aplicável à data dos factos. Em consequência, entendeu a sentença recorrida que o referido preceito não se aplica aos gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos do artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC – para sustentar a sua fundamentação jurídica, o tribunal a quo trouxe à colação a jurisprudência do TCAS nomeadamente a proferida no Proc. nº 1991/14.0BELRS de 12 de Janeiro de 2017, que transcreve em parte e com base no qual sustenta “que o artigo 45/3 do CIRC deve ser interpretado no sentido de, na sua previsão, não se incluírem os gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiras, que relevem para a formação do lucro tributável nos termos do artigo 18/1. a) do CIRC.

II. Contra o assim decidido, recorre a AT, alegando em síntese e estribando-se em posições doutrinárias por si citadas, que ”O artigo 45.º n.º 3 do CIRC inclui todas as perdas relativas às partes de capital, quer a diferença entre as mais-valias e as menos-valias realizadas, quer outras perdas potenciais, como por exemplo, os gastos resultantes da aplicação do justo valor.” E conclui que as perdas decorrentes da aplicação do justo valor às participações de capital de ativos financeiros detidos para negociação devem estar sujeitas à limitação do mencionado normativo do CIRC.
Para sustentar o seu entendimento, ancora-se ainda na jurisprudência arbitral proferida nos processos do CAAD n.ºs 90/2016-T, de 26/10/2016, 87/2016–T, de 29/10/2016, e 25/2015-T, de 24/09/2015, e ainda o voto de vencido dado no processo n.º 30/2015-T, de 11/12/2015.

III. Delimitado o recurso pelas conclusões das respectivas alegações, cumpre decidir se a decisão vertida na douta sentença sob recurso padece de erro de julgamento por errada interpretação feita ao artigo 45.º, n.º 3 do CIRC e a não aplicação artigo 35.º, n.º 3 do CIRC, quanto às perdas por imparidade por menos valias de títulos relativas ao ano de 2010.
Por último, termina a Recorrente peticionando a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça por não se ter utilizado qualquer meio que possa ser reputado de inútil, desadequado ou dilatório, nem se prever a utilização de articulados ou alegações prolixas.
São, por isso, duas as questões que importa ora resolver:
1 – É de considerar o disposto no artigo 45.º, n.º 3 do CIRC, na redacção em vigor à data dos factos, como aplicável às perdas registadas por aplicação do regime fixado no artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC ?
2 – Sendo total ou parcialmente indeferido o presente Recurso, haverá justificação para dispensa do remanescente da Taxa de Justiça?

IV. A respeito da primeira questão, importa começar por sublinhar que o artigo sob escrutínio – artigo 45.º, n.º 3 do Código do IRC – sempre se prestou a um elevado grau de litigância. Seja pela sua peculiar localização na estrutura do Código e respectiva linguagem, seja pela difícil justificação da sua estatuição numa perspectiva intra-sistemática, seja finalmente pela severidade da solução aí protagonizada, foi crescente a discussão em torno deste normativo.
Daí que, já antes da presente temática, este Supremo Tribunal tenha sido chamado a esclarecer os limites da hipótese legal aí contida. Foi o que sucedeu, por exemplo, a respeito das perdas apuradas aquando da partilha de uma sociedade, tendo este Supremo Tribunal, no Processo n.º 1401/14, de 17 de Fevereiro de 2016, esclarecido que: “I - O art. 81.º, n.º 2, alínea b), do CIRC, não só qualificava como menos-valia a diferença negativa entre o resultado da partilha e o custo de aquisição das partes sociais no caso da dissolução e partilha da sociedade, como também fixava o respectivo regime, especial, para a tributação do resultado da partilha, com uma forma própria de cálculo e com deduções específicas.
II - Dado o regime especial assim fixado e na ausência de remissão para o regime de limitação da dedutibilidade então fixado pelo n.º 3 do art. 45.º do CIRC, este não é aplicável àquela situação.” (sublinhado nosso). Vd., ainda no mesmo sentido, o Acórdão de 14 de Outubro de 2020, lavrado no Processo n.º 1055/18, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
Devido a estas singularidades, entendeu a Reforma de 2014 suprimir in totum o artigo 45.º do Código do IRC, aproveitando parcialmente o respectivo conteúdo no novo artigo 23.º-A do mesmo Código, onde se agregaram a generalidade dos decaimentos patrimoniais reputados indedutíveis.

V. Comecemos por recordar a norma que configura o ponto de partida de toda a presente questão: o artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC.
O mencionado regime foi introduzido por força das alterações introduzidas pelo Decreto-Lei 159/2009, de 13 de Julho, ao Código do IRC, passando desde então a dispor o artigo 18.º/n.º 9/alínea a) do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (doravante, IRC): “Os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados, exceto quando:
a) Respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que, tratando-se de instrumentos do capital próprio, tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, direta ou indiretamente, uma participação no capital superior a 5% do respetivo capital social; …”.
Assim, na linha do modelo da especialização económica dos exercícios, a lei fixa que o momento para a fixação da relevância fiscal das mais-valias e menos-valias é apenas o da "realização", i.e., a perda da posição jurídica de vantagem (o direito subjetivo, seja o de propriedade ou um outro) sobre um determinado ativo que integra o património do sujeito passivo. A condição de tributação é, por isso, a realização.
Assim, na linguagem fiscal pós-2009 – já influenciada pela terminologia do novo regime contabilístico – esta ideia encontra-se, como veremos, elevada a regra geral do n.º 9 do artigo 18.º do Código do IRC. Assim, há realização económica do ganho – com a consequente imputação ao respetivo exercício fiscal – quando “os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados”.
Além da restrição objetiva relacionada com o volume relativo da participação social, existem assim duas circunstâncias legais de que depende a relevância do método do Justo Valor nestes instrumentos financeiros:
i. Que os instrumentos em causa tenham sido contabilisticamente “reconhecidos pelo justo valor através de resultados” - i.e., exige-se que, de entre as duas avaliações contabilísticas possíveis, o sujeito passivo tenha optado por aquela que leva a resultados as ditas oscilações de valor;

ii. Que, de modo a assegurar o rigor na tributação, os valores a considerar para os mesmos se tenham formado em “mercado regulamentado”, segundo as características da transparência, atomicidade e fluidez normalmente associadas a tais mercados, assim se obviando a riscos de manipulação e imprecisão na determinação do respetivo valor e da subsequente obrigação fiscal.

Verificadas estas circunstâncias, as oscilações de valor destes ativos, tal como reveladas pelas respetivas cotações oficiais, concorrem imediatamente para o lucro tributável, independentemente da respetiva realização: o Justo Valor contabilístico produz, neste caso, plenos efeitos fiscais.
As meras flutuações de valor dos ativos da sociedade verificadas ao longo dos exercícios fiscais, por muito pronunciadas que sejam e ainda que concorrendo para o resultado contabilístico da empresa, são fiscalmente irrelevantes.
Assim, pela regra geral da periodização, enquanto não se verificar um dos eventos acima referidos (desreconhecimento, na linguagem contabilística), não há realização, donde não há que apurar qualquer mais-valia ou menos-valia fiscal até esse momento.
A exceção e novidade introduzida em 2009 respeita à consideração fiscal das oscilações do valor dos ativos ali previstos, apesar de se manterem reconhecidos no Balanço e na titularidade do Sujeito Passivo.
Tratam-se, portanto, de ganho e perdas meramente latentes.

VI. Ora, confronte-se agora o disposto no n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC, na versão à data dos factos: “A diferença negativa entre as mais-valias e as menos-valias realizadas mediante a transmissão onerosa de partes de capital, incluindo a sua remição e amortização com redução de capital, bem como outras perdas ou variações patrimoniais negativas relativas a partes de capital ou outras componentes do capital próprio, designadamente prestações suplementares, concorrem para a formação do lucro tributável em apenas metade do seu valor.
É notório que o regime se encontrava concebido (tal como, aliás, todo o Código) para teoria da realização económica – à luz do qual foi, aliás, redigido e concebido em 2002 – e que a adequação com a nova teoria do Fair Value, tal como supra descrita, seria sempre muito difícil ou impossível.

VII. Neste sentido, já se pronunciou este Supremo Tribunal em mais do que uma ocasião.
É assim que, por Acórdão lavrado em 6 de Junho de 2018, no Processo n.º 582/17, se pode ler: “A norma do artigo 45º, n.º 3 do CIRC não é aplicável quando ocorre a determinação – ao Justo Valor – do valor dos activos sujeitos a mercado regulado por entidades oficiais, porque a razão da sua existência, combate à evasão e elisão fiscal, não tem justificação, o valor dos activos – a posição financeira – acaba por ser “estranho” e alheio à vontade do contribuinte que, em última instância, nada releva para a valorização ou desvalorização do respectivo activo.” Mais recentemente, por acórdão de 16 de Dezembro de 2020, no Processo n.º 1760/15, foi reiterada esta leitura, com as seguintes conclusões: “I - A não aplicação da norma do artigo 45º/3 do CIRC aos gastos, e concretamente aos "Gastos resultantes da aplicação do justo valor em instrumentos financeiros", com a consideração plena das repercussões patrimoniais verificadas, sejam positivas ou negativas, leva a uma coerência da tributação qualquer que seja a altura em que se verifique a alienação do instrumento financeiro.
II- Segundo esse modo de ver, em qualquer altura que se escolha para proceder à alienação do instrumento financeiro, as alterações patrimoniais positivas e negativas compensam-se, de modo que, a final, o sujeito passivo apenas tenha acrescentado ou diminuído ao seu lucro tributável a diferença entre o valor de aquisição e o valor de venda.
III- Tal visão é conforme ao disposto na al. a) do nº9 do artigo 18º do CIRC segundo o qual “Os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor não concorrem para a formação do lucro tributável, sendo imputados como rendimentos ou gastos no período de tributação em que os elementos ou direitos que lhes deram origem sejam alienados, exercidos, extintos ou liquidados, excepto quando: a) Respeitem a instrumentos financeiros reconhecidos pelo justo valor através de resultados, desde que, tratando-se de instrumentos do capital próprio, tenham um preço formado num mercado regulamentado e o sujeito passivo não detenha, directa ou indirectamente, uma participação no capital superior a 5% do respectivo capital social.”
IV - Perante a literalidade e os elementos sistemático e teleológico desse preceito, estão verificados os pressupostos legais nele elencados, porquanto a variação patrimonial negativa decorrente da aplicação do método de mensuração do justo valor aos instrumentos financeiros detidos pela impugnante concorre para a formação do lucro tributável.
Por concordarmos com o teor das decisões, assim como com as fundamentações ali contidas, reiteramos aqui o conteúdo destas decisões, que igualmente subscrevemos.

VIII. Limitamo-nos, ainda assim, a desenvolver dois argumentos.
Um é de natureza teleológica, mas julgamos decisivo a este respeito: o de inexistência de um fundamento anti-elisivo para a extensão da restrição prevista no n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC às oscilações patrimoniais latentes verificadas à luz do artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC.
Na verdade, tendo a norma do artigo 45.º, n.º 3 do Código do IRC sido claramente talhada para combater o fenómeno da elisão fiscal – é a própria exposição de motivos da introdução da mesma aquando do Orçamento de Estado para 2003 que o assevera – por via do qual os sujeitos passivos podiam determinar quer o momento da realização (em suma, a “oportunidade” da menos-valia), quer os termos em que a mesma se efectivava, é notório, por todo o exposto, que não ocorre semelhante risco no caso das oscilações decorrentes das flutuações das acções em mercado regulamentado.
É que, sendo o valor formado num mercado regulamentado e atomístico – por natureza, insusceptível de manipulação por um único agente económico – sempre se encontraria ausente qualquer relevância da vontade que é determinante do comportamento elisivo fiscal. O risco de manipulação é, em tais circunstâncias, inexistente.

IX. O segundo argumento é de natureza sistemática.
A existência de diferentes relevâncias fiscais acerca da oscilação de valor (desapegada da vontade do Sujeito Passivo, como vimos) de um mesmo ativo, consoante a mesma seja positiva ou negativa, é forçosamente (e por definição) anti-sistemática. Que o Sujeito Ativo arrecade receitas fiscais quando o ativo sofre uma valorização, mas lhe negue (total ou parcialmente, como no caso) relevância fiscal assim que tal ativo sofra uma perda de valor configura uma distorção da neutralidade que deve pautar o sistema fiscal, geradora de uma derrogação da tributação pelo princípio do rendimento real e que só pode ser ultrapassada (leia-se, justificada) quando fundamentada em razões de interesse superior, como seja o combate à elisão fiscal. O que não tem sequer qualquer possibilidade de ocorrer in casu, como vimos.
Quer isto dizer que, também sob uma perspectiva sistemática, a solução que vem sendo propugnada por este Supremo Tribunal merece a nossa plena adesão.
Importa, assim, concluir que a extensão da restrição prevista no n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC às oscilações patrimoniais latentes verificadas à luz do artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC é ilegal, pelo que devem ser anuladas as liquidações aqui em causa, como correctamente fez a primeira instância.

X. Por último, e respondendo à segunda questão supra enunciada, acerca da possibilidade de dispensa de remanescente de Taxa de Justiça cabe responder positivamente.
Com efeito, por um lado, nada na conduta das partes revela a prática de atos inúteis, dilatórios ou desadequados. E, em paralelo, tão pouco podem as, objectivamente muito extensas, Alegações e Contra-Alegações nesta instância ser interpretadas como de natureza prolixa ou profusa.
Na verdade, é a própria delicadeza e densidade técnica da questão apresentada, assim como a sua natureza amplamente inovatória, que tornam as mencionadas Alegações e Contra-Alegações tão extensas: o cruzamento entre um sistema de tributação historicamente baseado na teoria da realização e um regime inovador introduzido pela necessidade de adequar o Código do IRC ao regime das IFRS, onde sobressai, de modo exuberante, a relevância do Justo Valor na determinação da evolução patrimonial da empresa. Acresce a isto a indiscutível cisão doutrinal e jurisprudencial a respeito do tema acima exposta.
Pelo exposto, é de conceder a solicitada dispensa do remanescente da Taxa de Justiça.


III. CONCLUSÕES
Seja teleologicamente, seja por razões sistemáticas, é ilegal a extensão da restrição prevista no n.º 3 do artigo 45.º do Código do IRC às oscilações patrimoniais latentes verificadas à luz do artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC.


IV. DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Supremo Tribunal em negar provimento ao recurso.


Custas pela Recorrida, com dispensa do remanescente da Taxa de Justiça.


Lisboa, 22 de Junho de 2022. - Gustavo André Simões Lopes Courinha (relator) - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia.

Segue acórdão de 11 de Janeiro de 2024:

DESCRITORES
· Justo valor

· Perdas por imparidade

· Realização


I - Só aquando da realização – porque é esta que tem relevância e produz impacto fiscal – se pode determinar a correção fiscal da imparidade registada relativamente a ativos a que se aplique o justo valor contabilístico.
II - À data da introdução do (antigo) artigo 45.º, n.º 3 no Código do IRC, estava longe de ser considerada a possibilidade de aplicação abstracta do Justo Valor (e das suas implicações e corolários) em sede fiscal; tal só veio a ocorrer a partir de 2010, com o surgimento das “perdas por imparidade” no Código do IRC.
III – O artigo 45.º, n.º 3 no Código do IRC não é aplicável às perdas por imparidade.


Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


I – RELATÓRIO

I.1 Alegações
Banco 1..., S.A., ora requerente notificado do acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo de 22/06/2022 veio nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 616.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 666.º, n.º 1, do CPC e artigo 2.º, alínea e), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), requerer a reforma do acórdão quanto a custas, com os fundamentos seguintes:
1.º O douto acórdão recorrido negou provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública, mantendo a sentença recorrida, a qual havia julgado procedente a impugnação judicial deduzida pelo Recorrido.
2.º Não obstante, no segmento decisório refere-se quanto às custas “Custas pela Recorrida, com dispensa do remanescente da Taxa de Justiça.” (cf. p. 58 do acórdão).
3.º Entende o Recorrido que, em conformidade com o disposto no artigo 527.º do CPC, aplicável ex vi artigo 2.º, alínea e), do CPPT, as custas deverão ser da responsabilidade da Recorrente, a Fazenda Pública.
4.º Com efeito, prevê o n.º 1 do artigo 527.º do CPC que “A decisão que julgue a ação ou algum dos seus incidentes ou recursos condenará em custas a parte que a elas houver dado causa (…)”.
5.º Por sua vez, estabelece o n.º 2 do mesmo artigo que “Entende-se que dá causa às custas do processo a parte vencida, na proporção em que o for.” (sublinhado nosso).
6.º No presente recurso, a parte vencida é a Recorrente, razão pela qual, tendo presente as normas supra citadas, é sobre a Fazenda Pública que deverá recair a responsabilidade quanto a custas.
7.º Assim, tendo o acórdão proferido nos presentes autos condenado o Recorrido em custas, impõe-se a reforma do acórdão neste segmento, condenando-se a Recorrente nas custas do processo, porquanto é a parte vencida.

I.2 – A FAZENDA PÚBLICA, notificada do douto acórdão veio, nos termos do art. 615º n.º 1 al. d) e n.º 4 e do art. 666º n.º 1, ambos do CPC, aplicáveis subsidiariamente por força do art. 2º al. e) do CPPT, arguir a sua nulidade, nos seguintes termos:

1) A al. d) do n.º 1 do art. 615º do CPC, prevê que a sentença é nula quando:
“d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.”.
2) Por outro lado, de acordo com o disposto no n.º 4 do mesmo artigo, tal nulidade só pode ser arguida “perante o tribunal que proferiu a sentença se esta não admitir recurso ordinário”.
3) O mesmo regime legal se aplica ao acórdão agora proferido, nos termos do art. 666º n.º 1 do CPC.
4) Nesta conformidade, vem a Fazenda Pública, perante o tribunal que proferiu o acórdão, arguir a nulidade consubstanciada no facto do mesmo não se pronunciar sobre questões que devia apreciar. Assim,
5) No douto acórdão proferido ficou identificado:
“III. Delimitado o recurso pelas conclusões das respectivas alegações, cumpre decidir se a decisão vertida na douta sentença sob recurso padece de erro de julgamento por errada interpretação feita ao artigo 45.º, n.º 3 do CIRC e a não aplicação artigo 35.º, n.º 3 do CIRC, quanto às perdas por imparidade por menos valias de títulos relativas ao ano de 2010.” (pág. 51 do acórdão, com nosso sublinhado).
6) Atento o alegado no recurso (alíneas 25 a 29) e o concluído (alíneas u a w), tal como indicado no supra transcrito parágrafo do acórdão lavrado, na parte sublinhada, constituía também questão a conhecer nos autos, saber se existindo uma perda por imparidade (como de facto existiu - vide Facto Provado H - pág. 13/74 da sentença em primeira instância) que fiscalmente foi dedutível, e que face à valorização dos títulos deixou de subsistir na parte em que a mesma correspondeu a uma redução da imparidade, deve-lhe ser efetuado um ajustamento fiscal nos termos do art. 35º n.º 3 do CIRC, como em sede inspetiva ficou realizado.
7) Contudo, atento o decidido, podemos verificar que não foi decidido por este douto Tribunal Superior se se verificava erro de julgamento ao não ter sido aplicado o art. 35º n.º 3 do CIRC à perda por imparidade para menos-valias de títulos, no montante de € 660.169,06, no exercício fiscal de 2010. Continuando,
8) Ainda sem conceder, conforme consta do acórdão lavrado, a questão decidida foi a seguinte: “1 – É de considerar o disposto no artigo 45.º, n.º 3 do CIRC, na redacção em vigor à data dos factos, como aplicável às perdas registadas por aplicação do regime fixado no artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC?” (págs. 51 e 52 do acórdão).
9) Ora, no que respeita à correção operada relativa a “outras perdas relativas a partes de capital – Ativos financeiros disponíveis para venda”, que no exercício fiscal de 2010 foi fixada em € 2.217.949,50, e no exercício fiscal de 2011 em € 618.552,20, embora estivesse em causa a aplicação do art. 45º n.º 3 do CIRC, não estava em questão uma perda registada por aplicação do regime previsto no art. 18º n.º 9 do CIRC.
10) Foi exatamente esta circunstância que levou a Recorrente a apresentar recurso do decidido em Primeira Instância. Ou seja, a questão que foi submetida a recurso foi a de saber se estando em causa ativos financeiros disponíveis para venda, os quais, por não cumprirem os requisitos do n.º 9 do art. 18º do CIRC, têm os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor reconhecidos em capital próprio (conforme factos provados J) e H)), é admissível ou não a aplicação do art. 45º n.º 3 do CIRC (conforme alegado sob as alíneas 30) a 34) e concluído sob os pontos x) e y)).
11) Afigura-se que o douto acórdão lavrado também omitiu pronúncia sobre esta questão, já que o decidido no acórdão se cingiu a saber se o art. 45º n.º 3 do CIRC era aplicável às perdas relativas a partes de capital classificados como ativos financeiros disponíveis para negociação, aos quais é inequivocamente aplicável o art. 18º n.º 9 al. a) do CIRC.
Contudo, a questão que foi levada a decisão deste Tribunal Superior respeitava às perdas relativas a partes de capital classificados como ativos financeiros disponíveis para venda, e aos quais não era aplicável o art. 18º n.º 9 al. a) do CIRC, dado que os ajustamentos decorrentes da aplicação do justo valor são reconhecidos em capital próprio.

I.3 - Com dispensa dos vistos legais, cumpre decidir, em conferência.

II.2- De Direito
I. Atento o teor do apresentado pedido de reforma quanto a custas e da apresentada reclamação por arguição de nulidades, devemos começar, por uma questão de procedência lógica, por responder a esta última e, só em seguida, dar resposta àquele pedido de reforma.
Atentemos, então, nas arguidas nulidades, traduzidas em supostas omissões de pronúncia.

II. Comecemos por recordar, no que é formulação assente neste Supremo Tribunal, entre outros pelo recente Acórdão lavrado no Processo n.º 336/18, de 12 de Abril de 2023, que: “Só há nulidade da decisão, por omissão de pronúncia quando o tribunal deixa, em absoluto, de apreciar e decidir “as questões” que lhe são colocadas e não quando deixa de apreciar argumentos, considerações, raciocínios, ou razões invocados pela parte em sustentação do seu ponto de vista quanto à apreciação e decisão dessas questões.” – disponível em www.dgsi.pt.
Posto isto, vejamos pois.


III. Entende a Fazenda Pública que não foi dada resposta à questão do tratamento fiscal dado a “uma perda por imparidade (como de facto existiu - vide Facto Provado H - pág. 13/74 da sentença em primeira instância) que fiscalmente foi dedutível, e que face à valorização dos títulos deixou de subsistir na parte em que a mesma correspondeu a uma redução da imparidade, deve-lhe ser efetuado um ajustamento fiscal nos termos do art. 35º n.º 3 do CIRC, como em sede inspetiva ficou realizado.” nem à questão do tratamento fiscal dado à “correção operada relativa a “outras perdas relativas a partes de capital – Ativos financeiros disponíveis para venda”, que no exercício fiscal de 2010 foi fixada em € 2.217.949,50, e no exercício fiscal de 2011 em € 618.552,20”, ativos aos quais não é aplicável o artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC.

IV. Ora, sem prejuízo dos termos ultra-concisos que estruturaram as conclusões recursivas quanto a estas duas questões – com apenas 3 conclusões para cada questão, por contraposição às demais duas dezenas de conclusões e a quase totalidade das Alegações – impõe-se reconhecer que tais questões ficaram, efectivamente, por responder; pelo menos, ficaram por responder em termos devidamente autónomos e formais, o que ora se faz.

V. Quanto à questão da reversão da perda por imparidade relativa a ativos a que se aplica o justo valor contabilístico, cabe esclarecer que tal imparidade, uma vez fiscalmente admitida – segundo critérios próprios e devidamente autonomizados – só pode ser revertida uma vez verificado o desreconhecimento do ativo, porquanto, para efeitos fiscais, é apenas nesse momento (e só nesse momento) que se apura se a mesma foi ou não fundada – e, por isso, só nesse momento, é que se determina a medida da perda efetiva que comprova ou infirma o montante da imparidade.
Quer dizer, só aquando da realização – porque é esta que tem relevância e produz impacto fiscal – se pode determinar a correção fiscal da imparidade registada e a necessidade de uma eventual reversão, total ou parcial, dos seus efeitos fiscais.
A não ser assim, revertia-se uma perda por imparidade que, sem prejuízo das oscilações do justo valor, poderia acabar por se demonstrar por plena e integralmente justificada no momento em que se operasse o desreconhecimento do ativo a que esta se reporta.
Questão distinta é a de saber, em abstrato, da eventual admissibilidade da constituição de imparidades quanto a ativos a que se aplique o justo valor, quando ocorra impacto fiscal. Mas não tendo sido alegada, nem resultando sequer da factualidade dos autos, é questão meramente teórica.
Não tem, por conseguinte, razão a Fazenda Pública a respeito desta questão, no que o Recurso não merece provimento.

VI. Quanto à questão da correção operada relativa à aplicação do artigo 45.º, n.º 3 do Código do IRC às perdas relativas a partes de capital – Ativos financeiros disponíveis para venda, aos quais não é aplicável o artigo 18.º, n.º 9, alínea a) do Código do IRC, cabe igualmente responder autonomamente.
Recorde-se, desde logo, o que afirmou a sentença recorrida: “Anote-se que os Serviços de Inspeção Tributária não detetaram partes de capital que não tivessem o preço regulamentado, nem que o sujeito passivo detivesse uma participação superior a 5%, donde se conclui que as partes de capital classificados com ativos financeiros detidos para negociação cumprem os requisitos estabelecidos no artigo 18/9.a) CIRC (cf. fls. 393 e 654 do PA).
Independentemente das classificações normativas feitas na sentença recorrida, que sempre imporia a Fazenda Pública rebater, sempre se dirá, além do argumentário aduzido pela Recorrida, que, à data da introdução do artigo 45.º, n.º 3 no Código do IRC (e sua ulterior alteração de redacção, em 2006), estava longe de ser considerada a possibilidade de aplicação abstracta do Justo Valor (e das suas implicações e corolários) em sede fiscal – a qual só veio a ocorrer a partir de 2010, com o surgimento das “perdas por imparidade” no Código do IRC (sendo que, mesmo a elaboração normativo-contabilística e sua aplicação, se encontrava ainda em estado de desenvolvimento à data da última alteração da redacção daquele inciso).
Por um critério histórico-teleológico, não se vê, por conseguinte, viabilidade aplicativa ao artigo 45.º, n.º 3 do Código do IRC quanto às perdas por imparidade – apenas surgidas em 2010, no Código do IRC – mesmo quanto a ativos aos quais não se aplique a relevância fiscal do Justo Valor; valores esses que não se traduzem, portanto, em perdas certas e definitivas, as quais só a realização (o “desreconhecimento” do ativo) permite assegurar.
Acresce que não se vislumbra qualquer evidência, com as alterações ao Código do IRC protagonizadas em 2009, da pretensão de retirar consequências ao nível da restrição da dedutibilidade das perdas por imparidade, as quais substituíram as vestustas provisões.
Não merece, pelo exposto, provimento o recurso interposto quanto a esta questão.

VII. Suprem-se, assim, nos termos acabados de expor as formais omissões de pronúncia incorridas no acórdão de 22 de Junho de 2022.

VIII. Quanto ao pedido de reforma quanto à questão da condenação em custas à Recorrida, trata-se de um notório lapso incorrido por este Supremo Tribunal, pelo que e atento o ora decidido – que em nada altera os termos em que o pedido de reforma quanto a custas se colocava – apenas resta conceder provimento ao pedido e reformar o Acórdão no sentido de correrem as custas pela Recorrente, parte que resultou vencida no presente Recurso, com dispensa do remanescente da Taxa de Justiça.


III. CONCLUSÕES
I - Só aquando da realização – porque é esta que tem relevância e produz impacto fiscal – se pode determinar a correção fiscal da imparidade registada relativamente a ativos a que se aplique o justo valor contabilístico.
II - À data da introdução do (antigo) artigo 45.º, n.º 3 no Código do IRC, estava longe de ser considerada a possibilidade de aplicação abstracta do Justo Valor (e das suas implicações e corolários) em sede fiscal; tal só veio a ocorrer a partir de 2010, com o surgimento das “perdas por imparidade” no Código do IRC.
III – O artigo 45.º, n.º 3 no Código do IRC não é aplicável às perdas por imparidade.


IV. DECISÃO
Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam os juízes da Secção Tributária deste Supremo Tribunal em deferir o pedido de reforma quanto a custas, fazendo recair as mesmas sobre a Recorrente (e ora Reclamante), assim como deferir a reclamação e proceder à emenda do Acórdão nos termos expostos, assim suprindo as nulidades incorridas.

Sem custas.

Lisboa, 11 de Janeiro de 2024. - Gustavo André Simões Lopes Courinha (relator) - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes.