Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02268/18.7BEBRG
Data do Acordão:04/11/2024
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:FONSECA DA PAZ
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
Sumário:
Nº Convencional:JSTA000P32134
Nº do Documento:SA12024041102268/18
Recorrente:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, IP, CENTRO DISTRITAL DE VIANA DO CASTELO
Recorrido 1:AA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: ACORDAM NA FORMAÇÃO DE APRECIAÇÃO PRELIMINAR DA SECÇÃO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO:
1. AA intentou, no TAF, contra o Instituto da Segurança Social, I.P., acção administrativa para impugnação do despacho, de 17/7/2018, do Director da Unidade de Prestações e Contribuições do Centro Distrital de Viana do Castelo, que declarara a nulidade das prestações que lhe haviam sido "atribuídas a título de subsídio de doença, nos períodos compreendidos entre .../.../2013 e .../.../2016, cessando a partir de 07-11-2016 até ../../2017, por se ter verificado a acumulação com o exercício de actividade profissional e/ou ausência da sua residência em horários a que não estava autorizado".
Foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente.
O A. apelou para o TCA-Norte, o qual, por acórdão de 15/12/2023, concedeu provimento ao recurso, revogando a sentença e julgando a acção procedente.
E deste acórdão que a entidade demandada vem pedir a admissão de recurso de revista.

2. Tem-se em atenção a matéria de facto considerada pelo acórdão recorrido.

3. O art. 150.º, n.º 1, do CPTA, prevê que das decisões proferidas em 2.a instância pelos tribunais centrais administrativos possa haver excepcionalmente revista para o STA "quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental" ou "quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito".
Como decorre do texto legal e tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência deste STA, está-se perante um recurso excepcional, só admissível nos estritos limites fixados pelo citado art.º 150.º, n.º 1, que, conforme realçou o legislador na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nos. 92/VIII e 93/VIII, corresponde a uma "válvula de segurança do sistema" que apenas pode ser accionada naqueles precisos termos.
O acto impugnado, para declarar a nulidade das prestações atribuídas ao A. , entendeu que este não podia cumular o recebimento do subsídio de doença com o exercício de funções de Secretário da Junta de Freguesia ... nem com a prática de actos de gestão da Associação ...".
A sentença, considerando que o mandato do A. como autarca, exercido em regime de permanência, não se enquadrava no conceito de actividade profissional pública, pelo que nada obstava à referida cumulação, mas que o mesmo já não sucedia quanto ao recebimento do subsídio de doença com o desempenho de funções, ainda que não remuneradas, de Presidente da Direcção de uma Instituição particular de Solidariedade Social, concluiu pela improcedência total da acção.
O acórdão recorrido, por sua vez, depois de referir que a presença do A. na Associação a acompanhar uma acção inspectiva "não pode ser vista como prova do exercício de actividade profissional, porquanto tal presença foi isolada " e que ele "apenas participou no acto, formal, de assinatura dos 4 Acordos de Cooperação, não tendo tido qualquer intervenção material na sua negociação ou conformação do seu clausulado”, entendeu que a sentença violava o disposto no n.º 1 do art.º 51.º da CRP por dela decorrer "o impedimento do cidadão que esteja a receber prestações sociais por doença de participar na vida das Associações de que faça parte ", sendo certo também que, nos termos do art.º 24.º, n.º 2, al. a), do DL n.º 28/2004, de 4/2, ele tinha expressa autorização médica (ainda que tivesse sido aposta manualmente pelo médico nos certificados de incapacidade temporária para o trabalho) para se ausentar da residência.
A entidade demandada justifica a admissão da revista com a relevância jurídica e social da questão a apreciar, de forma a uniformizar a aplicação do direito e a evitar a disparidade de critérios perante contribuintes em igualdade de circunstâncias, e com a necessidade de se proceder a uma melhor aplicação do direito, imputando ao acórdão recorrido erro de julgamento por o direito constitucional de associação - que não é um direito absoluto - não ser posto em causa pela não atribuição do subsídio de doença e por violação do aludido art.º 24.º , n.º 2, al. a), quando considera não ser actividade profissional a exercida pelo A. por se consubstanciar em actos "pontuais" e “esporádicos” apesar de o legislador não quantificar os actos.
A questão jurídica que se coloca na revista, decidida de forma dissonante pelas instâncias, apresenta alguma dificuldade de resolução, não se mostrando isenta de dúvidas a solução que veio a ser perfilhada pelo acórdão recorrido, o qual não contém uma sustentação sólida e detalhada, sobretudo no que concerne à precisão dos critérios que regem a acumulação da prestação subsídio de doença.
Justifica-se, pois, a intervenção do Supremo para uma melhor indagação e, eventualmente, uma melhor decisão num assunto que suscita interrogações jurídicas e que reclama que sejam traçadas orientações clarificadoras.

4. Pelo exposto, acordam em admitir a revista. Sem custas.


Lisboa, 11 de Abril de 2024. – Fonseca da Paz (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.