Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0630/18.4BALSB
Data do Acordão:05/20/2020
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:NEVES LEITÃO
Descritores:JUROS INDEMNIZATÓRIOS
PEDIDO DE REVISÃO
Sumário:Formulado pelo sujeito passivo o pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação e vindo o acto a ser anulado, ainda que em processo arbitral instaurado após o indeferimento tácito daquela revisão, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano, contado da apresentação do pedido de revisão, até à data do processamento da respectiva nota de crédito, e não desde a data do pagamento indevido do imposto (art.43º nºs1 e 3 al.c) LGT; art. 61º nº5 CPPT).
Nº Convencional:JSTA000P25930
Nº do Documento:SAP202005200630/18
Data de Entrada:06/27/2018
Recorrente:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A......................., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Pleno da Secção de Contencioso Tributário


1. RELATÓRIO

1.1. A Autoridade Tributária e Aduaneira interpôs recurso para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral proferida pelo Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) em 21 maio 2018 (processo 478/2017-T) invocando contradição com o acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo-Secção de Contencioso Tributário em 12 junho 2017 no processo 0926/17 (acórdão fundamento)

1.2. A recorrente apresentou alegações que sintetizou com a formulação das seguintes conclusões:
A. O presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência tem como objeto a decisão arbitral proferida no processo n.º 478/2017-T em 21-05-2018, por Tribunal Arbitral em matéria tributária constituído, sob a égide do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), na sequência de pedido de pronúncia arbitral presentado ao abrigo do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro.
B. A decisão arbitral recorrida colide frontalmente com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo em diversos e reiterados acórdãos, mormente no Acórdão proferido no âmbito do processo n.º 0926/17, datado de 12/06/2017, já transitado em julgado, no segmento decisório respeitante à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios.
C. O Acórdão arbitral recorrida incorreu em erro de julgamento, quando condenou a Requerida arbitral, aqui Recorrente a “(. . .) restituir à Requerente o imposto do selo por ela pago, acrescido de juros indemnizatórios, desde a data dos pagamentos efectuados até ao reembolso.”, enquadrando o pedido de pagamentos de juros indemnizatórios no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, em contradição total com o Acórdão fundamento e contrariando a jurisprudência reiterada do STA.
D. Quando a alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º o da LGT determina que nas situações, como a dos autos, de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão, prazo que se completou em 21.04.2018.
E. No Acórdão fundamento (também) estava em causa a extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art.43° n.º 3 al. c) LGT), como podemos constatar através do seguinte segmento que se cita: «Desse indeferimento interpôs impugnação judicial que foi julgada procedente pela sentença recorrida. E, assim sendo, apenas são devidos juros indemnizatórios decorrido um ano após o pedido de revisão dos actos tributários, ou seja, a partir de 28/04/2018.
Razão por que a sentença recorrida, na parte sindicada, não pode manter-se, devendo os juros indemnizatórios a favor da impugnante ser contabilizados a partir do decurso do prazo de um ano após a formulação do pedido de revisão oficiosa, ou seja, a partir de 28/04/2008, sendo devidos até a emissão da respectiva nota de crédito.»
F. Demonstrada está, assim, uma evidente contradição entre o Acórdão arbitral recorrido e o Acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito (que se prende com o pagamento de juros indemnizatórios nas situações de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte) que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso, requerendo-se a consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição por nova decisão que apenas reconheça à Recorrida arbitral o direito a juros indemnizatórios sobre as quantias pagas, a partir do decurso do prazo de um ano a contar da data do pedido da sua revisão oficiosa, apresentada em 21.04.2017 (n.º 6 do artigo 152.º do CPTA), na senda da jurisprudência reiterada por esse Douto Tribunal.
G. A infração a que se refere o n.º 2 do artigo 152º do CPTA, consiste num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que a Decisão Arbitral viola o disposto na alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT o qual determina que nas situações de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.
H. Ora, o pedido de revisão oficiosa que constituiu objeto da ação arbitral foi apresentado no dia 21.04.2017, não tendo sido tomada uma decisão por parte da AT dentro do prazo de um ano previsto na alínea c) do n.º 3 do artigo 43.º da LGT, não sendo por isso devidos juros indemnizatórios desde o pagamento das liquidações, ao contrário do que decidiu o Acórdão arbitral recorrido, mas somente desde 21.04.2018.
I. Por tudo o exposto, resta concluir que a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento por violação das normas legais aplicáveis, bem como se encontra em manifesta oposição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada pelo STA no Acórdão fundamento, devendo ser substituída por nova decisão que julgue improcedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde o pagamento das liquidações impugnadas.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser aceite e posteriormente julgado procedente, por provado, sendo, em consequência, nos termos e com os fundamentos acima indicados revogada a decisão arbitral recorrida e substituída por decisão consentânea com o quadro jurídico vigente.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações

1.4.O Ministério Público pronunciou-se no sentido de o recurso dever ser julgado findo, por inexistência de duas decisões expressas incompatíveis quanto a idêntica questão fundamental de direito (processo físico fls.40/44).

1.5. Após vistos dos juízes conselheiros adjuntos cumpre apreciar e decidir no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO
2.1.1. A decisão arbitral julgou provados os seguintes factos:
a) A Requerente é uma sociedade com sede em Lisboa que se dedica à compra e venda de bens imobiliários e consultoria e gestão de imóveis.
b) Era proprietária, em 31 de Dezembro de 2013 e como tal se manteve até, pelo menos, 31 de Dezembro de 2014, do prédio urbano inscrito na matriz como terreno para construção sob o artigo matricial 2404, da freguesia da …………, concelho de Lisboa, cujo valor patrimonial tributário (VPT) era, nessa data, de € 3.236.540,00.
c) O terreno tem uma área total de 2.704,570 m2
d) Em 03/08/2012 a Requerente viu aprovado pela Câmara Municipal de Lisboa o projecto de arquitectura que lhe submetera, para uma área bruta de construção de 7.212,220 m2, no identificado terreno, sendo 1.625,700 m2 destinados a habitação e o demais a serviços e comércio.
e) Foi notificada, em 28 de Março de 2015, da liquidação do IS 2014.9000354748, de 20 de Março de 2015, de imposto referente ao ano de 2014, no montante de € 33.093,62, através da nota de cobrança nº 2015.003472646, documento para pagamento da primeira de três prestações, no montante de € 11.031,22.
f) Foi mais tarde notificada para o pagamento das segunda e terceira prestações do imposto referente ao ano de 2014 através das notificações nºs. 2015.003472647 e 2015.003472648, respectivamente.
g) A Requerente foi também notificada em 8 de Abril de 2016 da liquidação do IS nº 2015.9000382754, de 4 de AbriI de 2016, imposto referente ao ano de 2015, no montante de € 33.093,62, através da nota de cobrança nº 2016.001629333, para pagamento da primeira de três prestações, no montante de € 11.031,22.
h) Posteriormente foi notificada para o pagamento das segunda e terceira prestações do imposto referente ao ano de 2015 através das notificações nºs. 2016.001629334 e 2016.001629335, cada uma no montante de € 11.031,20.
i) As liquidações identificadas resultaram da aplicação da Verba 28.1 da Tabela Geral do Imposto do Selo (TGIS).
j) Em 21 de Abril de 2017 deduziu reclamação graciosa contra as referidas liquidações, sem que tenha obtido decisão.
k) A Requerente procedeu aos pagamentos seguintes:
em 30/04/2015, € 11.031,22, 1ª prestação do IS de 2014;
em 31/07/2015, € 11.031,20, 2ª prestação do IS de 2014;
em 21/12/2015, € 11.031,20, 3ª prestação do IS de 2014;
em 29/04/2016, € 11.031,22, 1ª prestação do IS de 2015;
em 01/08/2016, € 11.031,20, 2ª prestação do IS de 2015;
em 21/11/2016, € 11.031,20, 3ª prestação do IS de 2015.

2.1.2. O acórdão fundamento julgou provados os seguintes factos:
A. A impugnante é uma sociedade anónima com sede e estabelecimento estável em Itália— cfr. fls. 68 a 93 do processo físico.
B. Durante os anos de 2003 e 2004, a sociedade comercial de direito neerlandês B……..(B…..) não dispunha de sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável em território nacional, sendo residente, para efeitos fiscais, nos Países Baixos, aí se encontrando sujeita e não isenta, sem possibilidade de opção, ao imposto neerlandês sobre o rendimento das sociedades— cfr. fls. 130 e ss. do processo físico.
C. Em 29.04.2003, a B……. era titular de 65.659.233 acções do Banco BPI, SA, adquiridas pelo valor de € 100.528.306,60, das quais 56.788.864 haviam sido adquiridas há mais de um ano pelo valor de € 84.972.065,51 — cfr. fls. 132 e ss. do processo físico.
D. As 65.659.233 acções do Banco BPI, SA, correspondiam a 8,64% do respectivo capital social — cfr. fls. 134 do processo físico.
E. Em 29.04.2003, a B……. auferiu dividendos resultantes da sua participação social no Banco BPI, S.A., no valor de € 5.252.738,64 — cfr. fls. 136 do processo físico.
F. Em 10.05.2004, as 65.659.233 acções do Banco BPI, SA, eram detidas pela B……. — cfr. fls. 132 do processo físico.
G. Em 10.05.2004, a B……. auferiu dividendos resultantes da sua participação social no Banco BPI, S.A., no valor de € 5.909.330,97 — cfr. fls. 138 do processo físico.
H. Os dividendos auferidos pela B……. foram sujeitos a tributação em Portugal à taxa de 10%, a qual perfez os montantes de € 525.273,86 e € 590.933,10, respectivamente — cfr. fls. 136 e 138 do processo físico.
I. Os dividendos auferidos pela B……., apesar de declarados na Holanda, não foram sujeitos a tributação nos Países Baixos, estado da residência da impugnante, por nele beneficiarem de uma isenção de tributação — cfr. fls. 1535 e ss. do processo físico.
J. Em 27.04.2007, a B……. apresentou pedido de revisão oficiosa das liquidações de IRC por retenção na fonte referentes aos exercícios de 2003 e 2004 nos montantes de € 525.273,86 e € 590.933,10, respectivamente — cfr. fls. 141 e ss. do processo físico.
K. Em 31.10.2007, por escritura pública de fusão jurídica transfronteiras, a impugnante declarou incorporar, por fusão, a B……., cuja actividade principal consistia na gestão de participações sociais noutras sociedades, sedeada em Amesterdão — cfr. fls. 68 a 113 do processo físico.
L. Em 24.01.2008, foi remetida a este Tribunal, via correio registado, a p.i. que deu origem aos presentes autos — cfr. fls. 186 do processo físico.

2.2 DE DIREITO
2.2.1. Requisitos formais e substantivos da admissão do recurso
2.2.1.1. Requisitos formais
Ao recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no art.152ºCPTA, contando-se o prazo para a sua interposição a partir da notificação da decisão arbitral (art.25º nº3 Regime Jurídico da Arbitragem Tributária (RJAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro)
No recurso sob análise estão verificados os respectivos requisitos formais: legitimidade da recorrente, tempestividade da interposição e trânsito em julgado do acórdão fundamento.
2.2.1.2. Requisitos substantivos
São requisitos substantivos cumulativos do conhecimento do recurso para o Supremo Tribunal Administrativo da decisão arbitral que tenha conhecido do mérito da pretensão deduzida:
- oposição entre a decisão arbitral e acórdão proferido pelos Tribunais Centrais Administrativos ou pelo Supremo Tribunal Administrativo relativamente à mesma questão fundamental de direito,
- inexistência de consonância da orientação perfilhada no acórdão impugnado com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA-SCT (art.25º nºs 2 RJAT;art.152º nºs 1 al.a) e 3 CPTA)

A expressão questão fundamental de direito inculca a primordial importância da sua análise, exigindo ponderação pelo tribunal dos argumentários contrastantes produzidos pelas partes; só deve ser considerada questão fundamental de direito aquela de cuja solução dependa, directa ou indirectamente, a decisão da causa
A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se «sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica»
A oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais
A oposição de soluções jurídicas exige ainda pronúncia expressa sobre a questão, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta
Jurisprudência: acórdão Plenário STA 12.11.2009 processo nº 429/03; acórdãos STA-Pleno SCT 19.06.96 processo nº 19 532; 18.05.2005 processo nº 276/05; 2.01.2010 processo nº 1042/08; 5.06.2013 processo nº 180/12; 3.07.2013 processo nº 700/12; 22.01.2014 processo nº 1106/13; 26.03.2014 processo nº 865/13; 15.10.2014 processo nº 1868/13; 26.03.2014 processo nº 865/13; 22.01.2014 processo nº 1106/13; 5.06.2013 processo nº 191/13; 5.06.2013 processo nº 180/12; acórdão Pleno SCA 21.04.2016 processo nº 62/16
Doutrina: Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume IV pp.475/478)

As situações factuais nos presentes autos e no processo em que foi proferido o acórdão fundamento são substancialmente idênticas: em consequência da procedência do pedido de anulação de liquidação de imposto (formulado num caso perante o tribunal arbitral e noutro caso perante o tribunal estadual), na sequência do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa efectuado pelo sujeito passivo, ambos os tribunais julgaram no sentido da restituição aos sujeitos passivos dos impostos indevidamente pagos, acrescidos de juros indemnizatórios

A recorrente enunciou como questão fundamental de direito com alegada solução antagónica nas decisões em confronto a extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art.43º nº3 al.c) LGT)

Sobre a questão pronunciou-se a decisão arbitral, com formulação singela mas em termos expressos, no sentido da condenação da Requerida [Autoridade Tributária e Aduaneira] a restituir à Requerente o imposto do selo por ela pago, acrescido de juros indemnizatórios, desde a data dos pagamentos efectuados até ao reembolso

A questão mereceu a seguinte pronúncia no acórdão fundamento:
No caso vertente, a recorrida pediu em 27/04/2007 a revisão oficiosa dos actos tributários, ao abrigo do disposto no art.º 78º, nº 1, 2.ª parte, da LGT, sendo tal pretensão tacitamente indeferida em 27/10/2007. Desse indeferimento interpôs impugnação judicial, que foi julgada procedente pela sentença recorrida. E, assim sendo, apenas são devidos juros indemnizatórios decorrido um ano após o pedido de revisão dos actos tributários, ou seja, a partir de 28/04/2008.
Razão por que a sentença recorrida, na parte sindicada, não pode manter-se, devendo os juros indemnizatórios a favor da impugnante ser contabilizados a partir do decurso do prazo de um ano após a formulação do pedido de revisão oficiosa, ou seja, a partir de 28/04/2008, sendo devidos até à emissão da respectiva nota de crédito

Neste contexto é patente a resposta divergente dos arestos em confronto à questão fundamental de direito supra enunciada, sobre a extensão temporal dos juros indemnizatórios arbitrados ao sujeito passivo

Finalmente, a solução jurídica da questão fundamental de direito adoptada na decisão arbitral diverge da jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Administrativo (conforme infra indicado)

Verificados os pressupostos formais e substantivos para o conhecimento do recurso importa prosseguir com a apreciação do seu mérito.

2.2.2. Apreciação do mérito do recurso
A questão fundamental de direito supra enunciada tem merecido pronúncia reiterada e uniforme, quer na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo quer no Pleno da Secção de Contencioso Tributário, designadamente expressa nos seguintes acórdãos desta última formação:
- de 23 maio 2018 processo n.º 1201/17;
- de 24 outubro 2018 processo n.º 99/18.3BALSB;
- de 27 fevereiro 2019 processo n.º 22/18.5BALSB;
- de 8 maio 2019 processo n.º 116/18.7BALSB;
- de 3 julho 2019 processo com o n.º 4/19.0BALSB
- de 4 março 2020 processo nº 08/19.2BALSB

A sólida e convincente fundamentação desta jurisprudência, a especial autoridade da formação que a proferiu e o objectivo de interpretação e aplicação uniformes do direito (art. 8º nº3 CCivil) justificam a nossa adesão e a consequente remissão para a fundamentação vertida no acórdão supra citado proferido em 27 fevereiro 2019 processo n.º 22/18.5BALSB (do qual se transcreve excerto relevante):
«A leitura do disposto no art. 61.º, n.º 1 do Código de Processo e Procedimento Tributário permite concluir que dirigindo-se ele à entidade administrativa lhe confere poder/dever de reconhecer o direito a juros indemnizatórios em benefício do contribuinte em diversas situações sendo que, tratando-se de entidade a quem compete decidir o pedido de revisão do acto tributário a pedido do contribuinte, situação destes autos, tal entidade apenas pode reconhecer esse direito se não for cumprido o prazo legal de revisão do acto tributário. O mesmo é dizer que se tal decisão for proferida dentro do prazo legal não tem a entidade administrativa competência para reconhecer o direito a juros indemnizatórios
Além do referido normativo dispõe ainda a Lei Geral Tributária, art. 43.º, n.º 3, que: «São também devidos juros indemnizatórios quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária». Como se concluiu no acórdão fundamento, e foi reafirmado no acórdão do Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo proferido no processo n.º 01201/17 em 23/05/2018, também a situação dos autos é enquadrável no n.º 3, al. c), do art. 43.º da Lei Geral Tributária porque o contribuinte, podendo ter obtido anteriormente a anulação do acto de liquidação praticado em 2012 e 2013, nada fez, desinteressando-se temporariamente da recuperação do seu dinheiro, até que em 28 de Setembro de 2016, apresentou um pedido de revisão oficiosa do acto tributário. Entre 2012 e 2016 decorre um extenso período em que a reposição da legalidade poderia ter sido provocada por iniciativa do contribuinte que a não desenvolveu, o que justifica que o direito a juros indemnizatórios haja de ter uma extensão mais reduzida por contraposição à situação em que o contribuinte suscita a questão da ilegalidade do acto de liquidação imediatamente após o desembolso da quantia em questão, nomeadamente nos três meses seguintes ao termo do prazo de pagamento voluntário usando o processo de impugnação do acto de liquidação
O legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte.
Impondo a lei constitucional ao Estado a obrigação de reparar os danos causados pelos seus actos ilegais, tem vindo a lei ordinária a estabelecer limites a essa reparação, sejam os decorrentes da valorização da maior ou menor diligência do lesado, seja do tempo que faculta para a Administração Tributária decidir
A decisão arbitral recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação.»
É certo que o contribuinte se viu forçado a recorrer ao tribunal arbitral em virtude de os serviços da Administração não terem procedido à solicitada revisão do acto de liquidação ilegal, e que isso constitui uma circunstância que tem sido esgrimida para afastar a aplicação da alínea c) do nº 3 do art.º 43º da LGT.
Todavia, importa não esquecer que o princípio da igualdade impõe um tratamento semelhante entre os contribuintes cujos pedidos de revisão obtêm êxito (para além do prazo de um ano) junto da Administração, e os contribuintes que obtêm idêntico resultado (também para além desse prazo) junto do Tribunal. Em qualquer dos casos, a demora de mais de um ano é imputável à Administração e deriva da prática de acto ilegal: ou porque tardou a dar razão ao contribuinte ou porque não lha deu e veio a revelar-se que o devia ter feito. Nestes casos, o direito de indemnização deriva da prática de acto ilegal e não do incumprimento de um prazo procedimental para os serviços decidirem favoravelmente a pretensão do contribuinte, já que o prazo de um ano fixado nesse normativo nem sequer coincide com o prazo de quatro meses que a LGT fixa para a emissão de decisão (art. 57.º, n.º 1)»

No caso sub judice, as liquidações foram pagas entre 30 abril 2015 e 21 novembro 2016 (factos provados al.k) tendo o pedido de revisão oficiosa sido apresentado em 21 abril 2017 (cf.relatório da decisão arbitral onde expressamente se refere o pedido de constituição de tribunal arbitral com vista à declaração de ilegalidade e consequente anulação dos actos de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa do Imposto do Selo- anos 2014 e 2015;por lapso material escreveu-se reclamação graciosa na al..j) dos factos provados); nesta circunstância, os juros indemnizatórios só podem ser contados a partir de um ano depois, isto é, a partir de 21 abril 2018.
Assim sendo, deve ser revogada a vertente da decisão arbitral que fixou o termo inicial dos juros indemnizatórios nas datas dos pagamentos dos impostos, julgando-se que o seu termo inicial só ocorreu em 21 abril 2018.

3.DECISÃO
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso;
em consequência:
-anular a decisão arbitral no segmento recorrido e declarar que os juros indemnizatórios são devidos a partir de um ano após o pedido de revisão formulado até ao processamento da respectiva nota de crédito
Custas pela recorrida, sem taxa de justiça por não ter apresentado contra-alegações (art. 527º nºs 1/2 CPC; art.7º nº2 Regulamento das Custas Processuais)
Após trânsito em julgado comunique ao CAAD.

Lisboa, 20 de maio de 2020. - José Manuel de Carvalho Neves Leitão (relator) - Isabel Cristina Mota Marques da Silva - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - José Gomes Correia – Suzana Maria Calvo Loureiro Tavares da Silva - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Paulo José Rodrigues Antunes – Gustavo André Simões Lopes Courinha.