Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01055/09
Data do Acordão:03/24/2010
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:JORGE LINO
Descritores:CONTRIBUIÇÃO ESPECIAL
FIXAÇÃO DA MATÉRIA COLECTÁVEL
DIREITO DE AUDIÊNCIA
DIREITO DE PARTICIPAÇÃO
COMISSÃO DE AVALIAÇÃO
CONSTITUCIONALIDADE
Sumário:I - O direito de audiência no procedimento tributário através das formas previstas no artigo 60.º da Lei Geral Tributária apenas tem lugar quando «a lei não prescrever em sentido diverso» (n.º 1).
II - O procedimento tributário, modelado no Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, prevê a participação do contribuinte na fixação da matéria colectável, por meio da integração deste (por si, ou por representante seu) na Comissão de Avaliação prevista no seu artigo 4.º.
III - E não se admite a possibilidade de a liquidação ser efectuada com base em valor diferente daquele que resulta da avaliação (artigo 2.º do mesmo Regulamento).
IV - Assim, é de concluir que, na situação, o direito de participação na formação da decisão administrativa é assegurado (apenas) através da inclusão do contribuinte naquela Comissão de Avaliação – o que se representa plenamente conforme à Constituição da República Portuguesa.
Nº Convencional:JSTA00066363
Nº do Documento:SAP2010032401055
Data de Entrada:01/06/2010
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC OPOS JULGADOS.
Objecto:AC TCA SUL PROC2895/09 DE 2009/05/12 - AC STA PROC977/02 DE 2002/11/13.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
DIR FISC - CONTRIB ESPECIAL.
Legislação Nacional:DL 43/98 DE 1998/03/03 ART2 ART4.
LGT98 ART60 ART57 N1.
CONST76 ART267 N5.
Jurisprudência Nacional:AC STAPLENO PROC837/07 DE 2008/11/19.; AC STAPLENO PROC617/06 DE 2008/07/14.
Aditamento:
Texto Integral: 1.1 “A..., L.dª” vem recorrer do acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 12-5-2009, proferido no recurso n.º 2.895/09 (constante de fls. 258 a 270), com fundamento em oposição com o acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, de 13-11-2002, proferido no recurso n.º 977/02.
1.2 Em alegação, a recorrente apresenta as seguintes conclusões.
I. Encontram-se preenchidos os requisitos dos quais depende a admissão do presente recurso por oposição de acórdãos, já que ambos foram proferidos no âmbito da mesma legislação – artigo 60.° da Lei Geral Tributária e Decreto-Lei 43/98, de 3 de Março – respeitam as mesmas questões fundamentais – existência ou não de preenchimento do direito de audição prévia do contribuinte através da participação de um seu representante numa comissão de avaliação e a possibilidade do contribuinte poder influenciar após a comissão de avaliação a liquidação; respeitam a soluções, expressamente, opostas, bem como foram decididas num quadro factual idêntico.
II. Resulta dos factos provados que a liquidação de contribuição especial foi efectuada pela Administração Fiscal, exclusivamente, com base em elementos, totalmente, exteriores à vontade da Recorrente. De facto, todos os elementos constantes do termo de avaliação a fls. 11 a 16 do apenso da reclamação graciosa foram trazidos pela Administração Tributária, limitando-se o contribuinte a indicar um perito para estar presente nessa avaliação. Resulta, assim, dos autos que em todo o procedimento nunca foi concedido ao contribuinte qualquer oportunidade de ser ouvido previamente à liquidação, sendo certo que a Recorrente só teve conhecimento dos termos da avaliação no dia em que foi notificada para proceder ao pagamento da contribuição especial.
III. Face aos factos provados a principal questão a analisar no presente recurso é pois a de saber se, nas circunstâncias acabadas de descrever, a Administração Fiscal estava ou não obrigada a cumprir o disposto no artigo 60.° da LGT, isto é, estava obrigada a notificar a Recorrente para que esta pudesse exercer o direito de audição prévia.
IV. O artigo 60.° da L.G.T. transpôs para o procedimento tributário o princípio constitucional da participação dos cidadãos na formação das decisões e deliberações que lhes dizem respeito, expresso no artigo 267.° n.° 5 da Constituição da República Portuguesa. Assim, nos termos da referida norma, mormente do disposto no artigo 60° n.° 1 a), da L.G.T., a Administração Fiscal antes de liquidar a contribuição especial deve ouvir o contribuinte.
V. O Tribunal a quo, no seu douto acórdão, considerou que a audição prévia no processo de liquidação de contribuição especial é realizada através da intervenção do contribuinte ou do seu representante na comissão de avaliação a que alude o art. 2.°, 4.° e 6.° do Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 43/98, sendo que tal intervenção estaria a coberto da expressão do artigo 60.° da L.G.T. que refere “sempre que a lei não prescrever em sentido diverso”.
Ora, tal interpretação é totalmente contrária, quer à ratio do artigo 267.° n.° 5 da Constituição da República Portuguesa (doravante CRP) quer à ratio do próprio princípio da participação do administrado nas decisões ou deliberações que lhe disserem respeito, já que a “alegada” audição prévia nunca poder ser realizada numa fase de instrução do procedimento, mas apenas numa fase de pré-decisão.
É, assim, inconstitucional, por violação do artigo 267.° n.° 5 da Constituição da República Portuguesa, a disposição inserta no n.° 1 e 2 do artigo 4.° do Regulamento Anexo ao Decreto-Lei n.° 43/98, de 3 de Março, conjugado com os artigos 57 n.° 1 e 60.° do Decreto-Lei n.° 398/98, de 17 de Dezembro (Lei Geral Tributária), quando interpretados no sentido de que a intervenção de um perito do contribuinte na comissão referida nesse artigo é suficiente para se considerar preenchido o princípio da participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito.
Assim sendo, o douto acórdão fez uma incorrecta e inconstitucional interpretação e aplicação da lei aos factos, mormente, do disposto no artigo 267.° n.° 5 da Constituição da República Portuguesa, do artigo 60.° n.° 1 e n.° 4 e 16.° n.° 1 da L.G.T., do artigo 100.° e 103.° do Código do Procedimento Administrativo e dos artigos 2.°, 4.° e 6.° do Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo Decreto-Lei n.° 43/98.
VI. In casu a liquidação impugnada, quer abstracta quer objectivamente, podia ser contestada através do exercício do direito de audição pela Recorrente, já que só esta poderia aferir correctamente, a título de exemplo, sobre o valor m2 de construção – em 1994 e à data do pedido de licenciamento –, sobre a área de construção efectivamente edificada, o n.° de fogos efectivamente edificados, a volumetria de construção efectivamente edificada, elementos estes que, apenas, constam do alvará de construção sob a forma de previsão, sendo estes, habitualmente, alterados em função da obra efectivamente edificada.
VII. Da mesma forma, em caso algum, poder-se-á considerar que a presença de um perito do contribuinte na avaliação efectuada sana o vício de preterição de audição prévia, já que para além de não se encontrarem preenchidos os requisitos do artigo 60.° n.° 1 a) e n.° 3 da L.G.T. , o perito indicado pela Recorrente não estava mandatado para exercer o direito de audição prévia em seu nome e o mesmo interveio, unicamente, num acto prévio de instrução, pelo que, também por isso, em caso algum se poderá considerar que se deu cumprimento ao direito de audição prévia da Recorrente.
VIII. In casu não ocorreram os requisitos que, excepcionalmente, permitem a dispensa do cumprimento do disposto no artigo 60.° da LGT, pelo que o acto impugnado padece de vício de forma, pelo que terá de ser anulado.
IX. Igualmente, não é de aplicar ao caso sub judice o disposto no artigo 103.º do CPA por tal norma não ter aplicação em matéria tributária, na medida em que esta só será de aplicar quando não existam normas procedimentais especiais sobre as matérias nele reguladas. E no caso em apreço existem – o artigo 60.° da LGT.
X. O princípio do aproveitamento do acto – tão doutamente desenvolvido pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo – não é, também, de aplicar in casu já que, como se demonstrou, em sede de audiência prévia, poderia a Recorrente, com toda a certeza, influenciar a posição da Administração Fiscal em inúmeros aspectos: a área do prédio; a área bruta de construção (prevista e edificada); o n.° de fogos (previstos e edificados); o n.° de estacionamentos (previstos e edificados); a volumetria da construção (prevista e edificada); o valor m2, estimado, da construção a 1 de Janeiro de 1994; o valor m2, estimado, de construção à data do pedido de licenciamento; as infra-estruturas envolventes, etc. Sendo, assim, decisiva a influência da Recorrente quer na fixação da matéria colectável objecto da taxa quer mesmo no controlo da operação aritmética que determina a contribuição especial a pagar.
XI. O acto tributário de liquidação da contribuição especial à Recorrente padece, assim, de vício de forma e substância que acarreta a sua nulidade.
Nestes termos e nos demais de Direito que Vossas Excelências doutamente suprirão, deve o douto acórdão de que se recorre, ser substituído por um outro que considere o presente recurso procedente por provado, considerando-se nula a liquidação efectuada à Recorrente.
1.3 A Fazenda Pública contra-alegou e produziu as seguintes conclusões.
1. Dos acórdãos em confronto resulta que as situações concretas que estão na origem dos mesmos são diferentes e que os factos dados como provados também são diferentes, o que motiva o tratamento diverso da mesma questão de direito, não existe real oposição de acórdãos, o presente recurso deve ser rejeitado por falta dos necessários pressupostos para a respectiva aceitação;
2. Sem conceder, ainda se dirá que correcta é a interpretação reflectida no douto acórdão recorrido, que, aliás, se encontra de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo, dando-se como verificada a participação do contribuinte, nos termos do art. 60º da LGT, se este teve intervenção nas avaliações de onde resultou a quantificação da matéria colectável da contribuição especial, sendo a liquidação impugnada uma mera operação aritmética de aplicação da taxa devida àquela matéria, não se justificando a anulação da liquidação em causa, por não se vislumbrar qualquer possibilidade de a omitida audição influenciar o conteúdo da liquidação.
Termos pelos quais e, com o douto suprimento de V. Exas., deve ser fixada como jurisprudência desse Venerando Tribunal, a constante do douto Acórdão recorrido.
1.4 O Ministério Público neste Tribunal emitiu o parecer de que o recurso não merece provimento e o acórdão recorrido deve ser confirmado – apresentando a seguinte fundamentação.
1. Pressupostos para o seguimento do recurso
Sufragamos a fundamentação do despacho do Mmo. Juiz relator declarando a verificação dos pressupostos para a resolução do conflito de jurisprudência emergente da oposição de acórdãos (fls. 310/311):
– identidade da questão jurídica decidenda
– identidade da regulamentação jurídica aplicável
– antagonismo das soluções jurídicas plasmadas nos arestos em confronto (art. 284° CPPT; art. 27° n° 1 al. b) ETAF vigente; art. 152° n° 1 al. b) CPTA)
2.Conflito de jurisprudência
Questão decidenda: saber se tendo o contribuinte intervenção, por si ou através de representante, na comissão prevista no art. 4° DL n° 43/98, 3 Março, deve ser-lhe garantido o exercício do direito de audição (art. 60° LGT)
A solução expressa na fundamentação do acórdão recorrido está em sintonia com jurisprudência consolidada do STA, com expressão de maior relevância nos acórdãos Pleno SCT proferidos em 17.12.2008 (processo n° 615/07), 19.11.2008 (processo n° 837/07) e 14.07.2008 (processo n° 616/07), transcrevendo-se o sumário doutrinário do último:
«I – O direito de audição no procedimento tributário através das formas previstas no art. 60° da LGT apenas tem lugar quando a lei não prescrever em sentido diverso (n° 1)
II – Prevendo-se no procedimento tributário regulado no Regulamento da Contribuição Especial aprovado pelo DL n° 43/98, de 3 de Março, a participação do contribuinte na fixação da matéria colectável, através da integração da comissão de avaliação prevista no seu art. 4°, e não se admitindo a possibilidade de a liquidação ser efectuada com base em valor diferente do que resulta da avaliação, é de concluir que é apenas através daquela comissão de avaliação que é assegurado o direito de participação do contribuinte na formação da decisão»
A especial autoridade dos arestos citados, a convincência da sua fundamentação, a necessidade de observância do princípio de interpretação e aplicação uniformes do direito (art. 8° n° 3 CCivil), justificam a resolução do conflito de jurisprudência no sentido da adesão à sua doutrina.
1.5 Tudo visto, cumpre decidir, em Pleno da Secção.
São pressupostos expressos do recurso para o Pleno da Secção, por oposição de julgados, que se trate do mesmo fundamento de direito; que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica; e que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução expressa oposta. O que naturalmente supõe a identidade de situações de facto já que, sem ela, não tem sentido a discussão dos referidos requisitos; por isso, ela não foi referida de modo expresso.
Para que exista oposição é, pois, necessária tanto uma identidade jurídica como factual – que, por natureza, se aferem pela análise do objecto das decisões em confronto (o acórdão recorrido, e o acórdão fundamento).
No acórdão recorrido, tanto quanto no acórdão fundamento, estava em causa uma liquidação de contribuição especial, efectuada ao abrigo do Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março.
Em ambos os casos, o contribuinte interveio na Comissão prevista no artigo 4.º do Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo dito Decreto-Lei n.º 43/98.
No acórdão recorrido entendeu-se que, tendo o contribuinte intervenção em tal Comissão, não era necessário proceder à sua audição antes da liquidação, nos termos do artigo 60.º da Lei Geral Tributária.
No acórdão fundamento, decidiu-se em sentido contrário.
Estão, assim, reunidos os requisitos do recurso com fundamento em oposição de acórdãos.
2. A questão que ora se coloca ao Tribunal é a de saber se, havendo o contribuinte, por si ou através de representante seu, tido intervenção na Comissão prevista no artigo 4.º do Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, não obstante isso, tem de lhe ser garantido o exercício do direito de audição, nos termos do artigo 60.º da Lei Geral Tributária.
O artigo 60.º da Lei Geral Tributária, sob a epígrafe “Princípio da Participação”, dispõe como segue.
1. A participação dos contribuintes na formação das decisões que lhes digam respeito pode efectuar-se, sempre que a lei não prescrever em sentido diverso, por qualquer das seguintes formas:
a) Direito de audição antes da liquidação;
b) Direito de audição antes do indeferimento total ou parcial dos pedidos, reclamações, recursos ou petições;
c) Direito de audição antes da revogação de qualquer benefício ou acto administrativo em matéria fiscal;
d) Direito de audição antes da decisão de aplicação de métodos indirectos, quando não haja lugar a relatório de inspecção;
e) Direito de audição antes da conclusão do relatório da inspecção tributária.
2. É dispensada a audição no caso de a liquidação se efectuar com base na declaração do contribuinte ou a decisão do pedido, reclamação, recurso ou petição lhe for favorável.
3. Tendo o contribuinte sido anteriormente ouvido em qualquer das fases do procedimento a que se referem as alíneas b) a e) do n.º 1, é dispensada a sua audição antes da liquidação, salvo em caso de invocação de factos novos sobre os quais ainda se não tenha pronunciado.
4. O direito de audição deve ser exercido no prazo a fixar pela administração tributária em carta registada a enviar para esse efeito para o domicílio fiscal do contribuinte.
5. Em qualquer das circunstâncias referidas no n.º 1, para efeitos do exercício do direito de audição, deve a administração tributária comunicar ao sujeito passivo o projecto de decisão e sua fundamentação.
6. O prazo do exercício oralmente ou por escrito do direito de audição não pode ser inferior a 8 nem superior a 15 dias.
7. Os elementos novos suscitados na audição dos contribuintes são tidos obrigatoriamente em conta na fundamentação da decisão.
Por seu lado, estabelece-se no artigo 2.º do Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo dito Decreto-Lei n.º 43/98, que “1 - Constitui valor sujeito a contribuição a diferença entre o valor do prédio à data em que for requerido o licenciamento de construção ou de obra e o seu valor à data de 1 de Janeiro de 1994, corrigido por aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda constantes da portaria a que se refere o artigo 43.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas, correspondendo, para o efeito, à data de aquisição a data de 1 de Janeiro de 1994 e à de realização a data da emissão do alvará de licença de construção ou de obra”, sendo que “2 - Os valores que servem para determinar a diferença são determinados por avaliação nos termos do presente Regulamento”.
E o seu artigo 4.º, no âmbito da “determinação da matéria colectável” da referida contribuição especial, reza que “1 - A avaliação referida no n.º 2 do artigo 2.º ficará a cargo de uma comissão constituída pelo contribuinte ou seu representante e por dois peritos nomeados pela Direcção-Geral dos Impostos de entre os incluídos nas listas distritais”, sendo que “2 - Um dos peritos nomeados pela Direcção-Geral dos Impostos terá apenas voto de desempate, devendo conformar-se com qualquer dos laudos apresentados”, e “3 - A avaliação será efectuada com precedência de vistoria, devendo as decisões ser devidamente fundamentadas”.
A Constituição da República Portuguesa impõe, no seu artigo 267.º, n.º 5, que o processamento da actividade administrativa assegure “a participação dos cidadãos na formação das decisões e deliberações que lhes disserem respeito”.
Ora, o dito artigo 60.º da Lei Geral Tributária veio regular especialmente o exercício do direito de audição no procedimento tributário, ocorrendo tal exercício, todavia e apenas, “sempre que a lei não prescrever em sentido diverso”, ou seja, “estará afastada a aplicação do regime deste artigo quando a lei estabelece uma forma especial de participação dos interessados na formação das decisões que lhe dizem respeito”.
E, como resulta do transcrito artigo 4.º, o contribuinte tem intervenção no procedimento da fixação da matéria colectável, directamente por si, ou através de um seu representante, na comissão de avaliação – pelo que não se vislumbra neste entendimento da lei a violação de alguma norma ou princípio constitucional, mormente do supra aludido princípio constitucional da participação dos cidadãos nas decisões administrativas.
Fixada a matéria colectável, e corrigido o valor por aplicação dos coeficientes de desvalorização da moeda, conforme o disposto no artigo 2.º, a contribuição é calculada nos termos do artigo 10.º, através da aplicação da respectiva taxa fixa, pelo que o contribuinte não tem qualquer possibilidade legal de actuar sobre tais factores, sendo consequentemente de todo inócua a sua nova intervenção no procedimento, antes da liquidação.
Nomeadamente, a ponderação dos elementos atinentes à avaliação, a que se refere o artigo 4.º do Regulamento, terá de ser efectuada no próprio âmbito desta.
Pelo que se pode concluir que “Neste contexto, prevendo-se uma forma de intervenção do contribuinte na formação da decisão através da participação na comissão de avaliação e não havendo qualquer utilidade em admitir uma nova intervenção antes da liquidação, por não poder ser alterado o valor sobre que deve incidir a taxa, é de concluir que a única forma de participação dos interessados na formação da decisão que se prevê é a que é assegurada ao contribuinte na comissão de avaliação, pois vigora no procedimento tributário um princípio geral de proibição de prática de actos inúteis, que aflora no n.º 1 do artigo 57.º da LGT”.
É, aliás, no sentido exposto a mais recente jurisprudência deste Tribunal.
Cf. tudo o que vem de ser dito, quase textualmente, no acórdão do Pleno desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 19-11-2008, proferido no recurso n.º 837/07, o qual, por sua vez segue de perto o acórdão, que cita, também do Pleno desta Secção, de 14-7-2008, proferido no recurso n.º 616/07.
Cf. ainda os acórdãos desta Secção, de 10-10-2007 (recurso n.º 616/07), e de 7-11-2007 (recurso n.º 615/07).
Estamos, deste modo, a concluir, e em síntese, que o direito de audiência no procedimento tributário através das formas previstas no artigo 60.º da Lei Geral Tributária apenas tem lugar quando «a lei não prescrever em sentido diverso» (n.º 1).
O procedimento tributário, modelado no Regulamento da Contribuição Especial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 43/98, de 3 de Março, prevê a participação do contribuinte na fixação da matéria colectável, por meio da integração deste (por si, ou por representante seu) na Comissão de Avaliação prevista no seu artigo 4.º.
E não se admite a possibilidade de a liquidação ser efectuada com base em valor diferente daquele que resulta da avaliação (artigo 2.º do mesmo Regulamento).
Assim, é de concluir que, na situação, o direito de participação na formação da decisão administrativa é assegurado (apenas) através da inclusão do contribuinte naquela Comissão de Avaliação – o que se representa plenamente conforme à Constituição da República Portuguesa.
3. Termos em que se acorda negar provimento ao recurso, confirmando-se o aresto recorrido.
Custas pela recorrente, com procuradoria de um sexto.
Lisboa, 24 de Março de 2010. – Jorge Lino Ribeiro Alves de Sousa (relator) – Alfredo Aníbal Bravo Coelho Madureira – João António Valente Torrão – António José Martins Miranda de Pacheco – Dulce Manuel da Conceição Neto – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Joaquim Casimiro Gonçalves – António Francisco de Almeida Calhau – Domingos Brandão de Pinho – Francisco António Vasconcelos Pimenta do Vale.