Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0332/14
Data do Acordão:04/09/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:INDEMNIZAÇÃO POR GARANTIA INDEVIDA
GARANTIA BANCÁRIA
EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:I – Do art. 53.° da LGT resulta que o direito à indemnização pela garantia indevidamente prestada, a atribuir sem dependência do prazo a que alude o n.° 1 do artigo supra citado, depende da verificação, dos seguintes pressupostos de facto: a) a prestação da garantia bancária ou equivalente (com vista à suspensão da execução fiscal que tenha por objecto a cobrança de dívida emergente da liquidação impugnada, ainda que a execução fiscal seja questionada através de oposição. b) a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia; c) o vencimento na reclamação graciosa, impugnação judicial, ou oposição onde seja verificado o erro imputável aos serviços.
II – No caso concreto dos autos, em que a garantia prestada foi a garantia bancária, e a ora recorrente decaiu na oposição não podia, ser requerida a fixação da indemnização ao abrigo da norma quantificadora do artº 53º nº 3 da LGT por, desde logo, não estarem verificados todos os pressupostos legais contidos no normativo citado.
III – O artº 171°, n.° 1 do CPPT, invocado pela recorrente, visa apenas regulamentar a forma de exercício do direito de indemnização previsto no art. 53.° da LGT. O pedido de indemnização por danos sofridos apresentado pela executada não pode ser formulado em processo de execução, dada a natureza jurídica deste tipo de processo, que não tem natureza declarativa, mas, tão só, de cobrança coerciva de dívidas constantes de determinado título executivo - o que, sempre conduziria à improcedência da pretensão formulada nesta sede.
IV – Sendo, no entanto, certo que a recorrente pode ter danos no caso concreto. Assim é de admitir a possibilidade de o pedido indemnizatório ser efectuado em processo autónomo onde se possam averiguar com mais acuidade os danos que o interessado possa ter sofrido (este deve especificar os concretos prejuízos que teve).
Nº Convencional:JSTA00068654
Nº do Documento:SA2201404090332
Data de Entrada:03/17/2014
Recorrente:FED PORTUGUESA DE FUTEBOL
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TT1INST LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CONST76 ART266.
LGT08 ART52 N8 ART53 ART55.
CPPTRIB99 ART171 ART183 N1 N2 N3 ART199 N11.
CPTA02 ART2 N2 F.
CPA91 ART6-A.
ETAF02 ART49.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0208/11 DE 2011/11/02; AC STA PROC0216/11 DE 2011/06/22; AC STA PROC0528/12 DE 2012/10/24
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLIII PAGS237-242.
JORGE DE SOUSA - SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO TRIBUTÁRIA POR ACTOS ILEGAIS PAG153.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, nesta Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A Federação Portuguesa de Futebol, veio, nos autos de execução fiscal n° 324720120129380 e apensos que, contra si correm no Serviço de Finanças de Lisboa - 2, para cobrança coerciva de dívida de IRC, apresentar reclamação do acto de indeferimento do pedido de ressarcimento, a título de indemnização, pelos encargos incorridos indevidamente com a garantia bancária, por esta ter permanecido activa no montante de € 2 512792,96, desde a data do pagamento em 27/12/2012.

Por sentença de 19 de Dezembro de 2013, o Tribunal Tributário de Lisboa (TTL) julgou a reclamação improcedente.
Reagiu a ora recorrente Federação Portuguesa de Futebol interpondo o presente recurso cujas alegações integram as seguintes conclusões:

I. Sem prejuízo da Recorrente reiterar todo o anteriormente exposto em sede de petição inicial da reclamação do ato do órgão de execução fiscal, importa salientar o seguinte:

II. O pedido da Recorrente não pretende o ressarcimento dos encargos suportados com a garantia desde a data da sua prestação até à data do seu cancelamento, mas apenas e tão só o pagamento das despesas incorridas com a prestação indevida da garantia desde a data em que procedeu ao pagamento da dívida subjacente até à data do cancelamento da respetiva garantia, ou, sem prescindir, até à data da sua redução;

III. O Tribunal a quo recusou o direito da Recorrente a ser indemnizada com fundamento de que “com a prolação da decisão que indeferiu a pretensão apresentada pela Reclamante na oposição, a Recorrente deixou de reunir o pressuposto do direito a indemnização, decorrente e nos termos do artigo 53° da LGT e do artigo 171° do Código de Procedimento e de Processo Tributário (...)”;

IV. O direito da Recorrente fundamenta-se na prestação indevida da garantia desde a data do pagamento da dívida exequenda aqui em apreço até à data do seu cancelamento, ou, sem prescindir, até à data da sua redução, nos termos do artigo 183°, ns.° 2 e 3, do CPPT;

V. Tal direito sustenta-se, ainda, no facto da AT ter o dever legal de cancelar a garantia na data do pagamento, em 27 de dezembro de 2012, quando ainda estava pendente o processo de oposição à execução fiscal, cuja sentença apenas transitou em julgado em 11 de fevereiro de 2013;

VI. Ou seja, a AT tinha o dever legal, ao abrigo do princípio da boa-fé (artigo 266°, n.° 2, da CRP, artigo 6°-A do CPA), e do princípio da justiça (artigo 266°, n.° 2, da CRP, e artigo 55° da LGT), de proceder ao imediato cancelamento da garantia com o pagamento da dívida exequenda;

VII. O Serviço de Finanças de Lisboa 2 ao ter conhecimento do pagamento efetuado pela FPF deveria ter procedido de imediato ao cancelamento da garantia bancária em apreço, nos termos do artigo 183°, n.° 2, do CPPT;

VIII. Deste modo, podemos concluir que a FPF tem direito a ser indemnizada, nos termos do artigo 171°, n.° 1, do CPPT, da totalidade dos encargos incorridos com a garantia bancária aqui em causa, desde a data do pagamento da dívida exequenda, em 27 de dezembro de 2012, dado que a partir dessa data a referida garantia deveria ter sido oficiosamente cancelada e levantada;

IX. Se assim não se entender e sem prescindir,

X. A garantia bancária no montante total da dívida de € 3.273.977,28 permaneceu indevidamente ativa desde a data do pagamento, em 27 de dezembro de 2012, até à data da redução da garantia, em 13 de maio de 2013;

Xl. O serviço de finanças deveria ter, nos termos do artigo 182°, ns°. 2 e 3, do CPPT oficiosamente diligenciado pela redução da garantia em 27 de dezembro de 2012, com o pagamento da dívida exequenda, e em 4 de janeiro de 2013 com a compensação de parte dos juros de mora;

XII. Na realidade ao valor total garantido de € 3.273.977,28, apenas deveria ter estado garantido desde 27 de dezembro de 2012 o montante de € 243.346,34 (= € 501.765,33 (que é o montante a que a garantia ficou reduzida em 13 de maio de 2013, e que o deveria estar desde 27 de dezembro de 2012) — € 259.418,99 (valor da compensação a 4 de janeiro de 2013);

XIII. Deste modo, a FPF tem direito a ser indemnizada, nos termos do artigo 171°, n.° 1, do CPPT, dos encargos incorridos indevidamente com a garantia bancária, por esta ter permanecido ativa no montante de € 2.512.792,96 (€ 3.273.977,28 — € 501.765,33 - € 259.418,99), desde a data do pagamento, em 27 de dezembro de 2012, até à data da sua redução, em 13 de maio de 2013;

XIV. Consequentemente, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a douta sentença do Tribunal a quo, e, em consequência, o pedido subjacente à reclamação do ato do órgão de execução fiscal interposta pela Recorrente deve ser julgado procedente, com todas as consequências legais.

Pedido:
Nestes termos e nos mais de Direito que Vs. Exas. doutamente, não deixarão de suprir, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a douta sentença do Tribunal a quo, e, consequentemente, a reclamação do ato do órgão de execução fiscal apresentada pela Recorrente deve ser julgada procedente, com todas as consequências legais. Pois só assim se fará inteira e sã JUSTIÇA!

Respeitosamente, Pede e Espera Deferimento.


Não houve contra-alegações.

O EMMP pronunciou-se pela improcedência do presente recurso e, consequentemente, pela manutenção do julgado.


2 – FUNDAMENTAÇÃO

O Tribunal “a quo” deu como provada a seguinte factualidade:

A) Contra o Reclamante foi instaurado o processo de execução fiscal n° 324720120129380 e apensos para cobrança coerciva de dívida de IRC, no valor de € 169313,58 — cf. fls. 1 do PEF;
B) Em 6/2/2012 a Reclamante deduziu oposição ao referido processo executivo, a qual correu termos no Tribunal Tributário de Lisboa com o n° 1170/12 - cf. fls. 91 dos autos e 38 do PEF;
C) Para suspensão do processo identificado em A), em 12/08/2012 a Reclamante prestou garantia bancária n.° N00378199 do Banco Espírito Santo no valor de € 3.229.854,20 — cf. fls. 48 e 52 dos autos e 65 e sgs do PEF;
D) Em 27/12/2012 a Reclamante procedeu ao pagamento do valor de €10821325,31 — cf. fls. 118 verso do PEF;
E) Em 24/1/2013 foi proferida sentença no processo identificado em B), negando provimento à pretensão da Reclamante - cf. fls. 91 dos autos;
F) A referida decisão transitou em julgado em 11/2/2013 — cf. fls. 134 do PEF;
G) Em 14/2/2013 a Reclamante requereu a devolução da garantia bancária alegando ter efectuado o pagamento da dívida exequenda - cf. fls. 114 do PEF;
H) Na mesma data o Serviço de Finanças de Lisboa - 2 informou que se mantinham pendentes os juros de mora e custas processuais nos processos pendentes, em que apenas foram pagas as quantias exequendas, e que tinha sido solicitado parecer sobre se, se encontravam reunidas as condições para a anulação dos respectivos juros e custas - cf. fls. 112 do PEF;
I) Por despacho de 22/4/2013 do substituto legal do Director Geral foi ordenada a redução da garantia, por ter sido reduzido o montante em dívida, e autorizada a substituição da garantia bancária por hipoteca legal por se ter considerado constituir garantia suficiente — cf. fls. 117 do PEF;
J) Por despacho de 13/5/2013 do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa — 2 foi reduzida a garantia que passou a vigorar pelo valor de € 501.765,33 — cf. fls. 125 do PEF;
K) Por despacho de 23/7/2013 foi determinado o levantamento da garantia bancária n.° N00378199 do Banco Espírito Santo — cf. fls. 53 dos autos;
L) Em 08/08/2013, a Reclamante requereu o pagamento a título de indemnização pela prestação de garantia indevida desde a data do pagamento no valor de €49099,66 — cf. fls. 162 do PEF;
M) A Título de comissões sobre a garantia bancária referida em K) a Reclamante pagou € 24554,83 em 24 554,83 e em 22/5/2013 24.544,83 — cf. fls. 212;
N) Por despacho de 23/9/2013 foi o pedido de pagamento de indemnização referido em L) indeferido por se ter considerado que se mantinha a responsabilidade da Reclamante quanto aos juros de mora e custas o que impediria o cancelamento oficioso da garantia, e que se mantinha a oposição por decidir — cf. fls. 271 do PEF;
O) Notificado de tal decisão, veio a Reclamante deduzir a presente reclamação em 4/10/2013 — cf. fls. 45 dos autos.

3 – DO DIREITO

A meritíssima juíza do TTL julgou a reclamação improcedente por entender que:
(destacam-se os trechos mais relevantes da decisão com interesse para o presente recurso)
Sentença

I — Identificação das partes e do objecto do litígio

Federação Portuguesa de Futebol, melhor identificada a fls. 4, vem, nos autos de execução fiscal n° 324720120129380 e apensos que, contra si correm no Serviço de Finanças de Lisboa - 2, para cobrança coerciva de dívida de IRC, apresentar reclamação do acto de indeferimento do pedido de ressarcimento, a título de indemnização, pelos encargos incorridos indevidamente com a garantia bancária, por esta ter permanecido activa no montante de € 2 512792,96, desde a data do pagamento em 27/12/2012.

Invoca que após o referido pagamento, a Administração Tributária procedeu à compensação de IRC na quantia de € 259.416,99, aplicada aos processos executivos apensos ao processo executivo supra identificado, estando pendente a definição da exigibilidade ou não dos juros de mora e custas subjacentes, relativos ao 2° período de avaliação do plano de regularização ao abrigo do DL 124/95, de 2 de Agosto pelo que requereu o pagamento de indemnização pelos prejuízos em que incorreu com a manutenção da garantia bancária, após o pagamento da dívida em 27/12/2012, até ao seu cancelamento em 23/7/2013, que veio a ser indeferido, decisão que afecta os seus direitos e interesses legítimos.

Invoca que o serviço de finanças ao ter conhecimento do pagamento efectuado pela Reclamante, deveria ter procedido de imediato ao cancelamento da garantia bancária, nos termos do n° 2 do artigo 183.° do CPPT, logo a Reclamante tem direito a ser ressarcida da totalidade dos encargos incorridos com a manutenção daquela garantia, pelo período supra referido, nos termos do artigo 171.°, n.° 1 do CPPT.

Subsidiariamente entende que deve ser indemnizada da totalidade dos encargos incorridos com a manutenção daquela garantia pelo decorrido entre 27/12/2012, data do pagamento efectuado e 13/5/2013, data em que se operou a redução da garantia.
Notificada a ERFP, pugnou pela improcedência da Reclamação, invocando que não se verificam os vícios que o Reclamante imputa à decisão reclamada.

Invoca que a decisão proferida no processo de oposição que motivou a prestação de garantia para efeitos de suspensão da execução transitou em julgado em 11/2/2013, pelo que não tendo a Reclamante obtido vencimento na acção, falece o pressuposto base que fundamenta o direito à percepção dos juros indemnizatórios: a procedência do pedido, total ou parcial, circunstância em que, considera não ocorrer acto ilícito que possa ser assacado à Fazenda Pública ou erro imputável aos serviços.

O DMMP emitiu parecer no sentido da procedência parcial do pedido, ou seja, a Reclamante tem direito a ser indemnizada dos encargos incorridos indevidamente com a garantia bancária por esta ter permanecido activa desde o período de pagamento da dívida, 27/12/2012 até à data da sua redução em 13/5/2013, porquanto nesse período a garantia deveria ter sido reduzida aos montantes da dívida.

II – Saneamento
(…)

III — Da fundamentação

III — 1. Dos factos
(…)

III — 2. Do Direito

Está em causa apreciar e decidir se a decisão reclamada que indeferiu o pedido de indemnização por prestação de garantia padece dos vícios que a Reclamante lhe imputa, mais concretamente impõe-se decidir se à Reclamante assiste o direito a ser indemnizada pelos custos incorridos com a prestação de garantia e por que período.

Vejamos o que prescrevem os artigos 53° da LGT e 171° do CPPT.

“Artigo 53.° Garantia em caso de prestação indevida

1 - O devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação, caso a tenha mantido por período superior a três anos em proporção do vencimento em recurso administrativo, impugnação ou oposição à execução que tenham como objecto a dívida garantida.
2 - O prazo referido no número anterior não se aplica quando se verifique, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços na liquidação do tributo.

3 - A indemnização referida no n.° 1 tem como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na presente lei e pode ser requerida no próprio processo de reclamação ou impugnação judicial, ou autonomamente.

4 - A indemnização por prestação de garantia indevida será paga por abate à receita do tributo do ano em que o pagamento se efectuou.

Artigo 171.° Indemnização em caso de garantia indevida

1 - A indemnização em caso de garantia bancária ou equivalente indevidamente prestada será requerida no processo em que seja controvertida a legalidade da dívida exequenda.

2 - A indemnização deve ser solicitada na reclamação, impugnação ou recurso ou em caso de o seu fundamento ser superveniente no prazo de 30 dias após a sua ocorrência.”

O fundamento da atribuição de uma indemnização aos contribuintes devedores, é o prejuízo provocado por uma actuação ilegal da administração tributária, ao efectuar erradamente uma liquidação, pelo que, a atribuição de tal direito justifica-se nos casos em que seja detectado um erro imputável aos serviços, sendo que como pressuposto primordial temos a procedência de uma acção.

No caso dos autos, a execução não se extinguiu, permanecendo em dívida o montante relativo aos juros de mora e custas, não podendo a indefinição quanto ao seu montante qualificar-se como incerteza da dívida para efeitos da sua exequibilidade. Tal questão tem antes a ver com a excepcionalidade do regime a que se encontra sujeito o pagamento da dívida exequenda que se reflecte, não ao nível da quantia exequenda, mas ao nível do acrescido que integra os juros de mora e custas, que podem ser objecto de regime excepcionalmente mais favorável por se enquadrar num regime especial de pagamento de dívidas (com redução de juros e custas), razão pela qual não pode proceder a pretensão da Reclamante de que o processo de execução deveria ser extinto com o pagamento por si efectuado e em consequência do que, a garantia deveria considerar-se extinta.

No caso dos autos a Reclamante prestou garantia com vista à suspensão do processo de execução fiscal por ter deduzido oposição.

O pagamento efectuado pela Reclamante não extinguiu o processo de execução fiscal por não terem sido pagos juros de mora nem custas. Motivou, no entanto, a redução da garantia prestada. Com a prolação da decisão que indeferiu a pretensão apresentada pela Reclamante na oposição, a Recorrente deixou de reunir o pressuposto do direito a indemnização, decorrente e nos termos do artigo 53.° da LGT e do artigo 171.° do Código de Procedimento e de Processo Tributário, porquanto, como refere Jorge Lopes de Sousa in CPPT anotado 6ª edição, “À face do referido artigo 53.° da LGT, não é reconhecido direito de indemnização por prejuízo resultante da prestação de garantia quando não houver vencimento no processo administrativo ou judicial que tiver sido utilizado e, por isso não se poderá saber se é de reconhecer direito a indemnização antes do momento em que for proferida a decisão do referido processo.

A Reclamante coloca a tónica do seu direito no facto de a garantia ter permanecido activa depois de ter efectuado o pagamento e ter sido efectuada a compensação parcial da dívida.

Numa leitura conforme à Constituição da República Portuguesa nada obsta a que seja reconhecido aos particulares o direito a serem ressarcidos os prejuízos decorrentes da actuação do Estado, verificados que estejam os seus pressupostos, contudo tal questão não cabe no âmbito da jurisdição fiscal (cf. artigo 49.° do ETAF e artigo 2.°, nº 2 alínea f) do CPTA), razão pela qual se indefere a pretensão da Reclamante.

Das custas
Atento o princípio da causalidade, consagrado no artigo 446°, n° 1, do CPC, aplicável por força do artigo 2°, alínea e), do CPPT, as custas ficam a cargo da Reclamante.

O valor da acção para efeitos de custas é fixado em € 5000 atenta a dificuldade da acção.

IV – DECISÃO

Termos em que se julga a presente reclamação improcedente”


DECIDINDO NESTE STA:

Está em causa no presente recurso, saber se a recorrente tem direito a ser indemnizada de encargos que suportou com a prestação de garantia bancária no âmbito do processo executivo n.° 3247201201029380 e apensos, uma vez que efectuou o pagamento da dívida exequenda em 27/12/2012 e entende que a partir dessa data deveria ter sido oficiosamente cancelada e levantada a referida garantia.
Adiantamos já que apesar de ser, efectivamente, acertado que a partir do pagamento a garantia prestada devia ter sido cancelada, ainda assim não assiste razão à recorrente no presente caso e que a sentença recorrida merece confirmação.
É que a indemnização prevista no art. 171.º do CPPT, só tem aplicação nos casos de «garantia indevida», de garantia «indevidamente prestada», que são os casos previstos no art. 53.° da LGT, “em que veio a ser reconhecida razão ao contribuinte, total ou parcialmente, na sua impugnação administrativa ou judicial ou oposição à execução fiscal”.
Com efeito dispõe, o artigo 53.º nº 1 da L.G.T: o devedor que, para suspender a execução, ofereça garantia bancária ou equivalente será indemnizado total ou parcialmente pelos prejuízos resultantes da sua prestação em proporção do vencimento em impugnação judicial que tenha como objecto a dívida garantida.
Esta indemnização terá como limite máximo o montante resultante da aplicação ao valor garantido da taxa de juros indemnizatórios prevista na L.G.T.
Deste dispositivo legal resulta, para o que aqui releva, que o direito à indemnização pela garantia indevidamente prestada, a atribuir sem dependência do prazo a que alude o n.º 1 do artigo supra citado, depende da verificação, dos seguintes pressupostos de facto: a) a prestação da garantia bancária ou equivalente (com vista à suspensão da execução fiscal que tenha por objecto a cobrança de dívida emergente da liquidação impugnada, ainda que a execução fiscal seja questionada através de oposição - assim se decidiu no Ac. do STA de 02/11/2011 no recurso nº 0208/11-; b) a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia; c) o vencimento na reclamação graciosa, impugnação judicial, ou oposição onde seja verificado o erro imputável aos serviços.
Sobre o conceito de garantia equivalente a garantia bancária pode ver-se Jorge de Sousa, in Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado volume III, 6ª edição 2011, a pag. 242
Esclarece o mesmo autor a fls. 237 do mesmo III volume “como se vê pela epígrafe e pelo nº 1 deste art.171º, o regime nele previsto aplica-se aos casos de “garantia indevida”, de garantia “indevidamente prestada” e esses são os casos previstos no artº 53º da LGT, em que veio a ser reconhecida razão ao contribuinte total ou parcialmente, na sua impugnação administrativa ou judicial ou oposição à execução fiscal. Com efeito, para além da manifesta correspondência das referidas expressões e das utilizadas naquele art.53º da LGT é nesses casos em que o contribuinte tinha total ou parcialmente razão e prestou garantia para suspender a execução fiscal é que se poderá falar com alguma propriedade, em «prestação indevida» da garantia, por esta prestação só se ter tornada necessária, total ou parcialmente, por ter sido praticado um acto ilegal, um acto indevido, um acto que não deveria ter sido praticado à face da lei”, sendo o montante da indemnização apurado em função do vencimento obtido, nos termos do n.° 1 do art. 53.° da LGT.
Como salienta o Mº Pº junto deste STA, ainda a propósito da indemnização por prestação de garantia indevida, assinala o mesmo autor, in “Sobre a Responsabilidade Civil da Administração Tributária por actos ilegais”, a pgs. 153 e 154, que “(à) face do (...) art. 53.° da LGT, não é reconhecido direito de indemnização por prejuízo resultante da prestação de garantia quando não houver vencimento no processo administrativo ou judicial que tiver sido utilizado (...)”.
No Acórdão deste Supremo Tribunal de 24-10-2012- P. 0528/12, (por nós relatado) escreveu-se que do art. 53.° da LGT resulta que: “o direito à indemnização pela garantia indevidamente prestada, a atribuir sem dependência do prazo a que alude o n.° 1 do artigo supra citado, depende da verificação, dos seguintes pressupostos de facto: a) a prestação da garantia bancária ou equivalente (com vista à suspensão da execução fiscal que tenha por objecto a cobrança de dívida emergente da liquidação impugnada, ainda que a execução fiscal seja questionada através de oposição - assim se decidiu no Ac. do STA de 02/11/2011 no recurso n° 0208/11-; b) a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia; c) o vencimento na reclamação graciosa, impugnação judicial, ou oposição onde seja verificado o erro imputável aos serviços”.
E, se assim é, tendo em conta o probatório fixado na decisão de 1ª Instância entendemos, desde logo, que os assinalados pressupostos não se verificam na sua totalidade no caso em apreço e que, também não se verifica o requisito do n.° 1 do art. 53.° da LGT de manutenção da garantia por período superior a três anos.
Acresce referir que o artº 171°, n.° 1 do CPPT, invocado pela recorrente, visa apenas regulamentar a forma de exercício do direito de indemnização previsto no art. 53.° da LGT (cfr., por todos, o douto Acórdão de 22.06.2011 — P. 0216/119.
Assim, à luz das disposições citadas, a pretensão indemnizatória da ora recorrente fundada em prestação indevida de garantia bancária não merece acolhimento na presente instância. Aliás, deve destacar-se que o pedido de indemnização por danos sofridos - como é aquele que foi formulado pela executada - nunca poderia ser formulado em processo de execução, dada a natureza jurídica deste tipo de processo, que não tem natureza declarativa, mas, tão só, de cobrança coerciva de dívidas constantes de determinado título executivo - o que, sempre levaria à improcedência da pretensão formulada nesta sede.
Não obstante é certo que na sequência do pagamento efectuado em 27.12.2012 a garantia apenas veio a ser reduzida em 22.04.2013 — alíneas D) e I) do probatório e esse facto, abstraindo de outras circunstâncias, é susceptível de gerar prejuízos indemnizáveis pois a possibilidade da redução da garantia, oficiosamente ou a requerimento dos contribuintes, que se encontra prevista nos arts. 52.°, n.° 8 da LGT e 199°, n.° 11 do CPPT não constitui, uma mera faculdade que poderá ou não ser exercida, antes se impõe, verificados os respectivos pressupostos de facto, face aos princípios da proporcionalidade e da suficiência que devem nortear a actuação da AT na constituição e manutenção das garantias para suspensão dos processos de execução fiscal. Mas, reitera-se, temos como certo que os contornos de um tal pedido de indemnização não se compaginam com o regime relativo à indemnização por prestação indevida de garantia previstos nos arts. 53.° da LGT e 171.º do CPPT, o que dita a sorte do presente recurso.
É de considerar, no entanto, que a recorrente pode ter tido danos no caso concreto. Assim é de admitir a possibilidade de o pedido indemnizatório ser efectuado em processo autónomo onde se possam averiguar com mais acuidade os danos que o interessado possa ter sofrido (este deve especificar os concretos prejuízos).
Como bem salienta o Mº Pº junto deste STA nada obstará que a ora recorrente possa formular autonomamente, através da competente acção de responsabilidade civil extracontratual, pedido de indemnização com um tal fundamento e, eventualmente, nele obter vencimento de causa, verificados que sejam os respectivos pressupostos legais.

Assim sendo, deve improceder o presente recurso sendo de confirmar a decisão recorrida.
PREPARANDO A DECISÃO FORMULAMOS AS SEGUINTES PROPOSIÇÕES:
I – Do art. 53.° da LGT resulta que o direito à indemnização pela garantia indevidamente prestada, a atribuir sem dependência do prazo a que alude o n.° 1 do artigo supra citado, depende da verificação, dos seguintes pressupostos de facto: a) a prestação da garantia bancária ou equivalente (com vista à suspensão da execução fiscal que tenha por objecto a cobrança de dívida emergente da liquidação impugnada, ainda que a execução fiscal seja questionada através de oposição. b) a existência de prejuízos emergentes da prestação dessa garantia; c) o vencimento na reclamação graciosa, impugnação judicial, ou oposição onde seja verificado o erro imputável aos serviços.

II – No caso concreto dos autos, em que a garantia prestada foi a garantia bancária, e a ora recorrente decaiu na oposição não podia, ser requerida a fixação da indemnização ao abrigo da norma quantificadora do artº 53º nº 3 da LGT por, desde logo, não estarem verificados todos os pressupostos legais contidos no normativo citado.
III – O artº 171°, n.° 1 do CPPT, invocado pela recorrente, visa apenas regulamentar a forma de exercício do direito de indemnização previsto no art. 53.° da LGT. O pedido de indemnização por danos sofridos apresentado pela executada não pode ser formulado em processo de execução, dada a natureza jurídica deste tipo de processo, que não tem natureza declarativa, mas, tão só, de cobrança coerciva de dívidas constantes de determinado título executivo - o que, sempre conduziria à improcedência da pretensão formulada nesta sede.
IV – Sendo, no entanto, certo que a recorrente pode ter danos no caso concreto. Assim é de admitir a possibilidade de o pedido indemnizatório ser efectuado em processo autónomo onde se possam averiguar com mais acuidade os danos que o interessado possa ter sofrido (este deve especificar os concretos prejuízos que teve).
4- DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes deste STA em negar provimento ao recurso e em confirmar a decisão recorrida.

Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 9 de Abril de 2014. – Ascensão Lopes (relator) – Dulce NetoFrancisco Rothes.