Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:050/22.6BALSB
Data do Acordão:09/29/2022
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:JUROS INDEMNIZATÓRIOS
REVISÃO OFICIOSA
Sumário:Os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano, contado da apresentação do pedido de revisão, até à data do processamento da respectiva nota de crédito, e não desde a data do pagamento indevido do imposto.
Nº Convencional:JSTA000P29981
Nº do Documento:SAP20220929050/22
Data de Entrada:04/08/2022
Recorrente:AT – AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:Z....... UNIPESSOAL, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo


1. – Relatório


A DIRETORA-GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA, notificada da Decisão Arbitral proferida no Processo 397/2021 -T, que correu termos no Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD) e em que é recorrida Z………. Unipessoal, Lda., melhor sinalizada nos autos, não se conformando com o seu conteúdo, vem dele recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do disposto no artigo 152.º, n.º1 do CPTA (Código de Processo dos Tribunais Administrativos) e do n.º 2, do artigo 25.º do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária, aprovado pelo DL n.º 10/2011, de 20 de Janeiro), com fundamento em o mesmo se encontrar em contradição com o Acórdão proferido pelo STA no Processo n.º 0722/14, de 28.01.2015, na parte referente à extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de pedido de revisão oficiosa da liquidação por iniciativa do contribuinte nos termos do artigo 43.º da LGT.

Inconformada, a recorrente DIRETORA-GERAL DA AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA formulou alegações, que terminou com as seguintes conclusões:


A) A Autoridade Tributária e Aduaneira vem, nos termos do artigo 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos aplicável por força do artigo 25.º, n.º 2, do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RJAT), interpor recurso para esse Supremo Tribunal da Decisão Arbitral proferida em 02.11.2021, no processo n.º 397/2021-T, notificada à AT em 28.02.2022, por estar em contradição com o Acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo em 28/01/2015, processo n.º 0722/14, que se indica como fundamento, designadamente, no segmento decisório respeitante à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento do respetivo pagamento, mais precisamente, o dies a quo a partir do qual devem ser contabilizados os juros indemnizatórios.
B) A Decisão Arbitral recorrida colide frontalmente com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo no Acórdão proferido em 28/01/2015, processo n.º 0722/14, que se indica como fundamento, relativamente ao termo inicial de contagem dos juros indemnizatórios, no caso de revisão oficiosa do ato tributário por iniciativa do contribuinte.
C) A Decisão Arbitral recorrida incorreu em erro de julgamento ao enquadrar o pedido de pagamento de juros indemnizatórios no n.º 1 do artigo 43.º da LGT, e, considerar como termo inicial de contagem dos juros indemnizatórios a data do pagamento indevido do imposto, contrariando a Jurisprudência reiterada do STA, que se cita, por todos, além do Acórdão fundamento, o Acórdão proferido em de 23.05.2018, pelo Pleno STA no Processo n.º 01201/17,e que determina quanto ao termo inicial dos juros indemnizatórios de revisão oficiosa do ato tributário por iniciativa do contribuinte, com o entendimento vertido no respetivo Sumário : “O artigo 43º, nº3, c) da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, aplicável apenas em situações de revisão do ato tributário em que os mesmos são devidos decorrido um ano após o pedido de revisão.”
D) Laborando neste erro, decidiu o Tribunal Arbitral, em contradição total com o Acórdão fundamento, condenar a AT a pagar à Requerente arbitral juros indemnizatórios contados desde a data do pagamento indevido do imposto por aplicação do n.º1, do artigo 43.º da LGT e 61.º n.º 3 do CPPT, diversamente do que determina esse normativo legal para as situações, como a dos autos, de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte, em que são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.
F) No Acórdão fundamento estava em causa “a extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte (art. 43.º n.º 3 al. c) LGT)”, tendo esse douto STA decidido que “A decisão recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação”, e, “Pelo exposto, se declara que os juros indemnizatórios a que as impugnantes têm direito neste processo são apenas devidos a partir de um ano após o pedido de revisão por elas formulado, ou seja, a partir de 24/11/2008”. (Sublinhado nosso)
H) Demonstrada está, assim, uma evidente contradição entre a Decisão recorrida e o Acórdão fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito que se prende com o pagamento de juros indemnizatórios nas situações de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte, que importa dirimir, mediante a admissão do presente recurso e consequente anulação do segmento decisório contestado, com substituição do mesmo por novo Acórdão que determine a improcedência do pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, nos termos do n.º 6, do artigo 152.º do CPTA.
I) A infração a que se refere o n.º 2, do artigo 152.º do CPTA, traduz-se num manifesto erro de julgamento expresso na decisão recorrida, na medida em que o Acórdão Arbitral viola o disposto no n.º 3, al c), do artigo 43.º da LGT, o qual determina que nas situações de revisão do ato tributário por iniciativa do contribuinte são devidos juros indemnizatórios apenas a partir de um ano após a apresentação do pedido de revisão.
J) Ora, o pedido de revisão oficiosa cujo indeferimento tácito constitui o objeto da ação arbitral foi apresentado no dia 18.12.2020, sendo que, apenas são devidos juros indemnizatórios decorrido um ano após aquela data, de acordo com o prazo estabelecido no n.º 3, al c) do artigo 43.º da LGT, ao contrário do que decidiu o Acórdão Arbitral recorrido.
K) Como tem sido entendido pela Jurisprudência e Doutrina, o regime estabelecido no artigo 152.º do CPTA para os recursos para uniformização da jurisprudência destinam-se a obter decisão que fixe a orientação jurisprudencial nos casos em que se verifiquem os seguintes pressupostos: i) existência de decisões contraditórias entre acórdãos do STA ou deste e do TCA ou entre acórdãos do TCA; ii) contraditoriedade decisória “sobre a mesma questão fundamental de direito”; iii) verificação do trânsito em julgado, quer do acórdão recorrido, quer do acórdão fundamento, devendo o recurso se mostrar interposto no prazo de 30 dias contado do trânsito do acórdão recorrido; iv) não conformidade da orientação perfilhada no acórdão impugnado com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA; a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta.
L) No presente caso, estão preenchidos todos os requisitos de admissibilidade do Recurso, impostos pelo artigo 152.º do CPTA, designadamente os que são enunciados no Acórdão do Pleno do STA de 21.04.2016, proferido no processo nº0698/15, quanto à contradição da mesma questão fundamental de direito, que pressupõe “identidade essencial quanto à matéria litigiosa”, conforme o Acórdão do S.T.J. de 02.02.2017, proferido no proc. 4902/14.9T2SNT.LI.SI-A.
M) Está em causa a aplicação de forma diversa dos mesmos preceitos legais em situações fácticas substancialmente idênticas, não se entendendo estas como total identidade dos factos mas apenas a sua subsunção às mesmas normas legais, na linha do entendimento de Jorge Lopes de Sousa (CPPT anotado, p.809), e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no recurso nº 87156, de 26.04.1995.
N) Decorre, de todo o exposto, que o Acórdão recorrido, ao não ter subsumido o caso sub judice à al c), do n.º3 do artigo 43.º da LGT, evidencia manifesta contradição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada pelo STA no Acórdão fundamento, devendo ser substituído por novo Acórdão que julgue improcedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento do imposto.
Termos em que deve o presente Recurso para Uniformização de Jurisprudência ser admitido por se mostrar verificada contradição entre a Decisão Arbitral proferida no proc. nº 397/2021-T e o Acórdão fundamento, proferido pelo STA no proc. N.º 0722/14, de 28.01.2015, devendo, em consequência, o mesmo ser julgado procedente e, nos termos e com os fundamentos acima indicados, ser revogada a Decisão Arbitral no segmento decisório sob recurso, e substituído por Acórdão consentâneo com o quadro legal vigente, de acordo com o qual, apenas existe direito a juros indemnizatórios, decorrido um ano da data da apresentação da Revisão Oficiosa.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido de o recurso dever ser admitido e julgado procedente, com a consequente revogação do segmento decisório da decisão arbitral proferida no processo n.º 397/2021-T, do CAAD, referente à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, com os seguintes fundamentos:

1. Objeto do recurso
A recorrente interpôs o presente recurso para uniformização de jurisprudência para o Pleno da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do artigo 25.º n.º2 do Regime Jurídico da Arbitragem em Matéria Tributária (RGAT), aprovado pelo Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de Janeiro, em obediência ao regime do artigo 152.º do CPTA, pugnando pela revogação da decisão arbitral proferida nos autos n.º 397/2021-T, datada de 22.02.2022 e pela correcção da interpretação perfilhada no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, datado de 28.01.2015, proferido no processo nº 0722/14, convocado como acórdão fundamento, relativamente à questão da extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de pedido de revisão oficiosa da liquidação por iniciativa do contribuinte, nos termos do artigo 43º da Lei Geral Tributária.
2. Admissibilidade do presente recurso - requisitos legais
2.1. A recorrente interpôs o presente recurso ao abrigo do estatuído no artigo 25.º do RJAT, na redação introduzida pelo artigo 17.º da Lei 119/2019, de 18.09.
De facto, o citado artigo 25.º do RJAT, admite recurso para o STA, da decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida, quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo. Ao recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152.º do CPTA, aplicável ex vi do artigo 25.º, n.º3 do RJAT.
2.2. São requisitos do prosseguimento do presente recurso para uniformização de jurisprudência:
- contradição entre um acórdão do TCA ou do STA e a decisão arbitral ou entre duas decisões arbitrais;
- trânsito em julgado do acórdão (decisão) fundamento;
- existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito;
- ser a orientação perfilhada no acórdão (decisão) impugnado desconforme com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.
Por sua vez quanto à caracterização da questão fundamental de direito:
- deve haver identidade da questão de direito sobre a qual incidiu o acórdão (decisão) em oposição, que tem pressuposta a identidade dos respetivos pressupostos de facto;
- a oposição deverá emergir de decisões expressas, e não apenas implícitas;
- não obsta ao reconhecimento da existência da contradição que os acórdãos (decisões) sejam proferidos na vigência de diplomas legais diversos se as normas aplicadas contiverem regulamentação essencialmente idêntica;
- as normas diversamente aplicadas podem ser substantivas ou processuais;
- em oposição ao acórdão (decisão) recorrido podem ser invocados mais de um acórdão (decisão) fundamento, desde que as questões sobre as quais existam soluções antagónicas sejam distintas.
2.3. Defende a recorrente que o entendimento perfilhado pelo Tribunal Arbitral na decisão recorrida, datada de 22.02.2022, proferida no processo nº 397/2021-T, está em contradição com o acórdão do STA, datado de 28.01.2015, proferido no processo nº 0722/14, (decisão fundamento). (Disponível, tal como os demais, em www.dgsi.pt.)
Em ambos os processos está em discussão a interpretação e aplicação da extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de pedido de revisão oficiosa da liquidação, por iniciativa do contribuinte, nos termos do artigo 43º da Lei Geral Tributária.
2.4. A recorrente defende que decisão arbitral recorrida colide com a jurisprudência firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo, no acórdão proferido pelo STA, datado de 28.01.2015, no processo nº 0722/14, que indica como acórdão fundamento, relativamente ao termo inicial de contagem dos juros indemnizatórios, no caso de indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa do ato tributário, por iniciativa do contribuinte.
O pedido de pronúncia arbitral foi deduzido na sequência do indeferimento tácito do pedido de revisão oficiosa, apresentado em 21.01.2021, referente a liquidações de Imposto Sobre Veículos (ISV).
A decisão arbitral sob recurso, tendo em consideração que foi deduzido, em 21.01.2021, pedido de revisão oficiosa ao abrigo do artigo 78º da LGT daquelas liquidações de ISV entendeu, na parte em que se refere aos juros indemnizatórios devidos pela AT, que o termo inicial deveria considerar-se da data do pagamento de cada uma das quantias até reembolso.
2.5. Defende a recorrente que tal entendimento contraria o decidido no acórdão fundamento, onde se decidiu que o artigo 43º, nº 3, c) da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, aplicável apenas em situações de revisão do ato tributário, em que os mesmos são devidos decorrido um ano após o pedido de revisão.
Ou seja, a AT defende o acertado da decisão fundamento por considerar que, tratando-se de revisão oficiosa, a pedido do contribuinte, existiu uma estabilização dos atos de liquidação, considerando não ter o contribuinte usado da faculdade de reclamação ou de impugnação das mesmas, nos prazos legais.
2.6. Na decisão do CAAD considerou-se que, existindo erro dos serviços, são devidos juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido.
No acórdão do STA de 28.01.2015 decidiu-se que “[o] legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte.”
2.7. Da análise da decisão do CAAD recorrida resulta que o pedido de revisão oficiosa, nos termos do disposto no artigo 78º da LGT, foi formulado em 21.01.2021, tendo ocorrido o indeferimento tácito do mesmo, uma vez que a AT não proferiu decisão no prazo de quatro meses, ou seja até 21.05.2021.
2.8. Ou seja, a questão jurídica em discussão - extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de pedido de revisão oficiosa da liquidação, por iniciativa do contribuinte, nos termos do artigo 43º da Lei Geral Tributária - é idêntica.
Em ambas as situações analisadas, se tratou da anulação de liquidação de imposto subsequente a pedido de revisão oficiosa formulado pelo contribuinte, em ambos os casos existiu indeferimento tácito do pedido, sendo que em ambas as situações os respectivos impostos, oportunamente liquidados, foram pagos pelos contribuintes.
Assim sendo, salvo melhor opinião, existe fundamento para o presente recurso para uniformização de jurisprudência, não apenas por a questão jurídica em discussão ser a mesma, na decisão recorrida e no acórdão fundamento, como, na verdade, a factualidade essencial ser de igual modo idêntica nas duas decisões, verificando-se também preenchido o requisito da contradição de julgados ser expressa.
3. Posição defendida
3.1. Tendo presente as duas posições divergentes importa tomar posição sobre a orientação jurisprudencial que deve ser fixada pelo Supremo Tribunal Administrativo.
A decisão recorrida assenta no pressuposto de que, nos termos do artigo 100.º da LGT, a AT está obrigada, em caso de procedência de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial/arbitral a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, de acordo com o princípio geral de direito de que devem ser apagados todos os efeitos jurídico consequentes do ato ilícito, reconstituindo-se a situação que existiria se ele não houvera ocorrido.
3.2. No presente caso, a situação hipotética atual, consistirá na situação que existiria caso não tivesse sido praticado o ato anulado no âmbito da decisão arbitral porquanto, caso não tivesse a AT erroneamente procedido ao cálculo de imposto de selo, a recorrida teria tido na sua esfera aquele montante, resultante do imposto que foi indevidamente pago.
3.3. É inequívoco que os tribunais superiores têm decidido que devem ser atribuídos juros indemnizatórios ao sujeito passivo que tenha satisfeito uma obrigação tributária que venha a ser anulada com fundamento em “erro imputável aos serviços”, designadamente, por erro na aplicação do direito e que os juros indemnizatórios se destinam a compensá-lo do prejuízo provocado pelo pagamento de uma quantia indevida.
Todavia, a questão colocada nos presentes autos, consiste em saber se, não tendo o contribuinte questionado a legalidade da liquidação nos prazos legalmente estabelecidos para a reclamação graciosa ou para a impugnação judicial, vindo a utilizar o meio excecional previsto no artigo 78º da LGT, que permite a revisão oficiosa do ato tributário, a pedido do contribuinte, nos quatro anos subsequentes à liquidação, os juros indemnizatórios devidos pela AT devem ser contabilizados desde a data do pagamento indevido, ou seja, desde o dia seguinte ao pagamento do tributo.
Ou, ao invés se, como defende a recorrente, devem os juros indemnizatórios ser contados um ano após da apresentação deste pedido de revisão, como resulta do disposto no art.º 43.º, n.º 3, c) da Lei Geral Tributária.
3.4. A jurisprudência do STA tem entendido que, decorrendo um período (mais ou menos) extenso entre a data da liquidação e a data do pedido de revisão, em que a reposição da legalidade poderia ter sido provocada por iniciativa do contribuinte que a não impulsionou, tal justifica que o direito a juros indemnizatórios haja de ter uma extensão mais reduzida (acórdão do Pleno da Seção do Contencioso Tributário do STA de 23.05.2018, proferido no processo nº 01201/17).
Tendo o citado acórdão decidido que o artigo 43.º, n.º 3, alínea c) da LGT consagra um regime especial, quanto aos juros indemnizatórios, aplicável apenas em situações de revisão do ato tributário, em que os mesmos são devidos decorrido um ano após o pedido de revisão.
No mesmo sentido, numa situação idêntica à aqui analisada, em que houve indeferimento tácito dos pedidos de revisão oficiosa, o acórdão do Pleno da Seção do Contencioso Tributário do STA de 29.01.2020 (proferido no processo nº 045/19.7BALSB) decidiu que os juros indemnizatórios apenas são devidos, depois de decorrido um ano após a apresentação daquele pedido e não desde a data do pagamento da quantia liquidada.
3.5. Bem assim, como se decidiu no acórdão do STA de 6.12.2017 (P. 0926/17) “[…] o princípio da igualdade impõe tratamento semelhante entre o contribuinte cujo pedido de revisão obtém êxito, para além do prazo de um ano, junto da administração, e o contribuinte que obtém idêntico resultado, também para além desse prazo, junto do tribunal. Em qualquer dos casos, a demora de mais de um ano é imputável à administração e deriva da prática de ato ilegal: ou porque tardou a dar razão ao contribuinte ou porque não lha deu e veio a revelar-se que o devia ter feito.”
Ou seja, na presente situação o contribuinte apenas obtém decisão favorável à sua pretensão com a decisão arbitral, pelo que a AT podia ter corrigido a sua posição e não o fez no momento e local próprios, pelo que a demora na reposição da legalidade lhe é parcialmente imputável. Na verdade, considerou o legislador ser o período de um ano o prazo razoável para os serviços da administração tributária analisarem e decidirem o pedido de revisão e executarem a decisão favorável ao contribuinte.
3.6. Pelo exposto, deve a decisão arbitral, no segmento indicado, ser revogada e substituída por outra que julgue serem devidos juros indemnizatórios desde 21.01.2022, ou seja, após um ano contado desde a data do pedido de revisão oficiosa.
4. Conclusão
Nestes termos, somos do parecer que deve o presente recurso para uniformização de jurisprudência ser admitido e, subsequentemente, ser o mesmo julgado procedente, com a consequente revogação do segmento decisório da decisão arbitral proferida no processo n.º 397/2021-T, do CAAD, referente à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios, sendo os mesmos devidos após o decurso de um ano sobre o pedido de revisão oficiosa formulado pelo contribuinte.
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Os autos vêm à conferência do Pleno corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

2.1.1.- Na decisão arbitral recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

- A Requerente importou, entre 09/01/2020 e 08/10/2020, com origem e primeira matrícula na Alemanha, Áustria, Bélgica, Espanha, França, Itália e Países Baixos, todos países da União Europeia, os veículos automóveis de passageiros, identificados no seguinte mapa

[Imagem]

– Deste mapa constam, relativamente a cada veículo, as datas das declarações aduaneiras, os números das liquidações de ISV e respectivas datas, os números de matrícula, as marcas, os valores pagos de ISV, as partes desses valores relativas à componente cilindrada antes e depois da redução resultante da aplicação das respectivas percentagens relativas ao número de anos de uso, os valores respeitantes à componente ambiental e os valores reclamados neste processo.
- A Requerente procedeu às declarações aduaneiras destes veículos, tendo a Requerida AT liquidado Imposto Sobre Veículos pelo valor total de 77.379,50 euros, imposto que foi pago pela Requerente.
- Deste valor liquidado, 50.162,92 euros correspondem à componente cilindrada e 27.306,55 euros à componente ambiental.
- Relativamente à componente cilindrada, aquele valor foi deduzido pelas quantias correspondentes às percentagens aplicadas ao seu montante, ou seja, 52.715,97 euros, por força da redução resultante do número de anos de uso dos veículos.
– Essa redução não foi aplicada na liquidação à componente ambiental, representando o montante de 13.249,89 euros.
- Em 01/07/2021, a Requerente entregou no CAAD o pedido de pronúncia arbitral.

2.1.2. - No acórdão fundamento consta como provada a seguinte matéria de facto:

A. Em 27/08/2004, no 1.º Cartório Notarial de Viseu, foi celebrada escritura pública de “Aumento de Capital e Alteração de Pacto Social”, na qual intervieram como outorgantes B…………. e C………………., na qualidade de Administradores, em representação da sociedade “A……………….., S.A.”, ora impugnante, cujo teor ora se transcreve parcialmente: “(…) Disseram os outorgantes: Que na referida acta da reunião da Assembleia Geral, de vinte deste mês, estando representada a totalidade do capital social, foi deliberado reforçar esse capital, em numerário, com SETE MILHÕES SEISCENTOS E SETENTA E CINCO MIL EUROS, elevando-o para DEZ MILHÕES DE EUROS, através da emissão de um milhão quinhentos e trinta e cinco mil novas acções, nominativas do valor nominal de cinco euros, cada uma, subscritas pela accionista D………………, SGPS, S.A. (…)”. – fls. 34/37 dos autos.

B. No ato de outorga da escritura pública referida em A) a impugnante “A……………….., S.A.” pagou Imposto de Selo, no montante de 30.700,00 €, correspondente à verba 26.3 da TGIS. – fls. 38 dos autos.

C. Em 27/08/2004, no 1.º Cartório Notarial de Viseu, foi celebrada escritura pública de “Aumento de Capital e Alteração de Pacto Social”, na qual intervieram como outorgantes E……………. e C……………….., na qualidade de Administradores, em representação da sociedade “F………………., S.A.”, ora impugnante, da qual consta, designadamente, o seguinte: “(…) Disseram os outorgantes: Que na referida acta da reunião da Assembleia Geral, de vinte deste mês, estando representada a totalidade do capital social, foi deliberado reforçar esse capital, em numerário, com CINCO MILHÕES DUZENTOS E CINQUENTA MIL EUROS, elevando-o para SETE MILHÕES E QUINHENTOS MIL EUROS, através da emissão de um milhão e cinquenta mil novas acções, nominativas do valor nominal de cinco euros, cada uma, subscritas pela accionista D……………., SGPS, S.A. (…)”. – fls. 39/42 dos autos.

D. No ato de outorga da escritura pública referida em C) a impugnante “F………….., S.A.” pagou Imposto de Selo, no montante de 21.000,00 €, correspondente à verba 26.3 da TGIS. – fls. 43 dos autos.

E. Em 23/11/2007, as sociedades impugnantes, em coligação, apresentaram um pedido de revisão oficiosa dos atos tributários de liquidação de imposto de Selo identificados nas alíneas B) e D), com a consequente restituição dos montantes de imposto indevidamente pagos, acrescida de juros indemnizatórios – fls. 44/55 dos autos e 1/12 do processo de revisão oficiosa apenso aos autos.

F. Não foi proferida decisão no âmbito do procedimento de revisão oficiosa a que se alude em E).

G. A petição de impugnação judicial deu entrada neste Tribunal em 01/08/2008 – cfr. carimbo aposto a fls. 2 dos autos.
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2.2.- Motivação de Direito

No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se o Acórdão recorrido, ao não ter subsumido o caso sub judice à al c), do n.º3 do artigo 43.º da LGT, evidencia manifesta contradição quanto à mesma questão fundamental de direito com a jurisprudência firmada pelo STA no Acórdão fundamento, devendo ser substituído por novo Acórdão que julgue improcedente o pedido de condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento do imposto.
À guisa de enquadramento, diga-se que a tese da recorrente AT é a de que o entendimento perfilhado pelo Tribunal Arbitral na decisão recorrida proferida no Processo 397/2021 -T, do CAAD, alegando contradição com o decidido no acórdão do Supremo Tribunal Administrativo no processo n.º 0722/14, de 28/01/2015, no segmento decisório respeitante à condenação da AT no pagamento de juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito, mais precisamente, o dies a quo a partir do qual devem ser contabilizados os juros indemnizatórios, portanto, na parte referente à extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de pedido de revisão oficiosa da liquidação por iniciativa do contribuinte, nos termos do artigo 43.º da LGT.
Para a recorrente, a existência dessa divergência é de molde a permitir o recurso para uniformização de jurisprudência, consubstanciado no artigo 152.º do CPTA.

Vejamos.


2.2.2.- Da admissibilidade do recurso de uniformização

Importa, então e preliminarmente, perante o circunstancialismo fáctico-jurídico seleccionado, aquilatar da verificação dos requisitos do recurso por oposição quanto à mesma questão fundamental de direito previsto pelo artº 25º, nº 2 do RJAT (Regime Jurídico da Arbitragem Tributária, DL nº 10/2011, de 20/1) na redacção da lei nº119/2019, de 18/09.
Consoante o disposto no nº 2 do art. 25º do RJAT (DL nº 10/2011, de 20/1) a decisão arbitral sobre o mérito da pretensão deduzida que ponha termo ao processo arbitral é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em oposição, quanto à mesma questão fundamental de direito, com outra decisão arbitral ou com acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo.
A este recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, o regime do recurso para uniformização de jurisprudência regulado no artigo 152º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, contando-se o prazo para o recurso a partir da notificação da decisão arbitral (cfr. o nº 3 do mesmo art. 25º).
O único requisito explicitamente referido para a admissibilidade do recurso para uniformização de jurisprudência (152º do CPTA) é a existência de contradição entre a decisão arbitral recorrida e a decisão arbitral fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito.
Na ausência de qualquer expresso tratamento legislativo neste domínio serão de acatar os critérios jurisprudenciais já fixados na vigência da LPTA e do ETAF quer relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deverá existir contradição, quer quanto à verificação da oposição de julgados.
Nessa senda, os acórdãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação sempre que, durante o intervalo da sua publicação, não tenha sido introduzida qualquer alteração legislativa substancial que interfira, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida.
No tocante à existência da oposição, impõe-se que a mesma norma jurídica tenha sido interpretada e aplicada diversamente numa idêntica situação de facto, não podendo ser considerada quando relativamente a um dos acórdãos em oposição vier a ser assinalada uma divergência sobre a factualidade apurada que puder ser determinante para a aplicação de um diferente regime jurídico.
A oposição deverá resultar de expressa resolução da questão de direito suscitada, não sendo atendível a oposição implícita dos julgados, o que acarreta que tenha havido julgamento contraditório sobre questões que tenham sido colocadas à apreciação do tribunal e sobre as quais este carecia de emitir pronúncia – cf., neste sentido, Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Dicionário de Contencioso Administrativo, Ed. Almedina, págs. 608/609, e, entre muitos outros, acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário de 05.05.1992, in AP.DR de 29.11.1994, pág. 426, de 18.02.1998, recurso 28637, de 26.09.2007, recurso 452/07, de 21.05.2008, recurso 460/07, de 13.11.2013, recurso 594/12, de 26.03.2014, recurso 865/13, de 07.05.2014, recurso 60/14, de 25.02.2015, recurso 964/14, e de 18.03.2015, recurso 525/14, de 11/12/2019, Recurso nº 46/19.5BALSB, de 04-11-2020, Recurso nº 24/20.1BALSB, de 09/12/2020, Recurso nº 43/20.8BALSB e de 20-01-2021, Recurso nº 60/20.1BALSB, todos in www.dgsi.pt.
Não obstante, determina o n.°3 do artigo 152.° que, "o recurso não é admitido se a orientação perfilhada na decisão impugnada estiver de acordo com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.”
Em suma e evocando Mário Aroso de Almeida e Carlos Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2.ª edição revista, 2007, página 883, e o Acórdão do STA-SCA, de 2012.07.05-P. 01168/1 disponível no sítio da Internet wvww.dgsi.pt, são requisitos do prosseguimento do presente recurso para uniformização de jurisprudência: (i) contradição entre um acórdão do TCA ou do STA e a decisão arbitral; (ii) trânsito em julgado do acórdão fundamento; (iii) existência de contradição sobre a mesma questão fundamental de direito; (iv) ser a orientação perfilhada no acórdão impugnado desconforme com a jurisprudência mais recentemente consolidada do STA.
Acresce que, quanto à caracterização da questão fundamental de direito, é exigível a identidade da questão de direito sobre a qual incidiu o acórdão em oposição, que tem pressuposta a identidade dos respectivos pressupostos de facto, oposição que terá de emergir de decisões expressas, e não apenas implícitas, não obstando ao reconhecimento da existência da contradição que os acórdãos sejam proferidos na vigência de diplomas legais diversos se as normas aplicadas contiverem regulamentação essencialmente idêntica. E as normas diversamente aplicadas podem ser substantivas ou processuais, podendo ser invocados mais de um acórdão fundamento, desde que as questões sobre as quais existam soluções antagónicas sejam distintas em oposição ao acórdão recorrido.
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2.2.3.- Da análise do caso concreto:

No caso posto, seguindo a factualidade fixada nas decisões fundamento e recorrida, a situação de paridade que importa considerar é a seguinte:
-Emerge da decisão do CAAD recorrida que a mesma parte do pressuposto de que, nos termos do artigo 100.º da LGT, a AT está obrigada, em caso de procedência de reclamações ou recursos administrativos, ou de processo judicial/arbitral a favor do sujeito passivo, à imediata e plena reconstituição da situação que existiria se não tivesse sido cometida a ilegalidade, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios, de acordo com o princípio geral de direito de que devem ser apagados todos os efeitos jurídico consequentes do ato ilícito, reconstituindo-se a situação que existiria se ele não houvera ocorrido.
In casu, a situação hipotética actual, consistirá na situação que existiria caso não tivesse sido praticado o acto anulado no âmbito da decisão arbitral porquanto, caso não tivesse a AT erroneamente procedido ao cálculo de imposto de selo, a recorrida teria tido na sua esfera aquele montante, resultante do imposto que foi indevidamente pago.
Ora, na presente situação o contribuinte apenas obtém decisão favorável à sua pretensão com a decisão arbitral e apura-se dos autos e infere-se da decisão do CAAD recorrida e não é posto em causa, que o pedido de revisão oficiosa, nos termos do disposto no artigo 78º da LGT, foi formulado em 21.01.2021, tendo ocorrido o indeferimento tácito do mesmo (conforme documentos junto aos autos e factos dados como provados da decisão Arbitral), uma vez que a AT não proferiu decisão no prazo de quatro meses, concretamente, até 21.05.2021. Com base nesse circunstancialismo fáctico e com fundamento na existência de erro dos serviços, decidiu-se que são devidos juros indemnizatórios desde a data do pagamento indevido.
-Adversamente, no acórdão do STA de 28.01.2015, foi fundamentado e decidido que “o legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte.”
Donde facilmente se depreende que a questão jurídica em discussão em ambas as decisões é idêntica, reconduzindo-se à determinação da extensão temporal dos juros indemnizatórios devidos em caso de pedido de revisão oficiosa da liquidação, por iniciativa do contribuinte, nos termos do artigo 43º da Lei Geral Tributária.
Identidade que também ocorre no plano factual porquanto, em ambas as situações dissecadas, se cuidou da anulação de liquidação de imposto subsequente a pedido de revisão oficiosa formulado pelo contribuinte, sucedendo, ainda, que em ambas as situações os respectivos impostos, oportunamente liquidados, foram pagos pelos contribuintes.
Logo, os acórdãos em confronto decidiram expressamente a mesma questão fundamental de direito, em sentidos contraditórios. E não existindo jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal Administrativo no sentido perfilhado na decisão arbitral recorrida, estão reunidos os requisitos para que se conheça do mérito do recurso.
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2.2.3.-Do mérito do recurso

Ponderemos então em que sentido deve ser solucionado o pedido de uniformização de jurisprudência entre as duas decisões em antagonismo.
As soluções jurídicas ditadas são díspares, já que na decisão recorrida foi decidido que na sequência de declaração de ilegalidade dos atos de liquidação, há lugar ao pagamento de juros indemnizatórios, nos termos dos artigos 43.º, n.º 1, da LGT e 61.º, n.º 5, do CPPT, calculados sobre a quantia que a Requerente pagou indevidamente, à taxa dos juros legais, sendo tais juros devidos desde a data do pagamento indevido do imposto até à data do processamento da respectiva nota de crédito.
Opostamente, no Acórdão fundamento perfilhou-se o entendimento de que o nº 3, c) do mesmo preceito consagra que … são devidos juros indemnizatórios, «quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à Administração Tributária» e que «… o legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte]. Sendo a questão de facto subjacente a esta solução de direito substancialmente idêntica, as soluções jurídicas encontradas quanto à mesma questão fundamental de direito, revela-se diversa, tornando-se imperioso analisar o mérito da questão de direito objecto do litígio tendo em vista o destino do recurso.
A questão que constitui o objecto do recurso é a de saber se caso haja imposto pago indevidamente, cujo montante indevido venha a reconhecer-se na sequência de reclamação graciosa, os juros indemnizatórios devidos devem calcular-se desde o pagamento indevido do imposto, como se julgou na decisão recorrida, ou ao invés devem calcular-se como resulta do n.º 3 c) do art.º 43.º da LGT.
Como vem alegado pela recorrente a Jurisprudência referente a esta questão tem sido uniforme quanto a esta questão fundamental de direito que se prende com o termo inicial dos juros indemnizatórios, mencionando-se, neste sentido, os acórdãos deste STA proferidos nos processos n.ºs 4/19.0BALSB, 116/18.7BALSB e 99/18.3BALSB.
Aqui chegados é nosso entendimento que a recorrente tem razão e que, como no caso dos autos, havendo imposto pago indevidamente, ocorrendo reclamação graciosa e determinando-se a restituição do indevidamente pago, são também devidos juros indemnizatórios, os quais devem ser calculados como se determinou no acórdão indicado como fundamento.
Como se considerou no Acórdão indicado como fundamento «o legislador considera que o prazo de um ano é o prazo razoável para a Administração decidir o pedido de revisão e executar a respectiva decisão, quando favorável ao contribuinte, afastando-se da indemnização total dos danos a partir do momento em que surgiram na esfera patrimonial do contribuinte.
Impondo a lei constitucional ao Estado a obrigação de reparar os danos causados pelos seus actos ilegais, tem vindo a lei ordinária a estabelecer limites a essa reparação, sejam os decorrentes da valorização da maior ou menor diligência do lesado, seja do tempo que faculta para a Administração Tributária decidir.
A decisão recorrida atribuiu a indemnização a partir da ocorrência do evento danoso, sendo que face às normas de direito tributário vigente tal indemnização não tem assento legal, pelo menos sob a égide do processo de impugnação da decisão de indeferimento do pedido de revisão oficiosa do acto de liquidação. Tal tem vindo a ser a posição reiteradamente afirmada pela jurisprudência do Supremo Tribunal Administrativo, em situações similares, de que a título meramente exemplificativo se enuncia o Ac. 01041/06 de 15-02-2007, disponível em www.dgsi.pt, aqui reiterada.
Pelo exposto, se declara que os juros indemnizatórios a que as impugnantes têm direito neste processo são apenas devidos a partir de um ano após o pedido de revisão por elas formulado, ou seja, a partir de 24/11/2008.»
Na senda do expendido, no Acórdão do Pleno de 04.11.2020, no Processo nº 038/19.4BALSB, acessível em www.dgsi.pt o Acórdão Fundamento (que é o mesmo destes autos), entre muitos outros, (referidos exemplificativamente no próprio Acórdão Fundamento), consagra a interpretação segundo a qual, nos casos em que o contribuinte solicita a revisão oficiosa do ato tributário, os juros indemnizatórios são devidos depois de decorrido um ano contado da apresentação do pedido de revisão, por aplicação do artigo 43.º, n.º 3, alínea c) da LGT, e não desde a data do pagamento indevido do imposto, porque o contribuinte poderia ter “obtido anteriormente a anulação do acto”, e ao não fazê-lo “desinteressou-se temporariamente pela recuperação do seu dinheiro”, “o que justifica que o direito a juros indemnizatórios haja de ter uma extensão mais reduzida por contraposição à situação em que o contribuinte, suscita a questão da ilegalidade do acto de liquidação imediatamente”.
No mesmo sentido se pronunciaram os acórdãos do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo dos que se destacam os proferidos nos processos 058/19.9BASLB e 051/19.1BASLB, ambos de 11/12/2019; processo n.º 0630/18.4BALSB, de 20/05/2020; processo 040/19.6BALSB; de 26/05/2022, Processo nº 0159/21.3BALSB; de 29/01/2020, Processo nº 045/19.7BALSB; de 27/02/2019, Processo nº22/18.5BALSB; de 23/05/2018, Processo n.º 01201/17, e de 06/12/2017, Processo n.º 0926/17, entre muitos outros.
Ora, na presente situação o contribuinte apenas obtém decisão favorável à sua pretensão com a decisão arbitral, pelo que a AT podia ter corrigido a sua posição e não o fez no momento e local próprios, pelo que a demora na reposição da legalidade lhe é parcialmente imputável. Na verdade, considerou o legislador ser o período de um ano o prazo razoável para os serviços da administração tributária analisarem e decidirem o pedido de revisão e executarem a decisão favorável ao contribuinte.
Destarte, o pedido de revisão oficiosa cujo indeferimento constitui o objecto da acção arbitral foi apresentado no dia 21.01.2022, sendo que, apenas são devidos juros indemnizatórios decorrido um ano após aquela data e até à data da emissão das respectivas notas de crédito a favor do sujeito passivo, de acordo com o prazo estabelecido no n.º 3, al c) do art. 43.º da LGT, ao contrário do que decidiu a decisão arbitral recorrida.
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3.- Decisão:

Nos termos e com os fundamentos expostos, acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em tomar conhecimento do mérito do recurso e, concedendo-lhe provimento, anular a decisão arbitral no segmento recorrido, mais declarando que os juros indemnizatórios são devidos pela AT somente a partir de um ano após o pedido de revisão formulado pelo sujeito passivo, até à data da emissão das respectivas notas de crédito.

Custas pela Recorrida, sem taxa de justiça por não ter apresentado contra-alegações (artigo 527.º n.ºs 1 e 2 Código de Processo Civil; artigo 7.º n.º 2 do Regulamento das Custas Processuais).

Após trânsito em julgado comunique ao CAAD.
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Lisboa, 29 de Setembro de 2022. - José Gomes Correia (relator) – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Joaquim Manuel Charneca Condesso - Nuno Filipe Morgado Teixeira Bastos - Aníbal Augusto Ruivo Ferraz - Gustavo André Simões Lopes Courinha - Paula Fernanda Cadilhe Ribeiro - Pedro Nuno Pinto Vergueiro – Anabela Ferreira Alves e Russo.