Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0235/12
Data do Acordão:07/11/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
DÍVIDA
INCENTIVOS ÀS MICROEMPRESAS
REVERSÃO
RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA
NULIDADE DE SENTENÇA
CONTRADIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO
Sumário:I – Não ocorre nulidade da sentença recorrida se esta é coerente entre os fundamentos e a decisão, sem prejuízo da eventual ocorrência de erro de julgamento quanto às questões a apreciar.
II – No caso dos autos, a decisão de julgar procedente a oposição por ilegitimidade não está em contradição com os fundamentos em que se alicerça a sentença, porque assente numa fundamentação clara e congruente.
III – Não figurando a recorrida no título executivo e uma vez que interveio no contrato de incentivos às microempresas apenas como sócia e em representação da sociedade, não pode ser responsabilizada pelo pagamento da dívida exequenda, ao abrigo do art. 204º, nº 1, alínea b), do CPPT.
IV – E não estando provado o exercício da gerência de facto nem de direito, a recorrida também não pode ser chamada à execução como responsável subsidiária, nos termos do disposto no art. 24º da LGT, sendo que tratando-se de uma dívida resultante do incumprimento de um contrato de incentivos, a recorrida não poderia sequer ser revertida nos termos deste preceito, que se aplica apenas às dívidas tributárias.
Nº Convencional:JSTA00067734
Nº do Documento:SA2201207110235
Data de Entrada:03/02/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LEIRIA PER SALTUM
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Área Temática 2:DIR PROC CIV
Legislação Nacional:CPC96 ART668 N1 C
CPPTRIB99 ART125 ART204 N1 B ART162 A
LGT98 ART24
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC947/11 DE 2012/03/28; AC STA PROC97/12 DE 2012/02/27; AC STA PROC966/02 DE 2002/10/23
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 2012 6ED PAG452
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I-RELATÓRIO

1. A……, com a identificação constante dos autos, deduziu oposição à execução, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, por ter sido citada para pagar a quantia exequenda da responsável originária “B……, S.A.”, na qualidade de responsável solidária, que foi julgada procedente.
2.Não se conformando com tal decisão, a Fazenda Pública veio interpor recurso, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, apresentou as respectivas Alegações, formulando as seguintes Conclusões:
“A) A autora deduziu oposição judicial contra a execução, PEF n° 13842001010113400 instaurado contra si, como responsável solidária pela de devolução de quantia recebida a título de incentivo financeiro pela Sociedade B……, LDA”, de que era sócia.
B) A oponente veio afirmar a sua ilegitimidade como responsável por tal dívida pelo facto de, apesar de ser sócia, nunca ter sido gerente da sociedade, não tendo portanto, qualquer responsabilidade dessa dívida.
C) Ficou demonstrado nos autos, que a oponente nunca fora gerente da sociedade nem de facto nem de direito, mas que, efectivamente subscreveu o contrato de concessão de apoio financeiro à sociedade, na sua qualidade de sócia da mesma sendo pois responsável originária da dívida.
D) Enviado o processo ao serviço de finanças de Leiria 1, procedeu este à cobrança da dívida e à sua execução, apesar de não se tratar de dívida fiscal, nos termos conjugados dos arts. 148°, n° 2 alínea b) e do art.152°, n° 1 do CPPT.
E) E porque não se tratava de dívida fiscal, a oponente foi citada como revertida com responsabilidade solidária, nos termos do art 153° do CPPT.
F) Entendeu a Meritíssima Juíza na douta sentença recorrida que a oponente não devia ser responsável pela dívida porquanto não sendo gerente da sociedade, seria parte ilegítima nos termos do art. 24° da LGT.
G) Com todo o respeito não se aceita esta tese porquanto a dívida não tem natureza tributária tal como resulta de ampla jurisprudência dos nossos tribunais superiores.
H) Entende Sua Exa a Meritíssima Juíza que “necessariamente concluímos pela ilegitimidade da oponente para a execução nos termos do disposto na al. b) do n° 1 do art. 204° do CPPT, procedendo, em consequência, com esse fundamento, a oposição por ele deduzida” sendo que, como se disse não ocorre tal ilegitimidade pois a oponente figura no contrato que foi celebrado com a Comissão de Coordenação da Região Centro como um dos titulares (sócia) da sociedade.
I) Portanto, concluiu pela ilegitimidade da autora, muito embora tenha dado como provada a sua vinculação à sociedade e ao contrato por si assinado e que a tornou responsável originária pelo cumprimento dos termos a que se obrigou.
J) Daqui decorre a invocada nulidade da sentença que dá como provados os factos e que decide em sentido oposto às conclusões obtidas.”

3. Não foram apresentadas Contra-alegações

4. O Digno Representante do Ministério Público, junto do STA, emitiu Parecer, no sentido de que “A sentença Impugnada deve ser revogada e substituída por acórdão declaratório da improcedência da oposição à oposição”.

5. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir

II- FUNDAMENTOS

1- DE FACTO
A sentença sob recurso deu como provados os seguintes factos:
“1. A oponente foi sócia da Sociedade B……, Lda., com sede na Av. …, …, … em Leiria, constituída em 17/09/1996. A gerência era exercida por C……, e era a assinatura deste que obrigava a sociedade perante terceiros — cfr. fls. 15 e 16 do processo administrativo apenso aos autos;
2. Em 07/11/1997, a B……., Lda., celebra com a Comissão de Coordenação da Região Centro um contrato de concessão de incentivos — processo n° 0393000916182/0019 (CGD), sendo o mesmo subscrito, por C……, A……. e por C…….. — cfr. fls. 17 do processo administrativo apenso aos autos;
3. Em 18/07/2001, através do ofício n° 808354, vem o Presidente da Comissão de Coordenação, junto do Chefe da 1.ª Repartição de Finanças de Leiria “ (...) intentar e fazer seguir, nos termos do n° 3, do art. 7.º do D.L. 269/89, de 17 de Agosto — Execução Fiscal contra: B……., Lda (...) nos termos e com os seguintes fundamentos: Pelo Despacho de Sua Exª a Ministra para a Qualificação e Emprego de 25 de Agosto de 1997 e pelo Despacho de Sua Exª o Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional de 20 de Agosto do mesmo ano, foi homologado o projecto de concessão de incentivos, a conceder à empresa B……, Lda (...), da qual eram à data sócios, o Senhor C…… (...) A…… (...) e D…… (...) no montante global de Esc. 8.342.220$00, referente ao Regime de Incentivos às Microempresas (...) Da quantia referida foi pago o montante de Esc. 7.577.155$00 a título de incentivo (...) foi violado o disposto nas alíneas d) e e) da clausula nona e al. a) da clausula décima primeira do contrato de concessão de incentivos, bem como o disposto no n°1, al. a) do art. 20° da RCM 154/96, de 17 de Setembro. Razão pela qual, a Comissão Regional de Selecção, entendeu, sob proposta do Coordenador Regional, estarem reunidas as condições para o rescisão do contrato de concessão de incentivos e consequente devolução dos incentivos (...) Esta decisão foi homologada em 28/12/2000 pela Ex.ma Ministra do Planeamento e em 11/01/2001, pelo Exm° Sr. Secretário de Estado do Trabalho (...) Nestes termos a Comissão de Coordenação da Região Centro, face ao referido incumprimento, vem requerer a cobrança coerciva da importância de Esc. 9.267. 529$00 (...)” — cfr. fls. 12 a 14 do processo administrativo apenso aos autos;
4. Em 12/08/2009, o Chefe do Serviço de Finanças de Leiria 1, profere despacho em que, nomeadamente, refere “(...) o contrato foi assinado por três pessoas, entre as quais, C…… e, A……. O primeiro tem nesse acto a prova do exercício da gerência de facto a que se alia a gerência de direito conforme consta do pacto social da sociedade. A segunda tem nesse acto o exercício da gerência de facto. São responsáveis pelo incumprimento contratual. Conforme se demonstra nos autos a representação da sociedade ausentou-se do local da sede e, a mesma, passou à situação de inactividade pouco tempo após a concessão dos incentivos. (...) Nestes termos e pressupostos, ordeno a notificação do presente despacho, para os três sócios e citação pessoal, simultânea, para dois (exceptua-se a D……,). Por se tratar de responsabilidade solidária, não há dispensa de juros de mora nem de custas (...)“ cfr. fls. 17 e 18 do processo administrativo apenso aos autos;
5. Em 28/09/2009, é realizada a citação pessoal de A……., ora oponente, nos seguintes moldes “executado por reversão nos termos do art. 160º do CPPT, na qualidade de responsável solidário pela divida exequenda da empresa/sociedade infra indicada (...) Identificação do Executado: B……, L.da.; N° processo 1384200101011340; Proveniência: CCDRC — MCOTA; Tributo: subsídios; Quantia Exequenda: € 37.794,69 (...)”— cfr. fls. 20 do processo administrativo apenso aos autos;
6. A sócia A……, ora oponente, nunca exerceu a gestão de facto da B……, Lda., trabalhava no laboratório de Análises Clínicas Drª. E…… das 09 às 18 horas, daí saindo para casa afim de tratar da vida familiar. Nunca a mesma praticou actos que se prendessem com a vida da empresa da qual era apenas sócia — cfr. depoimento da testemunha D……..”

2- DE DIREITO

2.1. Das questões a apreciar e decidir

Resulta do probatório que por Despachos de Sua Exª a Ministra para a Qualificação e Emprego, de 25 de Agosto de 1997, e do Secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, de 20 de Agosto do mesmo ano, foi homologado o projecto de concessão de incentivos, a conceder à empresa B……, Lda (...), da qual eram à data sócios, o Senhor C……. (...) A……. (...) e D……. (...) no montante global de Esc. 8.342.220$00, referente ao Regime de Incentivos às Microempresas (...).
Tendo por base o incumprimento de algumas cláusulas do referido contrato, por despachos, da Ministra do Planeamento de 28/12/2000 e do Secretário de Estado do Trabalho de 11/01/2001, foi homologada a rescisão do contrato de concessão de incentivos e ordenada a consequente devolução dos incentivos, indevidamente recebidos.
Por ofício n° 808354, o Presidente da Comissão de Coordenação, junto do Chefe da 1.ª Repartição de Finanças de Leiria “(...) veio, nos termos do n° 3, do art. 7.º do D.L. 260/89, de 17 de Agosto, requerer a execução coerciva de Esc. 9.267. 529$00 contra “B……, Lda (...) da qual eram à data sócios, o Senhor C……. (...) A…… (...) e D……”.
A ora recorrida deduziu, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, oposição judicial à execução contra si instaurada como responsável solidária, tendo a Mmª Juíza “a quo” julgado extinta a execução fiscal, ponderando para tanto:
· “(…)
· A LGT impõe como necessário para além da gerência de direito, a gerência de facto como termina o art. 24° da LGT
“Os administradores, directores o gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas sociedades, cooperativas e empresas públicas são subsidiariamente responsáveis em relação estas e solidariamente entre si (...).
· Ora, a oponente era apenas sócia da empresa, não era sequer gerente de direito, tendo-se concluído que o único gerente da empresa originária devedora pertencia ao C……….
· (…)
· E, em coerência com este entendimento sobre a responsabilidade subsidiária, a oponente foi citada para pagar a quantia exequenda na qualidade de responsável subsidiária, pelo facto de no acto que originou a divida, aqui em causa, ter exercido a gerência de facto.
Vejamos.
· (…) Face ao regime legal supra enunciado, se é certo que a gerência de facto não se presume, sem mais, da de direito, muito menos se poderá concluir que a sócia de uma empresa que não se encontra constituída por direito como gerente, tenha sido gerente de facto da mesma.
· Neste caso, cabia à Administração Tributária ter carreado provas conclusivas que permitissem chegar à conclusão que, apesar de a oponente não ser gerente de direito, exercia de facto a gerência, o que não se verificou, limitando-se no despacho de reversão, o Chefe do Serviço de Finanças de Leiria 1, a alegar tal situação, pelo que incumbindo à Administração Tributária o ónus da prova dos pressupostos da responsabilidade subsidiária da oponente entre os quais se inclui o exercício efectivo da gerência, falece à partida a tese da Administração Tributária.
· A falta de prova dessa gerência deverá ser valorada contra a Administração Tributária, neste sentido, v.g. acórdão do TCA Sul, de 03/12/2010, Proc. N.º 04296/10, in www.dgsi.pt.
· Ademais, conforme ressalta do probatório supra, a oponente nos presentes autos logrou provar que não exerceu a gerência de facto na referida empresa, nem em 2001, nem em qualquer outro período.
· Então, só podemos concluir que, à data em que a dívida em questão se reporta, a oponente não exercia na devedora originária qualquer cargo de que pudesse resultar a sua responsabilização, para os efeitos do artigo citado.
· Necessariamente concluímos pela ilegitimidade da oponente para a execução, nos termos do disposto na al. b) do n.º 1, do art. 204° do CPPT, procedendo, em consequência, com esse fundamento, a oposição por ele deduzida”.

Contra este entendimento se insurge a Fazenda Pública argumentando, em síntese, que, ficou demonstrado nos autos que a oponente efectivamente subscreveu o contrato de concessão de apoio financeiro à sociedade, na sua qualidade de sócia da mesma sendo pois responsável originária da dívida.
Nesta sequência, “Enviado o processo ao serviço de finanças de Leiria 1, procedeu este à cobrança da dívida e à sua execução, apesar de não se tratar de dívida fiscal, nos termos conjugados dos arts. 148°, n° 2 alínea b) e do art.152°, n° 1 do CPPT”.
“A Mmª Juíza “a quo” ao concluir pela ilegitimidade da oponente para a execução nos termos do disposto na al. b) do n° 1 do art. 204° do CPPT, incorre em erro de julgamento, porquanto, não se trata de dívida fiscal e a oponente foi citada como revertida com responsabilidade solidária, nos termos do art. 153° do CPPT”.
Alega ainda recorrente a nulidade da sentença porque dá como provados factos e decide em sentido oposto às conclusões obtidas.
Em face das conclusões que delimitam o objecto e âmbito do recurso [cfr. os arts. 684º, nº 3, e 685º-A/1, do CPC, e o art. 2º alínea e), do CPPT], a questão a apreciar e decidir traduz-se em saber se a Mmª Juíza “a quo”:
a) incorreu em erro de direito ao julgar extinta a execução fiscal em virtude da ilegitimidade da oponente nos termos do disposto na alínea b), do nº 1, do art. 204º do CPPT;
b) se procede a legada nulidade da sentença por contradição entre os factos dados como provados e a decisão.


2.1.2. Da alegada nulidade da sentença

Quanto à alegada nulidade da sentença por oposição entre os fundamentos e a decisão, nos termos das disposições conjugadas constantes dos arts. 668º, nº 1, alínea c), do CPC e art. 125º do CPPT, afigura-se não ter a recorrente razão.
Ao contrário do alegado pela recorrente e como bem refere o Ministério Público, no seu douto parecer, “a decisão de procedência da oposição é consequência lógica das premissas seguintes:
-citação da oponente na qualidade de responsável subsidiária
-inexercício da gerência de facto na sociedade executada”.
Com efeito, não obstante constar da matéria dada como provada que a recorrida foi sócia gerente da Sociedade B……, Ldª., e assinou o contrato de concessão de incentivos, a verdade é que também está dado como provado que a gerência era exercida por C…… e que era a assinatura deste que obrigava a sociedade perante terceiros (pontos 1 e 2 do probatório).
Neste quadro e tendo a recorrida fundamentado a sua oposição precisamente em nunca ter exercido nem de facto nem de direito a gerência, a Mmª Juíza “a quo” integrou a questão nos pressupostos da responsabilidade subsidiária, segundo o disposto no art. 24º da LGT.
A este propósito pode ler-se na referida sentença que “A LGT impõe como necessário para além da gerência de direito, a gerência de facto como termina o art. 24º da LGT. «Os administradores, directores e gerentes e outras pessoas que exerçam, ainda que somente de facto, funções de administração nas sociedades, cooperativas e empresas públicas são subsidiariamente responsáveis em relação a estas e solidariamente entre si (…)».
“Ora, a oponente era apenas sócia da empresa, não era sequer gerente de direito”, tendo-se concluído que “o único gerente da empresa originária devedora, pertencia ao C……”.
E, mais adiante conclui-se que “conforme ressalta do probatório supra, a oponente nos presentes autos logrou provar que não exerceu a gerência de facto na referida empresa, nem em 2001, nem em qualquer outro período. Então, só podemos concluir que, à data em que a dívida em questão se reporta, a oponente não exercia na devedora originária qualquer cargo de que pudesse resultar a sua responsabilização, para os efeitos do artigo citado. Necessariamente concluímos pela ilegitimidade da oponente para a execução, nos termos do disposto na al.b) do nº1, do art. 204º do CPPT, procedendo, em, consequência, com esse fundamento a oposição por ele deduzida”.
No contexto apontado e tendo em conta esta fundamentação clara e congruente, a decisão de julgar procedente a oposição, por ilegitimidade, não está em contradição com os fundamentos em que se alicerçou a sentença.
Como refere o Ministério Público, a falta da verificação das premissas em que assenta a sentença pode conduzir ao erro de julgamento, mas não à nulidade da sentença, nos termos do art. 125º, nº 1, do CPPT. No mesmo sentido, constitui jurisprudência deste Supremo Tribunal que “Não existe nulidade da sentença por oposição entre os seus fundamentos e a decisão [alínea c) do nº1 do art. 668º do CPC] quando a decisão está na linha lógica dos fundamentos tal qual que foram invocados pelo juiz, não importando se com erro do juízo probatório ou de determinação, interpretação e aplicação da lei” (Cfr. o Acórdão do STA de 28/2/96, proc nº 19825, CTF, nº 382, p. 333. E, mais recentemente, cfr., entre outros, o Acórdão do STA, de 28/3/2012, proc nº 947/2011.).


2.1.3. Da apreciação do erro de julgamento

No caso em apreço, a dívida em execução reporta-se a um apoio financeiro no âmbito de um contrato de concessão de incentivos às microempresas. E porque não foram cumpridas as condições contratuais, teve lugar a rescisão unilateral do referido contrato, com a consequente execução coerciva de dívidas para reembolso de quantias indevidamente recebidas, com base em certidão emitida pelo Presidente da Comissão de Coordenação.
A dívida exequenda emerge, portanto, de um apoio financeiro concedido pela Ministra para a Qualificação e o Emprego e o Secretário de Estado para o Desenvolvimento Regional, pelo que não tem natureza fiscal mas sim contratual.
Assim sendo, no caso sub judice, não estamos na presença de dívidas tributárias, mas sim de dívidas emergentes de incumprimento de um contrato de concessão de incentivos, no âmbito do Regime de Incentivos às Microempresas, que não seguem o regime das liquidações sujeitas às regras do CPPT e da LGT. Como tem dito a jurisprudência deste Supremo Tribunal, (Cfr., entre outros, os Acórdãos do STA de 23/10/2002, proc nº 966/02; de 1/6/2011, proc nº 214/11 e, mais recentemente, o Acórdão de 27/2/2012, proc nº 97/12.) o facto de tais dívidas serem cobradas coercivamente não lhes muda a natureza transformando-as em dívidas tributárias.
Como decorre do probatório, consta do título executivo que o contrato foi assinado por três pessoas, entre as quais, a recorrida, mas na qualidade de sócia e, por conseguinte, representante da sociedade, sendo que a mesma foi citada pessoalmente, por se tratar de responsabilidade solidária (ponto 4 do probatório), mas indevidamente, porquanto no despacho emitido pelo Presidente da Comissão de Coordenação (Certidão de dívida que constitui título executivo, nos termos do disposto no art. 162º, alínea a), do CPPT.) consta apenas como devedora a B……, Ldª. (fls. 11 do PA).
Também no ponto 2 do probatório se pode ler que “Em 07/11/1997, a B……., Lda., celebra com a Comissão de Coordenação da Região Centro um contrato de concessão de incentivos — processo n° 0393000916182/0019 (CGD)”, sendo o mesmo subscrito, entre outros, pela recorrida, em representação da sociedade.
Neste contexto, coloca-se a questão de saber se é de julgar, em sede de oposição, a recorrente parte ilegítima na execução fiscal, nos termos do art. 204º, nº1, alínea b), do CPPT, com o fundamento em a oponente nunca ter sido gerente nem de facto nem de direito da sociedade originária devedora e beneficiária do referido incentivo.
Alega a recorrente que “a oponente nunca foi gerente nem de facto nem de direito mas subscreveu o contrato de concessão de apoio financeiro à sociedade em causa, na qualidade de sócia da mesma sendo pois responsável originária da dívida” [ponto c) das Conclusões].
Por sua vez, a Mmª Juíza “a quo”, integrando a situação no regime da responsabilidade subsidiária e tendo por base as regras aplicáveis às dívidas tributárias, julgou procedente a oposição por ilegitimidade da recorrente pelo facto de não ter sido gerente nem de facto nem de direito da sociedade devedora originária.
E afigura-se que assiste razão à Mmª Juíza “a quo”, quando conclui pela ilegitimidade da recorrida.
O art. 204º, nº 1, alínea b), do CPPT, dispõe que a oposição poderá ter como fundamento “a ilegitimidade da pessoa citada por esta não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor ou, sendo o que nele figura, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram, ou por não figurar no título e não ser responsável pelo pagamento da dívida”.
Em anotação ao referido preceito, JORGE DE SOUSA (Cfr. Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6ª ed., Áreas editora, Lisboa, 2011, Anotação ao art. 204º, p. 452.) pondera que nesta alínea se prevêem três situações de ilegitimidade da pessoa citada:
“-não ser o próprio devedor que figura no título ou seu sucessor;
-sendo o devedor que figura no título, não ter sido, durante o período a que respeita a dívida exequenda, o possuidor dos bens que a originaram,
-não figurar no título e não ser o responsável pelo pagamento da dívida”.
Ora, no caso sub judice, não figurando a recorrida no título executivo e uma vez que interveio no contrato de incentivos apenas como sócia e em representação da sociedade, não pode ser responsabilizada pelo pagamento da dívida exequenda, ao abrigo do art. 204º, nº 1, alínea b), do CPPT.
Por outro lado, não estando provado o exercício da gerência de facto nem de direito, a recorrida também não pode ser chamada à execução nem como responsável solidária nem como responsável subsidiária, nos termos do disposto no art. 24º da LGT. Acresce que estando nós perante uma dívida resultante do incumprimento de um contrato de incentivos, a recorrida não poderia sequer ser revertida nos termos deste preceito, que apenas se aplica às dívidas tributárias.
Em face do exposto, não assiste razão à recorrente e a sentença recorrida ao julgar extinta a execução por ilegitimidade, nos termos do disposto no art. 204º, nº 1, alínea b), do CPPT, não merece qualquer reparo.
Assim sendo, deve julgar-se improcedente o recurso e manter-se a sentença recorrida, com a consequente procedência da oposição.

III- DECISÃO

Termos em que os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo acordam confirmar a sentença recorrida, e, consequentemente, negar provimento ao recurso e julgar procedente a oposição.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 11 de Julho de 2012. – Fernanda Maçãs (relator) – Casimiro Gonçalves – Francisco Rothes.