Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01585/10.9BELSB
Data do Acordão:07/09/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ANA PAULA PORTELA
Descritores:PRAZO DE PRESCRIÇÃO
RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
CONHECIMENTO
FACTO
Sumário:I - Quando na petição inicial tenham sido alegados factos que, a provarem-se, possam constituir o crime previsto no artigo 349º do CP, o prazo prescricional aplicável, face ao nº 3 do artigo 498º do Código Civil, é de 10 anos.
II - A determinação do concreto momento em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete faz-se pela ponderação da factualidade provada e com recurso à experiência comum.
III - Atendendo às declarações de 29/09/1995, entrega de fotocópias da sua defesa pessoal/declarações prestadas no “processo-inquérito/disciplinar” a decorrer no EMFA contra a sua ação de comando no CTA de 1992 a 1995 o recorrente revelou ter, nesta data, conhecimento do relatório IAF sobre o qual se pronunciou no sentido de que o seu conteúdo e conclusões não estão corretos, e poder concluir estar a ser vítima de perseguição e vingança.
Nº Convencional:JSTA000P26210
Nº do Documento:SA12020070901585/10
Data de Entrada:02/07/2019
Recorrente:A...
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral: RELATÓRIO
1. A…………. interpõe recurso de revista para este STA do acórdão do TCAS, de 11/7/2018 proferido em sede de recurso da sentença do TAF de Leiria, em 28.11.2014, em que era autor e réu o Estado Português, representado pelo Ministério Público, na parte em que este decidiu:

“(...)2. Em substituição, julgar prescrito o direito à indemnização fundado em responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos imputáveis aos órgãos da Força Aérea, no exercício da função administrativa, anulando a sentença recorrida nesta parte e absolvendo o Réu do pedido, e em julgar não prescrito o direito à indemnização fundada em responsabilidade civil do Estado, por violação do direito a decisão judicial em prazo razoável; (...)

4. Julgar prejudicado o conhecimento do recurso interposto pelo Autor, atento o julgamento antecedente, de prescrição do direito.”

2. Para tanto conclui as suas alegações da seguinte forma:

“I - Vem o presente recurso interposto do douto acórdão do Tribunal Central Administrativo do Sul - Secção de Contencioso Administrativo - na parte em que, em substituição do Tribunal “a quo” e na sequência do provimento do recurso subordinado interposto pelo réu, julgou prescrito o direito à indemnização fundada em danos causados pelos órgãos da Força Aérea, no exercício da função administrativa;

II - Apesar do carácter excecional do presente recurso de revista, tal como dispõe o nº1, do artº 150º, do CPTA, pode o mesmo ser admitido quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, peja sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.

III - Neste caso concreto, entendem-se verificados os dois pressupostos de que depende a admissão do recurso, quer pela relevância jurídica da questão em apreço, quer pela necessidade de assegurar correta aplicação do direito, tornando-se útil e necessária a intervenção deste tribunal, enquanto órgão regulador do sistema, atenta a forma ostensivamente errada e juridicamente insustentável com que a questão foi tratada pelo tribunal recorrido, consubstanciada em reiterada incorreta interpretação e aplicação do Direito;

IV - Que, consequentemente, culminou em manifesto erro de julgamento de direito, originado por deficiente enquadramento da matéria de facto considerada, deficiente interpretação conceptual dos preceitos legais aplicáveis, sobretudo no que se refere a lapsos objetivos elementares no enquadramento das questões fulcrais para uma boa Decisão;

V - Igualmente para uma boa aplicação do direito, importa ter em conta que a questão da apreciação do enquadramento da prescrição só aconteceu no acórdão recorrido, afigurando-se necessário, pela relevância e valor da causa, que possa ser assegurado um duplo grau de jurisdição, o que só pode ser viabilizado pela admissão do presente recurso;

VI - Acresce que, a questão do início da contagem do prazo de prescrição, previsto no artº 498º, do Código Civil (CC), afigura-se de relevância jurídica fundamental designadamente, pela elevada complexidade jurídica da matéria em apreço e das divergências e dúvidas que a mesma tem suscitado, ao nível da jurisprudência e da doutrina;

VII - Por último, a frequência com que as questões relativas ao instituto da Prescrição são tratadas nos nossos tribunais, conferem-lhe relevância social fundamental, podendo a solução/decisão saída do presente recurso constituir orientação para a apreciação de outros casos;

VIII - Razões que, no entender do R. justificam, em sede de Apreciação Liminar, a admissão do presente recurso;

IX - No tocante à decisão recorrida, entende o R., como já sustentado, que a mesma consubstancia erro de julgamento de direito, em consequência de deficiente/incorreta interpretação e aplicação da lei, exorbitando o tribunal dos seus poderes de cognição dos factos, tal como consignados na lei;

X - Embora com fundamentação diversa da que consta da decisão recorrida, também o R. considera que a esmagadora maioria dos factos que constituem a causa de pedir da ação, constituem crime, mas não é, seguramente, aos crimes imputados ao Autor no processo crime que a lei se refere, no nº3, do artº 498º, do CC;

XI - Os factos ilícitos cuja prática foi imputada a órgãos da Força Aérea, (ao Réu), alegados na descrição factual dos arts. 19º a 68º, da P.I. configuram - porque se pretendem provados, através do presente recurso - a prática de crime de denegação de justiça e prevaricação, previsto no artº 369º, do Cód. Penal (CP), praticados com a intenção de prejudicar o Autor e, consequentemente, com uma moldura penal até 5 anos de prisão, nos termos do nº2, do referido artigo;

XII - Em consequência e atendendo ao disposto no nº 3, do artº 498º do CC e na alínea b), do nº1, do art.º 118º, do CP, o prazo prescricional a aplicar ao caso é de 10 anos e não de 5 anos como, erradamente, se considerou na decisão recorrida;

XIII - Por outro lado, entende o R. que a contagem do prazo prescricional do seu direito apenas se iniciou após o trânsito em julgado do acórdão do Tribunal de Benavente, concretamente em 25.07.2007 porquanto, só nesta data se consolidaram na esfera jurídica do Autor /R. os efeitos da improcedência da acusação;

XIV - Ao invés, uma hipotética decisão condenatória do autor, no processo em causa, retiraria, como parece óbvio, qualquer sustentação à interposição de uma ação, com esta causa de pedir;

XV - No mesmo sentido, a jurisprudência dominante, da qual se destacam os dois acórdãos referidos (um do TRL e outro do STJ) e resumidos no desenvolvimento da presente alegação e cujo conteúdo descritivo se dá por integralmente reproduzido;

XVI - Tendo a ação sido interposta em 29.07.2010 (e não em 30.07.2010) com o número de registo 222364 (vd. doc. nº1) tem-se por interrompido o decurso do prazo da prescrição em 04.08.2010, conforme estabelecido no nº2, do artº 323º do CC, uma vez que não é imputável ao autor/r. a não citação do réu, que não ocorreu no prazo dos 5 dias após a interposição, por razões processuais, estranhas a este, sendo irrelevante a data da citação, ao contrário do que se considerou, como fator determinante;

XVII - Entre 25.07.2007 e 29.07.2010 decorreram 3 anos e 4 dias, não se verificando, nem o decurso do prazo de 10 anos, defendido pelo R, como aplicável, nem mesmo o prazo considerado pela decisão recorrida (5 anos) pelo que, se constata não ter ocorrido a prescrição do direito deste, ao contrário do que foi decidido;

XVIII - Em bom rigor pode afirmar-se que, tendo em conta o prazo de prescrição que se julga aplicável ao caso (10 anos), poderiam os factos constitutivos do direito invocado pelo Autor/R., ter chegado ao seu conhecimento após 05.08.2000, para que estivessem a coberto de qualquer prescrição;

XIX - Por outro lado, as datas e factos que sustentaram a decisão recorrida carecem de fundamento legal e factual, por resultarem de incorreto enquadramento dos mesmos;

XX - Os relatórios de inspeção e da PJM nunca foram do conhecimento do r., por nunca lhe terem sido notificados, conhecimento esse que nem sequer foi alegado pelo réu, quanto mais provado;

XXI - As únicas intervenções do autor/r. no decurso do processo, até à sua constituição como arguido, foram dois depoimentos, um prestado na fase de inspeção perante o senhor instrutor e outro perante magistrado, na PJM;

XXII - Como se pode constatar do elenco factual considerado na decisão recorrida, não consta qualquer facto que permita concluir pelo conhecimento do r., dos factos que lhe viriam a ser imputados, em sede acusação;

XXIII - Dando por provado esse conhecimento, a decisão recorrida é manifestamente ilegal, por violação do disposto no corpo do nº2, bem como nas suas als. a) a c), do art. 5º, do C.P.C., (aplicável por força do disposto no art. 1º, do (CPTA) incorrendo em manifesto erro de julgamento de direito;

XXIV - A decisão recorrida é absurda e falha do mínimo conteúdo factual, em sede de fundamentação, no que se refere ao invocado conhecimento dos factos que permitiriam ao R. o exercício do seu direito, no âmbito do recurso interposto para o STA, em 1997, do ato de desnomeação da frequência do curso superior de guerra aérea, tendo em conta o reconhecido objeto restrito do mesmo, por confronto com os restantes factos em causa neste processo;

XXV - Mas mesmo que se alinhasse pelo infundado e inaceitável raciocínio vertido na decisão recorrida, _que tomou como determinante a data em que a Polícia Judiciária Militar (06/12/2006) entregou o relatório final no processo crime, ainda assim não teria decorrido o prazo de cinco anos - ao contrário do que se entendeu - por ter sido omitida a ocorrência da interrupção da prescrição;

XXVI - Concluindo-se, face ao supra alegado, não ter decorrido o prazo de prescrição do direito do autor/r., e que a decisão recorrida carece de fundamento legal, incorrendo em manifesto erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação do direito, designadamente dos preceitos legais invocados, impondo-se a sua revogação e consequente substituição por acórdão/decisão que aprecie e julgue do mérito do recurso interposto pelo autor/r.

Termos em que, admitindo o presente recurso, revogando a decisão recorrida e julgando o recurso do autor, com revogação da sentença da 1ª instância, farão V.Exas. JUSTIÇA.”

6. O Ministério Público, em representação do Estado Português, deduziu contra-alegações que concluiu do seguinte modo:

“1.º Não é de se entender que se impõe a intervenção do STA, por não se mostrarem preenchidos os pressupostos que condicionam a admissão do recurso de revista, não se tratando de um caso em que seja necessária clarificação a efetuar por esse mais alto Tribunal da Justiça Administrativa,

2.º Dado ser clara a interpretação a dar ao caso em apreço e às normas aplicáveis, devendo o recurso ser rejeitado por não obedecer aos requisitos previstos no art.º 150.º, n.º 1, do CPTA, e se mostrar correto e isento do erro alegado o douto Acórdão Recorrido.

3.º A parte do pedido ainda em apreciação assenta em indemnização por responsabilidade civil extracontratual do Estado pelo exercício da função administrativa, por facto ilícito, prevista no art.º 2.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 48051, de 21/11/1967 (na atualidade, a Lei nº 67/2007, de 31/12), conjugado com o art.º 483.º, do C. Civil.

4.º O art.º 498º, n.º 1, do C. Civil, aplicável ex vi art.º 5.º do citado DL n.º 48051, estabelece um prazo de 3 anos de prescrição do direito à indemnização que começa a contar-se desde que o lesado tenha conhecimento da verificação dos pressupostos da responsabilidade civil, podendo considerar-se outro prazo, conforme resulta do n.º 3, se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo.

5.º O art.º 306.º, n.º 1, 1.ª parte, do C. Civil, estabelece a regra geral relativa ao momento inicial do prazo de prescrição, que começa a correr quando o direito puder ser exercido.

6.º Assim, a contagem do prazo inicia-se logo que o lesado tenha conhecimento do seu eventual direito de indemnização, ainda que não conheça nessa data a extensão integral dos danos - art.º 498.º, n.º 1, do C. Civil citado.

7.º Porém, o ora recorrente, como resulta do probatório, não demonstrou ter havido atuação ilícita da Força Aérea, nem se mostram provados os elementos essenciais do tipo legal de crime, ónus que sobre o mesmo impendia, pelo que, se deve aplicar, sem mais, única e exclusivamente o prazo de 3 anos para a contagem do prazo de prescrição em causa.

8.º Porém, sem nada conceder, neste caso, seria aplicável, no máximo, o prazo de prescrição de cinco anos, com referência aos art.s 369.º, n.º 1, e 118.º, n.º 1, al. c), ambos do C. Penal, dado tratar-se da invocação de um crime doloso cuja intencionalidade não se encontra demonstrada, e em que «só o dolo direto e o necessário são relevantes, como é jurisprudência uniforme do STJ», pressuposto que foi acertadamente afastado pela primeira instância - cf. Ac. STJ de 12/7/2012, P. 4/11.8TRLSB.S1.

9.º As datas, respetivamente, em que foi proferido o acórdão absolutório, ou do trânsito em julgado, ao contrário do alegado pelo recorrente, não podem ser consideradas relevantes, uma vez que desde a sua constituição como arguido, como é evidente e usual, o autor já dispunha dos elementos factuais necessários e estava em condições de conhecer todos os pressupostos da alegada responsabilidade civil por facto ilícito, iniciando-se, pelo menos, desde então o prazo de contagem da prescrição.

10.º O ora recorrente foi ouvido inicialmente em 29/09/1995 e em 21/03/1997, foi constituído arguido, conforme alíneas E) e H) do probatório, dispondo então dos pressupostos que o podiam ter levado a intentar a ação, pelos danos causados pelos órgãos da Força Aérea, no exercício da função administrativa, baseados na instauração do processo de inquérito.

11.º A ação entrou no site do SITAF, em 29-07-2010, mas só em 03-08-2010 se completou a entrada da petição inicial, com a entrega, presencialmente, dos documentos que da mesma fazem parte integrante - cf, consulta do processo no SITAF.

12.º A prescrição tem-se por interrompida decorridos cinco dias só após a referida data de 03-08-2010, desde que a citação não ocorra anteriormente, e foi o caso - art.º 323.º, n.º 2, do C. Civil.

13.º Pelo que, só em 09-08-2010 se poderia considerar interrompida, altura em que já há muito havia decorrido o respetivo prazo de prescrição que se completou no ano de 1998 ou, no ano 2000, se contabilizados 3 anos, ou mesmo, no máximo, em 22-03-2002, se contabilizados 5 anos da data em que foi constituído arguido.

14.º E, ainda que se considerasse o prazo de prescrição de 10 anos defendido pelo Recorrente, ainda assim, a mesma teria ocorrido no ano de 2007, até, pelo menos, 22-03-2007.

15.º O douto Acórdão recorrido não incorreu no erro de julgamento alegado, nem ofendeu por erro as normas invocadas pelo Recorrente, não merecendo censura, devendo ser negado provimento ao presente recurso.

VOSSAS EXCELÊNCIAS, assim decidindo farão, JUSTIÇA”

7. Foi admitida a revista por acórdão de 11.01.2019 da formação deste STA a que alude o nº 5 do artº 150º do CPTA, na redação da Lei n.º 59/2008, de 11/09.

8. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.


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II- FUNDAMENTOS

Resulta das instâncias como provada a seguinte matéria de facto, relevante para a decisão dos autos:

“A) Em 1995, o então Chefe do Estado-Maior da Força Aérea determinou a realização de uma inspeção inopinada ao Campo de Tiro de ………. (CTA) – cfr. doc. nº 1 junto com a p.i. e doc. nº 1 e 2, juntos com a contestação.

B) Em 01 de agosto de 1995 foi elaborado o Relatório de Inspeção da Área Financeira (IAF) ao Campo de Tiro de ………., realizada pelo Sr. Coronel ADMAER B………….., entre 31.05.1995 e 20.07.1995 – cfr. fls. 2 a 51 – doc. nº 1 junto com a p.i..

C) Por despacho de 23/08/1995 do Chefe do Estado-Maior da Força Aérea foi ordenado o envio de certidão do Relatório da Inspeção da Área Financeira (IAF) ao Campo de Tiro de ……….. relatório e correspondentes documentos ao Serviço de Polícia Judiciária Militar “por existirem indícios de matéria passível de procedimento criminal” – cfr. fls. 4, do PA.

D) Em 31/08/1995 foi proposto a instauração de inquérito militar – cfr. fls. 2, do PA.

E) Em 29/09/1995 o A. (arguido nos autos) foi ouvido – cfr. fls. 56, do PA.

F) Em 03/10/1995 foi junto relatório circunstanciado da Polícia Judiciária Militar – cfr. fls. 160 e s., do PA.

G) Entre 23/02/1996 e 15/01/1997 inquirição pela Polícia Judiciária Militar de 16 testemunhas e junção aos autos de prova documental – cfr. fls. 206-566, do PA.

H) Em 21/03/1997 o A. foi constituído arguido, sujeito a interrogatório e termo de identidade e residência – cfr. fls. 665-670, do PA.

I) Em 03/07/1998 foi junto relatório de peritagem contabilística à escrita do Campo de Tiro de ……….. – cfr. fls. 735-790, do PA.

J) Entre 03/03/2000 e 26/11/2001, inquirição pela Polícia Judiciária Militar de 7 testemunhas – cfr. fls. 814-857, do PA.

K) Em 13/09/2004 remessa dos autos ao DIAP de Lisboa com fundamento na entrada em vigor do Código de Justiça Militar, aprovado pela Lei nº 100/2003, de 15/11 – cfr. fls. 885, do PA.

L) Em 28/12/2004 o DIAP de Lisboa excepciona a sua competência e remete os autos ao Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa [NUIPC 13.256/04.0TDLSB] – cfr. fls. 888-892, do PA.

M) Em 28/01/2005 a Procuradoria-Geral Distrital de Lisboa excepciona a sua competência e remete os autos ao Ministério Público da Comarca de Benavente – cfr. fls. 897-900, do PA.

N) Em 01/06/2005 é proferido despacho do Ministério Público a remeter os autos à Polícia Judiciária Militar a fim de serem concluídas as diligências de investigação - cfr. fls. 903, do PA.

O) Entre 13/12/2005 e 30/10/2006 inquirição de duas testemunhas pela Polícia Judiciária Militar – cfr. fls. 921-993, do PA.

P) Em 22/11/2006 o Ministério Público profere despacho a solicitar a conclusão urgente das diligências de investigação e envio de relatório final atenta a iminência de decurso do prazo da prescrição – cfr. fls. 1003, do PA.

Q) Em 06/12/2006 a Polícia Judiciária Militar entrega o relatório final – cfr. fls. 1006- 1011, do PA.

R) Em 12/12/2006 foi deduzida acusação contra o ora A. A………….. pela prática, em co-autoria com C…………, de 8 crimes de peculato, 19 crimes de participação económica em negócio, 1 crime de peculato de uso e 1 crime de abuso de poder – cfr. fls. 1015-1082, do PA.

S) Os crimes de peculato de uso e de abuso de poder viriam a ser considerados prescritos, ainda antes do início do julgamento – cfr. fls. 1262, do PA.

T) No âmbito dos referidos autos o Ministério Público, em representação do Estado Português, deduziu pedido de indemnização civil contra os arguidos pedindo a sua condenação no pagamento ao Estado Português da quantia de € 133.728,97, acrescido do valor que vier a ser fixado em sede de liquidação da sentença e de juros legais vencidos e vincendos – cfr. fls. 1050-1080 do PA.

U) O A. exerceu as funções de Comandante do Campo de Tiro de ……….. entre 22 de Maio de 1992 e Março de 1995 – acordo.

V) Tendo como seu 2º Comandante, durante todo este período, o Tenente-Coronel C…………., co-arguido no processo-crime – acordo.

W) O Ministério Público deduziu acusação contra o A. e C…………., imputando ao A. os seguintes comportamentos/ omissões:

a) ter autorizado o pagamento de facturas para a construção de dois furos de captação de água, um no prédio denominado "………." e outro no "………." quando, no dizer da acusação, tais obras teriam sido realizadas no exclusivo interesse dos arrendatários (fls. 72, 73, 78 e 79);

b) ter autorizado o pagamento da construção de uma estrada para o "………..", sendo a mesma do exclusivo interesse do arrendatário (fls. 73 e 74);

c) ter fornecido e pago, pelo orçamento do CTA, 1.025 litros de gasóleo consumidos pelo gerador existente no "……….", entre 13.10.1994 e 31.03.1995, nos exclusivos interesses dos arguidos e do arrendatário (fls. 74 e 75);

d) ter vendido o rebanho do CTA sem para tal ter poderes - sem audição do Capitão ……., que seria obrigatória - beneficiando um dos concorrentes, quando a manutenção do rebanho seria mais vantajoso, economicamente, para a instituição (fls. 75 e 76);

e) ter cedido a título gratuito, ao Engº ………, uma pastagem com a área de 600 hectares, ovil e habitação para o pastor, por um período de três anos, no exclusivo interesse do arrendatário e contra os interesses do CTA, por este ter deixado de poder auferir uma renda portal cedência (fls. 77) – cfr. doc. nº 1 junto com a p.i..

X) O A. foi, também, acusado de:

a. ter celebrado com o arrendatário C………….. um protocolo para a construção, no "……….", de uma pista arenosa para treino de cavalos de corrida e outros com idêntica finalidade, sem ter competências próprias ou delegadas para o efeito (fls. 78);

b. ter assinado as Notas de Autorização de Despesa para pagamento à empresa ………… de um quadro eléctrico e proteção para um grupo gerador, bem como a instalação eléctrica e montagem de cabos até um furo de captação de água e outros acessórios de ligação à bomba, equipamentos instalados no "………." e na "………", cujas despesas, no dizer da Acusação, teriam sido efectuadas no exclusivo interesse dos arrendatários (fls. 78 e 79);

c. ter autorizado o pagamento da factura nº 22773, de 31.12.1992, à empresa ……., Lda, referente a materiais destinados ao furo de captação de água, obra que teria sido efectuada, repete-se, no exclusivo interesse dos arrendatários;

d. ter autorizado o pagamento da realização de obras de reparação no "………..", tal como consta do art 68), da acusação (fls. 81);

e. ter visado, favoravelmente, os Pareceres dados pelo 2º comandante para adquirir um grupo eletro bomba submersível, acessórios e respectiva montagem, bem como um coluna de suspensão para a eletro bomba e um sistema hidro-pneumático para abastecimento de água sob pressão, destinados ao furo de captação de água do "………..", tudo realizado no exclusivo interesse do arrendatário (fls. 82 a 84);

f. ter visado, favoravelmente, o Parecer dado pelo 2º comandante, para aquisição e montagem de um boca de incêndios para abastecimento de auto-tanques, a instalar no "………" (fls. 84);

g. ter "autorizado" o pagamento dos portões de acesso ao "………", tudo no exclusivo interesse do arrendatário;

h. ter realizado os consumos de gasóleo e óleo identificados no artº 102), da Acusação (fls. 87), nos geradores instalados no …………", custeados pelo CTA, no exclusivo interesse do arrendatário e dos arguidos, ou seja, também do Autor;

i. ter autorizado a troca de 24.200 m3 de saibro retirado de um fosso para instrução de tiro, por terra vegetal e barro gomoso, em menor quantidade e qualidade, sendo que esse saibro valeria entre 10.000$00 a 15.000$00 por camioneta (fls. 88);

j. ter autorizado a compra de diverso material de vedação, que viria a ser utilizado na construção de um canil, na moradia do CTA, atribuída ao 2º comandante (fls. 89) – cfr. doc. nº 1 junto com a p.i..

Y) Finalmente, o Autor viria a ser acusado de:

a. de se ter apropriado, conjuntamente com o 2º comandante, das verbas das facturas emitidas pela ………., Lda, (arts. 116) a 210), da Acusação - fls. 89 a 100 - que corresponderiam a serviços efectuados por pessoal do CTA, fora das horas de serviço permitindo, assim, que desviassem os montantes em causa em proveito próprio;

b. de ter cedido, em finais de 1993, ao seu filho, para utilização particular, a carrinha Renault 4L, com matrícula ……… (fls. 100 e 101), registada a favor do CTA, que viria a ficar destruída num acidente de viação, sem que a instituição fosse ressarcida dos prejuízos daí decorrentes - doc. nº 1 junto com a p.i..

Z) De acordo com a acusação, os arguidos “praticaram todas as supra descritas condutas em comunhão de esforço e de intenções. Os arguidos previram, quiseram e conseguiram, no exercício de funções de militares do Estado Português:

- fazerem seu, em proveito próprio e terceiro, de dinheiro e de objetos colocados sob o domínio público que lhe foram entregues e que lhe eram acessíveis em razão das suas funções,

- celebrar negócios, nomeadamente contratos de compra e venda, bem como de arrendamento e protocolos relativos interesses patrimoniais do Campo de Tiro de ……….. e do Estado Português com o propósito de obter, para si e para terceiro, participação económica ilícita relativamente a interesses patrimoniais que em razão da função, lhes competia administrar, fiscalizar e defender, vantagens essas de que fruíram;

- permitir que o filho do arguido A………… utilizasse a titulo particular veículo automóvel registado a favor do Estado Português, não obstante saberem que não podiam autorizar o uso do referido veículo, por o mesmo estar afecto ao uso dos militares do Campo de Tiro de ……….. e que lhes cabia administrar a utilização do referido veículo e guardá-lo;

- ordenar a militares que estavam sob a sua direção e comando a realização de trabalhos no interesse exclusivo dos arrendatários, apesar de saberem que a tal estes não se encontravam obrigados por não serem tais trabalhos realizados no interesse do Estado (fls. 101 e 102) – cfr. doc. nº 1 junto com a p.i..

AA) Em 26/11/2006, o A. não tinha averbada qualquer ocorrência, em termos de registo criminal (fls. 135) – cfr. doc. nº 1 junto com a p.i..

BB) Em 19 de Abril de 2007 teve início a audiência de julgamento – cfr. 1689- 1757, do PA.

CC) Em 09/07/2007 foi proferido Acórdão, tendo o A. e o co-arguido ………… sido absolvidos dos crimes de que vinham acusados e do pedido de indemnização civil – cfr. fls 1763-1812, do PA.

DD) No âmbito da referida decisão foram considerados provados os seguintes factos:

1. O Campo de Tiro de ………. situa-se a cerca de 5 Kms da vila de ………., contíguo à estrada nacional Barreiro - ……… do Extremo, na denominada ………..;

2. Inicialmente, o Campo de Tiro tinha a área de 1.680 Ha, com cerca de catorze Kms de comprimento, no sentido Oeste / Este e destinava-se, sobretudo, a ensaios de material de guerra;

3. A partir de 1954, o Campo de Tiro passa a ser utilizado, também, como carreira de tiro ar-solo e, em 1955, foram atualizadas as suas missões para estudos e ensaios de bocas de fogo, munições, explosivos e pólvoras, bem como treino dos pilotos da Força Aérea;

4. A partir da década de 80 o Campo de Tiro, que funcionava como órgão de apoio aos três ramos das forças armadas, viu serem alargadas as suas missões para ensaios de viaturas e realização de semanas de campo, daquelas forças e até de forças militarizadas;

5. Em finais de 1991, em resultado de um processo de alargamento, por expropriação, o Campo de Tiro passou a ter a área de 7.450 Ha, que resultou num alargamento do seu perímetro para cerca de 54 Kms;

6. Na área de terreno referida em 2, para além da zona utilizada para fins militares, permaneceram arrendadas várias parcelas de terreno, já do tempo da Companhia ………., destinadas a fins agrícolas e ocupando parte do perímetro exterior do Campo de Tiro, encontrando-se a mesma tratada (limpa e aceirada, em quadrícula de 500m x 500m) e com vias de acesso e pontos de reabastecimento de água colocados, de forma estratégica, para um mais eficaz combate a incêndios;

7. A nova área do Campo de Tiro, resultante da expropriação referida em 5, tinha elevado índice de florestação e de mato, com escassos acessos e confinava, numa grande extensão, com a EN 119;

8. As principais atividades desenvolvidas no Campo de Tiro são a prática/ensaio de tiro -terrestre e aéreo - envolvendo munições de alto calibre e potência e com zonas de proteção e segurança bastante exigentes;

9. O Campo de Tiro, em termos de comando de administração, esteve na dependência do exército, até 31 de Dezembro de 1993, passando para a dependência da Força Aérea, a partir de 01 de Janeiro de 2004, tendo sido, durante cerca de duas décadas, comandado pelo Sr Coronel ……….., oficial da Força Aérea Portuguesa (FAP);

10. O arguido A…………. exerceu as funções de Segundo Comandante do Campo de Tiro de ……….. desde 29 de Janeiro de 1992 e até ao dia 24 de Março de 1995;

11. O arguido C…………. exerceu as funções de Comandante do Campo de Tiro de ……….., desde o dia 22 de Maio de 1992 a finais de Março de 1995;

12. O Engenheiro Técnico Agrário, ………. era, até data não concretamente determinada de 1990, funcionário do Ministério da Agricultura e Pescas, tendo sido requisitado pelo Campo de Tiro de ……….. a partir dessa data para ficar responsável pela preservação da floresta e controlo das espécies cinegéticas do Campo de Tiro;

13. Em 19.11.91, foi celebrado um acordo, denominado de "contrato de arrendamento rural" entre o Campo de Tiro de ……….., representado pelo então comandante ……… e o Engenheiro Técnico Agrário ……….., relativamente ao prédio denominado "………….", pertença do Campo de Tiro, com a área de 250 hectares, descrito na CRP de ………. sob o nº 1150/061088, da freguesia de ………;

14. No âmbito desse acordo, foi declarado por ambas as partes que ajustavam entre si, um contrato misto de arrendamento e parceria agrícola, destinando-se os terrenos referidos à produção agro-pecuária, pelo prazo de dez anos, com início a 01.11.91, mediante o pagamento, pelo Eng. …….., da renda anual de Esc. 150.000$00 e 10% das crias da produção, que passam a ser pertença do Campo de Tiro, com a sua manutenção a cargo do Eng. ……;

15. Nesse acordo, foi ainda estipulado, que o Eng. …….. obrigava-se a efetuar os seguintes trabalhos: Conservação das vedações existentes; Limpeza de matos para instalação de pastagens; Manutenção das linhas de água; Manutenção das construções existentes nos terrenos que sejam complementares ou acessórias da exploração agro-pecuária;

16. Nos termos da cláusula sétima, desse acordo, o Campo de Tiro, através dos seus serviços florestais e agrícolas, colaboraria com maquinaria disponível na implantação de aceiros e pastagens na área referida, e demais conteúdo concreto constante de fls. 23-24 do Anexo 1, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido;

17. Em 5.06.92, foi executado um furo para captação de água no prédio denominado "………..", tendo para o efeito sido celebrado um contrato entre o Campo de Tiro e a sociedade comercial "………., Lda.";

18. Em 26.05.92, foi também realizado um furo para captação de água, no terreno do Campo de Tiro, denominado de "………..", tendo para o efeito sido celebrado um contrato entre o Campo de Tiro e a sociedade comercial "………, Lda";

19. O valor de custo desses furos foi, no total, de Esc. 1.920.380$00, o qual foi fraccionado em três recibos, correspondendo a cada um deles, respectivamente, Esc. 910.310$00; Esc. 505.035$00; e Esc. 505.035$00;

20. Para realização dos referidos furos de captação de água, foi realizado um ensaio prévio que importou a quantia de Esc. 46.110$00, valor que foi pago pelas dotações do Campo de Tiro;

21. O arguido C…………. requisitou a provisão para pagamento das despesas referidas em 19 e 20, e o arguido A………… assinou as notas de autorização de despesa, tendo tais valores sido pagos pelo orçamento do Campo de Tiro;

22. Em data não concretamente determinada, mas entre 19.11.91 e 15.12.92, foram executadas obras de beneficiação da estrada em terra batida de acesso ao prédio denominado "……….", pelo Regimento de Engenharia n.° 1, no valor de Esc. 600.000$00, montante que foi requerido pelo arguido A……….. às dotações do Campo de Tiro e foi pago pelo orçamento deste Campo de Tiro;

23. Nesse período temporal, foram também realizadas obras de beneficiação na estrada em terra batida do acesso a uma zona do campo do Tiro, denominada …….., e que também dava acesso à "…………";

24. Na data referida em 12, no prédio denominado "………." encontrava-se um gerador de matrícula ………, com motor Pitter PJ4W, Alternador Stamford C20B e Potência 27,5 KVA;

25. No período do 13.10.94 a 31.03.95, foi consumido pelo referido gerador, 1025 litros do gasóleo, o qual foi fornecido o pago pelo orçamento do Campo do Tiro, tendo sido, pelo menos, em parte, despendido para as atividades do próprio Campo do Tiro, nomeadamente, na recepção de convidados para almoços e caçadas;

26. Em 18.10.84, o arguido A………… proferiu um despacho, no qual consta que o Sector Agro-Pecuário e Florestal, chefiado pelo Eng. ……., estava obrigado a permutar o efetivo de 381 ovelhas e 15 carneiros por borregos em fase do abate (com 8 a 10 quilos do peso, mortos), com entregas faseadas,

27. Para prosseguir esse objectivo, em 25.10.94, foram enviadas propostas a quatro indivíduos para se proceder à venda do citado rebanho, sendo um dos concorrentes o próprio Eng. ………, e essas propostas referiam que as ofertas poderiam ser realizadas em dinheiro ou espécie, não se especificando a forma de permuta do rebanho em espécie;

28. Na sequência disso, surgiram três propostas, sendo uma de ………, residente na ………. de Esc. 2.400.000$00; outra de ……….., residente na ………, do Esc. 2.440.000$00, o outra do Eng. ……, residente em ………., de aquisição das 381 ovelhas o 15 carneiros com a entrega faseada durante 3 anos (1995,1996 e 1997) do 360 borregos em fase de abate;

29. O arguido A…………. autorizou e aceitou a proposta apresentada pelo Eng. ……..;

30. O Eng. …….. tinha conhecimento prévio de que o Campo de Tiro pretendia a permuta do efetivo de gado ovino e caprino por borregos, por desempenhar as funções de Técnico Responsável pelo Sector Agro-Pecuário e Florestal do Campo de Tiro de ……….;

31. Neste processo, não foi realizado qualquer estudo económico prévio e não foi solicitado parecer ou intervenção, nem disso teve conhecimento o Comandante da Esquadrilha de Administração e Intendência do Campo de Tiro de ……….;

32. O arguido A…………, por despacho de 02.12.94, cedeu pastagem, a título gratuito, por um período de três anos (1995 a 1997) numa área de 600 hectares, ao Eng. ……. e foi cedido, também a título gratuito, a área de ovil e habitação para o pastor, por um período de 3 anos;

33. Em 28.04.92, o arguido C…………, na qualidade de Comandante Interino do Campo de Tiro de ……….. e como primeiro outorgante, e …………., filho do arguido, como segundo outorgante, celebraram um acordo escrito, denominado de "contrato de arrendamento", relativo ao prédio rústico denominado "………….", pertença do Campo de Tiro, descrito na CRP de ………., sob o n.° 1150/061088, com a área de 206 hectares;

34. No âmbito desse acordo, foi declarado por ambas as partes que ajustavam entre si, um contrato misto de arrendamento e parceria agrícola, destinando-se os terrenos referidos a produção agro-pecuária, pelo prazo de vinte e cinco anos, com início a 01.05.92, mediante o pagamento, por C…………, da renda anual de Esc. 206.000$00;

35. Nesse acordo, foi ainda estipulado, que C…………… obrigava-se a efetuar os seguintes trabalhos: Conservação das vedações existentes; Limpeza de matos para instalação de pastagens; Manutenção das linhas de água; Manutenção das construções existentes nos terrenos que sejam complementares ou acessórias da exploração agro-pecuária;

36. Em 08.02.94, foi celebrado um protocolo entre o Campo de Tiro de ……….., representado pelo arguido A…………., e o arrendatário C…………., com vista à concretização de uma pista arenosa para o treino de cavalos de corrida e outros com idêntica finalidade;

37. Em data não concretamente determinada, mas entre 28.04.92 e 17.10.92, foram executadas obras de beneficiação da estrada em terra batida de acesso ao prédio denominado "………….", no valor de Esc. 930.000$00, montante que foi requerido e autorizado o pagamento, pelo arguido C………….. às dotações do Campo de Tiro e foi pago pelo orçamento deste Campo de Tiro;

38. Em data não concretamente determinada mas entre 28.04.92 e 05.01.93, foram executadas obras de beneficiação de uma pista arenosa no ……….., no valor de Esc. 1.170.000$00, montante que foi requerido e autorizado o pagamento pelo arguido C………… às dotações do Campo de Tiro;

39. Em data não concretamente determinada, mas entre 28.04.92 e 31.12.92, foi adquirido à sociedade comercial "…………." os seguintes equipamentos destinados a serem montados no furo de captação de água: - um quadro eléctrico de comando e proteção para o grupo gerador 23 KVA e bomba de 4 CV com sondas, bem como uma instalação eléctrica na casa do grupo e montagem de cabos até ao furo, no valor de 354.727$00; e -um conjunto de acessórios de ligação à bomba, composto por diverso material, no valor de 408.660$00;

40. O valor desse equipamento foi pago em 6 de Julho de 1994 e os custos da aquisição do mesmo foi suportada por dotações do Campo de Tiro, despesa essa com parecer favorável do arguido C………… e aprovada pelo arguido A………….;

41. Em data não concretamente determinada mas entre 28.04.92 e 17.10.92, foram adquiridos diversos materiais à sociedade comercial "…….., Lda." para o supra identificado furo de captação de água;

42. Para pagamento desse equipamento foi emitida, por esta sociedade comercial, a factura n.° 22773 de 31.12.92, no montante de Esc. 401.744$00, valor que foi pago pelo orçamento do Campo de Tiro, tendo o arguido A……….. autorizado o seu pagamento, tendo sido emitido o respectivo recibo com o n° 22724, com data de 31.12.02;

43. Em data não concretamente determinada de Dezembro de 1992, foram realizadas obras no "………", nomeadamente a substituição do telhado em chapa por telhas, incluindo montagem de barrotes e ripas em madeira para aplicação da telha e reparação de três vigas partidas, tratamento e aplicação de cuprinol de todo o madeiramento do telhado, substituição de caleiras antigas, reparação do vigamento e parede exterior e reparação da estrutura para implantação do grupo gerador, no montante total de Esc.928.000$00, tendo sido emitida a factura n.° 84, datada de 30.12.02, despesa essa cujo pagamento foi autorizado pelo arguido A………….;

44. Em data não concretamente determinada do ano de 1994, foi executado um furo de pesquisa e captação de água pela sociedade comercial "…………, Lda.", no prédio denominado "…………", no montante de Esc. 2.022.344$00, correspondendo à factura n.° 453, emitida por aquela sociedade comercial;

45. Para a atribuição dessa obra, foi realizado o concurso limitado n.° 27/94, tendo o arguido C…………. dado o seu parecer administrativo e o supra referido montante foi pago pelo orçamento do Campo de Tiro, tendo sido emitido o recibo n.° 442 daquela sociedade comercial;

46. Em data não concretamente determinada do ano de 1994, o arguido C………….. deu o seu parecer favorável no âmbito do processo administrativo de consulta n.° 32/94 relativamente à aquisição de um grupo eletro-bomba submersível destinado a ser montado no furo de captação de água e respectiva instalação no prédio denominado "………..", no montante de Esc. 831.156$00;

47. O arguido A………… apôs o seu visto no supra referido parecer administrativo de consulta;

48. O supra identificado grupo eletro-bomba submersível foi montado pela sociedade comercial "……….", pelo montante de Esc. 442.656$00, valor que foi pago pelo orçamento do Campo de Tiro;

49. Em data não concretamente determinada do ano de 1994, o arguido C………….. deu o seu parecer favorável no âmbito do processo administrativo de consulta n.° 31/94 relativamente à aquisição de uma coluna de suspensão para eletro-bomba submersível, acessórios e respectiva montagem no furo de captação de água, no montante de Esc. 442.656$0O, a ser instalado no prédio denominado "……….", valor que foi pago pelo orçamento do Campo de Tiro;

50.O arguido A………….. apôs o seu visto no supra referido parecer administrativo de consulta.

51. Em data não concretamente determinada do ano de 1994, o arguido C………… deu o seu parecer favorável no âmbito do processo administrativo de consulta n.° 41/94 relativamente à aquisição de um sistema hidropneumático para abastecimento de água sob pressão, no montante de Esc. 359.000$00, a ser instalado no prédio denominado "………..", valor que foi pago pelo orçamento do Campo de Tiro;

52. O arguido A………… apôs o seu visto no supra referido parecer administrativo de consulta.

53. Em 22.09.94, o arguido C………….. deu o seu parecer favorável no âmbito do processo administrativo de consulta n.° 37/94 relativamente à aquisição e montagem de uma boca de incêndios para abastecimento de auto-tanques, no montante de Esc. 373.224$00, a ser instalado no prédio denominado “………..”, valor que foi pago pelo orçamento do Campo de Tiro;

54. O arguido A…………. apôs o seu visto no supra referido parecer administrativo de consulta;

55. Em 20.02.95, foi lançado o processo administrativo de consulta n.° 10/95, com vista à aquisição e reparação de diversos portões do Campo de Tiro de ……….., no âmbito dos quais se encontrava o portão de acesso ao prédio denominado "……….";

56. A aquisição dos portões de acesso ao "………." e construção dos respectivos apoios foi adjudicada a ……….., pelo valor de Esc. 128.700$00, o qual foi pago pelo orçamento do Campo de Tiro;

57. Em 08.02.94, foi estabelecido um protocolo entre o Campo de Tiro de ………., representado pelo arguido A………….., e C…………..;

58. Nesse protocolo foi consignado que: O Campo de Tiro de ………… apoiará a concretização da pista arenosa própria para o treino de cavalos de corrida, já projetada na zona arrendada, bem como a utilização de aceiros e caminhos arenosos existentes no Campo de Tiro de …………; - O Campo de Tiro de ………… fornecerá a energia eléctrica indispensável à iluminação noturna das infra-estruturas da zona, bem como ao funcionamento do sistema de abastecimento de água, utilizada não só pelo rendeiro, mas também para o reabastecimento de água a carros de combate a incêndios; - para tal, manterá um Grupo Gerador de apoio e concretizará o futuro transporte de energia eléctrica através do lançamento de um cabo e de um posto de transformação; - logo que concretizado o transporte por cabo eléctrico, a energia consumida em proveito próprio do rendeiro será contabilizada através de um contador específico;

59. O tosco da pista arenosa própria para o treino de cavalos de corrida e os trabalhos de beneficiação das estradas de acesso ao "………." foram executados por pessoal do regimento de Engenharia n.°1 do Campo de Tiro de ………., por ordem dos arguidos;

60. Em datas não concretamente determinadas dos anos de 1992 e 1995, foram realizadas limpezas a caminhos e lenhas secas existentes no "……….." com máquinas do Campo de Tiro, por ordem dos arguidos;

61. O custo das horas de trabalho das máquinas não deu entrada na Tesouraria da Secção Financeira do Campo de Tiro;

62. No "……….", existia, desde 1992, um gerador com a matrícula …….. com motor VM/104, Alternador Stamford C20B e potência 25 KVA, o qual avariou em data não concretamente determinada de Janeiro de 1993;

63. A reparação desse motor foi realizada na ……….., S.A., em 29.06.94, tendo o seu custo atingido o montante de Esc. 1.787.595$00;

64. Para substituir o gerador referido em 62, o Campo de Tiro instalou o gerador de matrícula ……….., com motor Pitter PJ4W, alternador Stamford C20B e potência 27,5 KVA;

65. Após a reparação, conforme referido em 63, o gerador foi reinstalado;

66. Em data não concretamente determinada de Janeiro de 1995, partiu-se a cambota do identificado gerador de matrícula ………., e em data não concretamente determinada de Fevereiro de 1995, foi esse gerador substituído pelo Campo de Tiro, pelo gerador de matrícula ………., com motor Deutz, A4L514A, Alternador Pillet DK 288-4/7 + KD 304/116 e potência 30 KVA;

67. Relativamente a estes geradores, no período de tempo compreendido entre 25.07.94 a 07.04.95, foram registados os consumos de gasóleo, no global, de 9.625 litros e de óleo, no total, de 140 litros;

68. Os geradores instalados no ………. foram abastecidos com gasóleo agrícola que era atribuído ao campo de Tiro de ………. com recurso a subsídios comunitários ou, na sua falta, com gasóleo adquirido pelo Campo de Tiro;

69. Os consumos de gasóleo agrícola eram autorizados pelo arguido C………….;

70. Em datas não concretamente determinadas de Agosto e Setembro de 1994, numa zona localizada a Sul dos prédios denominados "…………” e "……….", pertença do Campo de Tiro, por ordem do arguido C…………. foi aberto um fosso com as dimensões aproximadas de 200 metros de comprimento por 45 metros de largura e 2 metros de altura, tendo dali sido retirado saibro na quantidade total de cerca de 24.200 metros cúbicos, que foi posteriormente transportado, por número não concretamente determinado, mas superior a duzentos carregamentos de camioneta;

71. Cada volume de saibro transportado por cada camioneta valia, à data do seu transporte, entre Esc. 10.000$00 e Esc. 15.000$00;

72. Em contrapartida da realização dos trabalhos para abertura desse fosso e retirada do saibro respectivo, as referidas camionetas transportavam para o …….. terra vegetal e barro gomoso;

73. Em 12.01.95, foi lançada a consulta n.° 7/95 com vista à aquisição de diverso material para vedação e foi aceite, para o efeito, a proposta da sociedade comercial "………., Lda.", no valor de Esc. 439.325$00, tendo o parecer administrativo sido dado pelo arguido C………….. e autorizado o pagamento pelo arguido A………….;

74. Do referido material, foram utilizados 110 paus e 400 metros de rede, no montante total de Esc. 302.649$00, para a construção da vedação de um canil na moradia do Campo de Tiro atribuída ao arguido C…………;

75. À data em que os arguidos assumiram o comando do Campo de Tiro existiam várias pessoas civis, incluindo o pastor, que prestavam serviço regular ao Campo de Tiro, pelo menos, há mais de 10 anos, mas que não tinham regularizada a situação em termos de vínculo contratual;

76. O pagamento dos vencimentos dessas pessoas fazia-se com verbas do Campo Tiro, mediante mapas de controle efectuados pelo serviço dirigido pelo Eng. …….., validados depois pelos arguidos, para que fossem disponibilizadas as verbas respectivas;

77. Este procedimento para pagamento dos trabalhos dessas pessoas foi praticado no Campo de Tiro, durante muitos anos e os arguidos limitaram-se a seguir o mesmo;

78. A partir de Junho de 1992, por diretivas emanadas do Comando da FAP, o Campo de Tiro deixou de poder apresentar as despesas com o pessoal civil, sem contrato ou com contratos sem possibilidade de renovação;

79. O pessoal em causa era indispensável para atividades no Campo de Tiro, consideradas importantes para o cumprimento da missão em curso e, nessa altura, o Campo de Tiro, era alvo de alguma contestação por parte das populações vizinhas, devido a um incêndio de grandes proporções que tinha ocorrido e os arguidos consideraram que não era uma boa altura para "dispensar" pessoas com um longo passado de colaboração com a instituição, abrindo uma nova frente de crispação;

80. Por isso, entenderam os arguidos que a melhor solução seria manter as pessoas a trabalhar no Campo de Tiro, encontrando-se uma solução para dar cobertura contabilística à saída das verbas correspondentes aos salários;

81. Assim, foram consultadas algumas empresas, tendo a "………" aceite facturar as verbas correspondentes aos ordenados desses trabalhadores, emitindo as facturas correspondentes aos serviços efetivamente prestados pelos mesmos ao Campo de Tiro e procedendo este ao pagamento real desses valores aos respectivos trabalhadores;

82. A contabilidade mensal relativa a esses trabalhadores era executada pelo Eng. ……, confirmada pelo arguido A…………. e apresentada, mensalmente, ao arguido C…………., que validava os mapas para pagamento;

83. Dessa forma, e para efeitos contabilísticos, a "……….." emitiu as facturas respectivas, correspondentes ao valor pago pelo Campo de Tiro aos referidos trabalhadores, concretamente, em 31.08.92, emitiu a factura n.° 00570 B, relativa à colocação de 2.000 metros de vedação na zona da escadaria, do Eucaliptal da Companhia …….., Secção G21, adjacente à zona do arrendamento da ………, no valor de Esc. 928.000$00;

84. Em 01.10.92, emitiu a factura n.° 00581 B, referente à colocação de 1.800 metros de vedação no prédio denominado "………." no valor de Esc. 916.400$00;

85. Em 30.11.92, emitiu a factura n.° 00591 B relativa à colocação de 2000 metros de vedação na Zona do eucaliptal da ………, no valor de Esc. 928.000$00;

86. Em 29.12.92, emitiu a factura n.° 00617 B, relativa à colocação de 2.000 metros de vedação na zona de ………. e ………., no valor de Esc. 928.000$00;

87. Em 31.08.92, emitiu a factura n.° 00571 B, relativa a eliminações de mato por gradagem (duas passagens) de grade de disco semi-pesado, no valor de Esc. 928.000$00;

88. Em 01.10.92, emitiu a factura n.° 00582 B, relativa a eliminações de mato por gradagem (duas passagens) de grade de disco semi-pesado", no montante de Esc. 918.720$00;

89. Em 29.12.92, emitiu a factura n.° 00618 B, relativa a eliminações de mato por gradagem (duas passagens) de grade de disco semi-pesado", no montante de Esc. 916.400$00;

90. Em 31.12.92, emitiu a factura n.° 00619 B, relativa a eliminações de mato por gradagem (duas passagens) de grade de disco semi-pesado, no montante de Esc. 928.000$00;

91. De igual modo, no ano de 1993, de forma a continuar com os trabalhos dos supra referidos trabalhadores civis, em data não concretamente determinada do ano de 1993 mas anterior 8 de Maio, foi aberto processo administrativo para a realização de obras de desmatação e aceiramento numa área de cerca de 20 hectares;

92. Nessa sequência, o arguido A…………. lançou processos de consulta às sociedades comerciais, Sociedade ………, Lda; ……….., Lda. e ……….., Lda, as quais tem sócios comuns;

93. A sociedade comercial vencedora foi a …………, Lda, que emitiria as facturas, nos termos referidos em 81 e 83;

94. Nessa sequência, a ………., em 28.10.93, emitiu a factura n.° 657 B, no valor de Esc. 922.200$00; emitiu a factura n.° 658 B, no valor de Esc. 916.400$00; emitiu a factura n.° 659 B, no valor de Esc. 916.400$00; emitiu a factura n.° 661 B, no valor de Esc. 928.000$00; emitiu a factura n.° 660 B, no valor de Esc. 928.000$00;

95. Em 15.11.93, emitiu a factura n.° 667 B, no valor de Esc. 928.000$00;

96. Em 19.11.93, emitiu a factura n.° 668 B, no valor de Esc.916.400$00;

97. Em 23.11.93, emitiu a factura n.° 669 B, no valor de Esc. 928.000$00;

98. Relativamente a todos os valores das facturas referidas em 83 a 90 e 94 a 97, requisição compromisso foi assinada pelo arguido C…………. e a nota de autorização de despesa foi assinada pelo arguido A…………. e os valores correspondentes foram debitados no orçamento do Campo de Tiro e foram entregues aos trabalhadores que realizaram esses serviços;

99. O arguido A…………, entendeu a sua missão de comandar o Campo de Tiro, e elegendo, entre outras, como tarefas prioritárias, a vedação do seu perímetro, tendo em vista impedir ou evitar a intrusão de estranhos; e a vigilância de detecção de fogos na área do mesmo, bem como seu combate, atenta a sua habitual deflagração, sobretudo com tempo seco, por força das atividades desenvolvidas e da enorme mancha florestal contígua;

100. Para concretização desses objectivos, o arguido A…………., propôs, entre outros, proceder à obtenção de viaturas de combate a incêndio, por parte do Campo de Tiro, bem como a manutenção da sua operacionalidade; obtenção de meios de comunicação para as referidas viaturas; limpezas (desmatações), realização de aceiros e melhoramento de caminhos interiores para intervenção rápida e segura de meios; garantir posições estratégicas de abastecimento de água, com respectivo equipamento; equipar o furo de ………. com um motor de trator; instalação de um posto de vigia, durante o Verão, para detecção de incêndios, situado na torre de aeronáutica, com equipamento de comunicações cedido pelos serviços florestais, realizar patrulhamentos exteriores, cumprindo ordens da RML; construção da barragem de ……..; instalação de linha eléctrica para o ……….; manutenção da política de arrendamentos das zonas periféricas do Campo de Tiro;

101. Relativamente ao seu comando, o arguido A…………. subscreveu o relatório de posse, datado de 14.07.92, junto aos autos no apenso V, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, o qual foi apresentando aos seus superiores hierárquicos;

102. No dia 08 de Julho de 1992, na sequência de ensaios com espoletas em bombas reais de 250 kg, deflagrou um incêndio no Campo de Tiro, que durou três dias, tendo sido realizado o respectivo relatório, no qual se mencionou a falta de viaturas de combate a incêndio e a necessidade de realizar o aceiramento do terreno e que o Campo de Tiro, cerca de 2 meses antes, já havia avançado com a abertura de dois furos para captação de águas em pontos estratégicos, por forma a evitar grandes deslocações dos meios móveis, bem como a compra de bombas e instalação de geradores, conforme consta de fls. 1369-1374, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido;

103. Esse incêndio obrigou à intervenção de várias corporações de bombeiros da região e de meios aéreos, sendo que o Campo de Tiro não dispunha de nenhuma viatura operacional de combate a incêndios, nem comunicações no terreno, nem pessoal especializado, e o reabastecimento dos bombeiros implicava deslocações médias de 20 Kms;

104. Ainda no ano de 1992, ocorreu um outro incêndio, na nova área expropriada, confinante com a EN 119;

105. Os furos referidos em 17, 18 e 44, foram colocados em locais estratégicos do Campo de Tiro, na área resultante do processo de expropriação referido em 5, o que permite um mais fácil acesso das viaturas dos bombeiros e menor dispêndio de tempo, nos reabastecimentos;

106. A construção desses furos e a aquisição dos geradores e equipamentos para enchimento de auto tanques dos bombeiros foram efectuados para execução de uma estratégia pré-definida de segurança interna, para detecção e combate de incêndios do Campo de Tiro;

107. A data da posse do Comando dos arguidos, e na área referida em 2, já existia um poço e um outro furo no Campo de Tiro, sito em …………, sendo a questão da detecção e combate a incêndios, era uma preocupação dos anteriores comandos;

108. Com o mesmo propósito de facilitar o combate aos incêndios, o arguido C…………. promoveu o início da construção de uma barragem perto de ………., a qual foi concluída após o arguido ter deixado o comando do Campo de Tiro;

109. Anteriormente à construção dos furos referidos em 18 e 19, as propriedades denominadas "……….." e "……….", já possuíam água própria com poços e depósitos, suficientes à sua exploração normal para a agro-pecuária;

110. As obras de beneficiação dos caminhos referidos em 22, 23, 37 e 38, foram realizadas com o mesmo objectivo de facilitar o acesso rápido de viaturas dos bombeiros aos referidos furos de captação de água e, nessa altura, foram melhorados todos os acessos à nova área expropriada, por necessidades operacionais do Campo de Tiro;

111. O "……….." confronta com a estrada nacional nº119, para onde tem saída direta;

112. O Campo de Tiro, por falta de instalações condignas próprias, utilizava a propriedade denominada "………”, mesmo depois de arrendada, com regularidade não determinada em concreto, para a realização de almoços e recepções oficiais; eventos desportivos e encontros de caça, para convidados;

113. Os custos de construção dos referidos furos, a realização de ensaios e a aquisição dos vários equipamentos necessários ao seu correto funcionamento, bem como as obras de beneficiação dos caminhos de acesso aos mesmos, foram realizados no interesse do Campo de Tiro e em execução de políticas anteriormente definidas e expressas no Relatório de Posse do arguido A…………., podendo os rendeiros deles ter beneficiado, reflexamente, nomeadamente na utilização da água proveniente dos furos;

114. Por forma a evitar avarias já sucedidas com equipamentos anteriores, na carta relativa ao envio do relatório final apresentado pela sociedade "………" destinado à realização do furo referido em 18, foi informado por essa sociedade ao Campo de Tiro que "...é conveniente que a captação funcione todos os dias, face à qualidade química da água captada, isto é, "água francamente mineralizada, agressiva, quimicamente potável";

115. Mesmo não funcionando diariamente, os geradores obrigavam, por razões de manutenção, à sua frequente utilização, de forma a manter ativos os furos e todo o gasóleo gasto nestas operações era-o no interesse do Campo de Tiro;

116. A realização do furo referido em 44, resultou da total inoperacionalidade do furo que primeiro ali foi aberto e referido em 18;

117. A reparação do telhado e a aquisição e reparação dos portões referidos em 44 e 56 dos factos provados foram realizadas para impedir a continuação da degradação do referido pavilhão e evitar a intrusão no Campo de Tiro de estranhos, tendo sido a reparação do portão do "………", nos termos em que o foi, por se pretender respeitar a traça arquitectónica existente, da altura em que essa propriedade pertencia à Companhia ……..;

118. A vedação do perímetro do Campo de Tiro, foi realizada por razões de segurança do próprio campo, de forma a evitar a intrusão de estranhos no mesmo;

119. O arguido A…………. promoveu a venda do rebanho, nas condições referidas em 26 a 32, após parecer da comissão de análise, presidida pelo Cap. ……, que considerou a proposta do Eng. ……. a mais vantajosa;

120. O arguido A……….. aceitou a proposta do Eng. ……., conforme referido em 29, por ter considerado a mesma mais vantajosa, pois contribuía com 360 borregos, em três anos, que valeriam, no total, cerca de € 10.800 e mantinha 157 cabeças, como efectivo registado no Campo de Tiro, permitindo receber o subsídio do INGA, durante 3 anos, no montante de € 13.467,54.

121. O motivo que determinou a necessidade de venda do rebanho residia na impossibilidade de manter a situação laboral do pastor que, como outro pessoal civil, trabalhava para o Campo de Tiro e era pago pelo Orçamento respectivo, mas não estava integrado no quadro de pessoal respectivo;

122. O arguido A……….. teve indicações superiores para resolver o problema de "desvinculação" de todo o pessoal civil do Campo de Tiro, naquela situação, incluindo o pastor, que auferia € 349,16;

123. Na fase de consultas para a venda do rebanho, o Eng.º …… foi confrontado com a necessidade de assumir o encargo do pastor, situação que aceitou, nas condições referidas em 28;

124. O arguido A…………. procedeu à cedência das pastagens, do ovil e da casa do pastor, conforme referido em 33, por permanecerem, durante os três anos em causa, 157 efetivos do rebanho pertença do Campo de Tiro, incluindo-se na contrapartida negocial efectuada;

125. O protocolo celebrado com o arrendatário "……….." e referido em 37, inseria-se numa política de valorização e arrendamento dos espaços periféricos, visando potenciar a segurança, quer em termos de vigilância a incêndios, quer dissuadindo a intrusão de estranhos;

126. E o aí prometido apoio à concretização de uma pista arenosa, decorrida do facto da mesma passar a ser utilizada tanto para treino dos cavalos do arrendatário, como para teste das viaturas que se deslocavam ao Campo de Tiro, para esse efeito, uma vez que seria a única adequada ao efeito;

127. O Campo de Tiro não chegou a realizar quaisquer obras de construção para essa pista, tendo apenas sido feita uma movimentação de terras, que deixou em aberto um fosso, que se permitiu aproveitar para ensaios/testes das viaturas militares e, também, para atividade do treino de cavalos;

128. As limpezas dos caminhos e retirada das lenhas secas referidas em 60, foram-no de acordo com o planeamento dos Serviços Agro-Florestais, e, por isso, não foram contabilizadas, conforme referido em 61, o que era procedimento habitual, por se tratar de uma atividade corrente no Campo de Tiro;

129. O fosso referido em 70, foi aberto por o Campo de Tiro precisar construir uma carreira de tiro, com as dimensões de 200m x 45 x 2, destinada a instruendos que frequentavam as semanas de campo e na fase final da recruta, libertando a carreira de tiro esquerda de aeronáutica das limitações em termos de coordenação e da segurança dos utilizadores;

130. De acordo com o relatório elaborado pela Direção de Infra-Estruturas da FAP, em termos estimativos, o volume de inertes retirado desse fosso, corresponderia a 24.200 m3; o custo da escavação e transporte a vazadouro seria entre 800$00 a 1.000$00 / m3, e o material retirado teria um valor de 150$00/m3, pelo que essa obra custaria Esc. 19.360.000$00 e o valor do saibro retirado seria de Esc. 3.630.000$00;

131. O "……….." é constituído por montado de sobro, sendo a cortiça retirada dos mesmos, pertença do Campo de Tiro e não possui qualquer aptidão agrícola, mas era apto à atividade pretendida pelo filho do arguido C…………., constituindo um factor acrescido a confiança mútua, atento os principais objectivos do arrendamento periférico dos terrenos do Campo de Tiro, em termos de segurança contra intrusos e na detecção atempada de incêndios;

132. Para concretização deste objectivo, o arrendatário obrigou-se à instalação de um telefone, no Monte, para reportar todas as situações de emergência que detectasse;

133. Os arguidos são cidadãos exemplares, respeitados pais de família, considerados pelo que com eles privam e que os conhecem;

134. E foram, militares reputados, com excepcional desempenho profissional, reconhecidos pela instituição que serviram;

135. Em 10.02.92, foi atribuído ao arguido …., um louvor, pela FAP, por vários serviços prestados, referindo-se os seus méritos para ter sido chamado a colaborar, entre outros, na reestruturação do Campo de Tiro de ………. e foi-lhe atribuído outro louvor, pela FAP, em 15.11.94, por desempenho das suas funções;

136. O arguido A……….., já após a realização da inspeção à sua ação de comando foi nomeado para o curso de Brigadeiro, o que só acontece nos casos de evidente reconhecimento do mérito e capacidade dos nomeados;

137. E desempenhou, a partir de 1992, as funções de Delegado Nacional da …….., organismo que pertence à NATO;

138. O arguido A………… encontra-se reformado da FAP, com a patente de Coronel, auferindo € 2.500,00 de pensão, mensalmente;

139. Vive com a mulher, em casa própria;

140. Não tem antecedentes criminais;

141. O arguido ………… encontra-se reformado da FAP, auferindo € 4.000,00 mensais, ilíquidos, de pensão;

142. Vive sozinho, em casa adquirida, mediante empréstimo bancário;

143. Não tem antecedentes criminais. – cfr. doc. nº 2, junto com a p.i..

EE) Não se provou que:

1. Os furos de captação de água e respectivos estudos prévios referidos em 17, 18 e 44 dos factos provados, foram realizados no exclusivo interesse do arrendatário;

2. As obras de beneficiação das estradas referidas em 22 e 23 dos factos provados, foram realizadas no interesse exclusivo do arrendatário do prédio denominado "………";

3. Os consumos de gasóleo e óleo do gerador referido em 25 dos factos provados, foram-no nos exclusivos dos arguidos e do arrendatário;

4. No processo destinado à alienação do rebanho, era obrigatório o conhecimento e a audição do Comandante da Esquadrilha e Intendência do Campo de Tiro;

5. A manutenção do rebanho seria mais vantajoso economicamente para o Campo de Tiro de …………;

6. A cedência, a título gratuito, da pastagem, área de ovil e habitação para o pastor referida em 32 dos factos provados, foi contra os interesses do Campo de Tiro de ………….. e foi realizada no exclusivo interesse do arrendatário Eng. ……;

7. O arguido C…………. celebrou o contrato referido em 33 dos factos provados, contra os interesses do Campo de Tiro e no interesse exclusivo do arrendatário;

8. As obras de beneficiação da estrada e pistas referidas em 37 e 38 dos factos provados, foram realizadas no interesse exclusivo do arrendatário do prédio denominado "………";

9. O grupo eletro-bomba, coluna de suspensão e sistema hidropneumático referidos em 48,49 e 51 dos factos provados, foram colocados no respectivo furo de água no exclusivo interesse do arrendatário do prédio;

10. A aquisição dos portões referidos em 56 dos factos provados, foi realizada no exclusivo interesse do arrendatário do "……….";

11. O gerador referido em 62 dos factos provados, foi colocado nos termos aí referidos, em cumprimento do protocolo aludido em 57 dos factos provados;

12. O arguido C………… não elaborava a documentação de requisição e ordem de entrega referente aos consumos de gasóleo aludidos em 69 dos factos provados;

13. A utilização dos geradores e os consumos de gasóleo e óleo dos mesmos, conforme referido em 62 a 69 dos factos provados, foram realizados no exclusivo interesse do arrendatário e dos arguidos;

14. No "………." existia uma linha de tiro identificada com o número 4 e que a utilização da mesma foi abandonada na data da celebração do protocolo referido em 58 dos factos provados, tanto a nível diurno como noturno;

15. Nessa linha de tiro não existem infra-estruturas que necessitem de alimentação eléctrica, pois todo o conjunto de infra-estruturas existentes não tem utilização, nem existem infra-estruturas para holofotes de vigilância;

16. Os arguidos fizeram seus os valores constantes das facturas referidas em 83 a 90 e 94 a 97 dos factos provados;

17. Os arguidos previram, quiseram e conseguiram, no exercício das suas funções de militares, fazerem seu, dinheiro e objetos colocados sob o domínio público e que lhe foram entregues em razão dessas funções;

18. Os arguidos previram, quiseram e conseguiram celebrar contratos de compra e venda, de arrendamento e protocolos relativos a interesses do Campo de Tiro ………. com o propósito de obter para si e para terceiro, participação económica nos mesmos. – cfr. doc. nº 2, junto com a p.i..

FF) A referida decisão transitou em julgado em 24/07/2009 – cfr. doc. nº 2, junto com a p.i..

GG) Os alegados ilícitos imputados ao A. e C………… foram do conhecimento geral na Força Aérea, sobretudo ao nível de oficiais e oficiais superiores, tendo causado enorme repercussão e alarido – cfr. depoimento das testemunhas ………, ……… e ……….

HH) Era do conhecimento público na Força Aérea que os arguidos eram suspeitos de um conjunto alargado de crimes, mas não era público o conteúdo do Relatório da Inspeção – cfr. depoimento das testemunhas ………, ………. e ………...

II) A inspeção ao Campo de Tiro de …………. decorreu entre fins de Maio e Junho de 1995, logo após a saída do Autor do comando e na vigência do comando do seu sucessor, o Coronel ………...– cfr. depoimento das testemunhas ……… e ………...

JJ) Na sequência da inspeção inopinada e como consequência das conclusões do relatório da mesma, a ação de comando do Autor foi objecto de um inquérito determinado pelo General Chefe do Estado Maior da Força Aérea, por despacho de 28/08/1995 – acordo/cfr. doc. nº 1, junto com a p.i., [fls. 232 e s.].

KK) Inicialmente foi nomeado como instrutor do inquérito o Brigadeiro ………. – cfr. depoimento das testemunhas ………. e ………...

LL) Tendo posteriormente passado a escrivão – cfr. depoimento da testemunha ………...

MM) E substituído pelo General ………, Inspetor-Geral da Força Aérea – cfr. depoimento das testemunhas ………. e …………..

NN) Até à decisão do processo-crime o Autor viveu uma situação de permanente angústia, sensação de injustiça e revolta pela incerteza da decisão da ação e dos seus efeitos nos familiares e amigos – cfr. depoimento das testemunhas ………...

OO) O Autor sentiu-se envergonhado e enxovalhado perante os seus pares no que respeita à apreciação do seu desempenho enquanto comandante do Campo de Tiro de …………. – cfr. depoimento das testemunhas ……….. e ………...

PP) A mulher do A. adoeceu em 1996, com uma doença incurável, da qual viria a falecer, em Dezembro de 2000 – cfr. doc. nº 5 e 6, juntos com a p.i..

QQ) O Autor era confrontado com a preocupação da sua mulher quanto ao futuro do processo, o que lhe provocava inquietação e sentimento de impotência – cfr. depoimento da testemunha ……….

RR) Os factos imputados ao Autor foram do conhecimento da generalidade dos militares do Campo de Tiro de ……….. e de outras unidades onde veio a prestar serviço, depois de abandonar o comando do Campo de Tiro de ……….. – cfr. depoimento da testemunha ………..

SS) O Autor sentiu-se incomodado no seu meio profissional e envergonhado com as acusações que lhe foram formuladas – cfr. depoimento da testemunha ……..

TT) À data da absolvição do Autor, a esmagadora maioria dos militares com quem trabalhava já haviam abandonado funções efetivas, encontrando-se na reserva ou na reforma – cfr. depoimento da testemunha ………….

UU) Não tendo tido conhecimento da absolvição nem dos precisos termos em que a mesma ocorreu – cfr. depoimento da testemunha ………...

VV) A Força Aérea não promoveu o conhecimento da absolvição do Autor - cfr. depoimento da testemunha ………..

WW) O Autor era engenheiro aeronáutico, com a patente de Coronel, eleito para “Conselhos da Especialidade” e que, coincidente com a ação de comando do Campo de Tiro de ………., era Delegado Nacional da ………, organismo que pertence à NATO – cfr. depoimento da testemunha ………..

XX) Encontrava-se colocado no primeiro lugar da lista, da sua especialidade, para aceder ao curso de Brigadeiro, para o qual foi nomeado em 1995, o que só acontece em casos de evidente reconhecimento do mérito e capacidade – cfr. depoimento das testemunhas ………, ……….., ………...

YY) O Autor, por razões relacionadas com as acusações constantes do Relatório de Inspecção, foi desnomeado da frequência do Curso Superior de Guerra Aérea 1995/96, curso que constituía condição especial para a promoção a Brigadeiro, por despacho do CEMFA de 27/10/1995, que homologou o parecer do Conselho Superior da Força Aérea, de 27/10/1995 – cfr. doc. nº 11, junto com a contestação e depoimento das testemunhas ………, ………, ……...

ZZ) O A. recorreu contenciosamente deste acto, por acórdão do STA de 09/10/1997 proferido no proc. 39266-Z 1ª Secção, foi decidido manter o acto do CEMFA impugnado e negar provimento ao recurso – cfr. doc. nº 11, junto com a contestação.

AAA) O A. passou à reforma com a patente de Coronel – cfr. depoimento da testemunha ………..

BBB) Situação que contribuiu para a sensação de angústia, sensação de injustiça e revolta do A. – cfr. depoimento da testemunha ………...


*

II.2 FACTOS NÃO PROVADOS

1. Que o processo instaurado contra o Autor e C………… resultou da iniciativa de uma facção de poder, à data, na Força Aérea, como uma tentativa de ajuste de contas com situações ocorridas no passado colonial e por, alguns anos antes do seu ingresso no Campo de Tiro de …………, o co-arguido C…………. se ter recusado a avalizar poderosos negócios ruinosos para a instituição militar relacionados com a compra de armamento que, por isso, não se realizaram – artº 19º, da p.i.

2. Que o processo instaurado contra o Autor resultou da sua recusa em deixar imputar apenas ao C………….. as consequências dos atos por que foram acusados e que, com exceção da situação de arrendamento do ………, avalizou e considerou também da sua responsabilidade – artº 20º, da p.i.

3. Que tendo em vista a prossecução de tais objectivos, os mentores do referido processo e os respectivos apaniguados, atuando de forma grosseiramente dolosa, manipularam e omitiram factos e documentos cuja existência não podiam deixar de conhecer – artº 21º, da p.i.

4. Que efetuaram, de forma intencional, uma incorreta interpretação de factos e de práticas levadas a cabo no Campo de Tiro de ………., que bem sabiam não constituir qualquer tipo de ilícito-criminal ou violação de conduta disciplinar – artº 22º, da p.i.

5. Que insinuaram comportamentos e supostos benefícios dos arguidos, que bem sabiam não ter ocorrido – artº 23º, da p.i.

6. Que os factos/práticas que foram apurados e considerados provados, constantes da sentença no processo-crime, eram do conhecimento prévio das entidades que tutelavam o Campo de Tiro de ………, designadamente o Chefe do Estado Maior da Força Aérea e demais chefias (e até os subalternos) – artº 24º, da p.i.

7. Que estas entidades sabiam que não correspondiam à verdade os factos que o Tribunal veio a considerar como não provados e que correspondem, na sua generalidade às conclusões da Inspeção/Inquérito realizados pela tutela – artº 25º, da p.i.

8. Que o objectivo único do processo movido aos arguidos foi o de enxovalhar e enlamear a reputação de dois ilustres militares e manter o labéu da suspeita e da calúnia na Força Aérea – artº 26º e 30º, da p.i.

9. Que a paragem do processo de inquérito entre Maio de 1997 e princípios de 2006 na Polícia Judiciária Militar (PJM) tinha o intuito de provocar a prescrição dos crimes por que os arguidos vinham acusados, promovendo-se a extinção do procedimento criminal, sem a apreciação da verdade dos factos de que vinham indiciados – artº 27º, 28º e 29º, da p.i.

10. Que o Coronel ………… já havia manifestado, por diversas vezes, a sua velha animosidade para com o 2º Comandante do Campo de Tiro de ………., C…………., devido ao facto deste último ter sido o responsável pela sua colocação, em tempo de guerra colonial no norte de Moçambique, quando ele pretenderia ficar em Lourenço Marques – artº 36º, da p.i..

11. Que o General ……….., seguiu a cartilha pré-determinada e a prática do Coronel B………… – artº 51º, da p.i.


*

O DIREITO

1. Alega o recorrente que os factos ilícitos cuja prática foi imputada aos órgãos da Força Aérea alegados na descrição factual dos arts. 19º a 68º, da P.I. configuram a prática de um crime de denegação de justiça e prevaricação, previsto no artº 369º, do Cód. Penal (CP), praticados com a intenção de prejudicar o Autor e, consequentemente, com uma moldura penal até 5 anos de prisão, nos termos do nº2, do referido artigo, pelo que o prazo prescricional a aplicar ao caso é de 10 anos e não de 5 anos como, erradamente, se considerou na decisão recorrida.

1.1. Pelo que, a 1ª questão a tratar é a de saber qual o prazo prescricional relativamente ao pedido que o ora recorrente formulou de condenação do réu Estado Português a indemnizá-lo pelos danos que sofreu em virtude de comportamentos malevolamente persecutórios de que foi vítima na Força Aérea, os quais culminaram num processo criminal de que veio a ser absolvido.

Como se disse no acórdão que admitiu a revista:

“Ora, o modo como o TCA resolveu este assunto não é modelar.

«Primo», disse que o prazo prescricional não era de três anos (art. 498º, n.º 1, do Código Civil), mas superior porque se haviam imputado ao autor factos que «revestem a natureza de crime»; porém, o que deveras relevava para a exceção em causa eram os comportamentos dos membros da Força Aérea – e não os do autor.

«Secundo», o TCA considerou que tal prazo era de cinco anos. Mas não explicou porquê – e o prazo seria esse ou outro consoante a qualificação que os aludidos comportamentos acaso merecessem à luz do Direito Penal.(...).

«Quinto», tudo aponta para que o TCA tenha invertido a ordem lógica da decisão. Para se saber se o direito invocado pelo autor prescrevera, era indispensável determinar o prazo da prescrição. Para tanto, impunha-se averiguar se – como o autor alegara – elementos da Força Aérea haviam atuado ilicitamente, ao ponto dessa atuação ilícita constituir algum crime para que a lei penal estabelecesse uma prescrição sujeita a prazo mais longo (art. 498º, n.º 3, do Código Civil). Ora, este ponto podia ser decidido em abstracto ou em concreto. No primeiro caso, afirmando-se logo que as condutas atribuídas na petição inicial àqueles membros da Força Aérea não integravam qualquer crime ou, integrando-o, não traziam um prazo prescricional obstativo da prevalência da exceção; no segundo caso, decidindo a impugnação da matéria de facto, constante da apelação, para depois se concluir se a conduta daqueles elementos da Força Aérea integravam a prática de algum crime e qual o prazo de prescrição dele. Mas, e como vimos, o TCA não seguiu por quaisquer destas vias.

Assim, a maneira como o acórdão recorrido solucionou a «quaestio juris» presente na revista não é satisfatório. Pelo que se justifica receber o recurso para se obter uma melhor aplicação do direito.”

Então vejamos.

Nos termos do artigo 498º do CC:

“1. O direito de indemnização prescreve no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável e da extensão integral dos danos, sem prejuízo da prescrição ordinária se tiver decorrido o respetivo prazo a contar do facto danoso.

2. Prescreve igualmente no prazo de três anos, a contar do cumprimento, o direito de regresso entre os responsáveis.

3. Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável.

4. A prescrição do direito de indemnização não importa prescrição da ação de reivindicação nem da ação de restituição por enriquecimento sem causa, se houver lugar a uma ou a outra.”.

E basta que tenham sido alegados na petição inicial factos que, a provarem-se, possam constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, para que esse seja o prazo prescricional aplicável, nos termos do disposto no nº 3 do artigo 498º do Código Civil.

Vejamos, assim, se o que é articulado pelo Autor, na petição inicial, nos permite identificar todos os elementos do tipo de crime.

Invoca o Autor na sua petição inicial que os factos que constam da matéria de facto provada e consubstanciados na realização de uma inspeção inopinada ao Campo de Tiro de ……… visaram atitudes persecutórias suscetíveis de integrar uma crime de denegação de justiça e prevaricação previsto no art. 369º do CP, por praticado com a intenção de o prejudicar e, por isso, com uma moldura penal até cinco anos de prisão, o que implicaria um prazo prescricional de 10 anos nos termos do nº3 do art. 498º e al. b) do nº1 do art. 118º do CP.

Para tanto refere que o processo instaurado contra si e C………….. resultou da iniciativa de uma fação no poder, à data, na Força Aérea, como uma tentativa de ajuste de contas com situações ocorridas no passado colonial e também porque, alguns anos antes do seu ingresso no CTA, este último co-arguido se recusou a avalizar poderosos negócios ruinosos, para a instituição militar que servia, ou seja, para o Estado Português, relacionados com compra de armamento que, por isso, não se realizaram.

E que, tendo em vista a prossecução de tais objetivos, os mentores do referido processo, manipularam e omitiram dolosamente factos e documentos, cuja existência não podiam deixar de conhecer.

E efetuaram, de forma intencional, uma incorreta interpretação de factos e práticas levadas a cabo no CTA, que bem sabiam não constituir qualquer tipo de ilícito criminal e, muito menos, qualquer violação de conduta disciplinar.

Assim como insinuaram comportamentos e supostos benefícios dos arguidos, que bem sabiam não ter ocorrido.

E que todos os factos/práticas que foram apurados e considerados provados, constantes da douta sentença eram, de forma irrecusável, do conhecimento prévio das entidades que tutelavam o Campo de Tiro, designadamente do Sr. Chefe do Estado Maior da Força Aérea e demais chefias que bem sabiam que não correspondiam à verdade, na sua generalidade, as conclusões da inspeção / inquérito realizados pela tutela.

Sendo que o objetivo único do processo movido aos arguidos foi o de enxovalhar e enlamear a reputação de dois ilustres militares, com um passado profissional impoluto e louvado pela Força Aérea e reconhecidos e respeitados pela “quase totalidade” dos seus pares e que, também a nível pessoal e familiar, constituem exemplos para os que com eles privam.

Prova das verdadeiras intenções dos mentores da “Inspeção Inopinada”, seria o facto de o Relatório estar datado de Agosto de 1995 e de, na sequência dele e com a conivência dos que tinham a tutela do processo, na PJM, os então arguidos apenas terem sido ouvidos quase dois anos depois, assim como de, entre maio de 1997 e princípios de 2006 nada ter acontecido com o processo, mantendo os arguidos suspensos na teia então montada, dando cumprimento aos objetivos pré-definidos.

O intuito seria, pois, provocar a prescrição dos crimes de que os arguidos vinham acusados, sem a apreciação da verdade sobre os factos, já que o objetivo único do processo era manter, de forma definitiva, sobre o Autor e o C………….., a suspeita e a calúnia.

O que, na realidade veio a acontecer com os crimes de que foi acusado de peculato e abuso de poder considerados prescritos antes do julgamento.

Na verdade, era do conhecimento público, na Força Aérea, que os arguidos eram suspeitos de um conjunto alargado e grave de crimes, mas não era público o conteúdo do Relatório da Inspeção.

Invoca, também, como revelador das verdadeiras motivações dos “mentores” da inspeção, um conjunto de factos que explicita na sua petição, nomeadamente que a inspeção ao CTA decorreu entre fins de maio e junho de 1995, logo após a saída do Autor do comando e na vigência do comando do seu sucessor, o então Coronel …………., que já havia manifestado, por diversas vezes, a sua velha animosidade para com o 2º Comandante do CTA, C…………, devido ao facto de este último ter sido o responsável pela sua colocação, em tempo da guerra colonial no norte de Moçambique, quando ele pretenderia ficar em Lourenço Marques.

E que o Coronel B………….., autor da inspeção omitiu, deliberadamente, a existência e conteúdo do Relatório de Posse do Autor (fls. 238 a fls. 256, do doc. nº1), quando assumiu o comando do CTA que, como se comprovou em audiência (101 – factos provados), foi apresentado aos superiores hierárquicos do Autor e era do conhecimento público na Força Aérea.

Conclui que veio a ser absolvido dos crimes que chegaram a julgamento.

Está aqui em causa uma situação de responsabilidade extracontratual cujo prazo prescricional apenas seria de 10 anos, nos termos do artigo do art. 498°, n° 3 do C.Civil, se o facto ilícito puder constituir um crime com prescrição sujeita a um prazo de 10 anos, ou seja, uma conduta dolosa suscetível de integrar um crime.

Nos termos do art. 365.º do CP:

“Denúncia caluniosa

1 - Quem, por qualquer meio, perante autoridade ou publicamente, com a consciência da falsidade da imputação, denunciar ou lançar sobre determinada pessoa a suspeita da prática de crime, com intenção de que contra ela se instaure procedimento, é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.

2 - Se a conduta consistir na falsa imputação de contraordenação ou falta disciplinar, o agente é punido com pena de prisão até 1 ano ou com pena de multa até 120 dias.

3 - Se o meio utilizado pelo agente se traduzir em apresentar, alterar ou desvirtuar meio de prova, o agente é punido:

a) No caso do n.º 1, com pena de prisão até 5 anos;

b) No caso do n.º 2, com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa.

4 - Se do facto resultar privação da liberdade do ofendido, o agente é punido com pena de prisão de 1 a 8 anos.

5 - A requerimento do ofendido o tribunal ordena o conhecimento público da sentença condenatória, nos termos do artigo 189.º”.

O núcleo objetivo essencial deste tipo criminal de prevaricação consiste numa atuação do funcionário contra o direito, praticando não o ato que era seu dever praticar, mas outro contrário a norma legal expressa.

Este tipo de crime pressupõe, assim, o dolo direto (e não o dolo meramente eventual) e um dolo específico, a intenção de prejudicar ou beneficiar alguém.

E há-de ser a partir dos factos objetivos entendidos à luz da experiência comum e da própria experiência profissional que se terá de concluir pela verificação ou não dos elementos de natureza interna a que só o agente tem acesso direto: a sua vontade, conhecimento e emoção.

Para o preenchimento do crime de denúncia caluniosa é necessário que o agente denuncie factos que saiba serem falsos, com intenção de fazer desencadear procedimento, seja criminal, contraordenacional ou disciplinar contra o denunciado, o que pressupõe, desde logo, a falsidade objetiva do que foi denunciado.

O tipo subjetivo do crime exige que o agente saiba e queira a falsidade da imputação.

Entre os objetivos da tipificação deste crime está, assim, a tutela da honra, bem jurídico de natureza claramente pessoal.

Ora, analisando o articulado pelo autor na petição inicial, verifica-se que o mesmo, socorrendo-se dos factos que foram provados e não provados no processo crime que contra si correu pretende tirar ilações de que o mesmo resultou de uma fação no poder, visando um ajuste de contas, por se ter colocado ao lado de outro arguido no mesmo processo, C…………., que no passado colonial e depois se recusou a avalizar negócios ruinosos para a instituição militar, relacionados com a compra de armamento.

E que os mentores desse processo crime dolosamente manipularam e omitiram factos e documentos cuja existência não podiam deixar de conhecer, efetuando de forma intencional uma interpretação de factos e práticas levadas a cabo pelo CTA, que bem sabiam não constituir ilícito criminal.

Podemos, assim, identificar todos os elementos do tipo de crime previsto no artigo 349º do CP.

Pelo que entende-se que o prazo prescricional seria de 10 anos.

1.2. A questão que se segue é, agora, a de saber qual o momento em que se inicia o prazo prescricional relativamente aos factos imputados à Força Aérea.

Como se disse no acórdão que admitiu a revista.

“Ora, o modo como o TCA resolveu este assunto não é modelar. (...)

«Tertio», o TCA não indicou com exatidão qual seria o «dies a quo» do prazo de prescrição.

«Quarto», e porque argumentou com a data real da citação do réu Estado na ação dos autos, o TCA parece ter esquecido o que se dispõe no art. 323º, n.º 2, do Código Civil.”

Alega o recorrente que a contagem do prazo prescricional do seu direito apenas se iniciou após o trânsito em julgado do acórdão do Tribunal de Benavente, concretamente em 25.07.2007 por apenas nesta data se consolidarem na esfera jurídica do Autor efeitos da improcedência da acusação.

Pelo que, tendo a ação sido interposta em 29.07.2010 (e não em 30.07.2010) tem-se por interrompido o decurso do prazo da prescrição em 04.08.2010, conforme estabelecido no nº2, do artº 323º, do CC, uma vez que não é imputável ao Autor a não citação do Réu, que não ocorreu no prazo dos 5 dias após a interposição, por razões processuais, estranhas a este, sendo irrelevante a data da citação, ao contrário do que se considerou, como factor determinante.

Conclui que entre 25.07.2007 e 29.07.2010 decorreram 3 anos e 4 dias, não se verificando, nem o decurso do prazo de 10 anos, defendido pelo Recorrente como aplicável, nem mesmo o prazo considerado pela decisão recorrida (5 anos) pelo que não ocorreu qualquer prescrição do seu direito.

Então vejamos.

O prazo da prescrição começa a contar a partir do momento em que o direito pode ser exercido [artigo 306º, nº1 CC], sendo que, no âmbito específico da prescrição do direito de indemnização, o art. 498°, n° 1 do C.Civil, dispõe que o prazo prescricional se conta "a partir da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete, embora com desconhecimento da pessoa do responsável ou da extensão integral dos danos".

A este propósito diz-se na decisão recorrida:

“Em relação ao pedido de indemnização pelos danos causados pelo exercício da função administrativa, decorrente da atuação dos órgãos da Força Aérea no âmbito da inspeção ao Campo de Tiro de ………., é de entender no sentido invocado pelo Réu, pela procedência da prescrição do direito.

Está em causa a atuação ocorrida em 1995, do Chefe de Estado Maior da Força Aérea, ao determinar a realização de uma inspeção ao Campo de Tiro de ………., em relação ao qual, em 01/08/1995 foi elaborado o relatório de inspeção e em 23/08/1995 foi enviado esse relatório para a Polícia Judiciária Militar, tendo em 31/08/1995 sido proposta a instauração de inquérito militar, o qual foi aberto e veio a determinar em 27/10/1995, a desnomeação do Autor para a frequência do Curso Superior de Guerra Aérea 1995/96.

Tais factos relativos à alegada atuação ilícita dos órgãos da Força Aérea ocorreram todos no decurso do ano de 1995, apenas tendo sido proferido o acórdão pelo STA, em 1997, que negou provimento ao recurso interposto pelo Autor.

Por outro lado, mesmo que se considere a data de 06/12/2006, em que a Polícia Judiciária Militar entregou o relatório final no processo-crime, considerando a data da citação do Réu, em 30/04/2012, já decorreu o prazo de cinco anos.

Pelo que, é seguro dizer que senão desde 1995, pelo menos desde 1997 ou mesmo de 2006, o Autor dispunha de todos os elementos que o levassem a agir em relação aos danos causados pelos órgãos da Força Aérea, no exercício da função administrativa, baseados na instauração do processo de inquérito.

Há muito que o Autor conhece os factos decorrentes da atuação dos órgãos da Força Aérea no âmbito do respetivo processo de inquérito, conhecendo os pressupostos e os elementos constitutivos do direito à indemnização, nada obstando que pudesse ter agido judicialmente.

Nestes termos é de concluir pela prescrição do direito em relação à indemnização fundada na responsabilidade civil extracontratual pelos danos causados no exercício da função administrativa, imputáveis aos serviços da Força Aérea.”

Vejamos então qual a data que resulta dos autos que o aqui recorrente teve conhecimento do direito que lhe competia, ou seja, do direito a ser indemnizado, embora com desconhecimento ainda da pessoa responsável e da extensão integral dos danos.

E, interpretando o referido art. 498º do CC tendo sempre presente o art. 9º do CC podemos concluir que basta que se saiba que o ato foi praticado ou omitido por alguém - saiba ou não do seu caráter ilícito - e dessa prática ou omissão resultaram para si danos.

Não está aqui em causa saber em que momento um hipotético lesado abstrato, agindo com ideal ou média diligência, poderia ter-se apercebido do direito a ser indemnizado, mas sim apurar quando é que dele efetivamente se apercebeu o concreto lesado que vem pedir a indemnização a tribunal.

E sendo relevante o conhecimento do lesado concreto, significa isso que esse conhecimento não implica um conhecimento jurídico, bastando um conhecimento empírico dos factos constitutivos do direito, ou seja, é suficiente que o lesado saiba que foi praticado um ato que lhe provocou danos, e que esteja em condições de formular um juízo subjetivo, pelo qual possa qualificar aquele ato como gerador de responsabilidade pelos danos que sofreu.

Como recentemente foi decidido no Ac. deste STA Pleno – Proc. 02142/13.3BELSB, de 07/05/2020 de onde se extrai:

“ A este propósito disse-se no acórdão deste STA de 21.11.2013 [Proc. n.º 0929/12] que este conhecimento «… “não tem que ser ‘um conhecimento jurídico’, bastando que o lesado conheça os factos constitutivos desse direito, ou seja, esteja em condições de formular um juízo subjetivo, pelo qual possa qualificar aquele ato como gerador de responsabilidade e seja percetível que sofreu danos em consequência dele” …» e, também, no seu acórdão de 06.02.2014 [Proc. n.º 01811/13] que «o prazo prescricional se inicia com o conhecimento dos pressupostos (objetivos) que condicionam a responsabilidade civil; e não com a consciência (necessariamente subjetiva) da possibilidade legal de um ressarcimento. Ou seja: o sobredito “conhecimento do direito” é, no fundo e apenas, o conhecimento dos pressupostos fácticos da responsabilidade civil, sendo despiciendo que o lesado, depois de apreender os constituintes naturalísticos desses requisitos, tenha incorrido numa errada representação das consequências jurídicas que deles resultariam, só mais tarde se apercebendo de que era, afinal, titular de um direito relativamente ao lesante», tanto mais que, e contínua, «a circunstância do lesado não ter submetido os factos lesivos a uma determinada perspetiva jurídica, o que equivale a uma “ignorantia legis” (que “non excusat” - art. 6.º do Código Civil), é impotente para alterar o termo inicial do prazo de prescrição, por forma a reportá-lo ao momento em que ele ficara juridicamente esclarecido», para além que o «estabelecimento de prazos prescricionais de direitos indemnizatórios visa, desde logo, instar os lesados a esclarecerem os contornos e as consequências da consabida lesão - a fim de que a discussão dos litígios não se distancie muito dos factos».

Pelo que, a determinação deste concreto momento em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete faz-se pela ponderação da factualidade provada e com recurso à experiência comum.

Ora, o aqui recorrente, nas suas declarações do dia 29/09/1995, claramente revelou ter conhecimento do relatório IAF sobre o qual se pronunciou no sentido de que o seu conteúdo e conclusões não estão corretos.

E, nesse momento fez a entrega de fotocópias da sua defesa pessoal/declarações prestadas no “processo-inquérito/disciplinar” a decorrer no EMFA contra a sua ação de comando no CTA de 1992 a 1995.

E quanto às ações do seu 2º Com/CTA Ten Cor C……….. afirma que não se quer pronunciar.

Curiosamente antes de si e no mesmo dia prestou declarações o Ten Cor C………… que expressamente referiu julgar-se vítima de perseguição e vingança.

Face ao exposto temos de concluir que o aqui recorrente mesmo nesta data teve conhecimento do direito que aqui invoca existir nos termos em que o mesmo está em condições de ser exercido e resulta do supra referido.

Sendo assim, entre 1995 e 29.07.2010 correram mais de dez anos pelo que não se coloca a questão da aplicabilidade do no nº2, do artº 323º, do CC já que o seu direito sempre estaria prescrito. (tenho dúvidas no assim concluído)

Pelo que, ficam prejudicadas as demais questões relacionadas com a prescrição nomeadamente as relacionadas com a aplicação do art. 323º do CC.


*

Em face de todo o exposto acordam os juízes deste STA em negar provimento ao recurso e manter a decisão recorrida com a presente fundamentação.

Custas pelo recorrente.

N.

Lisboa, 9 de Julho de 2020. – Ana Paula Soares Leite Martins Portela (relatora) – Jorge Artur Madeira dos Santos – Carlos Luís Medeiros de Carvalho (vencido conforme voto anexo).

Vencido, porquanto presente que a aplicação do prazo prescricional mais longo previsto no n.º 3 do art. 498º do CC apenas depende da prova de que o facto ilícito constitua crime cujo prazo de prescrição do procedimento criminal seja superior a três anos e que não é exigível a demonstração de que continua a ser possível a perseguição penal do agente do crime, sendo que tal aplicação não é afastada pelo facto de os entes públicos não estarem sujeitos a responsabilidade criminal, temos que, no caso, a factualidade alegada e integradora de tal responsabilidade, necessária à apreciação da exceção de prescrição, havia sido considerada como não provada pelo TAF e este juízo não se mostrava sequer estabilizado já que o acórdão recorrido, conhecendo em substituição, fê-lo sem previamente haver conhecido da impugnação dirigida àquele julgamento de facto dado o ter considerado prejudicado.

Nessa medida, o conhecimento da exceção em referência carecia ou exigia a prévia fixação daquilo que constitui a factualidade relevante ao seu conhecimento, na certeza de que estabilizada a factualidade no sentido da mesma não estar provada tal conduziria ao afastamento da regra do nº 3 do art. 498º do CC visto, então, o prazo prescricional aplicável ser o no n.º 1 do mesmo preceito.

Por outro lado, pretendendo efetuar-se o conhecimento da exceção, na consideração e no pressuposto de que a factualidade estaria provada, entendo que a exceção não poderia proceder, não acompanhando a solução que obteve vencimento, pois in casu não relevaria como momento relevante para o «conhecimento do direito» no quadro e para os efeitos do art. 498.º do CC o das declarações do A. prestadas no dia 29.09.1995 e do conhecimento do relatório IAF já que o momento relevante seria o da decisão penal que o absolveu das imputações que lhe haviam sido feitas e esse só ocorreu em 09.07.2007, pelo que, nessa medida, não procederia a invocada prescrição.

Carlos Luís Medeiros de Carvalho