Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01148/07.6BEBRG 0230/16
Data do Acordão:11/21/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
PRESCRIÇÃO
RESPONSÁVEL SUBSIDIÁRIO
CITAÇÃO
Sumário:I - De acordo com o disposto no artº 48º, nº 3 da LGT, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação.
II - Mas, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5.° ano, se ele for citado até ao fim do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele.
III - A citação do executado tem, não só o efeito instantâneo de inutilizar o tempo decorrido, mas também o efeito duradouro de obstar ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo em que a citação é levada a cabo (arts. 326.°, n.° 1, e 327.°, n.° 1, do CC).
Nº Convencional:JSTA000P25199
Nº do Documento:SA22019112101148/07
Data de Entrada:03/02/2016
Recorrente:AT-AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A.......
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Vem a Fazenda Pública interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga exarada a fls. 195/197, a qual entendeu verificar-se a prescrição das dívidas exequendas e julgou extinta a execução nos autos de oposição à execução fiscal deduzida por A…………, na qualidade de responsável subsidiário da devedora originária “B………., Ldª.”

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
1. A douta decisão em recurso errou na aplicação do direito e violou o artigo 48°, nº 1. artigo 49°, nº 2, ambos da LGT, bem como o artigo 326°, nº 1 e artigo 327°, nº 1 e nº 2, ambos do CC, aplicáveis por remissão do artigo 2°, alínea d) da LGT.

2. Sendo o prazo de prescrição das dívidas tributárias de 8 anos (artigo 48°, nº 1 da LGT), a citação para o processo executivo que tem por objecto aquelas dívidas tributárias interrompeu o prazo da prescrição (artigo 49° nº 2, da LGT), o qual não voltará a correr de novo (8 anos) enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigo 326°, nº 1 e artigo 327°, nº1 e nº 2, do CC).

3. A citação constitui causa duradoura e não instantânea de interrupção do prazo da prescrição (conforme autor e obra referidos no motivação do presente recurso).

4. Assim, não se encontra prescrita divida tributária (IVA e IRC), do ano de 2001 que se encontra em cobrança coerciva e cujo prazo de prescrição foi interrompido com a citação do responsável subsidiário para o respectivo processo executivo, o qual deduziu oposição à execução fiscal que ainda não conheceu decisão transitada em julgado.

5. Dito de outro, não se verifica a prescrição de divida tributária cujo prazo foi interrompido por força de uma causa (a citação) que ainda não deixou de produzir os seus efeitos e, em consequência, cujo prazo ainda não começou a correr de novo.

Nestes termos e nos mais que serão doutamente supridos por Vs. Exas. deve o presente recurso obter provimento, revogando-se a douta decisão em recurso.»


3 – O Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu parecer no sentido do provimento do recurso por entender, em síntese, que se verifica a interrupção do prazo de prescrição resultante da citação do oponente, caso em que, nos termos do n.º 1, do art. 327°, n.º 1 do C. Civil, não terá início novo prazo de prescrição enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo, sendo esta regra aplicável no âmbito da execução fiscal, como vem sendo jurisprudência reiterada deste Supremo Tribunal.

4 - Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – O Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga considerou como provados os seguintes factos:
«A) A AT instaurou execução fiscal n.º 0396200501028227 e aps., contra a sociedade "B………, Lda" NIPC ………, por dívidas de IVA ao CRSS, de IVA do ano de 2001, no montante total de € 78.777,24;
B) O aqui oponente foi citado pessoalmente, na qualidade de responsável tributário, para o processo mencionado em A., no dia 07-03-2007.»

6. Do objecto do recurso:
Da análise da sentença e dos fundamentos invocados pela Fazenda Pública para pedir a sua alteração, podemos concluir que a questão objecto do presente recurso se reconduz a saber se se verifica a prescrição das dívidas exequendas e se incorre em erro de julgamento a sentença recorrida que, com base em tal fundamento, julgou procedente a oposição e extinta a execução fiscal.

6.1 Da prescrição da dívida exequenda
Decorre dos autos que estão em causa dívidas de IVA e IRC de 2001, ascendendo o montante exequendo a 78.777,24 (vide certidão de fls. 80).

Para julgar verificada a prescrição, considerou o tribunal “a quo” que, sendo as dívidas constituídas em 2001, oponente foi citado para a execução fiscal no dia 07-03-2007.
Mais se considerou ser este facto interruptivo do prazo de prescrição de oito anos e que esse prazo se reiniciou nessa data, concluindo que o seu terminus terá ocorrido no dia 06-03-2015, não resultando dos autos a existência de outro facto interruptivo da prescrição, bem como de suspensão da mesma.

Não conformada com o assim decidido alega a Fazenda Pública que, sendo o prazo de prescrição das dívidas tributárias de 8 anos (artigo 48°, nº 1 da LGT), a citação para o processo executivo que tem por objecto aquelas dívidas tributárias interrompeu o prazo da prescrição (artigo 49°nº 2, da LGT), o qual não voltará a correr de novo (8 anos) enquanto não passar em julgado a decisão que puser termo ao processo (artigo 326°, nº1 e artigo 327°, nº1 e nº 2, do CC).
Mais alega que não se verifica assim a prescrição de divida tributária (IVA e IRC), do ano de 2001, cujo prazo foi interrompido por força de uma causa (a citação) que ainda não deixou de produzir os seus efeitos e, em consequência, cujo prazo ainda não começou a correr de novo.
No mesmo sentido se pronuncia o Exmº Procurador-Geral Adjunto neste Supremo Tribunal Administrativo.

Desde já se adiantará que assiste razão à recorrente.
Vejamos.
As dívidas exequendas são relativas ao ano de 2001, não sendo controvertido que o prazo da prescrição a considerar é prazo de 8 anos, nos termos do art. 48.°, n.º 1 da LGT.

Ao tempo do nascimento das dívidas exequendas a redacção do art. 48.°, n.º 1 da LGT previa como momento inicial da contagem do prazo da prescrição, no caso dos impostos periódicos, o termo do ano em que se verificou o facto tributário e, no caso dos impostos de obrigação única, com é o caso do IVA, a data da ocorrência do facto tributário.

Porém, com a alteração da redacção inicial do n.º 1 do art. 48.° da LGT, operada pela Lei n.º 55- B/2004, de 30 de Dez., o termo inicial do prazo de prescrição das dívidas de IVA passou a contar-se a partir do início do ano civil seguinte àquele em que se verificou a exigibilidade do imposto, sendo esta nova redacção do preceito aplicável no caso dos autos (art. 12.°, n.º 2, 2.ª parte, do CCivil).

Assim, iniciando-se a contagem do prazo prescricional a partir o termo do ano de 2001 (relação às dívidas de IRC) e a partir do início do ano de 2002 (em relação às dívidas de IVA) o prazo da prescrição ainda não se havia esgotado quando o Oponente, ora Recorrido, foi citado para a execução fiscal, o que ocorreu em 07.03.2007 [alínea B) dos factos provados].

Não decorre do probatório que existam causas de suspensão da prescrição e não relevam, para o caso, eventuais causas de interrupção relativamente ao devedor principal uma vez que a citação do ora oponente, enquanto responsável subsidiário, ocorreu após o 5.° ano posterior ao da liquidação (art. 48.°, n.º 3 da LGT).
Com efeito, de acordo com o disposto no artº 48º, nº 3 da LGT, a interrupção da prescrição relativamente ao devedor principal não produz efeitos quanto ao responsável subsidiário se a citação deste, em processo de execução fiscal, for efectuada após o 5.º ano posterior ao da liquidação
Porém, no caso de a citação do responsável subsidiário ser posterior ao 5.° ano, se ele for citado até ao fim do prazo de prescrição - como sucedeu no caso vertente - os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (e também em relação ao devedor originário, por força da regra do n° 2 do arte. 48°) – cf. adoptando este entendimento, entre muitos outros, os seguintes acórdãos da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: acórdãos de 27.08.2008, recurso 719/08, de 08.02.2012, recurso 33/12, e de 06.03.2014, recurso 601/13, de 12.10.2016, recurso 951/16 e de 08.02.2017, recurso 248/14.
Assim a citação do recorrido como responsável subsidiário tem relevância própria como facto interruptivo da prescrição, tendo inutilizado para a prescrição o prazo decorrido até à sua verificação.
Sendo que, como vem sublinhando a doutrina e a jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal Administrativo esta citação tem, não só o efeito instantâneo de inutilizar o tempo decorrido, mas também o efeito duradouro de obstar ao decurso da prescrição até ao trânsito em julgado da decisão que puser termo ao processo em que a citação é levada a cabo (arts. 326.°, n.° 1, e 327.°, n.° 1, do CC) - cf. neste sentido, Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo de 05.06.2013, recurso 903/13, de 27.01.2016, recurso 1698/15, de 20.05.2015, recurso 1500/14, de 26.08.2015, recurso 1012/15, de 14.12.2016, recurso 193/14, de 31.03.2016, recurso 184/16 e bem assim Jorge Lopes de Sousa, Sobre a prescrição da Obrigação Tributária, Áreas Edit., 2ª edição, pag. 57.).
Nestes termos forçoso é concluir que no caso vertente, por força da eficácia interruptiva autónoma decorrente da citação do recorrido efectuada em 07.03.2007, com o correspondente efeito de eliminação de todo o tempo decorrido anteriormente, determinando o início de novo prazo de prescrição após trânsito da decisão que vier a pôr termo ao processo de execução fiscal, não ocorreu ainda a prescrição de qualquer uma das dívidas exequendas objecto do presente recurso.
Procede, pois, o recurso, pelo que a sentença recorrida, que decidiu em contrário e julgou verificar-se a extinção da instância fiscal executiva contra o oponente, não pode manter-se.

7. Decisão
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, baixando os autos o tribunal recorrido para conhecimento dos fundamentos de oposição invocados, se a tanto nada obstar.
Custas pelo Recorrido, ainda que sem taxa de justiça uma vez que não contra-alegou.

Lisboa, 21 de Novembro de 2019. – Pedro Delgado (relator) – Francisco Rothes – Isabel Marques da Silva.