Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01509/13
Data do Acordão:11/18/2015
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PEDRO DELGADO
Descritores:REVISÃO DO ACTO TRIBUTÁRIO
RECLAMAÇÃO
AUTOLIQUIDAÇÃO
Sumário:I - A revisão do acto tributário com fundamento em erro imputável aos serviços deve ser efectuada pela Administração tributária por sua própria iniciativa, mas, como se conclui do n.º 7 do art. 78º da L.G.T., o contribuinte pode pedir que seja cumprido esse dever, dentro dos limites temporais em que Administração tributária o pode exercer.
II - O alcance do nº 2 do art. 78º da LGT, ao estabelecer que, para efeitos de admissibilidade de revisão do acto tributário, se consideram imputáveis à administração tributária os erros na autoliquidação, foi o de alargar as possibilidades de revisão nestas situações de autoliquidação, em relação às que existiam no domínio do CPT, solução esta que está em sintonia com a directriz primordial da autorização legislativa em que se baseou o Governo para aprovar a LGT, que era de reforço das garantias dos contribuintes;
III - As dívidas por contribuições à Segurança Social assumem natureza tributária, sendo-lhes aplicável a LGT (arts. 1º e 3º da LGT);
IV - Mesmo depois do decurso dos prazos de reclamação administrativa, designadamente do prazo para reclamar a restituição ou reembolso de contribuições indevidamente pagas à caixa sindical de previdência, previsto no artº 129º do DL nº 45266 de 23 de Setembro, a Administração tem o dever de efectuar a revisão de actos tributários ilegais, nas condições e com os limites temporais referidos no art. 78.º da L.G.T.
Nº Convencional:JSTA00069430
Nº do Documento:SA22015111801509
Data de Entrada:09/30/2013
Recorrente:INST DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
Recorrido 1:A....., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL
Legislação Nacional:LGT98 ART78 N1 N2 ART55 ART95 N2 D ART43 N1 N3 ART49 N1 ART2.
DL 45266 DE 1963/11/23 ART127 ART128 ART129.
CPPTRIB99 ART1.
RGIT01 ART1 N1 D ART106 ART107.
CONST76 ART268 N4 ART266 N2 ART112 N2.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0402/06 DE 2006/07/12.; AC STA PROC01540/13 DE 2014/10/29.; AC STA PROC0536/07 DE 2005/10/06.; AC STA PROC0402/06 DE 2006/07/12.; AC STA PROC0319/05 DE 2005/05/11.; AC STA PROC01171/04 DE 2005/02/02.; AC STA PROC01540/13 DE 2014/10/29.; AC STA PROC023889 DE 1999/06/16.; AC STAPLENO PROC01481/13 DE 2014/02/26.
Referência a Doutrina:LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM RODRIGUES E JORGE DE SOUSA - LGT ANOTADA 4ED PAG702 SEGS.
CASALTA NABAIS - DIREITO FISCAL 6ED PAG662 SEGS.
NAZARÉ CABRAL - CONTRIBUIÇÕES PARA A SEGURANÇA SOCIAL NATUREZA DE REGIME E DE TECNICAS E PERSPECTIVAS DE EVOLUÇÃO NUM CONTEXTO DE INCERTEZA IN CADERNOS DO IDEFF N12.
SÁ GOMES - MANUAL DE DIREITO FISCAL VOLI PAG322.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – Vem o Instituto da Segurança Social recorrer da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa que julgou procedente a impugnação deduzida pela A………, S.A. melhor identificada nos autos, contra a decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa de actos de autoliquidação de contribuições para a segurança social relativas aos períodos de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:
«I. Veio a impugnante, ora recorrida, solicitar a revogação da decisão proferida pela Caixa de Previdência do Pessoal ……………. a 08.06.2011, adiante Caixa de Previdência, que indeferiu o requerimento, apresentado pela impugnante a 15.01.2010, de revisão oficiosa de um conjunto de actos de autoliquidação de contribuições para aquela Caixa, referentes ao período de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008, bem como a condenação do impugnado no reconhecimento do direito da impugnante à devolução do valor de € 2.453.639,29, indevidamente suportado a título de contribuições da entidade empregadora, e do valor de € 1.291.397,61, indevidamente retido aos trabalhadores e posteriormente entregue à Caixa de Previdência;
II. Por sentença de 12.06.2013, julgou o douto tribunal a quo procedente a impugnação intentada, anulando o acto impugnado e condenando o ora recorrente a reembolsar à recorrida a quantia de €3.304.531,73, com fundamento em que i) a Lei Geral Tributária, adiante LGT, reúne de forma sistemática e autónoma as normas sobre a relação jurídico-tributária comuns aos diversos tributos, entre os quais se devem incluir as contribuições para a Segurança Social, enunciando os direitos e garantias gerais dos contribuintes, donde, por força do disposto nos artigos 1.º e 78.º desse diploma, a revisão oficiosa ali prevista é aplicável às contribuições em apreço; ii) o facto de a ora recorrida não poder requerer a devolução das contribuições em consequência da caducidade da reclamação prevista no artigo 129.º do Decreto n.º 45266, de 23 de Setembro de 1963, não põe em causa que o ora recorrente efectue essa devolução na sequência da revisão oficiosa da liquidação requerida pelo sujeito passivo, sob pena de violação dos princípios constitucionais da justiça, da igualdade e da legalidade;
III. Decisão com a qual não pode o recorrente conformar-se;
IV. O dissenso que opõe as partes reporta-se portanto unicamente à questão de direito de saber se, existindo autoliquidações de contribuições para a Segurança Social ilegais ou indevidas, como reconhecidamente é o caso, as mesmas devem ser objecto do procedimento de revisão oficiosa previsto no artigo 78.º da LGT, ou se, pelo contrário, se lhes deve aplicar o disposto no artigo 129.º do Decreto nº 45266, em vigor à data dos factos, ainda que entretanto revogado pelo Código dos Regimes Contributivos do Sistema Previdencial de Segurança Social, adiante Código Contributivo;
V. Ainda que com um regime jurídico e uma forma de gestão distintas, as instituições de previdência e, in casu, a Caixa de Previdência, encontravam-se sujeitas às disposições da Lei de Bases da Segurança Social e à legislação dela decorrente, como estabeleceram sucessivamente o artigo 79.º da Lei n.º 28/84, de 14 de Agosto, e os artigos 114.º da Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, e 126.º da Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro, e como resulta actualmente do artigo 106.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de Janeiro, actual Lei de Bases;
VI. À situação em análise é assim aplicável, no entender do recorrente, o disposto no citado Decreto n.º 45266, diploma que regulamentava a estrutura, funcionamento e esquemas de benefícios das caixas sindicais de previdência nas três espécies fundamentais que podiam revestir, cujos artigos 128.º e 129.º estabeleciam, respectivamente, que “1. As contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência serão restituídas a pedido dos interessados na medida em que não sejam devidas a outra caixa sindical (...) 3. Para os fins deste artigo, só se consideram indevidas as contribuições ou/o pagamento não tenha resultado de aplicação directa da lei ou despacho não anulado contenciosamente”, e que “O direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de um ano, a contar da data (...) do pagamento das contribuições, no caso do artigo 128.º»;
VII. Resulta dos princípios gerais do Direito, nomeadamente do princípio da especialidade, que a lei geral não derroga lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador (n.º 3 do artigo 7.º do Código Civil);
VIII. Como salienta Abílio Neto, na fixação dessa intenção, dada a palavra “inequívoca”, deve o intérprete ser particularmente exigente e, segundo Menezes Cordeiro, a existência de intenção inequívoca do legislador deve assentar em referência expressa na própria lei ou pelo menos num conjunto de vectores tão incisivos que a ela equivalham, pelo que, quando se pretenda, através de uma lei geral, revogar leis especiais, designadamente quando se vise firmar um regime genérico e homogéneo, há que dizê-lo, recorrendo à revogação expressa ou, no mínimo, a uma menção revogatória clara;
IX. A LGT define os princípios e regras gerais que regem o direito fiscal português, pelo que se trata de uma lei de aplicação geral que não pode derrogar uma lei especial de aplicação à Segurança Social pois, apesar de a doutrina e a jurisprudência qualificarem as contribuições para a Segurança Social como tributos, estas reconhecidamente têm especificidades relativamente aos demais, sendo por isso objecto de legislação própria;
X. No actual Código Contributivo, o legislador optou por manter o regime jurídico anterior, estabelecendo que o disposto no Código é aplicável, com as necessárias adaptações, às instituições de previdência criadas anteriormente à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 549/77, de 31 de Dezembro e prevendo nos artigos 267.º e seguintes o regime aplicável à restituição de contribuições e quotizações indevidamente pagas, que são aquelas cujo pagamento não resulte da lei, designadamente no âmbito da taxa contributiva (cfr. artigo 267.º n.º 2), com manutenção do prazo de um ano para apresentação do requerimento, ainda que com uma mitigação, de conteúdo favorável ao requerente, na medida em que o prazo já não se conta a partir da data de pagamento, mas a partir da data em que o requerente teve conhecimento de que o pagamento foi indevido (cfr. artigo 271.º, n.º 2);
XI. A expressa aplicação às instituições de previdência criadas antes da entrada em vigor do Decreto-Lei nº 549/77, e a expressa manutenção do regime outrora previsto no Decreto de 1963, contribuem, na opinião do recorrente, para o afastamento da tese sufragada na douta sentença recorrida pois, se o legislador pretendia aplicar às contribuições para a Segurança Social o procedimento de revisão oficiosa previsto na LGT, permanece sem explicação a razão pela qual insistiu na consagração, no Código Contributivo, do procedimento de restituição, sendo certo que um e outro têm os mesmos fundamentos e se destinam ao mesmo fim;
XII. A consagração de um prazo de caducidade para o exercício de um direito não é rara no ordenamento jurídico, e não se deve estranhar que no âmbito do direito da Segurança Social essa caducidade opere de forma distinta à que opera no ordenamento fiscal;
XIII. Como se salientou no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 8/2010, o sistema fiscal do Estado e o sistema da Segurança Social constituem em si realidades diferentes, não só do ponto de vista político, económico ou jurídico, mas também do ponto de vista psicológico e social, muito mais amplo aquele que este, e ambos organizados, evidentemente, a seu modo;
XIV. É assim de admitir que no caso de restituição de contribuições para a Segurança Social indevidamente pagas, o legislador quis ser mais severo para o contribuinte;
XV. Considerando que estão em causa contribuições para a Segurança Social, nunca poderá perder – se de vista a sua singularidade;
XVI. Devendo em consequência, revogar-se a douta sentença recorrida, substituindo-se por outra decisão que considere aplicável ao caso em apreço não a disposição geral prevista no artigo 78.º da LGT, mas o disposto nos artigos 128.º e 129.º do Decreto n.º 45266, concluindo-se que, quando a ora recorrida veio requerer a restituição das contribuições indevidamente pagas, havia há muito decorrido o prazo de caducidade de um ano previsto na lei para o efeito, bem andando o acto impugnado quando decidiu como decidiu.

2 – Por sua vez a recorrida, A………, S.A. apresentou as suas contra alegações, concluindo da seguinte forma:
A. A 8 de junho de 2011 foi a ora recorrida notificada do indeferimento do seu pedido de promoção da revisão oficiosa de um conjunto de actos tributários de autoliquidação de contribuições para a referida Caixa, referentes aos períodos de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008 e relativos a trabalhadores em situação de pré-reforma.
B. Decisão que a ora recorrida impugnou, tendo, para o efeito, apresentado a competente impugnação judicial, solicitando a sua revogação, fundamentando o seu pedido na ilegalidade dos actos de autoliquidação cuja promoção da revisão oficiosa se peticionou derivada da incorrecção dos montantes contributivos entregues, decorrente de erro manifesto na aplicação das taxas contributivas legais relativas aos pré-reformados por desconhecimento da Requerente quanto à realidade da carreira contributiva de alguns beneficiários.
C. Por sentença de 12/06/2013, o Tribunal Tributário de Lisboa entendeu que estavam reunidos os requisitos de aplicação do disposto no art.º 78.º da LGT, reconhecendo o direito da impugnante à revisão oficiosa dos actos de autoliquidação em causa com a consequente restituição do montante indevidamente entregue.
D. Não se conformando com esta decisão, vem a impugnada, ora recorrente, apresentar recurso da mesma, invocando a inaplicabilidade da LGT e da revisão oficiosa às contribuições indevidamente pagas à segurança social e a caducidade do direito de reclamação das mesmas conforme previsto no artigo 129.º do Decreto n.º 45266.
E. Ora, salvo o devido respeito, entende a recorrida que não existe qualquer fundamento ao recurso apresentado e que andou bem o tribunal a quo, na douta decisão recorrida.
F. A questão a decidir no presente recurso resume-se pois à questão de saber se “existindo autoliquidações ilegais, as mesmas devem ou não ser objecto da revisão oficiosa prevista no art.º 78.º da LGT ou se, pelo contrário, o facto de no art.º n.º 129.º do Decreto 45266, de 23 de Setembro se dispor que o direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de um ano, a contar (...) da data do pagamento das contribuições, no caso do artigo 128.º impede essa possibilidade”.
G. Sobre essa questão, entende a recorrida que apesar de existir um regime jurídico específico para eventual aplicação a situações de reembolsos de contribuições pagas à Segurança Social — constante dos artigos 128.º e 129.º do Decreto n.º 45.266, de 23 de Setembro de 1963 - tal não afasta a possibilidade de aplicação de outro regime de carácter geral, no caso a revisão oficiosa prevista no art.º 78.º da LGT, a qual pode e deve ser aplicada ao presente caso.
H. Com efeito, conforme decidiu o Supremo Tribunal Administrativo em Acórdão proferido em 6 de Outubro de 2005, no âmbito do processo n.º 0653/05 ou em Acórdão de 21 de Janeiro de 2009, proferido no âmbito do processo n.º 688/08, “o referido regime especial apenas pode subsistir como regime especial de revisão oficiosa que não afasta a possibilidade de ela ser realizada nos termos previstos naquele art. 78.º [da lei Geral Tributária], quer por iniciativa da administração tributária quer a pedido do contribuinte”.
I. Do mesmo modo, a hipotética caducidade do direito da ora Impugnante peticionar a devolução das quantias pagas indevidamente não obstaria à possibilidade desta requerer a revisão.
J. Sendo que a Caixa de Previdência não pode, validamente, invocar a caducidade do direito de um particular para o não cumprimento de um seu dever, no caso o de proceder à revisão oficiosa da tributação.
K. “Ou seja, a existência de um prazo de caducidade para o requerimento do sujeito passivo, como resulta previsto no art.º 129.º do Decreto n.º 45.266. de 26 de Setembro não é [...] incompatível com a aplicação do disposto no art.º 78.º da LGT (negrito e sublinhado nosso)
L. Demonstrado o erro na autoliquidação das contribuições por si efectuadas, bem como a imputabilidade do mesmo aos serviços, isto é, verificando-se os pressupostos da revisão, a administração tributária não poderá deixar de proceder à mesma, por imposição dos princípios da justiça e do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos cidadãos, que devem nortear a actividade administrativa.
M. Reconhecendo o direito da Impugnante, ora recorrida, à revisão oficiosa dos actos de autoliquidação em causa, com a consequente restituição do montante indevidamente entregue.
N. Devendo em consequência ser negado provimento ao recurso e confirmada a douta sentença recorrida nos seus precisos termos.

3 – O Ministério Público neste Supremo Tribunal Administrativo emitiu fundamentado parecer que, na parte relevante, se transcreve:
«2. A questão suscitada no recurso, como ali é referido, consiste em saber se, estando em causa autoliquidações de contribuições para a segurança social, por erro na taxa de autoliquidação, estas contribuições podem ser objecto do procedimento de revisão oficiosa previsto no artigo 78º da Lei Geral Tributária, por iniciativa do IGFSS, sob impulso do contribuinte.
De acordo com a matéria de facto assente em 1ª instância, estão em causa autoliquidações referentes aos períodos de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008, cuja revisão oficiosa foi suscitada por requerimento apresentado em 15/01/2010.
Não oferece qualquer dúvida que a natureza jurídica das contribuições para a Segurança Social devidas pelas entidades patronais tem sido, uniformemente, qualificada pela Jurisprudência do STA como sendo tributária, por se entender que tais contribuições mais não são do que “prestações exigidas unilateralmente pelo Estado, com carácter imperativo mas não sancionatório, que se destinam ao financiamento do sistema da Segurança Social”, o qual se encontra constitucionalmente consagrado como um direito fundamental - art. 63.º da CRP — cfr. acórdãos da 2.ª Secção do STA de 4/5/94 (rec. 17.958) e de 29/5/96 (rec. 18.986).
Por seu lado o Tribunal Constitucional adoptou igual entendimento no sentido de que “as contribuições para a segurança social que têm como sujeito passivo a entidade patronal - e são essas as únicas que aqui importa considerar - quer sejam havidas como verdadeiros impostos, quer sejam consideradas como uma figura contributiva de outra natureza, é seguro que sempre deverão estar sujeitas aos mesmos requisitos a que aqueles se acham constitucionalmente obrigados” — acórdão nº 183/96 do TC.
Seja considerando as contribuições para a segurança social como impostos ou receitas parafiscais, certo é que as mesmas constituem tributos cuja disciplina está sujeita à Lei Geral Tributária, como se depreende dos artigos 1º e 3º desde diploma legal.
Por outro lado a Lei Geral Tributária, embora não seja uma lei de valor reforçado, na sua aplicação às relações jurídico-tributárias, prevalece, como lei geral, sobre os demais diplomas legais, como se depreende do disposto no seu artigo 2º - cfr. neste sentido Diogo Leite de Campos e outros (Lei Geral Tributária anotada e Comentada, 4ª edição, pág. 65).
Importa, assim, perceber se as normas invocadas pela Segurança Social consagram uma disciplina especial que derrogue nessa parte a disciplina prevista na Lei Geral Tributária.
Dispunham os artigos 128º e 129º do Dec.- Lei nº 45.266, de 23 de Setembro:
Art. 128.º — 1. As contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência serão restituídas a pedido dos interessados na medida em que não sejam devidas a outra caixa sindical.
2. A restituição será feita às entidades patronais e aos beneficiários pela parte proporcional das respectivas contribuições, depois de deduzido o valor de todos os benefícios que na sua base tenham sido concedidos.
3. Para os fins deste artigo, só se consideram indevidas as ‘contribuições cujo pagamento não tenha resultado de aplicação directa de lei ou despacho não anulado contenciosamente.
Art. 129.º O direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de um ano, a contar da data da morte, no caso do n.º 2 do artigo 127º, e da data do pagamento das contribuições, no caso do artigo 128.º
Resulta dos transcritos normativos que o direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições indevidamente pagas se extingue com o decurso do prazo de um ano, a contar da data do seu pagamento.
Ora, o que tais normativos prevêem é um prazo específico de reclamação administrativa, que como regra especial afasta a aplicação de norma geral que consagre outro prazo de reclamação (designadamente o disposto no art. 131º do CPPT).
Por sua vez, o art. 78º da LGT dispõe, no que aqui interessa:
«1. A revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.
(…)»
Como igualmente referem Diogo Leite Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge de Sonsa, em Lei Geral Tributária comentada e anotada, 4.ª edição, nota 3 ao artigo 78.º, p. 705, «o regime do art. 78º, quando o pedido de revisão é formulado para além dos prazos de impugnação administrativa e contenciosa, reconduz-se a um meio de restituição do indevidamente pago, com revogação e cessação para o futuro dos efeitos do acto de liquidação, e não um meio anulatório, com efeito de destruição retroactiva dos efeitos do acto».
Acrescentam aqueles autores: «A esta luz, o meio procedimental de revisão do acto tributário não pode ser considerado como um meio excepcional para reagir contra as consequências de um acto de liquidação, mas sim como um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação)».
E concluem: «trata-se de um regime reforçadamente garantístico, quando comparado com o regime de impugnação de actos administrativos, mas esse reforço encontra explicação na natureza fortemente agressiva da esfera jurídica dos particulares que têm os actos de liquidação de tributos».
Partindo, assim, do pressuposto de que estamos perante “um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos... ou complementar deles”, afigura-se-nos que nada impede a sua aplicação em sede de impugnação do pagamento de contribuições à segurança social, desde que reunidos os respectivos requisitos legais e sem prejuízo da prescrição dessas contribuições.
Com efeito, só o decurso do prazo de prescrição das contribuições é que preclude o direito à restituição do indevido. Ora, no caso concreto dos autos, tendo o pedido sido apresentado em 15/01/2010 e sendo o prazo de prescrição de cinco anos (art. 49º da Lei nº 32/2002, de 20 de Dezembro), conclui-se que ainda não se encontrava esgotado o referido prazo.
Por outro lado o erro na autoliquidação considera-se imputável aos serviços — nº2 do artigo 78º da Lei Geral Tributária.
Entendemos, assim, que se mostra admissível o recurso à revisão do acto tributário, ao abrigo do disposto no artigo 78º da Lei Geral Tributária, para efeitos de apreciação do erro na autoliquidação de contribuições para a segurança social por parte da entidade patronal, no prazo de quatro anos, ainda que sob impulso do contribuinte.
Atento que as autoliquidações dizem respeito ao período de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008 e o requerimento da Recorrida foi apresentado em 15/01/2010, mostra-se respeitado o prazo de 4 anos previsto no nº1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária, que fundamenta a actuação da Segurança Social.
Em face do exposto, entendemos que a sentença recorrida não padece do vício que lhe foi assacado pela Recorrente, motivo pelo qual deve ser confirmada e o recurso ser julgado improcedente.»

4 – Colhidos os vistos legais, cabe decidir.

5 – Em sede factual apurou-se em primeira instância a seguinte matéria de facto:
1. Em 15 de Janeiro de 2010 a ora Impugnante apresentou junto da Comissão Administrativa da Caixa de Previdência do Pessoal dos …………. (doravante Comissão Administrativa) um pedido de promoção da revisão oficiosa de um conjunto actos tributários de autoliquidação de contribuições para a referida Caixa, referentes aos períodos de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008 e relativos a trabalhadores em situação de pré-reforma e identificados nas respectivas folhas resumo, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. requerimento a fls. 125 a 145 e actos de autoliquidação a fls. 30 a 124 dos autos e requerimento a 1 a 19 do PAT).
2. O pedido de promoção da revisão oficiosa referido no ponto anterior teve por fundamento a ilegalidade dos actos de autoliquidação em causa por incorrecção dos montantes contributivos entregues à Caixa de Previdência, decorrente de erro manifesto na aplicação das taxas contributivas legais relativas aos pré-reformados por desconhecimento da Impugnante quanto à realidade da carreira contributiva de alguns beneficiários e que segundo ali alegado se traduziu na aplicação incorrecta por parte da Impugnante das taxas legais na determinação relativas a trabalhadores em situação de pré-reforma de que resultou o pagamento indevido de EUR 2.453.639,29 a título de contribuições da entidade empregadora e de EUR 1.291.397,61 a título de contribuições dos trabalhadores (ct requerimento a fls. 125 a 145 e dos autos e requerimento a 1 a 19 do PAT).
3. Em 3 de Março de 2010 foi produzida pelos serviços da Caixa de Previdência do Pessoal dos ………….. uma comunicação interna, tendo por assunto “Correcção das taxas da pré-reforma. Ponto de situação”, com o seguinte teor (cf. comunicação e folha resumo anexa, a fls. 20 a 21 do PAT):
A A………… apresentou em 15 de Janeiro pp dois requerimentos de revisão oficiosa relativamente aos actos de autoliquidação de contribuições de pré-reforma para esta Instituição.
De acordo com os requerimentos apresentas e conferidos os ficheiros que acompanhavam os requerimentos, apurou-se o seguinte:
- por aplicação incorrecta das taxas 7% do trabalhador + 14.6% da A…… (acrescido de 1% para o Fundo Especial), a A……… entregou contribuições indevidas, de Dezembro/05 a Novembro/08, no valor 3.745.036.90 €. este ficheiro está conferido e está correcto.
- por aplicação incorrecta das taxas de 3% do trabalhador + 7% da A……… (acrescido de 1% para o Fundo Especial), de Dezembro/05 a Abril/09, a A……… enviou um ficheiro que foi devolvido por conter algumas incorrecções. O ficheiro de substituição está conferido e confirma-se que a A……… não entregou 440.505,17€, alterando-se assim o valor indicado inicialmente pela A……… e que era de 290.382.25 €.
- junta-se em anexo uma folha-resumo dos ficheiros em análise, reconhecendo-se que a A…… entregou indevidamente 3.304.531.73 €.
(…)
4. Em 10 de Março de 2010 foi emitido o ofício n.º 396 pelos serviços da Caixa Previdência do Pessoal dos .....…… dirigido ao Secretário de Estado da Segurança Social, tendo por assunto “A……….. — Requerimentos de revisão oficiosa de actos tributários de autoliquidação de contribuições / Taxas de pré-reforma”, com o seguinte teor (ct comunicação e folha resumo anexa, a fls. 20 a 21 do PAT):
(…)
Foram recepcionados pela Caixa de Previdência do Pessoal dos ………….., em 15 de Janeiro do corrente, dois requerimentos de revisão oficiosa emanados pela …………., ambos relativos a actos tributários de autoliquidação de contribuições para a Segurança Social, abrangendo um conjunto de beneficiários em situação de pré-reforma. Segundo a A…………., estará em causa uma aplicação errónea das taxas contributivas legais inerentes à referida condição de pré-reforma, bem como as consequências dai resultantes para a Empresa e para os Beneficiários em questão.
Relativamente a qualquer um dos requerimentos de revisão oficiosa, esta Caixa de Previdência levou a cabo todas as diligências que lhe competem, no sentido de conferir tanto os montantes a débito e a crédito, como os prazos envolvidos. Estando já exaustivamente auditados os valores e prazos em questão e tendo em conta:
a) Que esta Caixa de Previdência não dispõe de um Gabinete Jurídico especializado que possa lidar adequadamente com os diversos meandros jurídicos desta questão e
b) Os montantes até agora apurados,
Vimos por este meio elevar ambos os processos à Vossa consideração e deliberação superior, estando de imediato disponíveis para todo e qualquer esclarecimento que se prefigure como necessário.
(…)
5. Pelos serviços da Caixa Previdência do Pessoal dos …………….. foi produzido e enviado com o ofício referido no ponto anterior um CD contendo ‘ficheiro de revisão oficiosa de taxas de pré-reforma da A......”, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido (cf. CD a fls. 24-A do PAT).
6. Em 8 de Junho de 2011 os serviços da ora Impugnante tomaram conhecimento do indeferimento do seu pedido através do ofício n.º 1199 datado de 7 de Junho de 2011 dos serviços da Caixa de Previdência do Pessoal dos ………….., tendo por assunto “requerimento de revisão oficiosa de actos tributários de auto-liquidação de contribuições de pré-reforma”, do qual consta o seguinte (cf. ofício a fls. 146 a 147 dos autos e 31 a 32 e 38 a 39 e A/R assinado que acompanhou o mesmo a fls. 33-A todas do PAT):
(…)
Submetida a pretensão da requerente à apreciação da Direcção Geral da Segurança Social, com intervenção da Secretaria de Estado da Segurança Social, veio a mesma, em parecer fundamentado, do seu Director Geral, esclarecer os critérios subjacentes ao pedido de reembolso das contribuições, eventualmente, pagas indevidamente.
Alicerçados naquele parecer e atendendo a que:
a) A requerente reclama o reembolso das quantias indevidamente pagas, durante o período de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008;
b) O requerimento da requerente deu entrada na CPP………. no dia 15 de Janeiro de 2009;
c) O reembolso de qualquer contribuição indevidamente paga, teria de ser requerido no prazo de um ano, a conta da data do seu pagamento, de acordo com o estabelecido no artigo 129.º do Decreto n.º 45266, de 23 de Setembro de 1963, em vigor à data do requerimento, que dispõe: “o direito de reclamar a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de um ano a contar da data do pagamento das contribuições”;
d) Quando a requerente formulou o pedido de reembolso tinha decorrido o prazo de um ano, legalmente fixado para o exercício do direito de requerer o reembolso, com o que fica prejudicada, por inutilidade, a possibilidade de aferir se existem contribuições indevidamente pagas;
e) Existindo um regime jurídico específico para a eventual aplicação a situações de reembolsos de contribuições indevidamente pagas à Segurança Social, fica afastada a possibilidade de aplicação de outro regime de carácter geral.
Consequentemente, e sem necessidade de outras apreciações, indefere-se a pretensão da requerente.
7. Em 7 de Julho de 2011 a ora Impugnante requereu junto da Comissão Administrativa “nos termos e para os efeitos previstos nos artigos 24.º, n.º 1, 36º, n.ºs 1 e 2 e 37º, nºs 1 e 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário” que lhe fosse dado conhecimento do teor do parecer do Director-Geral mencionado no ofício referido no ponto anterior, assim como dos meios de defesa ao seu dispor e prazo para reagir contra a decisão de indeferimento ali referida, aqui se dando por integralmente reproduzido o teor do seu requerimento (cf. requerimento a fls. 149 a 154 dos autos e 33 a 37 do PAT).
8. Em 14 de Julho de 2011 os serviços da ora Impugnante receberam através do ofício n.º 1345 datado de 13 de Julho de 2011 da Caixa de Previdência do Pessoal dos ............. o texto do parecer que fundamentou o indeferimento da sua pretensão, por sua vez constante do ofício n.º 2935 de 17/05/2011 da Direcção-Geral da Segurança Social, com o seguinte teor (cf. ofícios respectivamente a fls. 157, 159 a 163 dos autos e 40, 26 a 30 do PAT):
(…)
Em cumprimento da solicitação feita a esta Direcção-Geral, transmite-se o seguinte:
A A………. vem pedir a restituição de contribuições indevidamente pagas relativas a um trabalhadores seus, no período compreendido entre Junho de 2000 e Junho de 2009.
Argumenta para tanto que, tendo a empresa celebrado com trabalhadores seus diversos acordos de pré-reforma, passou a entregar declarações de remunerações e a pagar contribuições e quotizações, naqueles períodos, em detrimento do disposto no artigo 9.º do Decreto-Lei n.º 261/91, de 25 de Julho, cujas normas foram repristinadas pelo Decreto-Lei n.º 87/2004, de 17 de Abril, e que sofreram alteração introduzida pelo Decreto-Lei n.º 187/2007, de 10 de Maio.
Nos termos do Código do Trabalho, configura a situação de pré-reforma a suspensão ou redução da prestação de trabalho para trabalhadores com idade igual ou superior a 55 anos de idade, situação esta que se pode manter até à data em que se verifiquem cumpridas as condições de atribuição de pensão de velhice.
Por seu turno, o regime jurídico da protecção social dos trabalhadores em situação de pré-reforma nos períodos abrangidos pelo pedido encontrava-se definido nos artigos 8º, 9.º, 12.º e 15.º do Decreto-Lei n.º 261/91, de 25 de Julho.
Nos termos deste regime, a taxa contributiva aplicável nestas situações é determinada consoante a carreira contributiva do trabalhador seja, ou não, igual ou superior a 37 anos (cf. artigo 9.º), após entrega do acordo de pré-reforma nos serviços de segurança social.
1. Assim, importará verificar em primeiro lugar se os acordos de pré-reforma foram entregues no serviço competente da Caixa de Previdência e, na afirmativa, quando foi efectuada essa comunicação.
É que, só após a entrega do acordo de pré-reforma - e a consequente verificação do cumprimento das condições pelos serviços de segurança social - se pode tornar aplicável o disposto no Decreto-Lei n.º 261/91 referido, atento também o facto de que a determinação da taxa contributiva aplicável a cada caso ser da competência do serviço de segurança social, visto que apenas os serviços se encontram em condições de aferir o tempo de carreira contributiva dos trabalhadores na segurança social.
2. Levanta-se depois a questão da taxa contributiva aplicável às situações concretas.
Quanto a este assunto, e para uma correcta aplicação da legislação em causa, identificam-se as regras do regime de protecção social nas situações de pré-reforma, por forma que os serviços possam verificar as situações que em concreto fundamentam o pedido de restituição de contribuições indevidamente pagas.
O Decreto-Lei n.º 261/91 determina, no seu artigo 9º, relativo ao regime contributivo, o seguinte:
“1 - As entidades empregadoras e os trabalhadores estão sujeitos a contribuições para a segurança social, que incidem sobre o valor da remuneração que serviu de base ao cálculo da prestação de pré-reforma do mês a que respeitam.
2 - Às contribuições referidas no número anterior são aplicadas as normas relativas ao pagamento das contribuições devidas por remunerações, de acordo com as seguintes taxas:
a) 7% e 3%, a pagar, respectivamente, pela entidade empregadora e pelo trabalhador, no caso de este ter completado 37 anos de período contributivo,
b) 14,6% e 7%, a pagar, respectivamente, pela entidade empregadora e pelo trabalhador, nos restantes casos.”
Ora, resultando da situação de pré-reforma o enquadramento específico no regime geral de segurança social dos trabalhadores por conta de outrem, a consideração da carreira contributiva do trabalhador, para efeitos de determinação da taxa contributiva aplicável, nos termos do n.º 2 do artigo 9.º identificado, deverá ter em conta exclusivamente os períodos registados na carreira contributiva na segurança social.
Ou seja, relativamente a cada trabalhador poderá verificar-se a existência de períodos de actividade que sejam relevantes para atribuição de pensão mas não são relevantes para verificar s carreira contributiva do mesmo na segurança social. É o caso, por exemplo, da prestação de serviço militar obrigatório, por um lado, ou de carreira contributiva (tempo de serviço) noutros regimes de protecção social, nacionais ou estrangeiros.
Importará assim, face à alegação da empresa interessada, verificar qual a efectiva carreira com contribuições na segurança social de cada um dos trabalhadores em causa à data em que foi entregue cada acordo de pré-reforma, pois só desta forma se torna possível aferir da correcção do fundamento invocado.
3. Verificadas as condições, e caso se mantenha válido o fundamento para o pedido de restituição de contribuições, importa então avaliar o pedido em si.
É o serviço competente de aplicação do regime de segurança social que determina a taxa aplicável a cada caso concreto, o que é efectuado com base no documento apresentado e na informação constante do sistema. De facto, dos termos do acordo resulta a definição do âmbito material a que o trabalhador passa a ter direito, e com base na verificação do período de contribuições na segurança social - carreira contributiva - resulta a definição da taxa contributiva que a empresa deverá aplicar.
Assim, não tendo sido correctamente avaliados os pressupostos para a aplicação da taxa contributiva devida, e tendo por esse motivo a entidade empregadora sido obrigada a pagar contribuições com base em taxa superior à legalmente prevista, encontram-se preenchidas todas as condições previstas na lei para a restituição das contribuições agora pedida.
Em matéria de Segurança Social, o regime jurídico relativo à restituição de contribuições indevidamente pagas relativamente às situações concretamente em apreço encontra-se previsto nos artigos 128.º e 129.º do Decreto n.º 45.266, de 23 de Setembro de 1963.
Determina o artigo 128.º referido o seguinte:
“1. As contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência serão restituídas a pedido dos interessados na medida em que não selam devidas a outra caixa sindical
2. A restituição será feita às entidades patronais e aos beneficiários pela parte proporcional das respectivas contribuições, depois de deduzido o valor de todos os benefícios que na sua base tenham sido concedidos.
3. Para os fins deste artigo, só se consideram indevidas as contribuições cujo pagamento não tenha resultado de aplicação directa de lei ou despacho não anulado contenciosamente.”
Nos termos do artigo 129.º do mesmo diploma, o direito de reclamar a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de um ano, a contar da data do pagamento das contribuições.
Sendo certo que o requerimento de restituição de contribuições deu entrada na Caixa de Previdência em Novembro de 2009 importará assim averiguar, caso seja verificado o direito a restituição, se relativamente a cada um dos trabalhadores abrangidos (e a data do pagamento da última contribuição em seu nome), está, ou não, ultrapassado o prazo de 1 ano sobre a data do pagamento das contribuições.

(…)

9. Em 7 de Setembro de 2011 a PI da presente impugnação judicial deu entrada no tribunal de Lisboa (cf. comprovativo de entrega de documento e carimbo aposto a fls. 2 dos autos.

6. Do objecto do recurso

Da análise do segmento decisório da sentença e dos fundamentos invocados pela entidade recorrente para pedir a sua alteração, podemos concluir que a questão objecto do recurso consiste em saber se padece de erro de julgamento a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa que julgou procedente a impugnação deduzida pela A………., SA, no entendimento de que, estando em causa autoliquidações de contribuições para a segurança social por erro na taxa de autoliquidação, estas contribuições podem ser objecto do procedimento de revisão oficiosa previsto no artigo 78º da Lei Geral Tributária, por iniciativa do IGFSS, sob impulso do contribuinte, e que a isso não obsta a existência de um prazo de caducidade para o requerimento do sujeito passivo, como o que resulta previsto no artº 129º do Decreto nº 45.266 e, mais tarde, no artº 271º, nº 2 do Código dos Regimes Contributivos.

A sentença do Tribunal Tributário de Lisboa perante a questão que lhe era proposta, de saber se existindo autoliquidações ilegais de contribuições para Comissão Administrativa da Caixa de Previdência do Pessoal dos …………, a que veio a suceder Instituto da Segurança Social, IP, as mesmas podiam ser objecto da revisão oficiosa prevista no art. 78.º da LGT e se a tal obstava o disposto no 129.º do Decreto n.º 45.266, de 23 de Setembro de 1963, concluiu que «por força do disposto no artigo 1º e no próprio art. 78.º da LGT, que se refere à revisão dos “actos tributários”, nos quais têm necessariamente de se incluir as contribuições para a segurança social, a revisão oficiosa ali prevista é aplicável às contribuições em apreço».

Mais ponderou a sentença recorrida que «a existência de um prazo de caducidade para o requerimento do sujeito passivo, como resulta previsto no art. 129.º do Decreto n.º 45.266 e mais tarde, no art. 271.º, n.º 2, Código dos Regimes Contributivos, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro (entrado em vigor a 1 de Janeiro de 2011 e aplicável com as necessárias adaptações, às instituições de previdência criadas anteriormente à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 549/77, de 31 de Dezembro, nos termos do artigo 2.º da Lei 110/2009) não é, sob pena de violação dos princípios constitucionais da justiça, da igualdade e da legalidade (….), incompatível com a aplicação do disposto no art. 78.º da LGT no que diz respeito à revisão oficiosa, ainda que a mesma seja accionada pelo próprio contribuinte».

Não conformado vem o Instituto da Segurança Social interpor o presente recurso.
A base da sua argumentação assenta nas seguintes proposições:
- À situação em análise é aplicável o disposto no citado Decreto n.º 45266, diploma que regulamentava a estrutura, funcionamento e esquemas de benefícios das caixas sindicais de previdência nas três espécies fundamentais que podiam revestir, cujos artigos 128.º e 129.º estabeleciam, respectivamente, que “1. As contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência serão restituídas a pedido dos interessados na medida em que não sejam devidas a outra caixa sindical (...) 3. Para os fins deste artigo, só se consideram indevidas as contribuições ou/o pagamento não tenha resultado de aplicação directa da lei ou despacho não anulado contenciosamente”, e que “O direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições extingue-se pelo prazo de um ano, a contar da data (...) do pagamento das contribuições, no caso do artigo 128.º»;
- Resulta dos princípios gerais do Direito, nomeadamente do princípio da especialidade, que a lei geral não derroga lei especial, excepto se outra for a intenção inequívoca do legislador (n.º 3 do artigo 7.º do Código Civil);

- A LGT define os princípios e regras gerais que regem o direito fiscal português, pelo que se trata de uma lei de aplicação geral que não pode derrogar uma lei especial de aplicação à Segurança Social pois, apesar de a doutrina e a jurisprudência qualificarem as contribuições para a Segurança Social como tributos, estas reconhecidamente têm especificidades relativamente aos demais, sendo por isso objecto de legislação própria;

6.1 Apreciando e decidindo
Do pedido de revisão do acto tributário e respectivos pressupostos
A nosso ver o recorrente não faz, do artº 78º nº da LGT, a melhor interpretação, pois não tem em conta a intenção subjacente ao nº 2 do referido preceito que foi a de alargar as possibilidades de revisão nestas situações de autoliquidação, em relação às que existiam no domínio da CPT, solução esta que está em sintonia com a directriz primordial da autorização legislativa em que se baseou o Governo para aprovar a LGT, que era a de reforço das garantias dos contribuintes.
Vejamos, pois.
Nos termos do artº 78º, nº 1 da LGT a revisão dos actos tributários pela entidade que os praticou pode ser efectuada por iniciativa do sujeito passivo, no prazo de reclamação administrativa e com fundamento em qualquer ilegalidade, ou, por iniciativa da administração tributária, no prazo de quatro anos após a liquidação ou a todo o tempo se o tributo ainda não tiver sido pago, com fundamento em erro imputável aos serviços.
A revisão do acto tributário, como vem afirmando de modo pacifico e constante a doutrina e a jurisprudência desta Secção, constitui um meio administrativo de correcção de erros de actos de liquidação de tributos, que é admitido como um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação) e tem em vista possibilitar sanar injustiças de tributação tanto a favor do contribuinte como a favor da administração - cf. neste sentido, entre outros, Acórdãos da Secção de Contencioso Tributário de 12.07.2006, recurso 402/06, de 20.11.2007, recurso 536/07, de 06.10.2005, recurso 653/05, de 22.03.2011, recurso 1009/11 e de 29.10.2014, recurso 1540/13, todos in www.dgsi.pt e na doutrina Lei Geral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, 4ª edição, Encontro da Escrita, pag. 702 e segs,
A revisão é sempre efectuada pela entidade que praticou o acto (art. 78.º, n.º 1, da L.G.T.) e pode ser efectuada por iniciativa do contribuinte ou por iniciativa da administração tributária.
Constitui este meio procedimental um reconhecimento no âmbito do direito tributário do dever de revogar de actos ilegais.
O dever de a Administração concretizar a revisão de actos tributários, a favor do contribuinte, quando detectar uma situação desse tipo por sua iniciativa ou do contribuinte, existe em relação a todos os tributos, pois os princípios da justiça, da igualdade e da legalidade, que a administração tributária tem de observar na globalidade da sua actividade (artº 266.º, n.º 2, da C.R.P. e 55.º da L.G.T.), impõem que sejam oficiosamente corrigidos todos os erros das liquidações que tenham conduzido à arrecadação de tributo em montante superior ao que seria devido à face da lei. (Neste sentido, podem ver-se, entre outros, os acórdãos do S.T.A. de 11-5-2005, recurso 319/05, de 06.10.2005, recurso 653/05, e de 12.07.2006, recurso 402/06).
Assim é hoje pacificamente aceite pela jurisprudência e pela doutrina que, mesmo quando oficiosa, a revisão do acto tributário pode ser impulsionada por pedido do contribuinte, no prazo de quatro anos que a lei confere à Administração Fiscal para o fazer, caso se verifiquem os respectivos pressupostos legais.
Sobre a interpretação que a Secção de Contencioso Tributário faz do regime de revisão do acto tributário e do disposto no artº 78º da LGT e nomeadamente sobre a possibilidade de pedir a revisão oficiosa do acto tributário para além dos prazos de reclamação administrativa, cumpre salientar o que ficou dito no supra citado Acórdão 536/07, cuja fundamentação jurídica acompanhamos.
Como se refere naquele aresto, «(….) é de notar que na autorização legislativa em que se baseou a aprovação da LGT pelo Governo se indicava como princípio primacial a assegurar o «reforço das garantias dos contribuintes» (artº 1º, nº 2, da Lei nº 41/98, de 4 de Agosto), pelo que, estando estas garantias incluídas na reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República [arts. 103º, nº 2, e 165º, nº 1, alínea i), da CRP], é de concluir com segurança que qualquer norma da LGT que, na sua redacção inicial, concretize uma redução dessas garantias será organicamente inconstitucional.

“É a esta luz que se tem de interpretar o artº 78º da LGT que estabelece o regime da revisão dos actos tributários. (…) “Embora este artº 78º da LGT, no que concerne a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte, se refira apenas à que tem lugar dentro do «prazo de reclamação administrativa», no seu nº 6 (nº 7 na redacção actualmente vigente) faz-se referência a «pedido do contribuinte», para a realização da revisão oficiosa, o que revela que esta, apesar da impropriedade da designação como «oficiosa», pode ter subjacente também a iniciativa do contribuinte. Idêntica referência é feita no nº 1 do artº 49º da LGT, que fala em «pedido de revisão oficiosa».
“Esta possibilidade de a revisão «oficiosa», que deve ser da iniciativa da administração tributária, ser suscitada por um pedido do contribuinte veio a ser confirmada pela alínea a) do nº 4 do artº 86º do C.P.P.T., que refere a apresentação de «pedido de revisão oficiosa da liquidação do tributo, com fundamento em erro imputável aos serviços».
“É, assim, inequívoco que se admite, a par da denominada revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (dentro do prazo de reclamação), que se faça, também na sequência de pedido seu, a «revisão oficiosa» (que a Administração deve realizar por sua iniciativa).
“Por outro lado, a alínea d) do nº 2 do artº 95º da L.G.T. refere os actos de indeferimento de pedidos de revisão entre os actos potencialmente lesivos, que são susceptíveis de serem impugnados contenciosamente. Não se faz, aqui qualquer distinção entre actos de indeferimento praticados na sequência de pedido do contribuinte efectuado no prazo da reclamação administrativa ou para além dele, pelo que a impugnabilidade contenciosa a actos de indeferimento de pedidos de revisão praticados em qualquer das situações, o que, aliás, é corolário do princípio constitucional da impugnabilidade contenciosa de todos os actos que lesem direitos ou interesses legítimos dos administrados (artº 268º, nº 4, da C.R.P.).
“Também à face da LGT, não é indiferente para o contribuinte impugnar ou não os actos de liquidação dentro dos respectivos prazos, pois em caso de anulação em processo impugnatório, judicial ou administrativo, pode ser invocada qualquer ilegalidade e, no caso de erro imputável aos serviços, há direito a juros indemnizatórios (artº 43º, nº 1, da LGT), enquanto nos casos de revisão oficiosa da liquidação (quando não é feita a pedido do contribuinte, no prazo da reclamação administrativa, situação que é equiparável à de reclamação graciosa) apenas há direito a juros indemnizatórios nos termos do artº 43º, nº 3, da LGT e a anulação apenas pode ter por fundamento erro imputável aos serviços e duplicação de colecta (artº 78º, nºs 1 e 6, da LGT). “Assim, é de concluir que, o facto de ter transcorrido o prazo de reclamação graciosa e de impugnação judicial do acto de liquidação, não impedia a impugnante de pedir a revisão oficiosa e impugnar contenciosamente o acto de indeferimento desta (Cfr., entre outros, os Acórdão do STA de 12/2/2001, rec nº 26233/2001; 19/2/2003, rec. nº 1461/02;9/4/2003, rec nº 422/03; e de 2/2/2005, rec nº 1171/04.). (…).
“Exposto este regime da revisão do acto tributário e impugnação das decisões proferidas (ou omitidas) no seu âmbito, chega-se à conclusão que não obsta à possibilidade de impugnação contenciosa a falta da reclamação prevista no artº 151º do CPT e, depois, no artº 131º do CPPT.
“Na verdade, essa reclamação era necessária para a impugnação judicial do acto de autoliquidação, com o regime geral da impugnação de actos anuláveis e com aos efeitos retroactivos próprios dos meios anulatórios.
“Porém, a sua falta não obsta (como também não obsta a impugnação judicial dos actos que podem ser impugnados contenciosamente por via directa), a que possa ser pedida a revisão oficiosa, com os efeitos próprios desta, limitados à cessação dos efeitos do acto, traduzida na restituição do que foi recebido pela administração tributária e que não deveria ter sido pago, à face do regime substantivo aplicável (eventualmente acrescida de juros indemnizatórios nos termos do nº 3 do artº 43º da LGT, sem natureza retroactiva)”.

Acresce dizer, regressando ao Acórdão que temos vindo a seguir, que “o nº 2 do referido artº 78º, ao estabelecer que «sem prejuízo dos ónus legais de reclamação ou impugnação pelo contribuinte, considera-se imputável aos serviços, para efeitos do número anterior, o erro na autoliquidação», poderia sugerir uma interpretação no sentido de, nos casos de autoliquidação, sem reclamação ou impugnação prévia não poder haver revisão. (É incompreensível a referência feita no início deste nº 2 ao «ónus legais de reclamação ou impugnação», parecendo mesmo que se trata de um lapso, pois o que seria compreensível e adequado seria referirem-se os «direitos legais de reclamação e impugnação», que, naturalmente, como sucede relativamente a qualquer outra liquidação, não são prejudicados pelo facto de haver possibilidade de revisão do acto tributário.)
“Porém, pelo que se disse sobre o sentido da autorização legislativa em que se baseou a aprovação da LGT pelo Governo, assente que à face do CPT era possível a revisão oficiosa nos casos de autoliquidação quando não tivesse sido apresentada reclamação graciosa e estivesse expirado o prazo para a apresentar, se aquele nº 2 pudesse ser interpretado com o sentido de impedir a revisão oficiosa quando não tivesse havido nem pudesse haver já reclamação graciosa, estar-se-ia perante uma situação em que a LGT diminuiria as garantias dos contribuintes, o que implicaria a inconstitucionalidade orgânica daquela norma, por ser uma iniciativa legislativa contrária à lei de autorização (artº 112º, nº 2, da CRP).
“No entanto, a interpretação referida não é forçosa, pois, embora a redacção do nº 2 do artº 78º seja infeliz, pela falta de clareza, o seu perceptível alcance, ao ficcionar que todos os erros na autoliquidação, para efeitos do nº 1, se consideram imputáveis aos serviços, é o de admitir a possibilidade de revisão oficiosa em todos os casos.
“Na verdade, a imputação de todos os erros da autoliquidação à administração tributária é uma ficção que está em manifesta dissonância com a realidade, pois, sendo o contribuinte quem faz a autoliquidação, o que é normal é que os erros lhe sejam imputáveis a ele próprio, que a fez, e não à administração tributária, que não a fez. “Apenas se entrevê a possibilidade de erros na autoliquidação serem imputáveis à administração tributária nos casos em que esta procedeu a correcções ou em que o contribuinte incorreu em erros seguindo instruções que aquela lhe forneceu. “Por outro lado, esta ficção de que todos os erros da autoliquidação são imputáveis à administração tributária vale apenas «para efeitos do número anterior», que estabelece as condições de admissibilidade da revisão oficiosa, fazendo depender a revisão por iniciativa da administração tributária da existência de erro imputável aos serviços. Isto é, esta ficção não vale para outros efeitos, designadamente para determinar direito a juros indemnizatórios.
“Por isso, é de concluir que o objectivo que se teve em vista com o nº 2, foi alargar as situações em que é admissível a revisão em casos de autoliquidação, permitindo-a sempre (e não apenas nos caso em que tivesse havido correcção dos elementos evidenciados pela declaração, como sucedia no regime do artº 94º, nº 2, do CPT), inclusivamente quando o erro é imputável ao contribuinte, que passou a ficcionar-se como imputável à administração tributária.

Concordando com a fundamentação desta jurisprudência (Que foi seguida por muitos outros arestos desta Secção, nomeadamente os que abaixo se citam, sem pretensões de exaustão: de 29.10.2014, recurso 1540/13, de 29.05.2013, recurso 140/13, de 12.09.2012, recurso 476/12, de 14.06.2012, recurso 259/12, de 14.03.2012, recurso 1007/11, de 14.12.2011, recurso 366/11, de 20.11.2007, recurso 536/07, de 2-2-2005, recurso nº 1171/04, todos in www.dgsi.pt.) entendemos que deve a mesma ser reiterada e aplicada no caso vertente, havendo de concluir-se que se mostram reunidos os requisitos legais para que a Impugnante pudesse pedir a revisão oficiosa, nos temos do artº 78º da LGT e dentro do prazo legal em que a Administração a podia efectuar.

Com efeito, no caso em apreço estão em causa contribuições para Comissão Administrativa da Caixa de Previdência do Pessoal dos ……………, a que veio a suceder Instituto da Segurança Social, IP.
Como é sabido a natureza jurídica das contribuições para a Segurança Social devidas pelas entidades patronais tem sido doutrinaria e jurisprudencialmente qualificada como tributária, sendo tais contribuições consideradas como impostos, ou pelo menos como equiparadas a impostos (Neste sentido, e sobre a natureza das contribuições para a Segurança Social vide, Casalta Nabais, Direito Fiscal, 6ª edição, Almedina, pags. 662 e segs., Nazaré da Costa Cabral, Contribuições para a Segurança Social - Natureza de Regime e de Técnicas e Perspectivas de Evolução num Contexto de Incerteza, Cadernos do IDEFF, nº 12, ed. Almedina, J.J.Teixeira Ribeiro, anotações ao Acórdão de 24 de Janeiro de 1996, revista de Legislação e Jurisprudência, 1 de Junho de 1996, Ano 129º, nº 3863, e Nuno Sá Gomes, Manual de Direito Fiscal, vol. I, ed. Rei dos Livros, pag. 322.).
Como refere Casalta Nabais (ob. citada, pag. 663) trata-se de uma acepção que vem sendo admitida um pouco por toda a parte e que, no nosso regime jurídico, tem manifestações importantes traduzidas no seguinte : «1) na integração das contribuições para a segurança social no nível de fiscalidade ou carga fiscal, nomeadamente para efeitos da sua comparação internacional ; 2) na equiparação das contribuições para a segurança social aos impostos, ao menos para efeitos jurídico-constitucionais, que o mesmo é dizer em sede da constituição fiscal ; 3) na aplicação às contribuições para a segurança social das normas do procedimento e processo tributários e do regime das infracções tributárias (v. o art. 1.º do CPPT e os arts. 1.º, n.º 1, al. d) e 106.º e 107 .º do RGIT)”
Também a jurisprudência do Tribunal Constitucional tem considerado as contribuições para a Segurança Social como impostos, desde a Constituição de 1976, e como tal sujeitas ao princípio da legalidade tributária (cfr., entre outros, os Acórdãos nºs 183/96 e 621/99, publicados, respectivamente, no Diário da República, II Série, de 23/05/1996 e 23/02/2000) .
E no mesmo sentido se tem pronunciado a jurisprudência desta secção, de que destacamos, os Acórdãos de 16.06.1999, recurso 23889 e de 23.05.2007, recurso 63/07, e o Acórdão do Pleno da Secção de 26.02.2014, recurso 1481/13, todos in www.dgsi.pt.
Temos, pois, por seguro que, em temos doutrinais e jurisprudenciais, as contribuições para a Segurança Social são consideradas, à luz do actual quadro legislativo, como impostos (pese embora com algumas peculiaridades).
E, assim sendo, assumem natureza tributária, sendo-lhes aplicável a LGT (arts. 1º e 3º da LGT).
Por outro lado resulta do probatório, e foi consignado na sentença recorrida, que a entidade impugnada e ora recorrente aceita que as autoliquidações em causa são ilegais (cf. artº 35.º da contestação e pontos 3 e 4 da fundamentação de facto), e que a impugnante entregou indevidamente a quantia de EUR 3.304.531,73, circunstância que se ficou a dever a um erro no apuramento das taxas aplicáveis nos termos do disposto no n.º 2 do art. 9º, do Decreto-Lei n.º 261/91, de 25/07, por sua vez motivado pelo desconhecimento da realidade contributiva de alguns dos beneficiários do esquema prestacional e contributivo da Caixa de Previdência.
Ora como vimos o nº 2 do artº 78º da LGT prevê um alargamento situações em que é admissível a revisão em casos de autoliquidação, permitindo-a sempre, inclusivamente quando o erro é imputável ao contribuinte, que passou a ficcionar-se como imputável à administração tributária.

Por outro lado, e tendo em conta que as autoliquidações dizem respeito ao período de Dezembro de 2005 a Novembro de 2008 e o requerimento da Recorrida foi apresentado em 15/01/2010, mostra-se respeitado o prazo de 4 anos previsto no nº1 do artigo 78º da Lei Geral Tributária,
Neste particular aspecto recorrente sustenta que não será aplicável o a disposição geral prevista no artigo 78.º da LGT, mas o disposto nos artigos 128.º e 129.º do Decreto n.º 45266, que estabelece um prazo de caducidade de um ano para o exercício do direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência, argumentando com a pretensa especialidade deste regime legal em relação à LGT.
Mas não lhe assiste razão.
É certo que, nos termos do disposto nos arts. 129º do DL nº 45266, de 23 de Setembro de 1963, o direito de reclamar o reembolso ou a restituição das contribuições se extingue pelo prazo de um ano, a contar da data da morte, no caso do n.º 2 do artigo 127º, e da data do pagamento das contribuições, no caso do artigo 128.º(as contribuições indevidamente pagas a uma caixa sindical de previdência).
Porém, como bem nota o Exmº Magistrado do Ministério Público no seu parecer, o que tais normativos prevêem é um prazo específico de reclamação administrativa, que como regra especial afasta a aplicação de norma geral que consagre outro prazo de reclamação (designadamente o disposto no art. 131º do CPPT).
Esse prazo específico de reclamação administrativa não contende assim, com o prazo para dedução do pedido de revisão do acto tributário previsto no artº 78º da LGT o qual constitui um meio alternativo dos meios impugnatórios administrativos e contenciosos (quando for usado em momento em que aqueles ainda podem ser utilizados) ou complementar deles (quando já estiverem esgotados os prazos para utilização dos meios impugnatórios do acto de liquidação) e tem em vista possibilitar sanar injustiças de tributação tanto a favor do contribuinte como a favor da administração.
De facto não está apenas em causa o direito do contribuinte solicitar o reembolso das contribuições pagas indevidamente, mas o dever de revogar actos ilegais, constituindo a revisão do acto tributário um meio complementar dos meios impugnatórios administrativos tendo em vista a correcção de erros de actos de liquidação de tributos.
Por isso não há qualquer relação de especialidade entre o regime previsto nos arts. 128 e 129 do DL nº 45266 e o regime de revisão do acto tributário previsto no artº 78º da LGT.
É que a Lei Geral Tributária, pela sua própria natureza, tem subjacente uma intenção legislativa de aplicabilidade à generalidade das relações tributárias e prevalece, como lei geral, sobre os demais diplomas legais, como se depreende do disposto no seu artigo 2º (Neste sentido Acórdão desta secção de 6.10.2005, recurso 653/05 e Lei Geral Tributária Anotada, Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, 4ª edição, Encontro da Escrita, pag. 65. ).
Assim, em face de tudo o exposto, forçoso é concluir que, apesar de não ter sido deduzida reclamação administrativa no prazo do artº 129º do DL nº 45266, no caso estavam reunidos todos os requisitos legais para que a Impugnante pudesse pedir a revisão do acto tributário, dentro do prazo legal em que a Administração a podia efectuar.
A sentença recorrida, que assim decidiu não incorre no erro de julgamento que lhe é imputado pela recorrente, pelo que improcederá o recurso.

7. Decisão:
Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente (tendo em atenção o valor da causa fixado a fls. 274).

Lisboa, 18 de Novembro de 2015. - Pedro Delgado (relator) - Casimiro Gonçalves - Dulce Neto.