Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0453/12
Data do Acordão:09/12/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
REVERSÃO
IMPUGNAÇÃO JUDICIAL
OPOSIÇÃO
REJEIÇÃO LIMINAR
ERRO NA FORMA DE PROCESSO
CONVOLAÇÃO
AMPLIAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
Sumário:I – O meio processual adequado para o revertido impugnar contenciosamente o despacho que ordena a reversão, com fundamento no facto de não ser o responsável pelas dívidas por ter renunciado à gerência, é a oposição à execução, e não o processo de impugnação judicial, dado que se trata de fundamentos que se reconduzem à oposição.
II – Não deve operar-se, sob pena da prática de actos inúteis, proibida por lei, a convolação da impugnação judicial em oposição se a petição é intempestiva para o efeito, pois logo haveria lugar a indeferimento liminar por extemporaneidade.
III – Não dispondo o Supremo Tribunal Administrativo de base factual para decidir o recurso jurisdicional - uma vez que ele pressupõe uma realidade de facto que não foi pré-estabelecida e que este Tribunal também não pode estabelecer por virtude de o STA, como Tribunal de revista, carecer de poderes de cognição em sede de facto, - torna-se essencial que o tribunal “a quo” amplie a matéria de facto de modo a fixar o quadro factual suficiente para o julgamento da causa.
Nº Convencional:JSTA00067768
Nº do Documento:SA2201209120453
Data de Entrada:04/27/2012
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL
Legislação Nacional:CPC96 ART2 N2 ART722 N3 ART729 N2 ART199 N1 N2 ART137 ART288 N1 B
LGT98 ART97 N2 N3 ART22 N4
CPPTRIB99 ART98 N4 ART99 ART204 N1 B ART70 N1 ART124 ART151 N1 ART203
CPC96 ART493 N1 N2 ART494 B
CPA91 ART133 N2 D
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC01153/12 DE 2012/02/23; AC STA PROC028/05 DE 2005/06/01; AC STA PROC0331/11 DE 2012/04/12; AC STA PROC01145/11 DE 2012/03/28; AC STA PROC01161/11 DE 2012/02/29; AC STA PROC0501/05 DE 2005/06/29; AC STA PROC0172/07 DE 2007/07/14; AC STA PROC0845/10 DE 2011/02/09; AC STA PROC0300/12 DE 2012/05/02; AC STA PROC0787/06 DE 2007/02/28; AC STA PROC01249/05 DE 2006/03/08; AC STA PROC0172/07 DE 2007/04/11
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 6ED PAG107/108 PAG447 PAG479.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I-RELATÓRIO

1. A……, com a identificação constante dos autos, apresentou, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, impugnação judicial, após o indeferimento da reclamação graciosa, por si efectuada, face à sua citação por reversão, em processo de execução fiscal contra “B……, Lda.”, que rejeitada liminarmente.

2.Não se conformando com tal decisão, A…… veio interpor recurso, para a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, apresentando as respectivas Alegações com as seguintes Conclusões:
“1 — Face à situação registral não podia o recorrente ser responsabilizado, em sede de reversão, como membro dos corpos sociais da B……., Lda., quando, juridicamente, deixou de ter tal qualidade a partir de Dezembro de 2005.
2 - A ser responsabilizado como “Gerente”, a partir de Dezembro de 2005, seria necessário ter sido invocado que tal obrigação decorria de, eventualmente, ter exercido a gerência de facto, o que não sucedeu por parte do Serviço de Finanças. (v. artº. 24º da LGT).
3 - O pressuposto da responsabilização do recorrente não foi, todavia, o de exercer a gerência de facto mas sim o de ter a qualidade jurídica de gerente, quando não a tinha.
4 - A exigência ao ora recorrente de responsabilidade subsidiária tributária fora das situações previstas no artigo 24 da LGT constitui uma manifesta ilegalidade.
5 - Em conformidade com o disposto no artº. 99º do CPPT constitui fundamento de impugnação qualquer ilegalidade, para além das mencionadas nas alíneas a), b), c) e d) desta disposição legal.
6 - Acresce que o recorrente encontra-se a ser responsabilizado por coimas conforme resulta do título executivo.
7 - Mas o Acórdão, de 12.03.2009, do Tribunal Constitucional, sanciona o mecanismo de reversão fiscal previsto no RGIT, quando aplicado à liquidação de coimas por administradores e gerentes de sociedades liquidadas ou sem bens patrimoniais.
8 - Assim, também constitui uma ilegalidade a responsabilização do recorrente pelo pagamento das coimas.
9- Deverá assim, com o douto suprimento de Vossas Excelências, ser revogada a douta decisão prosseguindo os autos os seus termos.”

3. Não foram apresentadas Contra-alegações

4. O Digno Representante do Ministério Público, junto do STA, emitiu Parecer, no sentido de que a sentença recorrida não merece censura, pelo que deve ser negado provimento ao recurso.

5. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II- FUNDAMENTOS

1. DE FACTO

Na decisão recorrida não foi fixada matéria de facto, o que se compreende face à natureza liminar dessa decisão.

2. DE DIREITO
2.1. Da questão a apreciar e decidir e delimitação do objecto do recurso

O ora recorrente, na sequência da citação por reversão, na qualidade de responsável subsidiário da Sociedade “B……, Lda.”, deduziu reclamação e, na sequência do indeferimento desta, por se entender que os fundamentos da reclamação graciosa não se enquadravam nos pressupostos da impugnação judicial, interpôs impugnação judicial no Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, alegando em suma, que deixou de exercer as funções de gerente de facto e de direito, a partir de 31/12/2005, pelo que, a sua responsabilidade pelo pagamento das dívidas deve ser limitada aquela data.
Da análise da petição inicial da impugnação, verifica-se que o impugnante invocou, entre o mais, que:
- “O ora impugnante é responsável tributário subsidiário por ter sido gerente da mencionada sociedade comercial, designada B……, conforme prevê o artigo 24º da LGT” (art.5º).
-“Sucede que o impugnante a partir de 31 de Dezembro de 2005 deixou de exercer as funções de Gerente da B……, por renúncia ao cargo” (art. 6º).
-“O ora impugnante considera que não são válidos os fundamentos legais invocados pelo Sr. Chefe de Serviço de Finanças para indeferir a reclamação graciosa” (art. 17º).
-“Na verdade, o artigo 70º nº1 do CPPT estabelece que a Reclamação Graciosa pode ser deduzida com os mesmos fundamentos previstos para a impugnação judicial” (art. 18º).
-“Ora, em conformidade com o disposto no art. 99º do CPPT constitui fundamento de impugnação qualquer ilegalidade, para além das mencionadas nas alíneas a), b), c), e d) desta disposição legal” (art. 19º).
- “A exigência ao ora impugnante de responsabilidade subsidiária tributária fora das situações previstas no artigo 24 da LGT constitui uma manifesta ilegalidade” (art. 20º).
-“Conforme atrás se disse e foi alegado na reclamação, o impugnante não exerceu de facto as funções de Gerente a partir de 31 de Dezembro de 2005 nem juridicamente a qualidade de Gerente desde a mencionada data” (art. 21º).
- “Assim, considera o impugnante que face à referida ilegalidade, violação do disposto no art. 24º da LCT, o procedimento de Reclamação Graciosa tinha fundamento legal, tendo sido adequada a sua dedução pelo impugnante” (art. 22º).
-“O impugnante não questiona a sua responsabilidade subsidiária tributária assumindo as dívidas da B……, Ldª. até 31 de Dezembro de 2005” (art. 23º).
-“Todavia, face ao disposto no art. 24º da LCT será ilegal atribuir a responsabilidade subsidiária tributária ao impugnante pelas dívidas da B……, Ldª, a partir de 31 de Dezembro de 2005” (art. 24º).
O impugnante termina pedindo que “seja julgada procedente a impugnação do indeferimento da Reclamação Graciosa, sendo limitada a responsabilidade subsidiária tributária do impugnante até 31 de Dezembro de 2005”.
No Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, foi proferida sentença a indeferir liminarmente a petição, com base na seguinte fundamentação:
“A……, com os demais sinais dos autos, interpôs a presente impugnação judicial, na sequência do indeferimento de reclamação graciosa que deduziu, na sequência da citação por reversão, que lhe foi efectuada em processo de execução fiscal, enquanto responsável subsidiário da sociedade “B…….., Lda.”, alegando em suma, que deixou de exercer as funções de gerente de facto e de direito, a partir de 31/12/2005, pelo que, a sua responsabilidade pelo pagamento das dívidas deve ser limitada aquela data.
Conforme dispõe o art. 22°, n°4 da LGT, art. 70°, n° 1 e art. 102, n° 1, al c) do CPPT, o responsável subsidiário citado em processo de execução fiscal pode usar os mesmos meios graciosos e contenciosos que o devedor originário, isto é, deduzir reclamação ou impugnação judicial com fundamento em qualquer ilegalidade, quer as referidas no elenco do artigo 99° do CPPT, quer outras que inquinem o acto de liquidação do tributo.
No caso dos autos, veio o impugnante alegar não ser o responsável pelo pagamento das dívidas da devedora originária, posteriores a 31/12/2005, por ter renunciado à gerência.
Vejamos se o fundamento invocado cabe no conceito de ilegalidade susceptível de sustentar a impugnação judicial.
Enquanto fundamento de impugnação as ilegalidades a invocar devem reconduzir-se às praticadas no procedimento de liquidação dos tributos, sendo que a sua verificação terá necessariamente como consequência a anulação total ou parcial do acto, a sua declaração de inexistência ou de nulidade, tal como decorre do disposto no art. 97°, n° 1, al. a) a f), e art. 124, n° 1 do CPPT.
Ora, a alegada ilegitimidade do impugnante por não ser o responsável pelo pagamento da dívida, não afecta a legalidade do acto de liquidação, mas apenas a exigibilidade da obrigação criada pela liquidação, constituindo fundamento de oposição à execução fiscal (art. 204°, n°1, al. b) do CPPT), cuja procedência determina a extinção da execução quanto ao impugnante.
As alegações do Impugnante não se reportam à ilegalidade de nenhuma liquidação de tributos, mas antes à inexigibilidade da dívida exequenda.
O pedido efectuado na petição inicial não se subsume ao de uma impugnação judicial. O Impugnante não pede que alguma liquidação seja anulada, mas antes que seja absolvido da responsabilidade pelo pagamento da dívida exequenda no âmbito da referida reversão.
Há, por isso, erro na forma processual utilizada pelo Impugnante: utilizou a impugnação judicial, quando deveria ter empregue a oposição à execução fiscal.
Não é admissível a convolação da impugnação judicial na forma processual adequada — oposição à execução fiscal — por já ter decorrido o prazo de 30 dias consagrado para a apresentação da oposição à execução fiscal — cfr. artigo 97°, n.° 3 da Lei Geral Tributária e artigos 98.°, n.° 4 e 203°, n.° 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Decisão
Termos em que, atento o supra exposto, se rejeita liminarmente a presente Impugnação.
…”

Contra este entendimento se insurge o recorrente, no presente recurso, argumentando, em síntese, não pode ser responsabilizado subsidiariamente como Gerente a partir de Dezembro de 2005, sendo que tal exigência é manifestamente ilegal e que constitui fundamento de impugnação judicial, em conformidade com o art. 99º do CPPT.
Alega ainda que se encontra a ser responsabilizado por coimas, o que constitui também uma ilegalidade, sendo que o “Acórdão, de 12.03.2009 do Tribunal Constitucional sanciona o mecanismo da reversão fiscal previsto no RGIT, quando aplicado à liquidação de coimas por administradores e gerentes de sociedades liquidadas ou sem bens patrimoniais”.
Em primeiro lugar, se o Recorrente está a referir-se ao Acórdão do Tribunal Constitucional nº 649/08, de 12 de Março de 2009, a verdade é que nele se concluiu “não julgar inconstitucionais as normas das alíneas a) e b) do nº 1 do art. 8º do Regime Geral das Infracções Tributárias, aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5 de Junho, na parte em que se refere à responsabilidade civil subsidiária dos administradores e gerentes por coimas aplicadas a pessoas colectivas em processo de contra-ordenação”.
Em segundo lugar, refere o Ministério Público, no seu douto parecer, que o recorrente vem alegar questão nova, que não foi apreciada pela decisão recorrida, consistente no facto de estar a ser responsabilizado por coimas, o que é sancionado pelo Tribunal Constitucional.
Não tendo o recorrente invocado tal questão na petição inicial, a mesma encontra-se fora do âmbito dos poderes de apreciação deste Supremo Tribunal.
Com efeito, é maioritária a jurisprudência no sentido de que os vícios de violação de lei constitucional ou comunitária só são de conhecimento oficioso quando geradores de nulidade, “no que concerne a violação de normas constitucionais, quando estiver em causa a ofensa do conteúdo essencial de um direito fundamental, em sintonia com o preceituado no art. 133º, nº 2, alínea d), do CPA” (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6ª ed., 2011, Áreas Editora, p. 447, e a ampla jurisprudência assinalada na nota (2).).
Assim sendo, tal questão estaria fora do âmbito da apreciação deste recurso uma vez que o mesmo “(…) constitui um meio de impugnação da decisão judicial com vista à sua alteração ou anulação pelo tribunal superior após reexame da matéria de facto e/ou de direito nela apreciada, correspondendo, assim, a um pedido de revisão da legalidade da decisão com fundamento nos erros e vícios de que padeça. O recurso jurisdicional visa apenas o reexame da decisão recorrida com vista à sua eventual anulação ou revogação, motivo por que não constitui forma de conhecer de questões novas, isto é, que não tenham sido oportunamente suscitadas perante o tribunal ad quem, salvo sempre o dever de conhecimento oficioso” (Cfr. o Acórdão do STA de 23/2/2012, proc nº 01153/2012. No mesmo sentido, cfr., entre outros, o Acórdão de 1/6/2005, proc nº 028/05 e o Acórdão do STA de 12/4/2012, proc nº 331/11.).
Note-se, porém, que, JORGE LOPES DE SOUSA considera que o contencioso tributário apresenta especificidades decorrentes, desde logo, do facto de nos casos enquadráveis na alínea a) do nº 1 do art. 204º, o interessado notificado do acto de liquidação, mesmo que não o impugne tempestivamente, “não ficará impedido de discutir no processo de oposição as questões de ilegalidade abstracta da liquidação, ficando apenas impedido de discutir a legalidade em concreto, relativa a vícios geradores de anulabilidade”, o que significa que “os vícios constitutivos de ilegalidade abstracta da liquidação não estarem sujeitos ao regime da mera anulabilidade”(Ibidem.).
Como quer que se entenda, a verdade é que, no caso em apreço, o recorrente não concretiza em que se traduz a invocada inconstitucionalidade e também não estamos no âmbito da oposição judicial.
Assim sendo, quer pelas razões expostas quer por não ter sido invocada oportunamente aquela questão, de modo a permitir que o Tribunal “a quo” se tivesse pronunciado sobre a mesma, não pode de qualquer modo agora este Supremo Tribunal Administrativo dela conhecer.
Assim, a questão central que cabe apreciar e decidir no presente recurso é a de saber se a Mmª Juíza “a quo”:
a) Incorreu em erro de julgamento ao indeferir liminarmente a Impugnação judicial, por entender que os factos invocados pelo impugnante não integram fundamento de impugnação mas, antes, de oposição;
b) Se tendo havido erro na forma do processo, os autos não podiam ser aproveitados para prosseguirem sob a forma de processo determinada na lei, por já ter decorrido o prazo para o efeito.

2.1.1. Da análise do erro de julgamento

Alega o recorrente, entre o mais, que é ilegal atribuir-lhe a responsabilidade subsidiária pelas dívidas da B…… Ldª., a partir de Dezembro de 2005 e que a impugnação judicial é o meio próprio e adequado para arguir tal ilegalidade.
Adianta-se, desde já, que não assiste razão ao recorrente.
Vejamos.
Dispõe o art. 2º, nº 2, do Código de Processo Civil, que “a todo o direito (…) corresponde a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo”. E, em termos semelhantes, refere o art. 97º, nº 2, da LGT, que “a todo o direito de impugnar corresponde o meio processual mais adequado de o fazer valer em juízo”.
Como ficou consignado no Acórdão deste Supremo Tribunal de 8/3/2006, proc nº 042/06, “Em face dessa correspondência entre direito e a acção adequada a fazê-lo reconhecer em juízo, haverá apenas um determinado meio processual que, em cada caso, pode ser utilizado para obter a tutela judicial. É à face do pedido ou conjunto de pedido formulados pelo interessado que se afere a adequação das formas de processo especiais e, consequentemente, se ocorre erro na forma de processo”.
O erro na forma do processo traduz-se numa nulidade que consiste na utilização de meio processual impróprio, aferindo-se tal erro pela adequação do meio processual utilizado ao fim por ele visado: se o pedido, ou seja, a concreta pretensão de tutela solicitada pelo autor ao tribunal não se ajusta à finalidade abstractamente figurada pela lei para essa forma processual ocorre erro na forma do processo (Cfr. neste sentido, entre outros os Acórdão do STA de 28/3/2012, proc nº 1145/11, e de 29/2/2012, proc nº 1161/2011.).
Como se pode ler no Acórdão deste Supremo Tribunal de 29/2/2012, proc nº 1161/11, o erro na forma do processo constitui uma nulidade de conhecimento oficioso e impõe a convolação do processo para a forma adequada, nos termos do disposto no art. 98º, nº4, do CPPT, e art. 97º, nº3, da LGT, “com a anulação apenas dos actos que não possam aproveitar-se para a forma processual adequada sem diminuição das garantias de defesa (art. 199º, nºs 1 e 2, do CPC), sendo que se não for possível a sanação da nulidade, o erro na forma do processo determina o indeferimento da petição inicial, se verificada na fase liminar, ou, se já ultrapassada a fase liminar, a anulação de todo o processado, com a absolvição do réu da instância (cfr. arts. 288º, nº1, alínea b), 493º, nºs 1 e 2, e 494º, alínea b), todos do CPC).”
O processo de impugnação judicial é a via processual adequada para obter a anulação de um acto praticado pela administração tributária, ou a declaração da sua nulidade ou inexistência (art. 124º do CPPT), sendo que na impugnação judicial são apreciados vícios que afectem a validade do acto impugnado, admitindo-se no art. 99º do CPPT que seja fundamento de impugnação qualquer ilegalidade (Cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6º ed., Áreas Editora, 2011, Anotação ao art. 99º, pp. 107 a 108.).
No caso sub judice, da leitura da Petição inicial resulta que o impugnante, ora recorrente, na sequência da citação que lhe foi feita, pretende atacar, na qualidade de responsável subsidiário, o despacho de reversão proferido na execução fiscal.
Na verdade, da análise do pedido e da causa de pedir resulta claramente que o Impugnante não ataca nenhuma das liquidações que deram origem à execução, nem põe em causa a sua invalidade, imputando todas as invalidades invocadas ao despacho que determinou a reversão.
Como se pode ler no despacho recorrido, no caso dos autos, o impugnante veio alegar “não ser o responsável pelo pagamento das dívidas da devedora originária, posteriores a 31/12/2005, por ter renunciado à gerência”. Acontece que “a alegada ilegitimidade do impugnante por não ser o responsável pelo pagamento da dívida, não afecta a legalidade do acto de liquidação, mas apenas a exigibilidade da obrigação criada pela liquidação, constituindo fundamento de oposição à execução fiscal (art. 204°, n°1, al. b) do CPPT), cuja procedência determina a extinção da execução quanto ao impugnante”.
No mesmo sentido, pode ler-se no Parecer do Ministério Público, junto deste Supremo Tribunal, que “o recorrente não invoca qualquer fundamento de impugnação judicial (artigo 99º do CPPT) nem formula qualquer pedido atinente a esse meio processual, a saber, a declaração de inexistência, nulidade ou anulação das liquidações dos tributos. O fundamento invocado pelo recorrente tem a ver com a ilegitimidade no PEF e constitui expresso fundamento de oposição judicial à execução fiscal.”
Acontece que constitui jurisprudência consolidada deste Supremo Tribunal que a Impugnação judicial não é o meio adequado de reacção contra o despacho de reversão da execução fiscal, mas sim o processo de Oposição. Neste sentido, pode ler-se no Acórdão do STA de 29/06/2005, proferido no processo n.° 0501/05, que “A forma processual que a jurisprudência tem eleito adequada para reagir contra o despacho que determina a reversão da execução fiscal é a de oposição à execução” (No mesmo sentido, cfr. os Acórdãos do STA de 14.07.2007, proferido no processo n.° 0172/07; de 9/2/2011, proc nº 845/2010; e de 2/5/20102, proc nº 300/2012. ).
Também JORGE DE SOUSA (Cfr. Código de Procedimento e de Processo Tributário, 6ª ed., Áreas Editora, Ldaª, 2011, Anotação ao art. 204º, p. 479.), referindo-se ao “meio processual adequado para impugnar uma decisão relativa à reversão da execução fiscal, com fundamento de o revertido não ser responsável pelo pagamento da dívida”, diz que é a oposição à execução fiscal, nos termos da alínea b) do nº 1 do art. 204º do CPPT.
Nas palavras do Autor, “A reclamação graciosa e o processo de impugnação judicial, a que os revertidos também podem recorrer na sequência da sua citação no processo de execução fiscal, nos termos do nº 4 do art. 22º da LGT, destinam-se a atacar a legalidade da liquidação visando obter a sua anulação ou a declaração da sua nulidade ou inexistência (arts. 70º, nº1, 99º e 124º do CPPT). Por outro lado, por força do preceituado no nº1 do art. 151º do CPPT, todas as questões relacionadas com os pressupostos da responsabilidade subsidiária deverão ser apreciadas em processo de oposição”.

2.1.2. Da admissibilidade de convolação

Justificando-se a convolação por razões de economia processual, torna-se necessário averiguar se existe no caso algum obstáculo ao prosseguimento da petição na forma processual adequada, designadamente em termos de tempestividade, pois, como vimos, uma das razões do indeferimento liminar foi o facto de não ser possível a convolação, por extemporaneidade. Como ficou consignado no Acórdão deste Supremo Tribunal de 28/2/2007, proc nº 787/06, “não deve operar-se, sob pena da prática de actos inúteis, proibida por lei (artigo 137º CPC), a convolação da oposição em impugnação judicial se a petição é intempestiva para o efeito, pois logo haveria lugar a indeferimento liminar por extemporaneidade”(No mesmo sentido, cfr., entre outros, os Acórdãos do STA de: 8/3/2006, proc nº 1249/05; e 11/4/2007, proc nº 172/07.).
Vejamos.
A convolação da presente impugnação judicial em oposição à execução fiscal está dependente da verificação de dois pressupostos, a saber:
a) Que a petição tenha sido tempestivamente apresentada para efeitos da nova forma processual, neste caso, oposição à execução fiscal;
b) Que o pedido formulado seja compaginável com a forma de processo adequado, pressuposto que, no caso concreto, conforme se referiu se verifica.
No que respeita à tempestividade, nos termos do artigo 203° do CPPT, a oposição à execução fiscal deve ser deduzida no prazo de 30 dias a contar da citação.
No caso dos autos não vem provada nem é feita qualquer referência nem no probatório nem na sentença à data da citação no âmbito da execução fiscal. O que se retira dos autos é que o despacho de indeferimento é de 28 de Janeiro de 2010 e a Impugnação Judicial deu entrada na Repartição de Finanças, em 18 de Fevereiro de 2010.
Todavia, a Mmª Juíza “a quo” concluiu pela inadmissibilidade da convolação da impugnação judicial na forma processual adequada — oposição à execução fiscal — por já ter decorrido o prazo de 30 dias consagrado para a apresentação da oposição à execução fiscal — cfr. artigo 97°, n.° 3, da Lei Geral Tributária e artigos 98.°, n.° 4, e 203°, n.° 1, alínea a), do CPPT. E fê-lo, com base na ilação simples que decorre do facto de o recorrente, citado no âmbito da execução, em vez de ter deduzido logo oposição, começou por reclamar graciosamente e só depois do indeferimento da reclamação apresentou impugnação judicial. Ora, se o despacho de indeferimento é de 28 de Janeiro de 2010 e a Impugnação Judicial deu entrada na Repartição de Finanças, em 18 de Fevereiro de 2010 (fls. 5 dos autos), o que perfaz vinte dias, logo, os dez dias que restam para perfazer os trinta dias exigidos para a oposição terão seguramente sido consumidos com a reclamação e resposta à mesma.
Não obstante se perceber o raciocínio lógico seguido pela Mmª Juíza “a quo”, a verdade é que este Supremo Tribunal não pode julgar com segurança se de facto a oposição, por convolação, é no caso extemporânea, por falta de matéria de facto pertinente: data da citação no âmbito do processo de execução fiscal.
Em face do exposto, considerando que este Tribunal de recurso não dispõe de base factual para decidir o presente recurso jurisdicional (uma vez que a decisão do mesmo pressupõe uma realidade de facto que não vem pré-estabelecida nem aqui pode estabelecer-se por o STA carecer de poderes de cognição relativamente a essa matéria) torna-se essencial que o Tribunal “a quo” proceda à averiguação da data da citação da execução fiscal, com vista a permitir aferir da viabilidade da convolação.
Assim sendo, impõe-se revogar, ao abrigo do disposto no nº 2 do art. 729º e no nº 3 do art. 722º, ambos do CPC, o despacho impugnado, na parte relativa à impossibilidade da convolação, devendo os autos regressar à 1ª instância para ser substituído por outro que decida após a determinação da data da citação, assim se concedendo provimento ao recurso.

III – DECISÃO

Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em dar provimento ao recurso, revogar o despacho de indeferimento liminar, na parte relativa à impossibilidade de convolação, com vista a averiguar previamente qual foi da data da citação, devendo ser proferido novo despacho liminar sobre a viabilidade da convolação em face da data que seja apurada.

Sem custas.

Lisboa, 12 de Setembro de 2012. – Fernanda Maçãs (relatora) – Casimiro Gonçalves –Francisco Rothes.