Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0132/22.4BALSB
Data do Acordão:02/01/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:RECLAMAÇÃO
CUSTAS
DISPENSA DO PAGAMENTO
REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA
Sumário:A dispensa do remanescente da taxa de justiça pressupõe que, in casu, se verifique o preenchimento dos critérios elencados no artigo 6.º, n.º 7 do RCP.
Nº Convencional:JSTA000P31863
Nº do Documento:SA1202402010132/22
Recorrente:ESTADO PORTUGUÊS, MINISTÉRIO DAS FINANÇAS E OUTROS
Recorrido 1:A..., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1 – Por acórdão de 7 de Dezembro de 2023, decidiu a Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo, no processo indicado em epígrafe, “negar provimento ao recurso, mantendo a decisão arbitral de condenação do Estado a restituir à A…. a quantia de €217.798.000, 00, mas com fundamento em caducidade do contrato de implementação” e, consequentemente, condenar o Recorrente Estado em custas.

2 – Por requerimento de 27 de Dezembro de 2023 (fls. 1587 do SITAF), veio o Recorrente Estado, nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 616.º do Código de Processo Civil (CPC), ex vi dos artigos 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), e do artigo 6.º, n.º 7 do RCP, requerer a reforma quanto a custas, nos termos e com os seguintes fundamentos:
«[…]
3. Ora, o artigo 6.º, n.º 7 do RCP prevê que, nas causas de valor superior a EUR 275.000,00, o pagamento do remanescente da taxa de justiça pode ser dispensado pelo Tribunal se a especificidade da situação o justificar e o juiz, de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, assim o entenda.

4. Conforme refere SALVADOR DA COSTA, “A lei não faz depender de requerimento das partes a intervenção do juiz no referido sentido, pelo que importa concluir que ele o pode fazer a título oficioso, na sentença ou no despacho final”.

5. Sucede que, no caso, não o tendo feito o Tribunal a título oficioso, pelo menos de forma expressa, por uma questão de cautela, não pode o Recorrente deixar de requerer essa dispensa, o que faz através do presente pedido de reforma do Acórdão quanto a custas, por não caber recurso do mesmo.

Dito isto,

6. De acordo com a Tabela I do RCP, em sede de recurso, o valor do remanescente da taxa de justiça é calculado da seguinte forma: para além do valor de EUR 275.000,00, ao montante da taxa de justiça paga acresce, a final, por cada EUR 25.000,00 ou fração, 1,5 UC (ou seja, EUR 153,00).

7. Com a interposição do recurso de revista, o Recorrente liquidou uma taxa de justiça no montante de EUR 816,00, correspondente a processos de valor entre EUR 250.000,00 e EUR 275.000,00.

8. Nessa conformidade, estima-se em mais de 1 milhão e 300 mil euros o valor ao qual pode ascender o remanescente de taxa de justiça a suportar pelo Recorrente.

9. Ora, como se viu, são essencialmente, dois os pressupostos processuais de que o RCP faz depender a dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente: (i) a complexidade da causa e (ii) a conduta processual das partes.

10. Considera o Recorrente que estão reunidos os pressupostos de que depende a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça.

11. Com efeito, para além de, salvo melhor entendimento, a apreciação do mérito do recurso por parte deste Tribunal não ter revelado especial complexidade, estamos perante um processo em que não tiveram lugar quaisquer outras diligências ou vicissitudes que, noutros casos, tornam os processos especialmente complexos (tais como múltiplas sessões de audiências de julgamento, diligências de produção de prova, entre outras).

12. Acresce que o próprio articulado de recurso apresentado pelo Recorrente, obedeceu, tanto quanto lhe era possível, a estritos critérios de objetividade e concisão, não padecendo de qualquer prolixidade.

13. Considera, pois, o Recorrente que se tratou de uma causa simples e que nada há a apontar relativamente à conduta processual das partes, nomeadamente do Recorrente.

14. Pelo que, caso fosse determinado o pagamento de qualquer valor remanescente de taxa de justiça, o mesmo sempre seria manifestamente exorbitante e desproporcionado.

15. Pelo que se conclui pela verificação dos pressupostos de que o artigo 6.º, n.º 7 do RCP faz depender a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida no caso concreto.

Sem conceder, acresce ainda que,

16. A dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça tem sido acolhida pela jurisprudência maioritária conhecida sobre a matéria em causa, mesmo em relação a processos que revelam uma atividade judicial visivelmente complexa.

17. Atente-se, a título exemplificativo, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 12 de dezembro de 2013, proferido no processo n.º 1319/12.3TVLSB-B.L1.S12, que concluiu pela dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça da seguinte forma:

“A cobrança de mais de € 150.000 como contrapartida de tramitação processual, inserida no âmbito de procedimento cautelar – embora de valor muito elevado e reportado a relações jurídicas de grande complexidade substantiva – que se consubstanciou essencialmente na emissão e confirmação de um juízo de inadmissibilidade de um recurso de apelação violaria os princípios da proporcionalidade e da adequação, erigindo-se, por isso, em ilegítima restrição no acesso à justiça” (sublinhado nosso).

18. Para além do mais, o dito montante do remanescente de custas obtido pela aplicação da norma constante do artigo 6.º, n.ºs 2 e 7 e da Tabela I-B anexa ao RCP não encontra justificação no princípio da cobertura de custos.

19. Com efeito, a entender-se que o valor da taxa de justiça a suportar pelas partes deve ser fixado estritamente em função do valor do processo, e sem prejuízo da complexidade dos autos, será flagrante a falta de correspetividade entre os serviços efetivamente prestados pelo Tribunal e a taxa de justiça suportada.

20. Situação que, por seu turno, viola o disposto no referido artigo 6.º, n.º 7 do RCP, interpretado à luz do princípio da proporcionalidade e do direito de acesso à justiça, consagrados constitucionalmente nos artigos 2.º, 18.º, n.º 2 e 20.º da Constituição da República Portuguesa (“CRP”).

21. Com efeito, através RCP, procurou “adequar-se o valor da taxa de justiça ao tipo de processo em causa e aos custos que, em concreto, cada processo acarreta para o sistema judicial, numa filosofia de justiça distributiva à qual não deve ser imune o sistema de custas processuais, enquanto modelo de financiamento dos tribunais e de repercussão dos custos da Justiça nos respectivos utilizadores”3 (sublinhado nosso).

22. Em regime de monopólio ou quase-monopólio que caracteriza a prestação do serviço de justiça, torna-se indispensável fazer intervir, pelo menos combinadamente, o critério do custo do serviço.

23. Neste sentido, pronunciaram-se, de forma unânime, os tribunais portugueses, referindo-se nesta sede, e a título meramente exemplificativo, o vertido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 22 de outubro de 2009, proferido no processo n.º 1179/03.5TVLSB-G.L1-64, nos termos do qual se decidiu pelo seguinte:

“E não se pode abdicar de uma certa correspectividade entre o custo e o serviço prestado, embora não tenha de ser absoluta, como já se referiu.

O direito de acesso aos tribunais pressupõe, pois, custos razoáveis, mesmo para os cidadãos mais abastados.

O cerne da questão reside, pois, em saber se as taxas exigidas ultrapassam sensivelmente custo o serviço prestado, se estão de tal modo divorciadas do serviço prestado que não se possa estabelecer uma correspectividade entre as duas prestações, e se são tal modo elevadas que o cidadão médio se sinta inibido de recorrer aos serviços de administração da justiça” (realce e sublinhados nossos).

24. No caso em apreço, salvo o devido respeito, estando cientes da exorbitância do valor de remanescente que pode estar em causa, torna-se claro que inexiste qualquer correspetividade entre esse valor e o serviço prestado pelo Tribunal, razão pela qual deverá ser expressamente dispensado o pagamento da mesma.

Ademais,

25. Sempre se dirá que a taxa de justiça deve ser determinada de acordo com os princípios constitucionais da proporcionalidade e da adequação (cfr. artigo 18.º, n.º 2 da CRP), com vista à garantia do acesso ao direito (cfr. artigo 20.º da CRP), como corolário do Estado de Direito Democrático (cfr. artigo 2.º da CRP).

26. Com efeito, a compatibilização da garantia de acesso aos tribunais com os princípios da adequação e proporcionalidade no que ao montante da taxa de justiça diz respeito, tem sido amplamente apreciada pelo Tribunal Constitucional, indicando-se, a título exemplificativo, os Acórdãos n.ºs 116/2008, 301/2009, 421/2013 e 179/20145.

27. Pelo que, atendendo aos critérios de adequação e proporcionalidade que devem necessariamente condicionar o juízo aplicativo do artigo 6.º, n.º 7, do RCP, iluminados pelo entendimento preconizado pelo Tribunal Constitucional em situações paralelas e equiparáveis supracitadas, não pode deixar de se concluir que a eventual sujeição do Recorrente ao pagamento da taxa de justiça remanescente seria manifestamente contrária aos referidos princípios, constitucionalmente consagrados.

28. Assim, interpretar o artigo 6.º, n.º 7, do RCP, no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da ação sem qualquer limite, designadamente, tendo em conta a natureza bilateral ou correspetiva do pagamento da taxa de justiça na medida da utilização do serviço público de justiça por parte do sujeito passivo, é uma interpretação inconstitucional, pois viola o princípio da proporcionalidade e adequação, bem como a garantia de acesso aos tribunais (cfr. artigos 18.º, n.º 2, e 20.º da CRP), o que se suscita expressamente nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 72.º da Lei do Tribunal Constitucional.

29. Razão pela qual, considera o Recorrente que, salvo melhor opinião, a taxa de justiça já paga é manifestamente suficiente, justa, proporcional e adequada para fazer face aos custos e despesas dos serviços prestados na presente causa.

30. Assim, de acordo com o supra exposto, mais uma vez se conclui pela verificação dos pressupostos de que o artigo 6.º, n.º 7 do RCP faz depender a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça devida no caso concreto.

Finalmente,

31. E à cautela, sempre se diga que a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça afigura-se, não como uma mera faculdade concedida ao Juiz, mas antes como uma obrigatoriedade que se impõe seja ponderada, por força dos princípios fundamentais de direito consagrados na CRP.

32. Razão pela qual, e sempre salvo o devido respeito, o Juiz não deve só dispensar o pagamento do remanescente da taxa de justiça apenas a requerimento das Partes, devendo antes verificar se a especificidade da situação assim o justifica, ainda que nenhuma das Partes o requeira.

33. Não o fazendo, incorrerá o Tribunal numa omissão, a qual, no entanto, poderá ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das Partes ou por iniciativa do Juiz, podendo tal retificação ter lugar a todo o tempo, nos termos do preceituado no artigo 614.º do CPC.

34. Com efeito, caso se considere que no Acórdão proferido deveria este Tribunal ter consignado a dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça, sempre se verificará que, nos termos do n.º 2 do artigo 613.º do CPC, não se encontra esgotado o poder jurisdicional quanto a tal questão.

35. Pelo que, em face de tudo o exposto, impõe-se a reforma do Acórdão nos termos acima mencionados, de forma a que, de acordo com os princípios da proporcionalidade e do direito de acesso à justiça acolhidos na CRP, possa ser assegurada a proporcionalidade entre os serviços prestados e a taxa de justiça cobrada aos cidadãos que recorrem aos tribunais.

36. Subsidiariamente, para o caso de assim não se entender e se concluir pela não dispensa do total do valor do remanescente, no que não se concede e por mera cautela de patrocínio se admite, sempre se imporá então que haja uma dispensa devidamente proporcional do remanescente.

Termos em que, se requer a V. Exas. se dignem dispensar o Recorrente do pagamento do remanescente da taxa de justiça na totalidade ou, subsidiariamente, em proporção.

[…]”.



3 – Compulsados os elementos constantes dos autos é possível deles extrair, com interesse para o presente pedido de reforma quanto a custas, o seguinte: i) o recurso foi interposto por articulado com 126 páginas, do qual constavam mais de 120 conclusões; ii) esta peça processual veio acompanhada do processo arbitral, que, no seu conjunto, incluía quase 1500 páginas; iii) o articulado das contra-alegações tinha 147 páginas e mais de 120 conclusões.

3.1. De acordo com o artigo 6.º do RCP, as custas processuais são essencialmente fixadas em função do valor da causa, sendo esse o parâmetro escolhido pelo legislador como critério-regra ou parâmetro-regra para o cálculo da contrapartida devida pelo uso do serviço público de justiça. E esse é o parâmetro legal e normal da proporcionalidade entre o serviço de justiça prestado e o custo do mesmo, o qual é aferido, objectivamente, “em função do valor e complexidade da causa”, sendo esse parâmetro objectivo de proporcionalidade igualmente válido para as causas de valor igual ou inferior a €275.000,00.
Em complemento deste regime regra, o n.º 7 do artigo 6.º contempla a faculdade de dispensa do remanescente da taxa de justiça para as causas de valor superior a €275.000,00, que o tribunal pode aplicar aos casos concretos, oficiosamente ou a requerimento das partes, desde que no caso, se verifiquem as especificidades legalmente indicadas, ou seja, complexidade abaixo do normal e conduta processual das partes que contribua activamente para agilizar o serviço de justiça.
Ora, neste caso, nenhum dos parâmetros para a dispensa do remanescente se encontra preenchido, seja porque a causa não apresenta uma complexidade abaixo da média daquelas que são julgadas por este Supremo Tribunal Administrativo – lembre-se que estava em apreciação a existência ou não de um erro de julgamento da decisão arbitral proferida a respeito de um contrato de implementação de um aproveitamento hidroeléctrico incluído no Programa Nacional de Barragens de Elevado Potencial Hidroeléctrico, num litígio que as partes revelaram considerar muito complexo, como é denotado pelo facto de em fase arbitral terem sido juntos aos autos diversos pareceres de jurisconsultos –, seja ainda porque ao apresentar articulados mais extensos do que a média, também a conduta processual não preenche objectivamente o pressuposto normativo imposto para a dispensa do pagamento dos “custos normais” do serviço de justiça.
O valor das custas apurado segundo a regra legalmente fixada nos artigos 529.º do CPC e 6.º do RCP é baseado num critério de proporção típico da bilateralidade das taxas e não pode ser interpretado, como parece pretender o reclamante, como se de uma medida sancionatória se tratasse. Por isso, não tem sustentação jurídica a alegação de que o montante apurado segundo a regra legal deva ser reduzido sempre que o comportamento das partes não mereça censura. Pelo contrário, nos casos em que o comportamento processual das partes merece ser censurado a consequência jurídica não é a aplicação do valor regra das custas, mas sim o agravamento da taxa de justiça, previsto no artigo 531.º do CPC.
Acresce que o que está em causa no n.º 7 do artigo 6.º do RCP é a possibilidade de o Tribunal “se a especificidade da situação o justificar”, dispensar uma parte do valor das custas (até à totalidade do remanescente da taxa de justiça) apuradas de acordo com os critérios legais, sempre que considere que aquele valor legal é desproporcionado, não em função do quantitativo das custas devidas que resulte do respectivo cálculo segundo a regra legal, mas sim em função da menor intensidade da contraprestação – o serviço de justiça concretamente prestado –, a qual é aferida pelos já mencionados critérios da maior simplicidade da questão (face à média) ou de um contributo activo das partes para agilizar o serviço de justiça, que, aqui, pelas razões acima expostas, não estão preenchidos.

3.2. O requerimento sustenta ainda que este Supremo Tribunal pode aplicar ao caso um critério residual de dispensa dos custos normais do serviço de justiça, e proceder à requerida dispensa do remanescente, assente num juízo global, à luz do princípio da proporcionalidade, entre as prestações e contraprestações em presença, do qual resultaria que o montante das custas legalmente devidas se revelaria, atendendo ao concreto serviço prestado, num montante desproporcionado.
Ora, é verdade que este juízo de proporcionalidade tem sido avançado em casos precedentes quando, comparado o montante global devido a título de custas e o serviço efectivamente prestado, seja manifesta a existência de uma desproporção, não obstante a complexidade da causa não ser inferior à média. O que é válido, por exemplo, quando a decisão apresenta carácter parcialmente remissivo ou quando as questões suscitadas no recurso não sejam todas conhecidas por algumas se deverem considerar prejudicadas ou ainda quando a decisão se circunscreve a aspectos processuais sem adentrar na análise do fundo das questões recursivas. Mas esse não é o caso aqui. E, por isso, também à luz deste critério não encontramos fundamento suficiente para proceder à dispensa do remanescente da taxa de justiça.
E também não reputamos como manifestamente excessivo o montante das custas devidas no âmbito do presente recurso, atendendo ao correspectivo serviço de justiça.

3.3. Subsidiariamente, o Reclamante ainda alega que a regra do artigo 6.º, n.º 7 do Regulamento de Custas Processuais deve ser interpretado em conformidade com o princípio da proporcionalidade, impondo que, em casos em que o montante das custas se revele elevado ou muito elevado, e mesmo que o Tribunal não possa reconduzir a factualidade processual aos pressupostos normativos da excepção para a dispensa do remanescente da taxa de justiça, há um poder dever de proceder àquela dispensa para assegurar o acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva.
Trata-se de um argumento difícil de interpretar e impossível de aplicar in casu, atenta a circunstância de o Reclamante ser o Estado.
Primeiro, porque não são avançados argumentos que permitam sequer compreender de que forma o Reclamante Estado pretende que o Tribunal analise em concreto a vulnerabilidade do Estado Recorrente no acesso ao serviço público de justiça, para uma eventual ponderação da alegada inconstitucionalidade da norma que lhe impõe o pagamento das custas por daí resultar um impedimento ou uma dificuldade na garantia do respectivo acesso ao direito e à tutela jurisdicional efectiva.
Segundo, também não resulta claro o tipo de ponderação que o Reclamante Estado pretende que este Tribunal faça à luz dos argumentos de este ser um serviço público prestado “em regime de monopólio ou quase-monopólio”, em relação ao qual se deve, por isso, garantir a universalidade no acesso. Entende o Estado que a obrigação de pagamento das custas processuais que são legalmente devidas consubstancia uma limitação para a sua litigação em sede de justiça estadual por comparação com os custos suportados na acção arbitral?
Nesta parte a argumentação do Reclamação afigura-se totalmente desprovida de sentido. O facto de o Reclamante e Recorrente ser o Estado inviabiliza qualquer ponderação a respeito da sua concreta situação económica no acesso à justiça. Pretende o Reclamante que se pondere nesta sede a tutela do direito do Estado no acesso à justiça por ele não ter cobertura legal suficiente em sede do regime jurídico de apoio judiciário? Em suma, é manifestamente improcedente toda a argumentação esgrimida a respeito deste ponto.

3.4. Por último, o Reclamante Estado invoca ainda jurisprudência do TC para sustentar a inconstitucionalidade do artigo 6.º, n.º 7 do RCP quando interpretado no sentido de que o montante da taxa de justiça é definido em função do valor da acção sem qualquer limite. Mas também esse argumento não tem procedência, pois não é essa a interpretação da norma que aqui se aplicamos. A decisão que foi proferida quanto a custas e que aqui se reitera é no sentido de que não estão neste caso preenchidos os pressupostos legais para se proceder à dispensa do remanescente da taxa de justiça, por o valor de custas devidas pelo Recorrente não ser, em si, desadequado ou desproporcionado face à complexidade do caso, à circunstância de este ser um recurso que tem por objecto uma decisão arbitral muito extensa e ainda ao facto de as partes não terem activamente contribuído, por via dos articulados recursivos apresentados, para agilizar a prestação do serviço de justiça.

Assim, os juízes da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo acordam em indeferir o pedido de reforma quanto a custas.

Custas do incidente: 3UC (artigo 7.º do RCP).

Lisboa, 1 de Fevereiro de 2024. – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva (relatora) - José Augusto Araújo Veloso - Maria do Céu Dias Rosa das Neves.