Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0481/16.0BESNT 0739/18
Data do Acordão:11/29/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MARIA DO CÉU NEVES
Descritores:CPTA
ÂMBITO
APELAÇÃO
Sumário:O processo quando chega ao Tribunal de Apelação, encontra-se já delimitado quanto ao âmbito do conhecimento do recurso e ao ónus de impugnação, impedindo que o Tribunal em sede de recurso possa vir “ex novo” suscitar ilegalidades que nunca foram suscitadas pelos sujeitos processuais.
Nº Convencional:JSTA000P23909
Nº do Documento:SA1201811290481/16
Data de Entrada:10/17/2018
Recorrente:A... E OUTROS
Recorrido 1:B... LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo
1. RELATÓRIO

B…………, Ldª (B………..), intentou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (TAFS) contra o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE (CHLO), a presente acção de contencioso pré-contratual, indicando como contra-interessada A…………., Lda. (A……….), e na qual peticionou a anulação da deliberação do Conselho de Administração do CHLO de 02 de Março de 2016, relativa à adjudicação da proposta apresentada pela A………. e à exclusão da proposta por si apresentada, no que respeita ao lote nº 5 do concurso público internacional nº CP000015, bem como a condenação do CHLO a retomar o procedimento, procedendo de imediato à avaliação das propostas apresentadas.


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Por sentença de 30.05.2017 do TAF de Sintra foi julgada procedente a presente acção e, em consequência, anulada a deliberação de 2.3.2016 de adjudicação e de exclusão da proposta apresentada pela B……….., com todas as legais consequências.

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Inconformados, o CHLO e a A………. interpuseram recurso jurisdicional para o TCA Sul dessa sentença.

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O TCA Sul, por Acórdão datado de 15.03.2018, decidiu negar provimento aos recursos jurisdicionais interpostos pela A……….. e pelo CHLO, mantendo, com distinta fundamentação, a sentença recorrida.

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Inconformada, a A…………. Ldª, interpôs o presente recurso de revista, nos termos do artº 150º do CPTA, para o que alegou e formulou as seguintes conclusões:

«A. O presente recurso de Revista vem interposto, de forma delimitada, às disposições decisórias constantes a fls. 31 do Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal a quo, em 15.03.2018, onde se decidiu que: “- o tribunal de 1ª instância deve na sentença que profere identificar a existência de vícios diversos dos que tenham sido alegados (cfr. art. 95º, nº 3, 2ª parte, ex vi arts. 97º nº 1 al. c), e 102º nº 1, todos do CPTA), pelo que, sendo objecto deste recurso a sentença proferida em 1ª instância, necessariamente, este tribunal de recurso pode e deve identificar a existência de vícios diversos dos que tenham sido alegados – e que não tenham sido identificados pelo tribunal a quo –, pois está em causa matéria de conhecimento oficioso” e, ainda, que “- de acordo com o disposto no art 51º nº 3, ex vi art. 97º nº 1, al. c), ambos do CPTA, o acto final do procedimento pode ser impugnado com fundamento em ilegalidades cometidas durante o procedimento, o que não inclui as ilegalidades que anteriormente já tenham sido reconhecidas pelo Tribunal ou pela Administração, mas pela deliberação de 21.9.2015 apenas foi reconhecida a ilegalidade do requisito mínimo vertido na subalínea i) da alínea b) da cláusula 5ª, do Caderno de Encargos [o que determinou a revogação dos actos de exclusão e de adjudicação de 15.7.2015 (cfr. alínea a), dessa deliberação de 21.9.2015)], não tendo existido até à data qualquer decisão (do Tribunal ou da Administração) sobre a (i)legalidade do modo de execução dessa deliberação revogatória de 21.9.2015, ou seja, a este propósito inexiste qualquer caso julgado ou decidido”.

B. Nessa medida, a Recorrente conformou-se e expressamente renunciou a recorrer dos demais segmentos decisórios do Acórdão, nomeadamente o respeitante à “violação dos princípios da imparcialidade e da prossecução do interesse público”.

C. No âmbito do capítulo. I. Da Decisão Preliminar Sumária, a Recorrente começou por demonstrar que as questões subjacentes ao presente Recurso de Revista não só se revestem de relevância jurídica e social, como a admissão do mesmo é imperativa para uma melhor aplicação do direito.

D. Para efeitos da demonstração quanto à admissibilidade do Recurso de Revista, quanto àquelas disposições decisórias do identificado Acórdão recorrido, a Recorrente começou por se pronunciar a propósito a. Da Admissão do Recurso de Revista, tendo evidenciado que o Venerando Tribunal a quo havia considerado, em duas grande linhas de decisão, que: i) O Tribunal de 2ª instância pode identificar vícios distintos e autónomos daqueles que foram invocados – pelas partes ou oficiosamente – em 1ª instância e sobre os quais as partes não tenham tido oportunidade de debater com recurso aos articulados que lhes são concedidos em 1ª instância, e ii) Que pese embora estar em impugnação um Acto de Adjudicação proferido em 02.03.2016, na sequência da anulação de um anterior Acto de Adjudicação, que ainda assim o Tribunal de 2ª instância tem poderes para apreciar e decidir sobre se a execução da Deliberação de Anulação (de 21.09.2015) foi, ou não, correcta e completa, ainda que o interessado (o impugnante) se tenha conformado com os termos dessa Execução,

E. Para concluir que o presente Recurso de Revista deveria ser admitido quanto a essas questões, para haver lugar a uma melhor aplicação do direito no caso concreto, na medida em que se deveria de decidir se haveria (ou não) lugar, no ordenamento jurídico vigente, para a interpretação que se fez do quadro legal, uma vez que, se desconheciam decisões jurisprudenciais que apontassem naquele sentido, não tendo aplicabilidade ao caso vertente aquelas que vinham invocadas pelo Tribunal de 2ª instância.

F. Neste sentido, demonstrou a Recorrente que da leitura e aplicação do quadro legal não assistia a interpretação e aplicação que o Venerando Tribunal a quo fez do mesmo, e que a mesma se traduzia, antes, num erro de aplicação do direito manifesto e grave, que justificava a intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo para que houvesse lugar a uma “melhor aplicação do direito”.

G. Mais demonstrou a Recorrente que este Recurso de Revista deveria ser admitido porque as questões subjacentes assumiam relevância jurídica e social, pois que tinham claro impacto na actividade jurisdicional dos Tribunais, face à séria probabilidade de se virem a colocar num sem número de casos futuros, tendo sério impacto na actividade decisórias dos Tribunais.

H. A este propósito, evidenciou a Recorrente que a vingar a orientação jurisprudencial do Venerando Tribunal a quo, as partes processuais podem ver-se confrontadas com decisões em 2ª instância que se afastam de forma absoluta daquilo que foi invocado e discutido em 1ª instância, com as nefastas consequências que daí podem advir, nomeadamente quando se tratem de questões que impliquem/justifiquem a produção de prova em 1ª instância e que imponham que haja uma discussão alargada das mesmas logo desde a fase dos articulados, podendo esse conhecimento “ex novo” pelo Tribunal de 2ª instância consubstanciar verdadeiras decisões-surpresa proibidas por Lei.

I. Neste sentido, evidenciou também a Recorrente que o Venerando Tribunal a quo também não poderia, à revelia da parte processual interessada – a Impugnante –, apreciar um Acto que não se encontrava em impugnação nos autos, considerando que a Entidade Adjudicante não deu cabal execução à decisão de Anulação proferida, sendo certo que a parte interessada – a Impugnante – não instaurou qualquer Acção de Execução de Sentença de Anulação com vista a extrair da decisão Jurisdicional de Anulação as consequências que o Tribunal de 2ª instância considerou que deveriam ter sido extraídas, quando a parte interessada se conformou com a execução que foi dada pela entidade adjudicante.

J. Isto é, demonstrou a Recorrente que numa decisão absolutamente inovadora da/na Jurisprudência, o Venerando Tribunal a quo veio repristinar o conhecimento de um acto que não se encontrava em impugnação, considerando que dele não foi extraída a devida execução, e, nessa medida, que o acto administrativo impugnado era ilegal, sendo certo que a parte interessada nunca se insurgiu, mediante processo de execução, quanto à execução que a entidade adjudicante deu do acto administrativo que previamente havia sido declarado ilegal.

K. Nesta sequência, evidenciou a Recorrente que também quanto aos requisitos da relevância jurídica e social, se deveria admitir o presente Recurso de Revista pois que a pronúncia deste Supremo Tribunal Administrativo para evitar a interposição de outros recursos e prolação de outros Acórdãos, no futuro, decidindo-se se a decisão recorrida deve ser aceite e integrada na interpretação que se faça das normas da lei processual administrativa, dando a conhecer aos operadores qual a orientação jurisprudencial a ser seguida, assim se evitando novos pleitos em que esta matéria seja discutida.

L. Por conseguinte, tendo demonstrado a verificação/preenchimento dos critérios/pressupostos de que depende a admissão preliminar sumária do presente Recurso de Revista, veio a Recorrente pronunciar-se sobre o erro de julgamento do Venerando Tribunal a quo, tendo procedido à divisão das suas alegações em 2 (dois) capítulos, a sabe: a) Da identificação e decisão quanto a vícios distintos e autónomos dos invocados em 1ª instância, e b) Dos Limites dos Poderes de Cognição do Tribunal a quo.

M. No âmbito do capítulo a) Da Identificação e Decisão quanto a Vícios Distintos e Autónomos dos Invocados em 1ª instância, a Recorrente veio demonstrar que a lei processual administrativa encontra-se em sentido contrário ao da decisão proferida pelo Venerando Tribunal a quo, retirando-lhe sustento legal, porquanto em nenhum momento o artigo 149º do CPTA, permitia ao Tribunal de 2ª instância identificar vícios distintos e autónomos daqueles que foram invocados – pelas partes ou oficiosamente – em 1ª instância, e sobre os quais as partes não tiveram oportunidade de debater com recurso aos articulados que lhes foram concedidos em 1ª instância.

N. Por outras palavras, evidenciou a Recorrente que com a Sentença proferida em 1ª instância havia ficado sedimentado o enquadramento jurídico dos autos, não podendo, sob pena de consubstanciar uma verdadeira “decisão surpresa”, haver lugar ao conhecimento oficioso de novos vícios em 2ª instância, contrariamente ao que foi decidido pelo Venerando Tribunal a quo, no Acórdão sob Revista, motivando, assim, a intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo, para serem reapreciadas as questões de relevância jurídica e social fundamental e para haver lugar a uma melhor aplicação do direito.

O. Por conseguinte, e no âmbito do capítulo b) Dos Limites dos Poderes de Cognição do Tribunal a quo, demonstrou a Recorrente que o entendimento do Acórdão sob revista nesta matéria assentava em erro crasso e manifesto, pois que à revelia da parte processual interessada – a impugnante –, veio apreciar um Acto que não se encontrava em impugnação nos autos, considerando que a entidade adjudicante não deu cabal execução à Decisão de Anulação proferida, quando a parte interessada – a impugnante – não instaurou qualquer Acção de Execução de Sentença de Anulação com vista a extrair da Decisão Jurisdicional de Anulação as consequências que o Venerando Tribunal a quo considerou que deveriam ter sido extraídas, tendo-se, antes, conformado com a execução que foi dada pela entidade adjudicante.

P. Neste sentido, evidenciou a Recorrente que era manifesta a necessidade de intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo, para que fosse reapreciada esta questão que é de relevância jurídica e social fundamental e que exige uma melhor aplicação do direito, já que claramente os poderes de cognição do Tribunal em sede impugnatória não permitiam repristinar o conhecimento de Actos que não se encontram em impugnação e relativamente aos quais não foi promovida qualquer Execução e cujos interessados se conformaram com o conteúdo executório que lhe foi dado pela entidade adjudicante.

Q. Por outras palavras, demonstrou a Recorrente, que o Venerando Tribunal a quo, numa decisão absolutamente inovadora da/na Jurisprudência, veio repristinar o conhecimento de um Acto que não se encontrava em impugnação, considerando que dele não foi extraída a devida Execução, e, nessa medida, que o Acto Administrativo Impugnado era ilegal, sendo certo que a parte interessada nunca se insurgiu, mediante Processo de Execução, quanto à execução que a entidade adjudicante deu do Acto Administrativo que previamente havia sido declarado ilegal.

R. Neste sentido, demonstrou a Recorrente que a Lei processual administrativa (CPTA) não permite nem legitima o entendimento e decisão do Tribunal Central Administrativo Sul, não havendo também registo de Jurisprudência nesse sentido, a que acrescia a circunstância de também nunca a Doutrina – nem, sequer, o mais criativo cultor do direito – alguma vez ter aventado essa hipótese.

S. Por conseguinte, concluiu a Recorrente ser inexorável o erro de julgamento em que incorre o Acórdão sob revista, impondo-se e justificando-se a intervenção deste Supremo Tribunal Administrativo, de forma a serem reapreciadas as questões de relevância jurídica e social fundamental e haver lugar a uma melhor aplicação do direito».


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A recorrida B………… Lda. apresentou contra-alegações que concluiu da seguinte forma:

«I. Perante as questões concretamente suscitadas no recurso de revista, verifica-se que não foi suscitada qualquer violação da lei processual ou da lei substantiva e que a jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo está estabilizada quanto ao tratamento a dar-lhes, pelo que não estão reunidos os pressupostos de que depende a admissibilidade do recurso de revista.

II. Assumindo o recurso de anulação natureza substitutiva, o Tribunal Central Administrativo Sul estava investido no poder/dever de substituir a decisão impugnada pela decisão que, no seu juízo, se apresentasse como aquela que deveria ter sido proferida logo na 1ª instância, incluindo quanto às matérias de conhecimento oficioso, o que inclui, nos termos do artigo 95º, nº 3, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a identificação da existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas.

III. Detetada a invalidade dos aspetos essenciais do Caderno de Encargos (a previsão de uma exigência ilegal restritiva da concorrência) após o termo do prazo para a apresentação de propostas, deve ser anulada a disposição ilegal e retomar-se o procedimento a partir do momento em que foi praticado o ato viciado, a partir do momento em que foram aprovadas as peças do procedimento, sendo esta a solução que resulta imposta pelo artigo 79º, nºs 1, alínea c), e 3 do Código dos Contratos Públicos.

IV. Não o tendo feito, mas, ao invés, tendo simplesmente ordenado o prosseguimento do procedimento a partir da análise das propostas, com desconsideração do requisito ilegal restritivo da concorrência constante do Caderno de Encargos, o CHLO praticou um ato inválido que tem por efeito a violação do princípio da concorrência.

V. A invalidade assim cometida transmite-se ao ato de adjudicação na medida em que, caso fosse novamente convocada a concorrência sem o requisito ilegal previsto no Caderno de Encargos, teria havido outros concorrentes a apresentar propostas e o ato de adjudicação não teria o mesmo conteúdo.

VI. A esta luz conclui-se pela validade do Acórdão recorrido.

VII. Quando seja de julgar procedente o recurso, importa proceder à ampliação subsidiária do objeto do recurso, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 636º, nº 2, do Código de Processo Civil, aplicável ex vi artigo 140º, nº 3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.

VIII. O CHLO e a A………… não recorreram dos segmentos da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra segundo a qual “Do exposto resulta uma predisposição para excluir a proposta da Autora, em conjugação com os factos anteriores à decisão aqui impugnada (cf. nº 1 e 2 do probatório)” (cfr. p. 13); e “Ainda que a 2ª avaliação tivesse sido objetiva (que não foi) (…)” (cfr. p. 14).

IX. Estas afirmações, aliadas à análise efetuada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra quanto às supostas falsas declarações prestadas pela B……….. e à conclusão de que não foram proferidas quaisquer falsas declarações (cfr. pp. 12 e 13 da respetiva sentença), que concorreram para o dispositivo de procedência da ação proposta, não coincidem com o vício de violação do princípio da imparcialidade por o júri que procedeu à segunda análise e avaliação de propostas ter sido o mesmo que procedera à primeira análise e avaliação de propostas e que constituiu o objeto dos recursos interpostos.

X. Do que se conclui que o CHLO e a A……….. não tinham interesse em recorrer, por terem transitado em julgado fundamentos da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra que são invalidantes do ato impugnado.

XI. A falta de interesse em recorrer foi suscitada nas contra-alegações de recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul apresentadas pela B……….. (cfr. nºs 9 a 11 do § 1º, conclusões I a IV e o primeiro pedido formulado a final pela B……….).

XII. O Tribunal Central Administrativo Sul em momento algum do Acórdão recorrido identificou esta questão ou procedeu ao seu tratamento, do que resulta a nulidade por omissão de pronúncia nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d), primeira parte, do Código de Processo Civil.

XIII. Importa, pois, verificar a nulidade do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, por omissão de pronúncia, e proferir julgamento sobre a matéria em causa, do que resultará a improcedência do recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra.

XIV. Quando assim não se entenda, deve este Colendo Tribunal determinar a baixa dos autos ao Tribunal Central Administrativo Sul para que este se pronuncie sobre o conteúdo da ampliação subsidiária do recurso interposto pela B……….. para essa instância, cujo conhecimento o Tribunal Central Administrativo Sul afirmou ter ficado prejudicado (cfr. p. 38 do Acórdão recorrido).

Nestes termos e nos melhores de Direito, sempre com o douto suprimento de V. Exªs:

a) Deve o recurso de revista interposto não ser admitido por não se verificarem os respetivos pressupostos;

Quando assim não se entenda,

b) Deve o recurso de revista interposto ser julgado improcedente, por não provado;

Quando assim não se entenda,

c) Deve ser admitida a ampliação subsidiária do recurso e, declarando-se a nulidade por omissão de pronúncia cometida, ser proferido Acórdão que julgue a falta de interesse em recorrer para o Tribunal Central Administrativo Sul (e a improcedência do recurso) por parte do CHLO e da A…………, em virtude de parte dos fundamentos da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, invalidantes do ato impugnado, terem transitado em julgado;

Quando assim não se entenda,

d) Deve ser determinada a baixa dos autos ao Tribunal Central Administrativo Sul para que este se pronuncie sobre o conteúdo da ampliação subsidiária do recurso interposto pela B……….. para essa instância, cujo conhecimento o Tribunal Central Administrativo Sul afirmou ter ficado prejudicado».


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O TCA Sul, por acórdão, de sustentação, datado de 14 de Junho de 2018, deu por não verificada a alegada nulidade do aresto de 15 de Março de 2018 nos seguintes termos:

«(…)

Inconformada, a A………… interpôs, ao abrigo do art. 150º, do CPTA, recurso de revista para o STA do referido acórdão. Na contra-alegação de recurso apresentada pela B……….. - concretamente na ampliação subsidiária do recurso - é invocada a nulidade do acórdão recorrido, por omissão de pronúncia.

Apreciando.

A B………… alega que o acórdão recorrido é nulo por não ter apreciado a questão relativa à falta de interesse em recorrer do CHLO e da A……….., na medida em que já tinham transitado em julgado fundamentos da sentença do TAF de Sintra que são invalidantes do acto impugnado, mas sem razão, atento o seu teor, em especial pág. 24 (linhas 3 a 19), desse acórdão, que corresponde à pág. 2163, dos autos em suporte digital, onde foi apreciada tal questão.

Nestes termos, terá de ser julgada inverificada a nulidade imputada ao acórdão proferido por este TCA Sul em 15 de Março de 2018.


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O «recurso de revista» foi admitido por acórdão deste STA, proferido a 21 de Setembro de 2018.

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O Ministério Público, notificado nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 146º, nº 1 do CPTA, não emitiu pronúncia.

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Sem vistos, por não serem devidos.

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2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1. MATÉRIA DE FACTO

A matéria de facto dada como provada é a seguinte:

«1.Em 28/10/2015, no Processo de Contencioso Pré Contratual com o nº 2915/15.2 BESNT, que correu neste Tribunal entre as mesmas partes, foi proferida a seguinte sentença (já transitada):

B………….., LDA., com sede na ……….., nº ….., …………, Edifício ….., Amadora, veio propor e fazer seguir contra - CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA OCIDENTAL, E.P.E., com sede na Estrada do Forte do Alto do Duque, 1449-005, Lisboa (“CHLO”), sendo contra interessada, - A…………, LDA, com sede na ……… …….., ………, Amadora (“A……….”), A presente ACÇÃO DE CONTENCIOSO PRÉ-CONTRATUAL, tendo por objecto a impugnação da deliberação de adjudicação da proposta apresentada pela A…………. e de exclusão da proposta apresentada pelo B…………, relativamente ao Lote nº 5 do concurso público internacional nº CP000015.

Alega, no essencial e em síntese, que o relatório final propôs a exclusão da proposta apresentada pelo B…………, por esta não cumprir um requisito do Caderno de Encargos.

No entanto, é inválida a previsão do requisito incumprido pelo B……….., pelo que é igualmente inválida:

(i) a exclusão da sua proposta com esse fundamento e,

(ii) a adjudicação da proposta apresentada pela A…………, deliberadas pelo Conselho de Administração do CHLO.

Sendo inválida aquela exclusão, impõe-se que o Júri do Concurso volte a proceder à análise e avaliação das propostas apresentadas, o que, à luz do conteúdo das propostas apresentadas pelo B………… e pela A………., determinará a adjudicação da proposta apresentada por aquela. Conclui, assim, pela procedência da acção, anulando-se a decisão de exclusão da proposta apresentada pelo B……….. ao Lote 5, com fundamento no incumprimento do requisito ilegal previsto na cláusula 5ª, alínea b), subalínea i, do Caderno de Encargos.

Consequentemente, pede a condenação do CHLO a retomar o procedimento e a, com a desaplicação do requisito previsto na cláusula 5ª, alínea b), subalínea i), do Caderno de Encargos, proceder à análise e avaliação das propostas apresentadas, tramitando o procedimento concursal até final.


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A Contra Interessada A………… veio apresentar Contestação, porém, posteriormente veio pedir que fosse dada sem efeito.

IDENTIFICAÇÃO DO PROCEDIMENTO TRAMITADO

1. Por anúncio publicado no Diário da República em 19 de Dezembro de 2014, foi publicitada a abertura do concurso público nº CP000015, com vista à aquisição de Reagentes para realização de testes de Biologia Molecular, com colocação de equipamentos (cfr. processo administrativo).

2. Nos termos do anúncio e das peças do procedimento, o concurso foi dividido em 18 lotes, estando em causa nos presentes autos apenas o Lote nº 5 (cfr. processo administrativo).

3. A presente acção deu entrada em juízo em 18/08/2015.

4. O CHLO foi citado em 24/08/2015 (fls. 168).

5. A………… foi citada em 25/08/2015 (fls. 169)


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Em 26/10/2015 a A……….. veio requerer a extinção da instância, com o fundamento na inutilidade superveniente por terem sido revogados os actos de exclusão, tendo-se retomado o procedimento, quanto ao LOTE 5, nos termos da Deliberação de 21/09/2015, nos termos seguintes:

Considerando que:

Deliberação

a) Por deliberação do Conselho de Administração do Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, E.P.E., (“CHLO”) de 10.12.2014, foi promovida a abertura de um procedimento de Concurso Público Internacional n° CP00015, para o fornecimento de reagentes para a realização de Testes de Biologia Molecular no CHLO em 2015, com colocação de equipamentos;

b) Relativamente ao lote 5, o Anexo I ao Caderno de Encargos estabelecia que o mesmo era constituído por 4 (quatro) posições, a saber:

Posição 6, Carga Viral HCV (2.500 testes para 2015);

Posição 7, Carga Viral HBV (1.300 testes para 2015); Posição 8, Carga Viral HIV-1 (7.440 testes para 2015); e Posição 9, Carga Viral CMV (1.000 testes para 2015);

c) De acordo com os n° 3 do artigo 10º do Programa de Procedimento, o critério de adjudicação desse lote 5 era o da proposta economicamente mais vantajosa, sem prejuízo dos critérios de desempate previstos no n° 4 do mesmo artigo;

d) Por sua vez, de acordo com o disposto na alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos previa como aspecto da execução do contrato não submetida a concorrência, entre outros, o requisito mínimo de os reagentes terem uma estabilidade, após abertura, de pelo menos 20 dias (cfr. subalínea i. daquela alínea b);

e) Ao lote 5 apresentaram propostas três concorrentes (…………, Lda., a B………….., Lda. E a A…………, Lda.);

f) No Relatório Preliminar, o Júri propôs, no contexto do lote 5, a exclusão das propostas apresentadas pelas concorrentes ………., Lda., e B……….., Lda., esta última com fundamento no não cumprimento do requisito previsto na subalínea i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos, e propôs a adjudicação da única proposta admitida, a apresentada pela concorrente A…………, Lda.;

g) Em sede de audiência prévia, a concorrente B…………, Lda. apresentou a sua pronúncia, defendendo que não devia ser excluída por, em seu entender, o referido requisito mínimo vertido na subalínea i. da alínea b) entender, o referido requisito mínimo vertido na etecção i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos restringia a concorrência de forma ilegal uma vez que “Os únicos reagentes no mercado que cumpriam a exigência do ponto i da alínea b) do Cláusula 5ª do Caderno de Encargos são os da concorrente A…………., LDA.” (cfr. pronúncia apresentada pela concorrente B…………, Lda., em sede de audiência prévia);

h) Requereu então a concorrente B…………, Lda., na sua pronúncia, que “deve o Relatório Preliminar ser alterado na parte em que propõe a exclusão da proposta da B………… ao lote 5 com fundamento no ponto i. da alínea b) da Cláusula 5ª do Caderno de Encargos, por este ser inválido, e proceder a adjudicação das propostas apresentadas em conformidade com o critério de adjudicação definido no Programa de Concurso” (cfr. pronúncia apresentada pela concorrente B……….., Lda., em sede de audiência previa);

i) No Relatório Final, ponderando sobre o alegado pela concorrente B…………, Lda., na sua pronúncia, o Júri concluiu que, depois de enfatizar a importância que para o CHLO tinha o referido requisito mínimo, pelo menos duas empresas no mercado tinham reagentes que cumpriam esse requisito, pelo que não seria restritivo da concorrência, não estando o requisito previsto de forma a que apenas um operador de mercado estivesse apto a cumpri-lo. O Júri propôs assim manter a proposta de exclusão das propostas apresentadas pelas concorrentes …………, Lda., e B……….., Lda. (esta última com o fundamento tratado nos considerandos anteriores);

j) Em 15.07.2015, o Conselho de Administração do CHLO proferiu a decisão de adjudicação, no contexto do lote 5, da proposta apresentada pela concorrente A…………., Lda., e de exclusão das propostas apresentadas pelas outras duas concorrentes;

k) Não concordando com a referida decisão, a B……….., Lda. Intentou um Processo de Contencioso Pré Contratual junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra (Processo n° 2915/15.2BESNT), voltando a suscitar a invalidade do requisito mínimo previsto na subalínea i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos e, assim, da exclusão da sua proposta (cfr. Petição Inicial que se anexa);

l) Na Petição Inicial, a B………., Lda. demonstra não ocorrer o pressuposto de que partiu o Júri no Relatório Final de que existiam à data pelo menos duas empresas no mercado que conseguiam apresentar proposta ao lote 5 estando previsto aquele requisito mínimo; Com efeito,

m) Na Petição Inicial, a B………, Lda. demonstra que uma (a Hologic), não obstante ter uma oferta de reagentes para testes de carga viral HIV-1 cuja estabilidade após abertura é superior a 20 dias, cumprindo assim os requisitos relativos a posição relativa aos reagentes para a realização de testes de carga viral HIV-1, não cumpriria qualquer uma das demais posições previstas para o lote 5 por não comercializar reagentes para os mesmos;

n) A B………., Lda. também demonstra que a outra (a ……….), não obstante ter agora reagentes com características de estabilidade depois de abertos exigidos por aquele requisito mínimo, as datas da abertura do procedimento e de apresentação de propostas ainda não os podia comercializar porquanto só obteve posteriormente a marcação CE para os reagentes aplicáveis à hepatite C e HIV-l;

o) Após demonstrar que seria ilegal a sua exclusão por não cumprir aquele requisito mínimo, porquanto o mesmo restringe ilegalmente a concorrência, a B……….., Lda. apresenta, a final, dois pedidos:

a) A anulação da decisão de exclusão da sua proposta com fundamento no incumprimento do requisito previsto na subalínea i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos; e, consequentemente,

b) A condenação do CHLO a “retomar o procedimento e a, com desaplicação do requisito previsto na cláusula 5ª, alínea b), subalínea i, do Caderno de Encargos, proceder a análise e avaliação das propostas apresentadas, tramitando o procedimento concursal até final”.

p) Encontra-se a decorrer presentemente o prazo para o CHLO apresentar a sua contestação no referido Processo de Contencioso Pré-Contratual;

q) Avaliados os argumentos apresentados pela B………., Lda. na sua Petição Inicial, concorda-se com os mesmos, na estrita medida em que a mesma demonstra não ocorrer, na data do lançamento do procedimento, nem do termo para a apresentação das propostas, mais do que um operador no mercado capaz de apresentar proposta ao lote 5, situação apenas possível pela existência do referido requisito vertido na subalínea i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos, requisito esse que, tudo ponderado, não necessitaria de ser tão restritivo quanto foi previsto (com um período de tempo de estabilidade do reagente, após abertura, de pelo menos 20 dias) para que pudesse responder as necessidades do CHLO (conforme também demonstrado pela B…………, Lda. na sua Petição Inicial, com a qual se concorda).

r) Importa assim eliminar da ordem jurídica o ato de exclusão da proposta apresentada pela B……….., Lda., com aquele fundamento, por ser ilegal, bem como retornar o procedimento ao momento em que as propostas apresentadas (com exceção da proposta da concorrente ……….., Lda; cfr. considerando seguinte infra) são analisadas e avaliadas sem que o referido requisito mínimo, por ser ilegal, seja tornado em conta nas mesmas, o que implica, também, a revogação do ato de adjudicação da proposta apresentada pela concorrente A…………, Lda., porquanto foi praticado pressupondo a exclusão da proposta da concorrente B…………, Lda., pressuposto esse que não se pode ter como correto, como vimos;

s) O referido no considerando anterior não prejudica a análise já etecção quanto a proposta da concorrente ………, Lda., porquanto quanto a esta nenhuma ilegalidade existe e a mesma, tendo tido oportunidade para o efeito, não impugnou o ato de exclusão da sua proposta, o qual se consolidou na ordem jurídica;

t) Importa clarificar que, metodológica e cronologicamente, deve distinguir-se duas fases distintas, ambas referidas pela concorrente B……….., Lda. nos seus pedidos apresentados na Petição Inicial: por um lado, a análise das propostas, enquanto etecção a orientada para efeitos de aferição das causas de exclusão que recaiam sobre as propostas; e, por outro lado, a avaliação das propostas, realizada após aquela análise e orientada para a ordenação das propostas para efeitos de adjudicação; dito de outro modo: a aplicação do critério de adjudicação só opera nesta última fase (de avaliação) e não prescinde aquela primeira fase (de análise), destinada a apurar eventuais causas de exclusão, como se referiu;

u) Retomando a fase de análise e de avaliação, o Júri deverá reanalisará as propostas apresentadas (com exceção da proposta da concorrente ……….., Lda; cfr. considerando s) supra) quanto a eventuais motivos de exclusão, não podendo ser tornado em conta o requisito mínimo previsto na subalínea i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos, por ilegal, e, terminada essa fase, a avaliação das propostas pelo Júri será feita de acordo com o critério de adjudicação da proposta economicamente mais vantajosa, tal como previsto no artigo 10.º do Programa de Procedimento;

v) Deste modo são acauteladas as legítimas expectativas dos concorrentes, procedendo-se ao aproveitamento do procedimento concursal, no respeito pela transparência, igualdade e imparcialidade concursais.

Termos em que:

a) Revogam-se os atos de exclusão da proposta apresentada pela concorrente B……….., Lda. E de adjudicação da proposta apresentada pela concorrente A…………., Lda., quanto ao lote 5 do Concurso Público Internacional n° CP00015, para o fornecimento de reagentes para a realização de Testes de Biologia Molecular no CHLO em 2015, com colocação de equipamentos, nos termos do artigo 168.°, n° 3, do Código do Procedimento Administrativo;

b) Ordena-se que o procedimento identificado na alínea anterior retome os seus trâmites a fase de análise e de avaliação das propostas (com exceção da proposta da concorrente ………., Lda; cfr. considerando supra) pelo Júri, quanto ao lote 5, sem que seja tornado em conta o requisito mínimo previsto na subalínea i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos;

c) Não há audiência prévia dos interessados, nos termos conjugados, (i) por um lado, da alínea a) do n° 1 do artigo 124° do Código do Procedimento Administrativo, face ao termo do prazo de contestação (dia de hoje) no Processo n°2915/15.2BESNT, que corre termos do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, porquanto não permitira ao CHLO praticar os atos indicados nas duas alíneas anteriores e invocar perante o Tribunal a devida exceção processual de inutilidade da lide naquela peça processual daí necessariamente decorrente, sendo etecção a imperioso concluir o fornecimento destes bens imprescindíveis ao funcionamento desta unidade hospitalar; e, (ii), por outro lado, da alínea e) do n° 1 do artigo 124° do Código do Procedimento Administrativo, na medida em que o motivo determinante das presentes decisões (a saber, a ilegalidade do requisito mínimo previsto na subalínea i. da alínea b) da cláusula 5ª do Caderno de Encargos) já ter sido amplamente suscitado e discutido durante o procedimento, tendo todas as concorrentes tido a oportunidade de sobre o mesmo se pronunciarem. (…)


*

Conforme resulta da Deliberação junta pela Contra Interessada, a Entidade Hospitalar eliminou da ordem jurídica os actos administrativos pré-contratuais que constituíam o objecto do presente processo.

Assim sendo, a presente lide perdeu o seu objecto, devendo, em consequência, decretar -se a extinção da instância, por inutilidade.

Decisão

Pelo exposto,

Declaro a extinção da instância, por inutilidade superveniente da lide.

Custas pelo Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE, por ter dado causa à acção. Registe e notifique”.

2. O mesmo Júri do procedimento, em cumprimento da Deliberação de 21/09/2015 referida na sentença supra transcrita, procedeu à reanálise e reavaliação das propostas, tendo aprovado o Relatório Final, no qual propõe a exclusão da proposta da Autora, submetendo-o a nova Audiência Prévia – fls. 767, 768/816 do p.a.

3. A Autora pronunciou-se em sede de audiência prévia, porém, o júri no Relatório Final mantém a proposta de exclusão da Autora, e de adjudicação à Contra Interessada A………… no Relatório Final de 17/02/2016 – fls. 755/816 a 762/816, no processo administrativo, que aqui se dão como reproduzidas.

4. Dos fundamentos de rejeição da proposta da Autora consta o seguinte, no que ora interessa:

(…)

Ora, sem necessidade de considerações adicionais, uma detecção a conclusão se impõe: os reagentes identificados no Anexo I ao Caderno de Encargos nunca referem reagentes de amplificação como defende a B……….., mas sim … Carga Viral HCV, Carga Viral HBV, Carga Viral HIV-1 e Carga ViraI CMV.

Neste contexto, importa precisar que, como é sabido, um ensaio de carga viral engloba sempre a extracção (passo mais trabalhoso do ensaio de carga viral), amplificação e detecção. A preparação da amostra consiste em centrifugar um tubo de sangue e separar o plasma para extrair ácidos nucleicos. Para extrair ácidos nucleicos (fase de extracção) são necessários reagentes, assim como para a amplificação.

Deste modo, é impossível dissociar estes dois passos (a extracção e a amplificação), como a concorrente B………. fez na sua pronúncia sob apreciação – e objectivamente só se justifica que tenha empregue tal argumento unicamente como justificação (que não colhe) para as falsas declarações prestadas (através da aposição de um “x” na coluna do “Sim”; cfr. supra e “Modelo de apresentação dos atributos das propostas” constante do Anexo I ao Programa do Procedimento) de que os reagentes propostos eram prontos a usar, pois nenhum outro sentido é admissível. Com efeito, é sabido que qualquer interpretação, não se cingindo à letra dos textos normativos, deve ter «um mínimo de correspondência verbal» (cfr. nº 2 do artigo 9° do Código Civil), não havendo nada nas peças procedimentais que permita sustentar a interpretação que a concorrente B………… vem agora sustentar a propósito da (cristalina) redacção do subfactor g) do lote 5 (“Reagentes pronto a usar sem manipulação por parte do operador”), como vimos.

Aliás, se algo resulta claro do Caderno de Encargos é a obrigação de todos os reagentes a fornecer (sejam os de extracção, sejam os de amplificação) serem prontos a usar. Com efeito, e por mais que a B………. o tente demonstrar, não decorre das peças procedimentais nenhuma razão justificativa (e desculpante) para a alegada distinção de tipos de reagentes efectuada pela concorrente B……….. para efeitos do disposto no subfactor g) do factor “Qualidade” do lote 5 (“Reagentes pronto a usar sem manipulação por parte do operador”), porquanto o nº 3 da cláusula 7ª do Caderno de Encargos (“3. Os requisitos mínimos do(s) equipamento(s) a concurso para os lotes 5 e 9 deverão obrigatoriamente incluir: / a. fase de amplificação e etecção automatizada; / b. devem apresentar uma solução de extracção também automatizada /c. (…)/ d. (…)”) expressamente determina como requisito dos equipamentos a concurso para os lotes 5 e 9 que as fases de extracção, amplificação e detecção sejam automatizadas, o que pressupõe, precisamente, reagentes prontos a usar … tal como valorizado no referido subfactor g). Resulta daqui claro, portanto, a necessidade de todas as fases serem automatizadas, o que implica a existência de reagentes sem manipulação do utilizador, i.e., prontos a usar.

Não se compreende, portanto, face ao previsto nas peças (cfr. supra) e ao conhecimento do meio (por parte de todos os operadores económicos deste mercado, com ampla experiência, tal como a concorrente em questão), a defesa da possibilidade de interpretações diferentes, sendo disso sintomático o facto de mais nenhum concorrente ter sequer alguma vez assumido que os reagentes em questão seriam apenas para a fase de amplificação …

Assim sendo, toma-se claro que a concorrente B……….. não poderia ter assumido – se verdadeiramente assumiu, o que se estranha – tal distinção aquando da indicação de um “x” na coluna “Sim” no formulário de apresentação dos atributos do lote 5 (subfactor g) supra idêntico ao previsto no Anexo I ao Programa do Procedimento, assim se vinculando a propor “Reagentes prontos a usar sem manipulação por parte do operador”, bem sabendo que não o poderia ter feito (tendo sido, no mínimo, negligente, e, por isso, culposa tal actuação), por tal ser falso, como expressamente decorre das várias passagens das fichas técnicas dos reagentes citadas no anterior Relatório Final e acima reproduzidas.

Finalmente, diga-se que o facto de a proposta da concorrente B……….. ser a economicamente mais vantajosa mesmo quando avaliada com 0 pontos no subfactor em causa, não é um argumento atendível, porquanto só são avaliadas as propostas que não devam ser excluídas, sendo que o juízo de análise (tendente à aferição de causas de exclusão) é lógica e metodologicamente prévio ao juízo de avaliação (de medição da performance das propostas que não devam ser excluídas), não tendo a virtualidade de sanar uma causa de exclusão (…)

- Relatório final no p.a., fls 749 a 762/816 (sublinhado nosso)

5. A Autora apresentou uma proposta de preço inferior ao proposto pela Contra Interessada A…………. em 79.480,00€ (223.540,00€/ano contra 303.020,00€/ano), o que permitiria executar o mesmo contrato ao longo de três anos gastando menos 238.440,00€ (= € 79.480,00 X 3) – mais do que o valor que a Autora propôs para um só ano – facto admitido.».


*

A esta matéria de facto, o TCA Sul aditou a seguinte:

«Ao abrigo do art. 662º, nº 1 do CPC de 2013, ex vi, art. 140º nº 3 do CPTA (na redacção dada pelo DL 214-G/2015, de 2/10, tal como as demais referências feitas ao CPTA neste acórdão), procede-se ao aditamento da seguinte factualidade:

6. Por deliberação de 2.3.2016 o Conselho de Administração do CHLO aprovou os relatórios finais descritos em 2. a 4., a adjudicação à A………… e a minuta do contrato, bem como autorizou a despesa no valor total de 372 713,60€ (cfr. fls. 767 e 768 do processo administrativo)».


*

2.2. O DIREITO

Na presente acção de contencioso pré-contratual intentada por B………. Ldª contra o Centro Hospitalar de Lisboa Ocidental, EPE, [e em que é contra interessada a A…………., Ldª], mostra-se impugnada a deliberação do Conselho de Administração do CHLO de 02 de Março de 2016 relativa à adjudicação da proposta apresentada pela A………… e à exclusão da proposta por si apresentada no que respeita ao lote nº 5 do concurso público internacional nº CP000015, bem como a condenação do CHLO a retomar o procedimento, procedendo de imediato à avaliação das propostas apresentadas.

Por decisão do TAF de Sintra, foi anulada a deliberação de 02.03.2016, no segmento em que adjudicou a proposta apresentada pela A……….. e, no segmento em que excluiu a proposta apresentada pela B……….. com base nos seguintes vícios: (i) não verificação do motivo (prestação culposa de falsas declarações pela B……….) que conduziu à exclusão da proposta apresentada pela B……….. e, (ii) violação dos princípios da imparcialidade (na medida em que, após a deliberação de 21.9.2015, o concurso prosseguiu com o mesmo júri) e (iii) da prossecução do interesse público (por ser reconhecido que a proposta da B………. era a proposta economicamente mais vantajosa, mas considerar-se que tal não era um argumento atendível).

Interposto recurso para o TCAS, veio este a proferir o Acórdão recorrido, tendo-se aqui decidido que improcediam as nulidades assacadas ao Acórdão de 1ª instância e considerado que este errou ao considerar procedentes os vícios de violação dos princípios de imparcialidade e da prossecução do interesse público.

Porém, foi considerado procedente um outro vício que havia sido suscitado, oficiosamente, no TCAS, pela Relatora, em 31.01.2018, sendo que, o recurso de revista interposto pela A………., que agora incumbe analisar limitou o seu objecto a este mesmo vício que veio a anular a Deliberação de 02.03.2016 e, consequentemente, a conceder provimento à acção.

Assim sendo, impõe-se a análise prioritária do presente recurso de revista, precisamente por esta questão que constitui o seu único objecto.

Vejamos:

O despacho proferido pela Relatora em 31.01.2016 no TCAS que identificou uma nova causa de invalidade que não tinha sido suscitada pela B………., tem o seguinte teor:

«II – Tendo em conta que o vício que determinou a prática da deliberação de revogação de 21.9.2015 se verificava no caderno de encargos, a execução dessa deliberação revogatória implicava a reformulação (e respectiva aprovação) do caderno de encargos (para efeitos de expurgação desse vício) e, seguidamente, a prática dos subsequentes actos do procedimento do concurso [v.g. publicação do anúncio do procedimento, apresentação de propostas (só o podendo fazer quem, à data em que foram apresentadas as propostas iniciais, estivesse em condições de o fazer, ou seja, por exemplo uma empresa que nessa data não tinha existência jurídica não podia apresentar qualquer proposta), elaboração do relatório preliminar, audiência prévia, relatório final e adjudicação] - sendo que os actos do concurso situados a montante e apenas estes [in casu, a deliberação de contratar (que não se confunde e é necessariamente anterior à aprovação das peças do procedimento), a qual não foi posta em causa pela deliberação de 21.9.2015] permanecem indemnes -, o que in casu não foi feito e é causa de anulação da deliberação impugnada de 2.3.2016. – sub nosso.

Nestes termos, notifique as partes para, querendo, se pronunciarem, no prazo de 5 (cinco) dias, sobre a presente questão».

Este despacho, como resulta do seu texto, foi notificado às partes processuais, tendo havido pronúncia sobre o mesmo.

Em sede de Acórdão recorrido [TCAS], consignou-se na apreciação desta ilegalidade o seguinte:

«Vício identificado pelo despacho da Juíza relatora de 31.1.2018

Passando, então, à análise do vício identificado no despacho de 31.1.2018.

O vício causador da deliberação de revogação - praticada em 21.9.2015 [atenta a data desta deliberação e tendo em conta o disposto no art. 8º nº 1, conjugado com o art. 9º, ambos da Lei 4/2015, de 7/1 (a qual aprovou o novo CPA), tal deliberação antes se traduziu numa anulação administrativa (cfr. art. 165º nº 2, do CPA de 2015)] -, dos actos de adjudicação da proposta apresentada pela A……….. e de exclusão da proposta da B……….. constantes da deliberação de 15.7.2015, situa-se nas peças procedimentais, in casu no Caderno de Encargos, concretamente foi considerado ilegal o requisito mínimo vertido na subalínea i) da alínea b) da cláusula 5ª, do Caderno de Encargos [por restringir ilegalmente a concorrência, dado que, por um lado, à data de lançamento do procedimento, bem como do termo para a apresentação de propostas, não existia mais do que um operador no mercado capaz de apresentar proposta para o lote 5 e, por outro lado, tal requisito não necessitaria de ser tão restritivo quanto foi previsto para que pudesse responder às necessidades do CHLO].

Assim sendo, os efeitos da pronúncia revogatória - ou melhor, da anulação administrativa, conforme acima explicitado - causam a eliminação do passo procedimental afectado e da actuação administrativa que, a seguir, lhe deu sequência, mas, e correspondentemente, todos os actos do procedimento anteriores àquele em que o vício emergiu ficam a coberto da pronúncia revogatória (anulatória), de modo que a execução da deliberação de 21.9.2015, e face ao disposto no art. 172º, do CPA de 2015 [ex vi art. 8º nº 1, conjugado com o art. 9º, ambos da Lei 4/2015, de 7/1 (a qual aprovou o novo CPA)], consistirá em refazer, a partir do ponto viciado, os termos do procedimento que sofreram os efeitos desse vício.

Sendo as coisas assim, a execução dessa deliberação de 21.9.2015 implicava que o concurso se retomasse no exacto passo em que o CHLO vislumbrou o vício causal da revogação (anulação administrativa).

Ora, o CHLO considerou que o afrontamento do princípio da concorrência ocorreu no Caderno de Encargos – o que conduziu a que considerasse ilegal o requisito mínimo vertido na subalínea i) da alínea b) da cláusula 5ª, do Caderno de Encargos -, o qual se terá reflectido, desde logo, no número de propostas apresentadas (face à ilegalidade de tal cláusula, terá havido concorrentes que, por não a preencherem, nem sequer terão apresentado proposta ao lote 5).

Assim, a execução dessa deliberação de 21.9.2015 implicava uma nova aprovação do Caderno de Encargos do qual não constasse a subalínea i) da alínea b) da cláusula 5ª, bem como a prática dos subsequentes actos do procedimento do concurso [v.g. publicação do anúncio do procedimento, apresentação de propostas (só o podendo fazer quem, na data em que foram apresentadas as propostas iniciais, estivesse em condições de o fazer, ou seja, por exemplo uma empresa que nessa data não tinha existência jurídica não pode apresentar qualquer proposta), elaboração do relatório preliminar, audiência prévia, relatório final e adjudicação], sendo que os actos do concurso situados a montante e apenas estes [in casu, a deliberação de contratar (que não se confunde e é necessariamente anterior à aprovação das peças do procedimento), a qual não foi posta em causa pela deliberação de 21.9.2015] permanecem indemnes [neste sentido, entre outros, Ac. do STA de 4.12.2012, proc. nº 198/12, Acs. do TCA Sul de 14.10.2004, proc. nº 11 441/02 (“II - Tendo sido anulado o acto de homologação de uma lista classificativa final de um concurso, por falta de especificação de determinados factores a atender na avaliação dos concorrentes, verificada no Aviso de Abertura, a execução integral deverá consistir no regresso do processo concursal à fase inicial, com a publicação de novo Aviso de Abertura que contenha as menções em falta.”), 24.5.2012, proc. nº 3967/08, e 14.5.2015, proc. nº 11799/15 (“IV – Revogado o acto de adjudicação por violação dos princípio da igualdade e da imparcialidade (ambivalência de sentidos criada por uma das cláusulas do caderno de encargos) impõe-se, para a reconstituição da situação, a reformulação da cláusula do caderno de encargos que permitiu a ambivalência de sentidos, bem como a prática da subsequente tramitação do procedimento de concurso (v.g. publicação do anúncio do procedimento, apresentação de propostas, elaboração do relatório preliminar, audiência prévia, relatório final e adjudicação), sendo que a deliberação de contratar, situada a montante, permanece indemne”)], o que in casu não foi feito e é causa de anulação da deliberação impugnada de 2.3.2016 (cfr. nº 1 do art. 163º do CPA de 2015, e sendo certo que não se verifica qualquer das situações previstas nas três alíneas do seu nº 5, pois, havendo necessidade designadamente de publicação de novo anúncio do procedimento, não se pode afirmar que o conteúdo da deliberação de 2.3.2016 não pode ser outro, assim improcedendo o alegado em sentido contrário pelo CHLO, concretamente a págs. 4 e 5, do requerimento apresentado na sequência do despacho de 31.1.2018, ponto II, as quais constam de fls. 1286 e 1287, destes autos em suporte de papel).

Com efeito, no caso vertente verifica-se que a execução da deliberação de 21.9.2015 traduziu-se, erradamente, em que o concurso fosse retomado na fase de análise e avaliação das propostas [o que se mostraria correcto se o vício que determinou a anulação da deliberação de 15.7.2015 tivesse que ver com uma mera interpretação errada da subalínea i) da alínea b) da cláusula 5ª, do Caderno de Encargos, o que não é o caso, pois tal anulação decorreu da ilegalidade do requisito mínimo vertido nessa subalínea i)].

Nestes termos, cumpre negar provimento aos recursos jurisdicionais interpostos pela A………… e pelo CHLO, mantendo, com distinta fundamentação [ou seja, com base na verificação do vício identificado por despacho de 31.1.2018], a sentença recorrida, ficando prejudicado o conhecimento das restantes questões suscitadas, conforme supra referido».


*

Dispõe-se no artº 95º do CPTA/2015 [aplicado ex vi artºs 97º, nº 1, al. c) e 102º, nº 1]:

1. A sentença deve decidir todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação e não pode ocupar-se senão das questões suscitadas, salvo quando a lei lhe permita ou imponha o conhecimento oficioso de outras

2. (…)

3. Nos processos impugnatórios, o tribunal deve pronunciar-se sobre todas as causas de invalidade que tenham sido invocadas contra o acto impugnado, exceto quando não possa dispor dos elementos indispensáveis para o efeito, assim como deve identificar a existência de causas de invalidade diversas das que tenham sido alegadas, ouvidas as partes para alegações complementares pelo prazo comum de 10 dias, quando o exija o respeito pelo princípio do contraditório.

(…)»

Feita esta transcrição, impõe-se avaliar a questão da aplicação do disposto no nº 3 do artº 95 do CPTA, maxime, apurar se, o se o juiz no tribunal de recurso [TCAS] pode em, abstracto, suscitar e conhecer de um vício, que até então, nunca fora alegado pelas partes processuais.

Ora, parece ser unânime o entendimento segundo o qual, os poderes dos Tribunais Centrais, enquanto tribunais de apelação, não se restringem ao poder de revogar a decisão recorrida e ao poder de ordenar a baixa dos autos ao tribunal recorrido para que aí seja proferida nova decisão, uma vez que o artº 149º do CPTA obriga, sempre que seja possível, a conhecer do mérito e a substituir a decisão impugnada por uma nova decisão, sendo que para esse efeito, o tribunal pode não só reformular o julgamento da matéria de facto feito na instância recorrida aproveitando-se dos elementos probatórios já recolhidos, como promover a produção de novas provas com vista à reformulação dessa instância decisória – cfr. neste sentido, os Acs. deste STA de 05.03.2015, in proc. nº 01511/14 e de 25.11.2015, in proc. nº 01309/13.

Significa isto que os poderes actualmente conferidos pelo legislador ao tribunal ad quem não são de mera cassação, mas igualmente de decisão substitutiva.

Neste sentido, cfr. Vieira de Andrade, A justiça administrativa, 16ª Edição, Almedina, 2017, pág. 416 quando refere que se trata de uma classificação que se funda na existência ou inexistência dos poderes dispositivos do tribunal superior”, segundo a qual, “nos recursos substitutivos, o Tribunal ad quem julga de novo o mérito da causa, procedendo a um reexame da relação jurídica controvertida”.

É o que também parece, numa análise superficial, que se encontra explanado no nº 3 do artº 95º do CPTA, quando aí se referem outras causas de invalidade não invocadas pelo impugnante, admitindo-se, inclusive, que seja reformulado o julgamento sobre a matéria de facto feito na 1ª instância, em vista à reformulação decisória com a realização de novas provas, ou não, se tal se mostrar desnecessário, mas impondo apenas que, para evitar decisões surpresa, se notifiquem as partes, dando oportunidade de se pronunciarem, em cumprimento do princípio do contraditório.

Porém, será que foi consagrado aos Tribunais Centrais, que julgam em sede de Apelação um poder/dever de cognição oficiosa de identificar a existência de causas invalidantes, diversas das que tenham sido alegadas pelas partes processuais?

Não cremos, que tal poder/dever se encontre legalmente consagrado para os Tribunais de Apelação.

Com efeito, importa ter em consideração que o processo quando chega ao Tribunal de Apelação, se encontra já delimitado quanto ao âmbito do conhecimento do recurso e ao ónus de impugnação, impedindo que o Tribunal em sede de recurso possa vir “ex novo” suscitar ilegalidades que nunca foram suscitadas pelos sujeitos processuais.

Primeiro, porque se não foram alegados, e certamente tal sucedeu porque as partes assim o pretenderam, ao abrigo do princípio do dispositivo, pois de outra forma poderiam quiça prejudicar a sua tese de impugnação ou de defesa, não cabendo ao Tribunal de recurso, quando o processo está estabilizado e delimitado pelas respectivas conclusões, substituir-se a qualquer dos sujeitos processuais.

Por outro lado, os poderes conferidos pelo legislador ao Tribunal de apelação, consagrados no artº 140º do CPTA, também não permitem outra solução, uma vez que, uma leitura atenta da norma, apenas permite concluir que os poderes ali elencados, se movem sempre nas linhas trilhadas pelos sujeitos processuais, ou seja, sempre inseridos numa relação em que já houve produção de alegações e contra-alegações, por parte dos sujeitos processuais.

Cremos, pois, que os poderes conferidos no artº 140º do CPTA ao Tribunal de apelação, se movem sempre dentro da relação jurídica que já vinha conformada do Tribunal de 1ª instância, não se vislumbrando que exista aqui qualquer poder/dever que permita ao Juiz do Tribunal Superior fazer uso dos poderes consagrados no nº 3 do artº 95º do CPTA, norma esta que apenas tem aplicação no Tribunal de 1ª instância, e não em sede de recurso de apelação.

Na verdade, os recursos jurisdicionais visam a sindicância das decisões recorridas, sendo balizados pelas críticas que a estas são feitas e condensadas nas respectivas conclusões; logo, tal significa que, na sua decisão, o que há que ter em conta, por um lado é o conteúdo real dessas decisões e, por outro lado o ataque que lhes é feito.

E quanto aos poderes conferidos ao juiz no nº 3 do artº 95º do CPTA, [cfr. também o artº 608º do CPC], estes apenas possuem âmbito de aplicação na fase de decisão em primeira instância – veja-se que o legislador usa, nos vários números, propositadamente a expressão “sentença” e não “acórdão” – não se aplicando aos Tribunais de Apelação, cuja actividade está vinculada ao conhecimento do objecto do recurso, dentro dos limites objectivos legalmente impostos, mas sempre balizados pelas conclusões vertidas nas alegações de recurso.

E esta conclusão não põe em causa a doutrina e jurisprudência que defende que actualmente os poderes conferidos pelo legislador ao tribunal ad quem não são de mera cassação, mas igualmente de decisão substitutiva, uma vez que tal afirmação se apresenta como verdadeira, só que tal, só sucede dentro dos limites conferidos pela lei.

E a lei, não permite que em sede de recurso de apelação, se possam suscitar, oficiosamente, ou seja, sem que nunca no processo, qualquer parte processual tenha aflorado tais questões, novas causas de invalidade, nunca antes suscitas por quem tinha o dever de as suscitar se assim quisesse e lhe fosse favorável, sob pena de, se assim não for entendido, o Tribunal superior estar oficiosamente a produzir um outro processo impugnatório que nunca foi pensado e construído até então, ou seja até ao momento processual adequado que só pode ser o Tribunal de 1ª instância.

Atento o exposto, procede a questão respeitante à não aplicação aos Tribunais de Apelação, máxime do TCA do disposto do nº 3 do artº 95º do CPTA, e consequentemente o recurso principal interposto pela A……….., assim se impondo a revogação da decisão recorrida no segmento objecto de recurso.


*

Atendendo à procedência do recurso principal, importa agora tomar conhecimento da ampliação subsidiária do objecto do recurso, requerida pela autora da acção, B……….. – ora recorrida – cfr. artº 636º do CPC.

Alega-se neste recurso que, o TCAS no acórdão proferido, apenas se limitou a conhecer da violação do princípio da imparcialidade, na vertente decorrente da identidade dos membros do júri do concurso na segunda análise das propostas e, da violação do princípio do interesse público, omitindo pronúncia quanto à questão decidida no TAF de Sintra que considerou “a existência de uma predisposição do CHOL para excluir a proposta da B……….. e que a segunda análise efectuada dessa proposta não foi objectiva”, vertente esta que a ora recorrente considera ter sido violadora também do princípio da imparcialidade.

E com estes argumentos assaca ao acórdão recorrido, a nulidade por omissão de pronúncia – al. d) do nº 1 do artº 615º do CPC – alegando que a sentença do TAF de Sintra transitou em julgado no que a este aspecto respeita e, que deste modo, os recorrentes não tinham interesse em agir [na interposição dos recursos jurisdicionais].

Vejamos:

O acórdão recorrido proferido no TACS, a este respeito, pronunciou-se da seguinte forma [cfr. fls. 24]:

«Quanto à alegação da B……….. de que a sentença recorrida já transitou em julgado – na medida em que nos recursos interpostos pela A………… e pelo CHLO não teria sido impugnada “uma das conclusões alcançadas na sentença recorrida”, carece de fundamento.

Com efeito, a sentença recorrida anulou a deliberação de 02.03.2016 no segmento em que adjudicou a proposta apresentada pela A……….. e no segmento em que excluiu a proposta apresentada pela B……….., com base nos seguintes vícios: não verificação do motivo (prestação culposa de falsas declarações pela B……….) que conduziu à exclusão da proposta apresentada pela B………. e violação dos princípios da imparcialidade (na medida em que, após a deliberação de 21.09.2015, o concurso prosseguiu com o mesmo júri) e da prossecução do interesse público (por ser reconhecido que a proposta da B………… era a economicamente mais vantajosa, mas considerar-se que tal não era um argumento atendível).

Estes vícios foram impugnados nos recursos interpostos pela A………… e pelo CHLO, pelo que a sentença não transitou em julgado.

E tal conclusão não é posta em causa pela circunstância de na sentença recorrida serem tecidos comentários referidos pela B……….. [“predisposição para excluir a proposta da autora” e “Ainda que a 2ª avaliação tivesse sido objectiva (que não foi)]” pois deles não é retirada qualquer consequência, isto é, tais comentários não configuram a identificação de um vício autónomo».

Esta argumentação foi mantida no despacho de sustentação proferido pelo TCAS nos termos que constam do referido Acórdão proferido em 14.06.2018.

Face ao exposto, é inequívoco que o TCAS se pronunciou sobre a questão suscitada pela B……….. no sentido da sua improcedência, pelo que é manifesta a inexistência da nulidade por omissão de pronúncia suscitada na presente ampliação do objecto do recurso.

E porque não vem suscitado o erro de julgamento no que a este aspecto concerne [que de resto também nunca existiria, por tal não constituir a verificação de uma ilegalidade autónoma que o TAF de Sintra tivesse decidido] improcede, sem mais a nulidade suscitada.


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Atenta a presente decisão, importaria analisar e decidir as demais questões suscitadas nas contra-alegações apresentadas pela B………. em sede de ampliação do objecto do recurso, que o Acórdão recorrido não conheceu por ter julgado prejudicado o seu conhecimento face à decisão que proferiu de julgar procedente o vício que oficiosamente invocou e julgou procedente [cfr. fls. 411 constituindo as respectivas conclusões fls. 449 verso a 445].

Porém, no mais que importa conhecer, a B………. veio impugnar a matéria de facto dada como assente na decisão proferida no TAF de Sintra e que o TCAS não conheceu, por ter considerado prejudicado o seu conhecimento, pedindo, inclusive, caso se mostre necessário que seja produzida prova acerca de tal matéria.

Deste modo, e porque todas as questões aqui suscitadas [que têm origem na petição inicial apresentada] implicam que se tome uma posição acerca da matéria de facto fixada, designadamente, com eventual aditamento da mesma, tarefa que está legalmente vedada a este Supremo Tribunal, por não conhecer de matéria de facto em sede de revista, importa determinar a baixa dos autos ao TCAS para que aí sejam apreciadas todas as questões suscitadas nesta sede de ampliação do objecto do recurso, se nada a tal obstar, o que se decide.


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3. DECISÃO

Atento o exposto, julga-se procedente o recurso interposto pela recorrente A……….., revoga-se o acórdão recorrido no segmento impugnado, e determina-se a baixa dos autos ao TCAS para que tome conhecimento da matéria que julgou prejudicada, face à solução adoptada, bem como da alegada em sede de ampliação do objecto do recurso, como requerido pela B………...

Custas a cargo da recorrente.

Lisboa, 29 de Novembro de 2018. – Maria do Céu Dias Rosa das Neves (relatora) – António Bento São Pedro – José Augusto Araújo Veloso.