Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01097/21.5BEPRT
Data do Acordão:11/24/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
CONTRATAÇÃO PÚBLICA
CADUCIDADE
ADJUDICAÇÃO
CAUÇÃO
MEDIDAS PREVENTIVAS
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Justifica-se a admissão do recurso de revista dado estarem em discussão questões relativamente às quais se verifica capacidade de expansão da controvérsia e cuja elucidação assume relevo jurídico, e, bem como, onde se regista a necessidade de intervenção clarificadora deste Supremo Tribunal.
Nº Convencional:JSTA000P30264
Nº do Documento:SA12022112401097/21
Data de Entrada:11/10/2022
Recorrente:MUNICÍPIO DE AMARANTE
Recorrido 1:A.........., UNIPESSOAL, LDA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:


1. MUNICÍPIO DE AMARANTE [doravante R.], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista interposto do acórdão de 08.08.2022 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 1892/1962 (retificado em parte e no mais mantido/sustentado pelo acórdão de 28.10.2022 - fls. 2129/2138) - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que concedeu provimento ao recurso e que revogou a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto - Juízo de Contratos Públicos [doravante TAF/PRT-JCP], que havia julgado improcedente a presente ação administrativa urgente de contencioso pré-contratual deduzida por A………., UNIPESSOAL, LDA. [doravante A.] para impugnar o ato de adjudicação, datado de 30.03.2021, e o subsequente ato que determinou a caducidade da adjudicação a favor da sua proposta, em 09.08.2021.

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 1972/2077] na relevância jurídica e social fundamental das questões objeto de dissídio [respeitantes às matérias das medidas excecionais e temporárias de resposta à pandemia da doença COVID-19 no âmbito cultural e artístico, em especial quanto aos espetáculos não realizados (art. 11.º do DL n.º 10-I/2020, de 26.03) na sua concatenação com o regime definido pelo Código dos Contratos Públicos (CCP) e da recusa do adjudicatário na assinatura do contrato quando discorda do conteúdo da minuta do contrato por a mesma violar alegadamente as peças do procedimento] e, bem assim, para uma «melhor aplicação do direito», fundando tal posição, para além de incurso em nulidade de decisão [art. 615.º, n.º 1, al. c), do Código de Processo Civil (CPC/2013)], nos acometidos erros de julgamento em que terá incorrido o TCA/N no acórdão sob impugnação, já que lavrado em infração, nomeadamente do disposto nos arts. 91.º, n.º 1, 105.º, n.º 1, al. a), e 292.º do CCP, e 11.º, n.º 5, do DL n.º 10-I/2020.

3. Foram produzidas contra-alegações em sede de recurso de revista pela A. [cfr. fls. 2080/2116], onde pugna, desde logo, pela não admissão do recurso.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/PRT-JCP julgou total improcedente a pretensão anulatória/condenatória deduzida pela A. [cfr. fls. 1709/1764], juízo este que foi revogado pelo TCA/N no acórdão sob censura.

7. Compulsados os autos importa, destarte, apreciar, «preliminar» e «sumariamente», se se verificam os pressupostos de admissibilidade referidos no n.º 1 do citado art. 150.º do CPTA quanto ao recurso de revista, ou seja, se está em causa uma questão que «pela sua relevância jurídica» assume «importância fundamental», ou se a intervenção deste Supremo Tribunal se apresenta como «claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

8. As quaestiones juris que relevantemente se mostram colocadas na presente revista revelam-se in casu dotadas de relevância jurídica, porquanto assumem carácter paradigmático e exemplar, nelas se verificando alguma capacidade de expansão da controvérsia, visto suscetíveis de se poderem projetar ou de serem transponíveis para outras situações, apresentando, assim, interesse para a comunidade jurídica, o que legitima a admissão do recurso de revista como garantia de uniformização do direito nas vestes da sua aplicação prática.

9. Temos, por outro lado, que as mesmas revelam-se dotadas de complexidade jurídica já que a sua análise envolve o cotejo e ponderação normativa e principiológica objeto de controvérsia e discussão, revelada também pelos juízos diametralmente divergentes das instâncias, cientes, ainda, de que o juízo sob impugnação não se apresenta, prima facie, como isento de controvérsia, nem está imune à dúvida e, nesse contexto, carecido de devida análise e reponderação por parte deste Supremo Tribunal.

10. Flui do exposto a necessidade de intervenção clarificadora deste Supremo Tribunal, e daí que se justifique a admissão da revista.
DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em admitir a revista.
Sem custas.
D.N..

Lisboa, 24 de novembro de 2022. - Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa - José Veloso.