Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0486/14
Data do Acordão:09/10/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ARAGÃO SEIA
Descritores:EXECUÇÃO DE SENTENÇA
RECURSO JURISDICIONAL
COMPETÊNCIA
RECURSO PER SALTUM
Sumário:I – No regime dos recursos jurisdicionais aplicável aos meios processuais comuns à jurisdição administrativa e tributária é aplicável o regime previsto no CPTA como legislação subsidiária, por força do disposto na alínea c) do art. 2.º do CPPT.
II – O recurso per saltum previsto no art. 151.º do CPTA só é admitido desde que se encontrem preenchidos os requisitos seguintes: (i) o fundamento do recurso consista apenas na violação de lei substantiva ou processual; (ii) o valor da causa, fixado segundo os critérios estabelecidos nos arts. 32.º e segs., seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável (n.º 1 do art. 151.º); (iii) incida sobre decisão de mérito; (iv) o processo não verse sobre questões de funcionalismo público ou de segurança social (n.º 2 do art. 151.º).
III – A tal não obsta o disposto nos arts. 26.º e 38.º do ETAF, pois, sendo certo que a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, em regra, se efectua nos termos daqueles preceitos, nada obsta a que outros preceitos, contidos em diploma legal com igual posição hierárquica, regulem de modo que conduza a resultado diverso (como sucede, v.g., no art. 151.º do CPTA, quando aplicável no contencioso tributário por remissão do n.º 2 do art. 279.º do CPPT).
Nº Convencional:JSTA00068874
Nº do Documento:SA2201409100486
Data de Entrada:04/28/2014
Recorrente:A............, SA
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:DECL INCOMPETÊNCIA
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART16 ART97 N2 ART279 N2.
CPTA02 ART13 ART191 ART151 ART32 N2 C.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01495/12 DE 2014/01/15.; AC STA PROC01847/13 DE 2014/02/12.; AC STA PROC0165/14 DE 2014/07/09.; AC STA PROC01007/12 DE 2014/07/09.
Referência a Doutrina:MÁRIO AROSO DE ALMEIDA E CARLOS ALBERTO CADILHA - COMENTÁRIO AO CÓDIGO DE PROCESSO NOS TRIBUNAIS ADMINISTRATIVOS 3ED ALMEDINA 2010 PAG999.
JORGE LOPES DE SOUSA - CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED VOLII PAG49 VOLIV PAG321.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

A…………, SA, inconformada, recorreu da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (TAF do Porto), datada de 30 de Setembro de 2013, que julgou improcedente a execução de sentença de anulação de acto administrativo, que tinha interposto contra a Autoridade Tributária e Aduaneira (AT).
Alegou, tendo concluído como se segue:

i. Tal como consta dos presentes autos, a petição inicial visava a execução de uma sentença na qual se requeria a condenação da AT a reconstituir a situação jurídica que existiria se não tivesse sido praticado o acto tributário de determinação do VPT, compreendendo, por isso o pagamento da quantia indevidamente liquidada sobre aquele VPT judicialmente anulado, acrescida de juros indemnizatórios e moratórios - nos termos do artigo 100.º da LGT e 173.º do CPTA.
ii. Segundo o Tribunal a quo, para que fosse possível reconstituir a situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado, era necessário que no julgado anulatório contivesse, para além da anulação do acto de determinação do VPT, a condenação da AT proceder à devolução do imposto ilegalmente liquidado com base naquele valor.
iii. Note-se, antes de mais, que, como o próprio Tribunal a quo reconhece, os actos de liquidação de IMI que foram efectuados tendo por base o VPT judicialmente anulados são ACTOS CONSEQUENTES que, como tal, SÃO NULOS — nos termos do artigo 133.º n.º 2 i) do CPA.16
iv. A determinação do VPT de um imóvel antecede, naturalmente, o acto de liquidação de IMI, uma vez que constitui base de incidência desta, pelo que anulação do acto de avaliação, como acto antecedente, acarreta, de forma inevitável e automática, a nulidade do acto de liquidação de IMI consequente e, em sede de execução do julgado anulatório, a sua integral restituição com juros.
v. Segundo é entendimento da melhor Doutrina: “A anulação judicial do acto tributário implica a anulação de todos os seus efeitos ex tunc, pelo que tudo se deve passar como se ele não houvera sido praticado.17 (...) Importando a reparação, em grande número de casos, a prática de actos administrativos consequentes e tendo estes actos a natureza de actos de administração activa, é lógico que lhe caiba, segundo os princípios do direito administrativo continental, em primeira mão e em primeiro lugar, a possibilidade de emenda dos efeitos lesivos provocados ao particular. 18»
vi. É que, “(...) a execução da sentença anulatória do acto administrativo consiste na prática pela Administração — a quem incumbe tirar as consequência da anulação — dos actos e operações materiais necessárias à reintegração da ordem jurídica violada de molde a que seja restabelecida a situação que o interessado tinha à data do acto ilegal e a reconstituir, se for caso disso, a situação que o mesmo teria se o acto não tivesse sido praticado.19”
vii. «No âmbito da execução de sentenças a Administração deve procurar reconstituir a situação actual hipotética, isto é, deve repor a situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado, o que passa pela reparação de todos os danos sofridos em resultado da prática daquele acto. E, porque assim, a execução do julgado só pode considerar-se concluída quando hajam sido cumpridas todas as operações necessárias à colocação do Exequente na posição em que se encontraria não fora a prática do acto.»20.
viii. A sufragar-se a posição defendida pelo Tribunal a quo, a Recorrente, na qualidade de Contribuinte, ainda que na posse de uma decisão judicial anulatória da determinação do VPT, ver-se-ia na contingência de propor uma nova acção judicial autónoma - eventualmente uma acção para reconhecimento de direito em matéria tributária (?) - de modo a que lhe fosse reconhecido o direito a ser restituída do imposto relativo às liquidações nulas.
ix. Por outro lado, aquando da notificação das liquidações de IMI sequentes ao acto de determinação de VPT impugnado, a Recorrente tampouco teria forma de impugnar as mesmas — na medida em que as ilegalidades apontadas eram próprias do procedimento avaliativo.
x. Mesmo não tendo a sentença exequenda referido, ipsis Iitteris, que da anulação da segunda liquidação haveria lugar à anulação da liquidação do IMI, tal nunca implicará que a Exequente, ora Recorrente, não possa, em sede de execução do julgado, peticionar o reembolso dos montantes de IMI liquidados com base no VPT anulado — nos termos previstos nos artigos 47.º n.º 2 e n.º 3, 173.º n.º 1 e 2 do CPTA.
xi. Com efeito, “Face aos termos amplos em que o CPTA enquadra o dever de executar as sentenças de anulação, o demandante poderá obter, no processo de execução de sentença anulatória, não só o restabelecimento da situação que existiria se não tivesse sido praticado o acto anulado — mediante a especificação pelo tribunal dos actos e operações materiais necessários para esse efeito -. como também a imposição à Administração da prática de um novo acto administrativo que substitua o anterior (cfr. art. 173º)»21.
xii. Tal significa que a execução do julgado anulatório não se basta com a mera anulação do acto de determinação do VPT, por parte da AF, mas a essa anulação deve acrescer uma conduta positiva da AF, no sentido de reconstituir a situação jurídica que existiria caso a decisão anulada não tivesse sido praticada - o que apenas será possível na medida em que o administrado sela reembolsado das quantias de imposto liquidadas com base no acto administrativo anulado.
xiii. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo, não teve em conta a supremacia do direito à plena e imediata reconstituição da legalidade da situação jurídico-tributária, incorrendo em errada interpretação e aplicação da lei — mormente do disposto nos artigos 100.º da LGT, 47º n.º 2 b) e 3, 173.º n.º 1 e 2 do CPTA — a impor a anulação da decisão recorrida.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve conceder-se provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, o que se deverá fazer por obediência à Lei e por imperativo de JUSTIÇA!

Contra-alegou a recorrida, tendo concluído:

a) Vem o presente recurso interposto contra a douta sentença de 30/09/2013, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, nos autos supra identificados, que julgou improcedente a execução de julgado acima identificada.
b) Em causa está a execução de uma sentença proferida pelo TAF do Porto, no processo de Impugnação Judicial n° 2585/10.4 BEPRT, que ordenou a anulação da segunda avaliação do prédio inscrito na matriz sob o artigo P5588°, da freguesia de Leça do Balio, concelho de Matosinhos.
c) Entende a R. que o Tribunal a quo, ao julgar improcedente a execução de julgado, incorreu em erro de julgamento da matéria de direito.
d) A ora R. recorre daquela decisão, ao abrigo do disposto nos artigos 142°/1 e 144° do CPTA, invocando, essencialmente o seguinte:
- A execução da sentença requeria a condenação da AT a reconstruir a situação jurídica que existiria se não tivesse sido praticado o acto tributário de determinação do VPT, incluindo o pagamento de quantia indevidamente liquidada sobre o VPT judicialmente anulado, acrescido de juros indemnizatórios e de mora (artigos 100° da LGT e 173° do CPTA);
- O Tribunal ao determinar que os actos de liquidação de IMI que foram efectuados tendo por base o VPT judicialmente anulado, são actos consequentes, e como tal são nulos nos termos do artigo 133°/2 al. i) do CPA;
- Assim, caberia ao Tribunal incumbir a AT, por força do caso julgado, retirar todas as consequências do julgado anulatório, restituindo o imposto relativo às consequentes liquidações nulas;
- Deste modo, mesmo que a sentença exequenda não tenha referido, ipsis verbis, que da anulação da segunda avaliação haveria lugar à anulação da liquidação de IMI, tal nunca implicará que a ora R. não possa peticionar o reembolso dos montantes de IMI liquidados com base no VPT anulado, nos termos previstos no artigo 173°/2 do CPTA;
- Ao decidir desta forma, o Tribunal a quo não teve em conta a supremacia do direito à plena e imediata reconstituição da legalidade da situação jurídico-tributária, incorrendo em errada interpretação e aplicação da lei. (artigos 100° da LGT, 47°/2 al.b) e 3, 173°/1 e 2 do CPTA.
e) A recorrente interpôs os presentes autos recursivos, nos termos dos artigos 142.° n.° 1 e 144.° do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), para o Supremo Tribunal Administrativo.
f) Por conseguinte, e salvo o devido respeito, o recurso da decisão do TAF do Porto para o Supremo Tribunal de Justiça, configura-se, nos termos do art.° 151.° do CPTA, como um recurso de revista per saltum.
g) Tendo este natureza absolutamente excepcional, só admissível “nos precisos e estritos termos em que o legislador o consagrou, ou seja apenas deve ser admitido para viabilizar a reapreciação pelo Supremo Tribunal Administrativo de questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.”
h) Impendendo sobre a requerente o ónus de demonstrar, a verificação daqueles requisitos, tal não aconteceu.
i) Sendo pois inadmissível o recurso da decisão do TAF do Porto para o Supremo Tribunal Administrativo, o que se requer com todas as legais consequências.
Não obstante,
j) Em sede recursiva, a recorrente alega, em suma, que muito embora esteja em causa o cumprimento de uma decisão anulatória de um acto administrativo, está em causa o “pagamento da quantia indevidamente paga sobre aquele VPT judicialmente anulado, acrescido de juros indemnizatórios e moratórios”.
k) No entanto, o pressuposto do processo de execução de julgados para pagamento de quantia certa, é a existência de um título executivo, do qual resulte claramente definido o conteúdo da prestação ou prestações devidas, assim como dos eventuais juros moratórios que julgue devidos.
l) A sentença, objecto de execução de julgado, não determina, como pretende dar a entender a requerente, o pagamento de qualquer quantia pecuniária, mas que se julgue procedente, por provada, a presente impugnação e, em consequência anulo a segunda avaliação do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo n° P5588, da freguesia de Leça do Balio, concelho de Matosinhos, que lhe atribuiu o Valor Patrimonial Tributável de €1.792.240,00.”
m) A recorrente parece esquecer que a execução de sentenças anulatórias de actos administrativos e a execução para pagamento de quantia certa, são realidades absolutamente diferentes e distintas.
n) A argumentação da R. levaria ao limite de que a Administração, independentemente de qualquer procedimento, deveria imediatamente cumprir, pagando aquilo que esta entende ser o devido pois “tendo presente a ratio do artigo 100.º da LGT, a AT não deveria dispor, sequer, de um prazo (seja de 30 dias ou 3 meses) para executar espontaneamente a sentença, na medida em que essa obrigação nasce logo após o trânsito da sentença, sendo esta dilação de prazo incompatível com a aquela norma”.
o) Como se pode constatar do Processo Administrativo, junto aos autos “a plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade”, não se limita a uma “obrigação de pagar” são necessárias várias operações para a anulação do acto de segunda avaliação, que não se integram num dever de indemnizar.
p) Assim, decidiu e bem, o TAF do Porto que: “A Administração Tributária dispõe do prazo de 3 meses (...) para proceder à execução da decisão.”
q) A anulação, por sentença de um acto administrativo, constitui a Administração no dever de proceder aos actos jurídicos e operações materiais necessários à reintegração efectiva da ordem jurídica violada, mediante a reconstituição da situação que existiria se o acto ilegal não tivesse sido praticado, tendo por base os factos e o direito vigente à data do acto anulado (o que decorre do princípio tempus regit actus) — cf. artigos 173°, n.° 1 e 175°, n.° 2 do CPTA
r) Relativamente aos Efeitos da Sentença, destacamos os efeitos processuais, e neste, o Caso Julgado. Dentre os efeitos processuais, o mais importante é o caso julgado ou efeito de caso julgado, tendo como principais características: Imodificabilidade, irrepetibilidade, Imunidade, Superioridade, Obrigatoriedade, Executoriedade e Invocabilidade.
s) Ora, como se vê da sentença junta aos autos, a acção intentada pela ora R. foi julgada “procedente, por provada, e em consequência anulada a segunda avaliação do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo n° P5588 da freguesia de Leça do Balio, concelho de Matosinhos, que lhe atribuiu o Valor Patrimonial Tributável de € 1.792.240,00.
t) Ora Vejamos o que decidiu o Tribunal na Execução de Julgado intentada com base naquele título executivo:
i. Da decisão da Impugnação Judicial foi determinado a anulação da segunda avaliação do prédio acima descrito;
ii. Competia, assim, à AT, nos termos do artigo 100° da LGT o dever de executar a sentença em causa;
iii. A AT, deveria ter executado o julgado no prazo de 3 meses nos termos do artigo 175°/1 do CPTA, não tendo até à presente data cumprido o julgado;
iv. Na acção de Execução de Julgado, a então requerente peticionou o pagamento do montante de € 10.582,01, acrescido de juros de mora vincendos até integral pagamento, o valor de € 3.060,00 a titulo de custas de parte, juros moratórios e indemnizatórios;
v. Para que a sentença seja cumprida, a AT terá de anular a segunda avaliação do prédio urbano, e, consequentemente a conclusão da avaliação do imóvel;
vi. Só após aquele acto, é que a AT fica obrigada à plena reconstituição da legalidade do acto; (artigo 100° da LGT)
vii. Na petição, a então requerente não peticiona a anulação do acto da segunda avaliação, mas sim a restituição do montante de € 7.168,96, juros indemnizatórios e moratórios no valor de €10.582,01;
viii. Assim, não pode o Tribunal condenar a executada no referido pedido, uma vez que não é essa a decisão proferida na sentença do processo de impugnação 2585/10.4 BEPRT e processo n°2585/10.4-A BEPRT, e não foi esse o pedido efectuado pela então exequente;
ix. Nos termos do artigo 609°/1 do CPC, o Tribunal fica limitado ao pedido efectuado, pelo que não pode condenar a executada ao cumprimento do julgado, pelo que terá de ser improcedente o pedido;
x. Quanto às custas de parte e juros moratórios, o meio processual próprio é a Execução por custas, pelo que nesta parte também improcede a pretensão da então requerente.
u) No âmbito do princípio da tutela jurisdicional efectiva, no plano da tutela executiva, em que se põe à disposição de quem tenha obtido uma decisão jurisdicional, com força de caso julgado, as formas processuais adequadas à materialização dessa decisão, com vista à obtenção da sua execução, a exequibilidade extrínseca da pretensão é condicionada pelo título executivo, que determina o fim e os limites da acção executiva, com prevalência para a sua parte decisória.
v) Atento o princípio da vinculação do pedido inerente a uma posição neutra e imparcial do juiz perante as causas que lhe são submetidas para apreciação, em sede executiva, a pretensão da então requerente não pode extravasar os limites objectivos do caso julgado formado pela sentença, que não impôs à Administração, para além do dever de anular a segunda avaliação, qualquer anulação ou declaração de nulidade das liquidações de IMI.
w) O objecto da condenação na anulação de uma segunda avaliação de um imóvel, pressupõe que a AT proceda a uma nova avaliação do imóvel, como aliás já foi efectuado. (DOC. 1)
x) Porém, não pode existir uma tão ampla intervenção do juiz, porquanto a R. pede a restituição de €7.168,96, juros indemnizatórios e moratórios no valor de €10.582,01, e a decisão proferida quer em sede de impugnação judicial, quer em Execução de Julgados se refere à anulação da segunda avaliação do imóvel citado.
y) No que concerne ao pedido indemnizatório formulado na PI do petitório, a decisão do julgado é totalmente omissa na sua apreciação, limitando-se, a final, a julgar improcedente a presente acção.
z) Como já se referiu anteriormente, a sentença constitui caso julgado nos precisos termos em que julga (artigo 621° do CPC).
aa) Assim, na sua pronúncia exequenda, para execução da decisão judicial anulatória, o tribunal não poderá ir mais longe do que antes declarou, sob pena de ultrapassar os limites do caso julgado.
bb) Quanto aos juros moratórios também já se pronunciou a sentença do julgado anulatório “No que concerne à condenação de € 3 060,00 a título de custas de parte e juros moratórias de € 62.37, importa realçar que os valores agora reclamados dizem respeito às custas de parte devidas no processo de impugnação 2581/10.4, constante da nota discriminativa e apresentada nos termos do art. 25° e 26° do RCP”.
Nos termos supra expostos, e nos demais de Direito que V. Exas. doutamente suprirão, devem ser julgadas improcedentes as pretensões recursivas da Recorrente.

O Ministério Público (MP) pronunciou-se pela improcedência da excepção de incompetência arguida pela recorrente e pela procedência do recurso, devendo ser revogada a sentença recorrida e condenar-se a entidade requerida a restituir o imposto indevidamente pago acrescido de juros, nos termos legais, no prazo legal de 30 dias. Para tal entende o MP que, “Uma vez que a entidade requerida não procedeu à restituição oficiosa do imposto, como se lhe impunha, o recorrente pode, certamente, exigir tal prestação em sede de execução de decisão que anulou o VPT com base no qual foi calculado o IMI, nos termos do disposto no artº 47º/2 b)/3 do CPTA.” Entende portanto o MP que é inconcebível que o recorrente tivesse de interpor uma acção de impugnação contra o acto de liquidação do IMI consequente de acto anulado sendo por esse facto um acto nulo.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Na sentença recorrida deu-se como assente a seguinte factualidade concreta:

1. Em 19 de janeiro de 2012 foi proferida sentença pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Porto, no processo que correu termos sob o n.° 2585/10. BEPRT, a qual transitou em julgado em 01 de fevereiro de 2012 (cfr. fls. 74 a 77 do processo principal);
2. A impugnação foi julgada procedente e ordenada a anulação da segunda avaliação do prédio urbano inscrito na matriz sob o artigo n.° P5588, da freguesia de Leça do Balio, concelho de Matosinhos, que lhe atribuiu o Valor Patrimonial Tributável de € 1.792.240,00. (cfr. fls. 74 a 77 do processo principal);
3. Em 23.02.2012, veio a impugnante juntar aos autos cópia discriminativa e justificativa das custas de parte, no valor de € 3 060,00 (fls. 81-A do processo principal);
4. Em 03.06.2012 a Fazenda Pública procedeu ao pagamento da conta (fls. 86 verso principal)
5. Em 04 de setembro de 2012, a exequente apresentou a petição inicial que motiva os presentes autos, via mail, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Porto (cfr. fls. 1 dos autos;
Nada mais se levou ao probatório.

Há agora que conhecer do recurso que nos vem dirigido e, antes de mais, da excepção da incompetência em razão da hierarquia, arguida pela recorrida nas suas contra-alegações
A recorrida equaciona esta questão tendo presente o disposto no art. 151º do CPTA, de onde conclui que não se mostram preenchidos os requisitos previstos em tal inciso legal para que possa ser admitido o presente recurso.
Este entendimento tem sido sufragado pela jurisprudência uniforme deste Supremo Tribunal, entre outros, nos acórdãos datados de 12/02/2014 e 15/01/2014, respectivamente, recursos n.ºs 01847/13 e 01495/12.
Mais recentemente foi reafirmada esta jurisprudência, entre outros, nos acórdãos datados de 09/07/2014, recursos, nºs. 0165/14 e 01007/12, os quais subscrevemos.
Também agora se seguirá o mesmo entendimento e a mesma linha de raciocínio, terminando-se, a final, por concluir pela incompetência em razão da hierarquia deste Supremo Tribunal, sendo que se seguirá de muito perto o que se deixou escrito naqueles acórdãos.

A execução das sentenças proferidas pelos tribunais tributários é regulada pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 102º da LGT («A execução das sentenças dos tribunais tributários e aduaneiros segue o regime previsto para a execução das sentenças dos tribunais administrativos.»), ou seja, pelo disposto nos arts. 157º e ss. do CPTA.
O presente recurso é interposto da sentença proferida nestes autos que improcedeu na totalidade o pedido executivo que havia sido formulado.
Ou seja, o presente recurso jurisdicional encontra-se sujeito às regras previstas no CPTA, como resulta do estatuído no n.º 2 do art. 279.º do CPPT («Os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos».).
Com efeito, a execução de sentença constitui um meio processual comum à jurisdição administrativa e tributária e do art. 278.º do CPPT resulta inequivocamente que o regime de recursos que nele se encontra previsto só se aplica aos processos regulados nesse mesmo Código. Pelo que, na falta de indicação do regime de recursos jurisdicionais aplicável aos meios processuais comuns à jurisdição administrativa e tributária há que aplicar o regime previsto no CPTA como legislação subsidiária, por força do disposto na alínea c) do art. 2.º do CPPT, sendo certo, além do mais, que toda a tramitação da execução é regulada por este mesmo CPTA.
Neste contexto, importa ter em conta o disposto no art. 151.º, n.º 1, do CPTA, segundo o qual o recurso per saltum para o Supremo Tribunal Administrativo só pode ocorrer «Quando o valor da causa seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável e as partes, nas suas alegações, suscitem apenas questões de direito (...)».
Como referem MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS ALBERTO FERNANDES CADILHA (Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativo, 3.ª edição, Almedina, 2010, anotação 1 ao art. 151.º, pág. 999.), este recurso per saltum só é admitido desde que se encontrem preenchidos os seguintes requisitos: «(a) o fundamento do recurso consista apenas na violação de lei substantiva ou processual; (b) o valor da causa, fixado segundo os critérios estabelecidos nos artigos 32.º e seguintes, seja superior a três milhões de euros ou seja indeterminável (artigo 151.º, n.º 1); (c) incida sobre decisão de mérito; (d) o processo não verse sobre questões de funcionalismo público ou de segurança social (artigo 151.º, n.º 2)».
No caso, o valor da execução é de 10.228,96€ (juros e capital), que foi o indicado na petição inicial.
Assim sendo, atento o disposto no art. 31.º, n.º 2, alínea c) do CPTA («2 - Atende-se ao valor da causa para determinar:
[…]
c) Se cabe recurso da sentença proferida em primeira instância e que tipo de recurso».) e no já citado n.º 1 do art. 151.º do mesmo código, verifica-se uma circunstância que, desde logo, exclui que o recurso possa assumir-se como uma revista a dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo e impondo-se, consequentemente, observar o disposto no n.º 3 do mesmo art. 151.º do CPTA, segundo o qual «Se, remetido o processo ao Supremo Tribunal Administrativo, o relator entender que as questões suscitadas ultrapassam o âmbito da revista, determina, mediante decisão definitiva, que o processo baixe ao Tribunal Central Administrativo, para que o recurso aí seja julgado como apelação, com aplicação do disposto no artigo 149.º».
Concluímos, portanto, pela incompetência, em razão da hierarquia, desta Secção de Supremo Tribunal Administrativo para conhecer do presente recurso, sendo competente para o seu conhecimento a Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte.
Nem se diga que ao caso não se aplica o disposto no art. 152.º do CPTA por a distribuição da competência entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, no que se refere ao contencioso tributário, dever ser a que resulta dos arts. 26.º e 38.º do ETAF, motivo por que sempre competiria à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários com exclusivo fundamento em matéria de direito [cfr. art. 26.º, alínea b) do ETAF] e à Secção de Contencioso Tributário dos tribunais centrais administrativos conhecer dos recursos de decisões dos tribunais tributários, salvo o disposto na referida alínea b) do art. 26.º [cfr. art. 38.º, alínea a) do ETAF].
Na verdade, sendo certo que a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, em regra, se efectua nos termos daqueles preceitos, nada obsta a que outros preceitos, contidos em diploma legal com igual posição hierárquica (Apesar de o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais ter sido aprovado por lei (Lei n.º 13/2002, de 15 de Fevereiro) e o Código de Procedimento e de Processo Tributário o ter sido por decreto-lei (Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro), entre a lei e o decreto-lei não existe relação de hierarquia. Para maior desenvolvimento, J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 166 e segs.), regulem de modo que conduza a resultado diverso noutras situações, como sucede, v.g., no art. 151.º do CPTA, quando aplicável no contencioso tributário por remissão do n.º 2 do art. 279.º do CPPT.
Do exposto resulta que o presente recurso jurisdicional deve baixar ao Tribunal Central Administrativo Norte, para aí ser julgado como apelação.

Face ao exposto, os juízes da Secção do Contencioso Tributário acordam, em conferência, em declarar este Supremo Tribunal Administrativo incompetente para conhecer do presente recurso e ordenar a baixa dos autos ao competente Tribunal Central Administrativo Norte (Secção do Contencioso Tributário), para que o recurso aí seja julgado como apelação (n.º 3 do art. 151.º do CPTA).
Custas pela recorrente, com t. j. em 1 UC
D.N.
Lisboa, 10 de Setembro de 2014. – Aragão Seia (relator) - Casimiro GonçalvesFrancisco Rothes.