Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01012/12
Data do Acordão:10/17/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:RECLAMAÇÃO DE DECISÃO DO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL
PRAZO DE RECLAMAÇÃO
PRAZO DE DECISÃO
Sumário:A reclamação a que se refere o art. 276º do CPPT deve ser deduzida no prazo de 10 dias após a notificação da respectiva decisão e o OEF poderá, ou não, revogar o acto reclamado, no prazo de 10 dias (nº 2 do art. 277° do CPPT).
Nº Convencional:JSTA00067850
Nº do Documento:SA22012101701012
Data de Entrada:09/28/2012
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF VISEU PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART125 ART276 ART277.
CPC96 ART660 N2 ART668 N1 D N2.
LGT98 ART103.
Referência a Doutrina:LEBRE DE FREITAS E OUTROS CODIGO DE PROCESSO CIVIL ANOTADO 2001 VOLII PAG670.
JORGE DE SOUSA CODIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIV PAG293.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A……, com os demais sinais dos autos, recorre da decisão que, proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal de Viseu, julgou improcedente a reclamação apresentada, nos termos do art. 276º do CPPT, contra o despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis, de 8/3/2012, que indeferiu a pretensão do reclamante de suspensão da venda de bens no âmbito do processo de execução fiscal contra si instaurado na qualidade de revertido por dívidas da devedora originária B……, Lda.

1.2. O recorrente termina as alegações formulando as conclusões seguintes:

a) O tribunal "a quo" não fez uma avaliação correcta da situação em causa nos autos, tendo, inclusivamente, feito uma interpretação errada no nosso modesto entendimento, do disposto nos artigos 150°, 151° e 276° e seguintes do CPPT.

b) Tendo considerado a reclamação intempestiva não apreciando abstendo-se do mérito.

c) O Tribunal "a quo" centra a questão do presente processo, na intempestividade da Reclamação, que no entender do Recorrente não se verifica.

d) A reclamação tem por objecto a decisão do órgão da execução fiscal no que à arguição de nulidades interposta por requerimento, diz respeito, para a suspensão da venda judicial (art. 276° CPPT).

e) A tramitação processual adequada para a arguição de nulidades em processo de execução fiscal, deve consistir em arguição perante o órgão de execução fiscal e, em caso de indeferimento, reclamação para o tribunal nos termos do art. 276° do CPPT.

f) Com a apresentação do requerimento de arguição de nulidades ou de vícios, para o conhecimento de todas elas, é primariamente competente o órgão de execução fiscal, e não o Tribunal, podendo este intervir, contudo, em caso de indeferimento da arguição de nulidade pelo órgão de execução fiscal (cfr. a título de exemplo, o Acórdão de 05.05.2010, rec. n° 125/10).

g) Neste sentido, é igualmente sustentado por Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado, 5ª Edição, volume II, pag. 648.

h) Assim, notificado o Recorrente em 20.01.2012 que, foi determinada a venda do direito e acção à herança ilíquida e indivisa por óbito de C……, a ter lugar em 20.04.2012.

i) Através de requerimento remetido ao Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis em 02.03.2012, invoca vários fundamentos ou a arguição de nulidades apresentando natureza incidental relativamente ao Processo de Execução Fiscal.

j) Com a apresentação do requerimento de arguição de nulidades, o recorrente pretendia que o órgão de execução fiscal anulasse a venda judicial com base em vícios que integram ilegalidade da conduta processual, desse mesmo órgão.

k) Com efeito, no entendimento do Recorrente, e que nos termos do art. 150° do CPPT, confere ao OEF as atribuições e/ou competências para a apreciação da arguição de nulidades e de questões incidentais, que determinem um juízo de legalidade.

l) As nulidades processuais derivam de actos ou omissões praticados no processo e se substanciam em desvios ao formalismo processual prescrito na lei.

m) Estamos portanto, a nosso ver, perante alegações de nulidades de actos processuais praticados pela AT com deficiências, o que legitimará, e se nos afigura revelar, pois que, para conhecimento de todas elas é competente o órgão de execução fiscal, e não o Tribunal, podendo este intervir, contudo, em caso de indeferimento da arguição de nulidade pelo órgão de execução fiscal.

n) Assim sendo, indeferido o pedido pelo OEF em 09.03.2012, o Recorrente tem sempre a possibilidade legal de reclamar - nos termos do art. 276° do CPPT - do despacho que, em sede de execução, aprecie tais nulidades.

o) Com efeito, em 19.03.2012 o aqui Recorrente ao abrigo do art. 276° e ss do CPPT, apresentou reclamação do despacho de 09.03.2012.

p) A verdade é que na situação sub judice não é possível considerar-se como dies a quo do prazo para reclamar outro que não aquele em que o Executado, aqui Recorrente, foi notificado do despacho proferido em 09.03.2012.

q) A partir do momento que o órgão da administração tributária profere uma decisão sobre um requerimento que lhe é dirigido pelo executado, está sempre e sem excepção, a admitir que este último possa apresentar reclamação da sua decisão, nos termos dos artigos 276° e 277° do CPPT.

r) Não obstante, a administração tributária está obrigada a pronunciar-se sobre todos os assuntos da sua competência que lhe sejam apresentados por meio de reclamações, recursos, representações, exposições, queixas ou quaisquer outros meios previstos na lei pelos sujeitos passivos ou quem tiver interesse legítimo, com base no princípio de decisão plasmado no art. 56° da LGT.

s) E nesses termos, a administração tributária proferiu decisão através do despacho de 08.03.2012, notificado ao mandatário do Recorrente em 09.03.2012, não pode agora ser negado, ao executado aqui Recorrente, o direito consagrado no art. 276° do CPPT.

t) A reclamação do despacho e tempestiva, uma vez que foi interposta após 10 (dez) dias da notificação da decisão do órgão da administração tributária, que a lei consagra no n° l do art. 277° do CPPT.

u) A douta decisão violou o preceituado na lei, nomeadamente, nos artigos 276° e 277° do CPPT.

v) Com efeito, o Tribunal "a quo" labora em erro.

w) De facto, é nula por omissão de pronúncia, a sentença que deixe de apreciar questão que deva conhecer e que não esteja prejudicada pela solução dada a outra, nos termos dos artigos 125°, n° l do Código do Procedimento e do Processo Tributário e 668°, n° l, alínea d) e 660° n° 2 do Código de Processo Civil.

x) A nulidade da Sentença recorrida por alegada "falta de fundamentação ou de abstenção de pronúncia", em virtude de não ter apreciado as questões levantadas na reclamação, ao fazê-lo incorreu, por falta de fundamentação ou abstendo-se de pronúncia, em nulidade prevista no n° l do art. 125° do CPPT.

y) Deve, consequentemente, ser anulada, com a consequente baixa dos autos ao Tribunal "a quo" para reforma da decisão, nos termos do n° 2 do art. 731° do CPC.

z) A não se entender que ocorre a nulidade invocada, ou não se ordenar a baixa dos autos para a reforma da decisão, sempre terá de entender-se que a douta Sentença recorrida incorreu em erro de julgamento.

Termina pedindo a procedência do recurso e que, consequentemente, se dê como provado o erro de julgamento das questões colocadas e reforma da decisão.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«… A decisão recorrida julgou verificada a excepção de caducidade do direito de acção e absolveu a Fazenda Pública do pedido.

O recorrente termina as suas alegações com as conclusões de fls. 373/378, que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso, nos termos do estatuído nos artigos 684º/3 e 685°-A/1 do CPC, e que aqui se dão por inteiramente reproduzidas.

Não houve contra-alegações.

A nosso ver o recurso não merece provimento.

O recorrente, além do mais vem arguir a nulidade da sentença recorrida por vício formal de omissão de pronúncia.

Existe omissão de pronúncia quando se verifica violação do dever processual que o tribunal tem em relação às partes, de se pronunciar sobre todas as questões por elas suscitadas.

Para se estar perante uma questão é necessário que haja a formulação do pedido de decisão relativo a matéria de facto ou de direito sobre uma concreta situação de facto ou de direito sobre que existem divergências, formuladas com base em alegadas razões de facto e de direito ((1) Acórdão do STA, de 19 de Abril de 2008, recurso nº 18150, AP-DR, de 2001.11.30, página 1.311).

Nos termos do disposto no artigo 660º/1 a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica, sendo certo que nos termos do número 2 o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excepto aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.

Ora, a partir do momento em que a decisão recorrida julgou verificada caducidade do direito de acção ficou prejudicado o conhecimento das restantes questões.
Não ocorre, pois, à evidência, a alegada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

De qualquer maneira não deixa de se assinalar que a sentença recorrida conheceu da questão da alegada falta de fundamentação do despacho sindicado, bem como do erro na forma processual adoptada e impossibilidade de convolação.

Como muito bem refere a sentença recorrida o acto lesivo que o recorrente sindica, ainda que de forma indirecta, é o despacho de 2012.01.16 do OEF que determinou a venda do direito e acção à herança indivisa.
De facto, e ao contrário do que o recorrente sustenta nas suas alegações, o requerimento de fls. 216 em que pede a suspensão da venda do direito e acção à herança indivisa não consubstancia nenhum requerimento de arguição de nulidades processuais.

Na verdade, o recorrente, invocando alegadas "excepções peremptórias", que, em seu entender, se consubstanciariam na ilegalidade concreta da dívida exequenda e no facto de haver transmitido o direito penhorado, pede a suspensão da ordenada venda.

Ora, ao pedir a suspensão da venda está a sindicar o despacho que a havia determinado, uma vez que os fundamentos invocados apenas podem servir de fundamento a reclamação graciosa/impugnação judicial e embargos de terceiro.

O recorrente foi notificado do acto lesivo sindicado em 2012.01.20, sendo certo que a reclamação graciosa foi deduzida em 2012.03.19.

O prazo para deduzir e reclamação de actos de órgão de execução fiscal é de 10 dias, contados da notificação da decisão reclamada (artigo 277°/1 do CPPT).

Tal prazo conta-se de foram contínua, suspendendo-se durante as férias judiciais e transferindo-se para o primeiro dia útil subsequente (artigos 103° da LGT, 20°/2 do CPPT e 144° do CPC).

Tratando-se de um prazo processual o recorrente poderia praticar, ainda, o acto até ao terceiro dia útil seguinte ao termo do prazo.

É, pois, manifesta a intempestividade da reclamação graciosa.

A não se entender assim, então, o interessado poderia pôr em causa o acto determinativo da venda depois de, largamente, ultrapassado o prazo legal de recurso judicial (10 dias).

A caducidade do direito de acção consubstancia excepção dilatória, determinante da absolvição da instância da entidade requerida (artigos 87°, 88° e 89° do CPTA, ex vi do artigo 2º c) do CPPT).

Se assim não for entendido, então, deverá ser julgada extinta a instância por inutilidade superveniente da lide.

Como resulta dos pontos 4, 7, 8 e 9 do probatório e documentos para os quais remetem (nomeadamente fls. 288), a administração tributária, admitindo a falta de fundamentação do despacho sindicado, revogou-o e substitui-o pelo despacho de 3 de Maio de 2012.

Tal despacho revogatório, era ilegal, porque proferido para além do prazo de 10 dias estatuído no artigo 277º/2 do CPPT.

Todavia, não tendo o mesmo sido objecto de impugnação consolidou-se na ordem jurídica.

Assim, a reclamação judicial interposta do primeiro acto ficou sem objecto, facto que acarreta a extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide ((2) Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição, 2011, volume IV, página 293, Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa).
Termos em que deve ser negado provimento ao recurso, mantendo-se a sentença recorrida na ordem jurídica, ou, então, ser julgada extinta a instância por impossibilidade superveniente da lide».

1.5. Com dispensa de vistos, dada a natureza urgente do processo, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
1. No Processo de Execução Fiscal n° 0132200401004638 e apensos, em que é executado, por reversão, o Reclamante, foi por despacho do Chefe de Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis, de 16/01/2012, determinada a venda do direito e acção à herança ilíquida e indivisa aberta por óbito de C……, a ter lugar em 20/04/2012 - Cfr. documentos fls. 198 a 200 do PEF, que se dão por integralmente reproduzidos como os demais que seguem.

2. Pelo ofício n° 560, de 19/01/2012, recebido a 20/01/2012, foi o Reclamante notificado do Despacho que antecede - cfr. documentos de fls. 203 e 203 verso.

3. Por requerimento subscrito por advogado, remetido ao Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis em 02/03/2012, o Reclamante requereu a suspensão da venda, apresentando como fundamentos a cessação de actividade da devedora originária em 31/12/2001 e, sendo o IVA respeitante a anos posteriores, os valores correspondentes não são devidos, bem assim, que procedeu à transmissão da quota-parte ideal do direito de propriedade dos imóveis, pertencentes ao quinhão hereditário de herança líquida e indivisa, com o recebimento de tornas, não sendo, deste modo, sua propriedade, referindo ainda que caso não seja aceite o pedido de suspensão da venda, "deduzirá uma p.i., cujo petitório se insere em reclamação contenciosa, com base em prejuízo irreparável — cfr. documento de fls. 206 a 219 verso.

4. Por Despacho do Chefe do Serviço de Finanças de 08/03/2012, foi indeferido o pedido de suspensão da venda, com fundamento em informação onde é referido que a petição apresentada "não é uma reclamação nos termos do n° 3 do artigo 278° do CPPT, mas tão só a manifestação de intenção de reclamação e, bem assim, que o Documento Particular Autenticado de transmissão do quinhão hereditário não se encontra registado" - cfr. documento de fls. 222 e 222 verso.

5. O Despacho anteriormente referido foi notificado ao mandatário do reclamante em 09/03/2012 - cfr. documento de fls. 223 a 226 e ainda como resulta da consulta a www.ctt.pt/feapl_2/app/open/tools.jspx?tool=0.
6. Em 19/03/2012, o Reclamante, ao abrigo do artigo 276° e ss do CPPT, apresentou reclamação do Despacho de 08/03/2012, anteriormente referido, invocando como fundamentos que a devedora originária B……, Lda., está inactiva desde 31/12/2001 e respeitando as dívidas a anos posteriores a sua cobrança coerciva é ilegal, tendo contestado a quantificação administrativa da matéria tributável e quanto à venda dos bens refere que transmitiu a quota-parte ideal do direito de propriedade dos imóveis, pertencentes ao quinhão hereditário de herança ilíquida e indivisa em face do que a Administração tributária está a proceder à venda de bens alheios, concluindo que "a decisão que indeferiu o pedido, ora reclamado, a exigência legal de fundamentação não se encontra cumprida, não tendo sido dado a conhecer o modo e as razões, porque decidiu, e não respondendo ao alegado pelo reclamante", concluindo, assim pela falta de fundamentação da decisão de 08 de Março de 2012, bem assim pela omissão de pronúncia quanto aos fundamentos invocados que, em sua opinião deveriam motivar a suspensão da venda determinada por Despacho de 16/01/2012 - cfr. documento de fls. 249 a 260.

7. Por Despacho do Chefe de Serviço de Finanças de 27/03/2012, foi determinada a suspensão da venda em curso, com a remessa dos autos à Divisão de Justiça Tributária cfr. documento de fls. 265 verso dos presentes autos, que se dá por integralmente reproduzido.

8. Pela informação n° 32/2012, de 13/04/2012, a Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Aveiro pronunciou-se acerca da reclamação apresentada, concluindo que "não assiste razão ao reclamante quanto à omissão de pronúncia... " e reconhece que "...o despacho reclamado carece de fundamentação, não sendo clara e inequívoca para o seu destinatário a motivação subjacente que deveria esclarecer as razões de facto e de direito que justificam o sentido da decisão ... não esclarece o reclamante de que o requerimento por si apresentado não constitui meio próprio para reagir de um acto de OEF, qual o meio próprio e quais as razões que impossibilitam a sua convolação ... não esclarece que, tendo o reclamante transmitido o bem penhorado, deixa de dispor de um interesse legítimo em agir ... assim como não esclarece que com a entrada em vigor da Lei n° 64-B/2011, de 30/12, foi revogado o n° 2 do artigo 244° do CPPT, deixando de se encontrar legalmente prevista a possibilidade de suspensão da venda..." - cfr. documento de fls. 271 a 276.

9. Por Despacho do Chefe do serviço de Finanças de 03 de Maio de 2012, foi revogado o Despacho proferido em 27 de Março de 2012, que suspendia a venda, retomando-a e designando nova data para o efeito - cfr. documento de fls. 278 a 279.

10. Do Despacho que antecede foi o mandatário do reclamante notificado através do ofício n° 3176, de 10/05/2012 - cfr. documento de fls. 280 e 280 verso.

11. Por ofício n° 3270, de 11/06/2012, foi o Reclamante notificado da data da realização da venda - Cfr. documento de fls. 285 e 285 verso.

12. Na sequência da notificação que antecede, o reclamante dirigiu requerimento ao Director de Finanças de Aveiro, dando conta que uma vez apresentada a reclamação dos presentes autos, o mandatário do reclamante não foi notificado da revogação do acto reclamado, referindo que "o Órgão da Administração tributária não pode retomar a venda e revogar um Despacho proferido em 27/03/2012, do qual o mandatário do requerente é completamente alheio" e requer a remessa da reclamação por considerar que a mesma não ficou sem objecto - cfr. documento de fls. 286 a 288 dos presentes autos que se dá por fielmente reproduzido.

13. Por Despacho de 23/05/2012, o Chefe do Serviço de Finanças determinou a suspensão do procedimento de venda - cfr. documento de fls. 295 e 295 verso.

14. Pelo ofício n° 3514, de 23/05/2013, foi o mandatário do reclamante notificado do despacho que antecede - cfr. documento de fls. 297 dos presentes autos que se dá por integralmente reproduzido.

3.1. A sentença recorrida julgou intempestiva a presente reclamação, por entender que, embora esta seja apresentada na sequência da notificação do despacho do OEF de 8/3/2012 (que indeferiu o pedido de suspensão da venda) o acto concreto que o reclamante pretende atacar acaba por ser (ainda quer de forma indirecta) o despacho do OEF que determinou a venda do direito e acção à herança indivisa, ou seja, o primitivo despacho de 16/1/2012, pelo que, assim sendo, é intempestiva a presente reclamação deduzida à luz do art. 276º do CPPT.

Mas, ainda assim, a sentença veio, em seguida, a apreciar igualmente:
a) a questão da alegada falta de fundamentação do (directamente) sindicado despacho (o de 8/3/2012) que indeferiu o pedido de suspensão da venda formulado no requerimento de 2/3/2012, concluindo a sentença que o dito despacho está fundamentado, porque se apoia na informação dos serviços da AT;
b) a questão do erro na forma processual utilizada pelo recorrente [face ao pedido que deduz – revogação do despacho reclamado - e às restantes causas de pedir que também invoca, pois, a par da mencionada falta de fundamentação do despacho em causa, o reclamante alega ainda, por um lado, que já transmitiu para outrem a quota-parte ideal do direito de propriedade dos imóveis, pertencentes ao quinhão hereditário de herança ilíquida e indivisa, com o recebimento de tornas, pelo que a AT ao proceder à venda judicial de imóveis não pertencentes ao executado viola o disposto no nº 1 do art. 821º do CPC e, por outro lado, reportando às dívidas exequendas (IVA e IRC), invoca também a inexistência de facto tributário e o erro na quantificação da matéria tributável], concluindo a sentença, na parte referente a esta questão (erro na forma de processo) o seguinte:
- Perante os fundamentos apresentados verifica-se que alguns deles se reconduzem à forma processual de Embargos de Terceiro, que independentemente da verificação da legitimidade do reclamante para o efeito, deveriam ser apresentados no prazo de 30 dias (art. 237°, n° 3 do CPPT), prazo esse que já havida decorrido;
- E quanto aos fundamentos reconduzíveis à reclamação graciosa ou à impugnação judicial, o próprio reclamante diz ter já delas feito uso, o que inviabiliza a convolação.
- Sendo que, de todo o modo, os fundamentos reconduzíveis à anulação da venda cabem na reclamação a que alude o art. 276° do CPPT, mas esta é intempestiva.
c) E, em face da impossibilidade da convolação dos presentes autos noutra espécie processual, e determinada que foi a intempestividade da Reclamação, a sentença conclui pela respectiva improcedência.

3.2. É do assim decidido que o recorrente discorda sustentando, desde logo (cfr. as Conclusões XIV a XVI) que a sentença enferma de nulidade, por omissão de pronúncia (arts. 125°, n° l do CPPT e 668°, n° l, al. d) e 660° n° 2 do CPC) dado que não apreciou as questões suscitadas na reclamação.

Vejamos, desde já esta questão.

4. Prevista no art. 125º do CPPT e na al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC, a nulidade da sentença por omissão de pronúncia está directamente relacionada com o comando constante do nº 2 do art. 660º deste último diploma: o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, sendo que o conceito de «questões» não se confunde com o de «argumentos» ou «razões» aduzidos pelas partes em prol da pretendida procedência das questões a apreciar («Para se estar perante uma questão é necessário que haja a formulação do pedido de decisão relativo a matéria de facto ou de direito sobre uma concreta situação de facto ou jurídica sobre que existem divergências, formulado com base em alegadas razões de facto ou de direito.» cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, Anotado e Comentado, volume I, 5ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 913 - anotação 10 ao art. 125º). Ou seja, o juiz deve, sob pena de nulidade da sentença (por omissão de pronúncia), conhecer de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e excepções invocadas e todas as excepções de que oficiosamente lhe cabe conhecer e cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão (e sem prejuízo de a lei impor ou permitir o conhecimento oficioso de outras - nº 2 do art. 660° do CPC), mas já não constituindo nulidade a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes das da sentença, que as partes hajam invocado (cfr. Lebre de Freitas, Montalvão Machado e Rui Pinto, Código de Processo Civil Anotado, Vol. 2°, Coimbra Editora, 2001, pag. 670).

No caso, o recorrente limita-se a dizer que sentença enferma da dita nulidade porque não apreciou «as questões levantadas na reclamação».

Não especifica, porém, quais são essas questões que não foram apreciadas.

De todo o modo, a sentença julgou intempestiva a reclamação e, consequentemente, face a este sentido da decisão, sempre ficará prejudicada a apreciação das demais questões porventura também suscitadas (nos termos do disposto no nº 1 do art. 660º do CPC a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica e nos termos do nº 2 o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excepto aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras).
Ora, no caso, tendo a sentença julgado verificada a caducidade do direito de acção [por entender que, embora esta seja apresentada na sequência da notificação do despacho do OEF de 8/3/2012 (que indeferiu o pedido de suspensão da venda) o acto concreto que o reclamante pretende atacar acaba por ser (ainda quer de forma indirecta) o despacho do OEF que determinou a venda do direito e acção à herança indivisa, ou seja, o primitivo despacho de 16/1/2012] ficou, desde logo, prejudicado o conhecimento das restantes questões, pelo que, deste ponto de vista, não ocorre a alegada nulidade da sentença por omissão de pronúncia.

5.1. Nas restantes Conclusões o recorrente imputa à sentença erro de julgamento quer na medida em que julgou intempestiva a reclamação, quer na medida em que apreciou erradamente os fundamentos que ele, reclamante, invocara no requerimento de 2/3/2012 como causa do pedido de suspensão da venda.

E neste âmbito, alegou, em síntese, o seguinte:

1) A sentença, ao julgar intempestiva a reclamação e ao não conhecer de mérito, faz uma interpretação errada do disposto nos arts. 150°, 151° e 276° e seguintes do CPPT, sendo que não ocorre a referida intempestividade da reclamação dado que esta tem por objecto a decisão do OEF no que à arguição (no requerimento de 2/3/2012) de nulidades diz respeito, para a suspensão da venda judicial (art. 276° CPPT).

2) A arguição de nulidades em processo de execução fiscal deve ser feita perante o OEF e, em caso de indeferimento, pode reclamar-se para o tribunal, nos termos do art. 276° do CPPT.
Ora, no caso, notificado em 20/1/2012 do despacho que determinou a venda do direito e acção à herança ilíquida e indivisa por óbito de C…… (venda a ter lugar em 20/4/2012) foi através do requerimento de 2/3/2012 que o recorrente logo veio arguir, junto do Serviço de Finanças de Oliveira de Azeméis, várias nulidades relativamente ao PEF, pretendendo que o OEF anulasse a venda judicial com base em vícios que integram ilegalidade da conduta processual, desse mesmo órgão (nulidades processuais que derivam de actos ou omissões praticados no processo e se substanciam em desvios ao formalismo processual prescrito na lei).

3) E assim sendo, indeferido que foi em 8/3/2012 o pedido, por parte do OEF, sempre o recorrente (notificado em 9/3/20102) tem a possibilidade legal de reclamar (nos termos do art. 276° do CPPT) desse despacho que em sede de execução apreciou tais nulidades. E tendo a respectiva reclamação sido apresentada em 19/3/2012, a mesma é tempestiva, não podendo considerar-se como dies a quo do prazo para reclamar outro que não aquele em que o executado/reclamante foi notificado daquele despacho proferido em 8/3/2012.

Vejamos pois.

5.2. Da factualidade que vem provada resulta a seguinte sequência temporal de actos processuais:
- O recorrente foi notificado, em 20/1/2012, do despacho proferido pelo OEF em 16/1/2012, que determinou a venda do direito e acção à herança líquida e indivisa por óbito de C…… (venda a ter lugar em 20/4/2012).
- Face a tal notificação, o recorrente apresentou nos Serviços da AT, em 2/3/2012, um requerimento a pedir a suspensão da venda, invocando, para fundamentar esse pedido de suspensão, o seguinte:
a) A inactividade da empresa “B……, Lda.”, enquanto devedora originária, desde 2001-12-31, data de cessação da actividade para efeitos de IVA.
b) O processo de execução fiscal n° 0132200401004638 e Aps. foi instaurado com vista à cobrança coerciva de IRC relativo a 2002, 2003, 2004 e 2005; e IVA relativo a 2001, 2004 e 2005;
c) Dada a sua inactividade, desde Dezembro de 2001, quanto às dívidas de IVA a sua cobrança coerciva é ilegal;
d) Quanto às dívidas de IRC, porque a empresa se encontrava inactiva, havendo por isso, prova de que os elementos utilizados pela AT ou o método que utilizou estão errados (art. 100° n° 1 do CPPT), Acórdão do TCA no processo n° 07025/02 de 05.05.05 em www.dgsi.pt.
e) Da prova produzida (cessação da actividade em IVA), resulta fundada dúvida sobre a existência e quantificação do facto tributário obtido, traduzem a ilegalidade do acto.
f) O reclamante contestou a quantificação administrativa da matéria tributável, e apresentou prova bastante credível, de forma a contrariar a quantificação apurada pela Administração Tributária.
g) Inexistindo facto tributário em resultado da inactividade do sujeito passivo e consequente não demonstração da obtenção de receitas no ano a que respeita a tributação, não se verifica o pressuposto do imposto (art. 1° do CIRC).
h) O reclamante transmitiu a quota-parte ideal do direito de propriedade dos imóveis/ pertencentes ao quinhão hereditário de herança ilíquida e indivisa, com o recebimento de tornas.
i) A Administração Fiscal ao proceder à venda judicial dos imóveis não pertencentes ao executado, viola o estatuído no n° l do art. 821° do Código de Processo Civil (CPC) por força do art. 2° do CPPT, ao consentir que o bem de um terceiro responda pela dívida, quando só os do devedor/executado podem ser afectos a esse fim.
- Em 8/3/2012 o OEF proferiu despacho indeferindo este pedido de suspensão da venda, dado que a petição apresentada «não é uma reclamação nos termos do n° 3 do artigo 278° do CPPT, mas tão só a manifestação de intenção de reclamação e, bem assim, que o Documento Particular Autenticado de transmissão do quinhão hereditário não se encontra registado». Este despacho foi em 9/3/2012 notificado ao mandatário do recorrente.
- No seguimento desta notificação, o recorrente deduziu a presente reclamação, nos termos do art. 276º do CPPT, pedindo a revogação desse despacho de 8/3/2012 e invocando a falta de fundamentação do mesmo por dele não se perceber porque é que, tendo sido alegados pelo requerente os ditos fundamentos invocados como causa de suspensão da venda, ocorreu, ainda assim, tal indeferimento.
- O OEF pronunciou-se sobre esta reclamação em 27/3/2012 e determinou a suspensão da venda.
- O processo foi então remetido à Direcção de Finanças de Aveiro que por despacho de 17/4/2012 ordenou que fosse proferido novo despacho com a fundamentação necessária.
- O OEF proferiu em seguida, em 3/5/2012, novo despacho, com fundamentação carecida, e revogou o anterior despacho proferido em 27/3/2012 que tinha suspendido a venda, designando uma nova data (o dia 25/6/2012) para venda.
- O executado/recorrente foi notificado desse despacho, em 11/5/2012 e dele não apresentou reclamação nos termos dos arts. 276° e ss. do CPPT, antes optando por requerer, em 16/5/2012, que a reclamação que apresentara em 19/3/2012 fosse remetida a Tribunal, alegando que não podia ter sido revogado o despacho de 27/3/2012, que tinha suspendido a venda.
- A venda foi de novo suspensa, agora por despacho de 23/5/2012, que se pronunciou sobre aquele requerimento de 16/5/2012.

5.3. Nos termos do art. 276° do CPPT, as decisões proferidas pelo OEF e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e os interesses legítimos do executado ou de terceiro são susceptíveis de reclamação para o Tribunal tributário de lª instância.

E de acordo com o teor do art. 277° do mesmo CPPT, a reclamação será apresentada no prazo de 10 dias após a notificação da decisão e o OEF poderá, ou não, revogar o acto reclamado, no prazo de 10 dias – nº 2 do mesmo artigo.

Também nos termos do art. 103° da LGT é garantido aos interessados o direito de reclamação para o Juiz de execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária no âmbito do processo de execução fiscal.

A sentença recorrida considera que a reclamação apresentada em 19/3/2012 contra o acto (despacho) do OEF de 8/3/2012 é intempestiva porque o que o reclamante ali pretende é a revogação do despacho de 16/1/2012, no qual se determinara a venda.

Mas, a nosso ver, não pode acolher-se esta posição.

Na verdade, foi no seguimento da notificação de 9/3/2012 [notificando o teor do despacho de 8/3/2012 que indeferiu o requerimento (de 2/3/2012) a pedir a suspensão da venda por esse requerimento não ser «uma reclamação nos termos do n° 3 do artigo 278° do CPPT, mas tão só a manifestação de intenção de reclamação e, bem assim, que o Documento Particular Autenticado de transmissão do quinhão hereditário não se encontra registado»] que o recorrente deduziu a presente reclamação, nos termos do art. 276º do CPPT, pedindo a revogação desse despacho de 8/3/2012 e invocando a falta de fundamentação do mesmo por dele não se perceber porque é que, tendo o requerente alegado os ditos fundamentos como causa bastante para a suspensão da venda, ocorreu, ainda assim, tal indeferimento.

Ora, a conclusão, retirada pela sentença recorrida, no sentido de que, embora a reclamação seja apresentada na sequência da notificação daquele despacho de 8/3/2012, o acto concreto que o reclamante pretende atacar acaba por ser (indirectamente) o despacho de 16/1/2012 que determinou a venda e que, por isso, a reclamação é intempestiva, esquece que o reclamante também imputa ao despacho vício de forma, por falta de fundamentação e por não ter apreciado os supra referidos fundamentos invocados pelo reclamante como causa de suspensão da venda. Tanto que a sentença veio, como se disse, a apreciar também essas questões.
Daí que, considerando que nos termos do art. 277° do CPPT a reclamação é deduzida no prazo de 10 dias após a notificação da decisão reclamada, deva considerar-se tempestiva a presente reclamação.

5.4. Competiria, então, apreciar as questões cujo conhecimento teria, necessariamente, ficado prejudicado em face da decisão de intempestividade.

Todavia, como se disse (cfr. Ponto 3.1.) a sentença, considerando, porventura, que o requerimento visa atacar os dois referidos actos (o despacho de 16/1/2012 e o despacho de 8/3/2012), apesar de ter considerado intempestiva a reclamação (na parte que concerne àquele primeiro despacho) também apreciou em seguida as invocadas questões atinentes quer ao alegado vício de forma (por falta de fundamentação) do dito despacho de 8/3/2012, quer aos fundamentos que o reclamante tinha invocado (no seu requerimento de 2/3/2012) como causa do pedido de suspensão da venda.

Ora, se assim é, não há, então, questões cuja apreciação tivesse ficado prejudicada, concordando-se com a fundamentação constante da sentença (no sentido de que o despacho em causa – de 8/3/2012 – contém, nos termos ali explanados, a fundamentação legalmente exigível) e que, relativamente aos alegados fundamentos que o recorrente entende serem aptos para que se determinasse a suspensão da venda, os mesmos se reconduzem a causas de pedir que sempre determinariam a improcedência, nessa parte, da presente reclamação, face, até, ao pedido aqui formulado (revogação do despacho reclamado), não havendo, portanto, lugar a convolação para a forma que seria legalmente adequada.

Acresce dizer, de todo o modo, que, como salienta o MP, a questão relativa à falta de fundamentação do despacho reclamado (o de 8/3/2012) ficara já definitivamente decidida pelo posterior despacho de 3/5/2012, que designou nova data para a venda dos bens (esta decisão, proferida nos autos pelo OEF – mas para além do prazo de 10 dias estatuído no artigo 277º/2 do CPPT - não foi impugnada pelo recorrente, pelo que pouco importa agora saber se o OEF podia ou não ter revogado aquele despacho já que o acto administrativo tributário que o revogou não chegou a ser impugnado contenciosamente), pelo que, assim sendo, a reclamação judicial interposta também teria ficado sem objecto, com a consequente eventual extinção da instância por impossibilidade superveniente da lide (cfr. Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento c de processo Tributário, anotado e comentado, 6ª edição, 2011, volume IV, pag. 293).

Improcedem, assim, todas as Conclusões do recurso.

DECISÃO

Nestes termos, acorda-se em negar provimento ao recurso e confirmar, com a presente fundamentação, a decisão recorrida.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 17 de Outubro de 2012. - Casimiro Gonçalves (relator) - Francisco Rothes - Maria Fernanda Maçãs.