Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0116/12.0BEMDL
Data do Acordão:05/21/2020
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
LICENCIAMENTO DE OBRAS
LEGALIZAÇÃO
PRINCÍPIO TEMPUS REGIT ACTUM
Sumário:É de admitir a revista do acórdão revogatório da sentença que declarara a nulidade de um acto recaído sobre matéria urbanística, por haver dúvidas quanto à natureza do acto – se de licenciamento, se de legalização – e, por isso, quanto ao regime legal aplicável «ratione temporis».
Nº Convencional:JSTA000P25948
Nº do Documento:SA1202005210116/12
Data de Entrada:03/10/2020
Recorrente:A....................... (E OUTROS).
Recorrido 1:MUNICÍPIO DE VILA REAL
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:

B………… e A……………, identificadas nos autos, interpuseram esta revista do acórdão do TCA Norte que, revogando a sentença do TAF de Mirandela – declarativa da nulidade de um acto emanado do Município de Vila Real e incidente sobre uma questão urbanística onde figura como contra-interessado C………. – julgou improcedente a respectiva acção impugnatória.

As recorrentes pugnam pela admissão da revista por ela tratar duma «quaestio juris» relevante e mal decidida.
Não houve contra-alegação.

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
A acção dos autos – impugnatória do acto camarário que licenciou (ou legalizou) um edifício (industrial ou comercial) num prédio fronteiro à moradia dos primitivos autores – procedeu no TAF de Mirandela, que declarou a nulidade de tal acto por ofensa do PDM.
Mas o TCA, após alterar a matéria de facto – caracterizando «o edifício licenciado pelo acto» de um modo diferente do indicado na petição e acolhido pelo TAF – considerou que o acto impugnado era de licenciamento (repetindo ou substituindo outro declarado nulo), que não estava sujeito às regras do PDM e que, até por défice de alegação havido «in initio litis», não se justificava invalidá-lo. Assim, o acórdão recorrido revogou a sentença do TAF e julgou a acção improcedente.
Na sua revista, as recorrentes dirigem ao aresto críticas várias, em que avultam duas: «primo», o TCA teria violado normas adjectivas ao estabelecer que o edifício visado pelo acto tem uma função económica diferente da que resultara do acordo das partes (na fase dos articulados); «secundo», o TCA ter-se-ia equivocado na aplicação, «in casu», do princípio «tempus regit actum».
O processo dos autos inscreve-se numa longa querela judicial relacionada com a construção do sobredito edifício. Esse demorado «iter», onde já houve diversas pronúncias judiciais favoráveis aos iniciais autores, torna complexa a resolução do presente caso; até porque, ao menos numa «summaria cognitio», não é absolutamente claro se o acto impugnado procedeu a um licenciamento «ex ante» ou a uma legalização «ex post» – e este assunto determinará o regime legal aplicável («ratione temporis»).
Por outro lado, as instâncias emitiram decisões cuja contrariedade é sugestiva da incerteza do problema posto nos autos.
Assim, justifica-se que o STA reveja o assunto; até porque o recurso coloca questões de ordem geral, ligadas ao licenciamento e à legalização de obras, que, pela sua fácil repetibilidade, merecem um novo «apport» por parte do Supremo.

Nestes termos, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Lisboa, 21 de Maio de 2020. – Madeira dos Santos (relator) – Teresa de Sousa – Carlos Carvalho.