Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0256/12
Data do Acordão:03/12/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:IRC
GRUPO DE EMPRESAS
Sumário:I - Para a existência de um grupo de sociedades para efeitos fiscais é necessário que uma sociedade, dita dominante, detenha, direta ou indiretamente, pelo menos 90% do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto, há mais de um ano à data em que se inicia a aplicação do regime.
II - Relativamente às sociedades dominadas, não podem fazer parte do grupo as que, no início ou durante a aplicação do regime, registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, se a participação (de pelo menos 90% exigida à sociedade dominante) já for detida há mais de dois anos, o que no caso dos autos não ocorre quanto à sociedade dominada que, registando prejuízos nos três anos anteriores ao início do regime, era detida há menos de dois anos (v. alíneas C) a F) e H) do probatório supra.
III - Este regime especial de tributação reveste, assim, um aspeto dinâmico podendo cessar se deixarem de se verificar as respetivas condições, mas podendo também vir a ter lugar quando as condições não reunidas em determinado momento passarem a verificar-se.
Nº Convencional:JSTA00068619
Nº do Documento:SA2201403120256
Data de Entrada:03/08/2012
Recorrente:A......, S.A.
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF SINTRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - IRC
Legislação Nacional:LGT08 ART11 ART53 ART68.
CIRC01 ART47 N8 ART63 N4 C ART65 ART69.
CPPTRIB99 ART125 N1.
CPC96 ART103 N2 ART266 N1 ART268 N4 ART659 N2 ART668 N1 C ART685-A N2 B.
CCIV66 ART9.
CONST76 ART103 N2.
DL 414/87 DE 1987/12/31.
L 71/1993 DE 1993/11/26.
L 52/1996 DE 1996/12/27.
L 30-G/2000 DE 2001/12/29.
L 109-B/2001 DE 2001/12/27.
L 39-A/2005 DE 2005/07/29.
L 53-A/2006 DE 2006/12/29.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. “A……, SA”, com os demais sinais nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Sintra que julgou parcialmente improcedente a impugnação judicial por si deduzida contra a liquidação adicional de IRC relativo ao ano de 2007, no montante de 1.060.124,60 euros, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:

1ª). Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, no âmbito do Processo de Impugnação que correu termos com o nº. 1407/10.0BESNT, que tinha por objeto o ato tributário de liquidação de IRC de 2007, na parte em que a mesma indeferiu a impugnação do ato e absolveu a demandada, ou seja,

IIª). Na parte referente à correção efetuada ao regime especial de tributação dos grupos de sociedades, aqui também designado RETGS, que se traduziu na exclusão da dedução ao lucro tributável da Recorrente, sociedade dominante, do prejuízo fiscal da sociedade dominada designada B………, SA e aqui também designada B…….. e ao pedido de indemnização por garantia indevidamente prestada, ao abrigo do artº. 53º da LGT.

IIIª). A correção dos prejuízos fiscais da participada B…… ao lucro da Recorrente foi efetuada em virtude da exclusão do RETGS pelos Serviços de Inspeção ancorada na interpretação que os mesmos fazem - e que o Tribunal recorrido reiterou - da norma constante da alínea c) do nº 4 do artº. 63º do Código do IRC (atualmente correspondente ao artº. 69 do mesmo Código).

IVª). Salvaguardando melhor e mais avisado entendimento, a matéria deste Recurso, o thema decidendum de que depende o respetivo mérito, é exclusivamente jurídica e reconduz-se à concreta questão da interpretação da norma da alínea c) do nº 4 do artº. 63º do Código do IRC (redação ao tempo em vigor que é a que se refere nestas alegações e que corresponde ao atual artº. 69º do mesmo Código), a saber: se a condição de dedução dos prejuízos fiscais, dela constante, depende de que a participada seja detida há mais de dois anos (condição que a lei refere) na proporção de 90% do seu capital social nesses mesmos dois anos transatos (condição que a lei não refere e que dela não resulta, nem literal nem sistematicamente, no entendimento da Recorrente).

Vª). A matéria de facto relevante para a decisão da questão de direito tem natureza incontrovertida e dela resulta que a (i) B……., cujos prejuízos estão em causa, era participada da Recorrente há mais de dois anos, que (ii) é o veículo societário através do qual o Grupo exerce a atividade de distribuição em Portugal (ii) atividade essa que era exercida pela própria Recorrente antes da aquisição desta participada (ao tempo designada “D........”) e, bem como o facto de (iii) a dita B…….. ser detida em mais de 100% pelo Grupo por via da A’……..França pois, a partir de 10.12.2003, a C………., teve o seu domínio absoluto, tendo a Recorrente passado a detê-la total e diretamente a partir de março de 2005.

VIª). O presente Recurso vem sustentado em violação de lei e nulidade da sentença recorrida: violação das disposições legais contidas, entre outras, nos artºs. 103º, nº 2 e 3, 266º, nºs 1 e 2 e 268º, nº 4 e 685º-A, nº 2, alínea b), todos da CPC, resultando a nulidade da sentença, de jure, do artº. 125º, nº 1 do CPPT e dos artºs. 659º, nº 2 e 668º, nº 1, alínea, c) do C.P.C. ex vi artº. 2º, alínea e).

VIIª). A inconstitucionalidade vem invocada por violação por violação direta dos nºs 2 e 3 do artº. 103º da CRP, nos termos do qual “os impostos são criados por lei” e “ninguém pode ser obrigado a pagar impostos (...) cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”, por o Tribunal a quo considerar que na lei estão requisitos relativos a tributação que dela não constam, ou seja, que a detenção das participações nos dois anos anteriores ao da aplicação do RETGS tem de ser igual ou superior a 90%.

VIIIª). Entende a Recorrente, nos termos e para os efeitos previstos no artigo 685-A, nº 2, alínea b) do CPC, que a norma em causa - alínea c) do nº 4 do artº. 63º do Código do IRC - deve ser interpretada no sentido de que a lei exige um prazo de detenção de dois anos relativamente a sociedades que apresentem prejuízos fiscais nos últimos três anos e que esse nível de detenção só pode ser o que é considerado em termos gerais para os Grupos de Sociedades (vide artigo 483º, nº 2 do Código das Sociedades Comerciais).

IXª). Os factos relevantes para a decisão da causa encontram-se descritos na douta sentença recorrida que, para o efeito, aqui se dá por reproduzida (vide o nº III. Fundamentos. Dos factos. Factos Provados a fls. 5 e ss. da sentença recorrida) e, ainda, dos artigos 66º a 106º da p.i. que igualmente se dá aqui por reproduzida e descritos nos números 15 e seguintes das presentes alegações.

Xª). Dos factos resulta que (i) em todo o decurso do exercício de 2005 e do exercício de 2006, ou seja, nos dois exercícios anteriores ao da aplicação do RETGS (2007), a sociedade dominante deteve a participada B………, numa percentagem superior à maioria do capital social, ou seja, uma percentagem superior a 50%, sendo certo que (ii) a mesma B……. pertencia, nesses anos e na sua totalidade, à A’ …… França e à própria Recorrente, ou seja, estava totalmente integrada no Grupo e (iii) no ano de aplicação do RETGS – 2007- a Recorrente detinha efetivamente a totalidade do seu capital social e, como tal, em percentagem superior a 90%.

XIª). Ou seja: os níveis de detenção da dominada pela dominante, demonstram que, no caso, a relação de domínio da participada foi sempre de domínio absoluto, desde a sua aquisição: numa primeira fase, de 10.12.2003 a 22.3.2005, de domínio absoluto do Grupo A’’….., através da C………, por via indireta e por esta ser a detentora da totalidade do capital social da Recorrente e de 22.3.2005 até ao final de 2007 (e posteriormente) de domínio direto absoluto através da participação da totalidade do seu capital social pela Recorrente.

XIIª).Verificam-se, in casu, todos os requisitos e condições de que a Lei faz depender a aplicação do RETGS, sendo certo que os mesmos não estão em causa nestes autos, nunca foram questionados, resumindo-se a questão controvertida, como já vai referido, à interpretação da norma contida na alínea c) do nº 4 do artº. 63º do Código do IRC.

XIIIª). De referir, ademais que os prejuízos cuja correção o ato liquidatário consubstancia são da referida B………, mas do exercício de 2007.

XIVª). Do ponto de vista de toda a doutrina da Administração Fiscal emanada sobre a norma em questão, resulta que a interpretação que da mesma faz para sustentar a correção em crise neste autos é inovadora, contrária às referidas orientações que, nos termos do artigo 68º da LGT vinculam a Inspeção Tributária: neste sentido as Circulares nº 5/2002 de 2 de abril; nº 4/2001 de 14 de fevereiro e nº 15/94, de 6 de maio. Esta última já estabelecia que a condição referente à detenção pela dominante de, pelo menos, 90% do capital social das restantes sociedades do grupo “deve ser satisfeita desde o início do período de tributação em que se pretende iniciar ou renovar a aplicação do regime ou desde a data de constituição de qualquer das sociedades consolidadas, se esta ocorrer até ao termo do prazo estabelecido para a apresentação do pedido de autorização”. (sublinhado nosso). E a Circular 5/2002 de 2 de abril a Administração Fiscal é taxativa no mesmo sentido e, no seu ponto 5 relativo aos “Prejuízos apurados no âmbito do regime de tributação pelo lucro consolidado”, diz: 5.1. Os prejuízos apurados por uma sociedade no âmbito do grupo e comunicados à base tributável consolidada não são objeto de correção nos termos do disposto nos nºs 10, 11 e 12 do ex-artº. 59º do Código do IRC quando a sociedade que os gerou sair do grupo abrangido pelo novo regime. 5.2. Os prejuízos fiscais consolidados apurados em exercícios anteriores ao da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo apurado no âmbito do novo regime” (sublinhado nosso). No mesmo sentido, e o Despacho emitido no Processo 3089/2005 de 31 de março de 2006 da Direção-Geral dos Impostos relativo à “Aplicação da limitação prevista no nº 8 do artº. 47º do CIRC aos prejuízos fiscais apurados no RETGS”. Neste despacho diz a DGCI o seguinte: “Quando uma entidade faz parte de um grupo sujeito ao regime especial de tributação dos grupos de sociedades, os prejuízos fiscais apurados no âmbito do grupo seguem o regime específico de dedução de prejuízos fiscais, previsto no art. 65º do CIRC. De acordo com esse regime, os prejuízos verificados em exercícios anteriores ao do início de aplicação do regime só podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da sociedade a que respeitam. Os prejuízos fiscais apurados em cada exercício do período de aplicação do regime só podem ser deduzidos aos lucros tributáveis do grupo. Quando, durante a aplicação do regime, haja lugar a fusões entre sociedades do grupo ou uma sociedade incorpore uma ou mais sociedades não pertencentes ao grupo, os prejuízos fiscais das sociedades fundidas verificados em exercícios anteriores ao do início do regime só podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da nova sociedade ou da sociedade incorporante, desde que seja obtida a autorização prevista no artº. 69º do CIRC. Assim, a nova redação do nº 8 do artº. 47º do CIRC, dada pela Lei nº 39º-A/2005, de 29 de julho, só poderá impor limitações na dedução dos prejuízos fiscais gerados antes da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades e não aos obtidos durante a aplicação desse regime, visto que se tratam de prejuízos fiscais do grupo e não da sociedade que os gerou e apenas nos casos em que a alteração da titularidade do capital tenha ocorrido após a entrada em vigor da referida lei.” (sublinhado nosso). E nas orientações emitidas posteriormente a 2007, foi sempre esta a doutrina emanada. Veja-se, a título de exemplo, o Despacho de 23 de julho de 2008, do Diretor-Geral dos Impostos, emitido no Processo 2397/2008; a Circular no Despacho do Subdiretor Geral dos Impostos emitido no Processo 1239/2007 de 18 de julho de 2008, o Ofício-Circulado nº 90013 de 12 de março de 2008, etc.

XVª). Ou seja: a Administração Tributária nunca defendeu a interpretação da alínea c) do nº 4 do artº. 63º do Código do IRC como o faz para sustentar a liquidação em crise, motivo pelo qual a ora Recorrente não se pode conformar com a mesma.

XVIª). E também não se conforma a Recorrente com o argumento aduzido pelo Tribunal a quo de que estas orientações seriam de desconsiderar na situação sub judice porque seriam relativas a redações anteriores à da norma em causa na medida em que, embora a redação da norma tenha mudado e tenha até sido alterada a denominação do regime (de tributação pelo lucro consolidado para RETGS), o que é certo é que a exigência de participação durante períodos anteriores relativamente à sociedade que apresentem prejuízos vem de antes da redação controvertida da norma, como aqui se referirá.

XVIIª). Conclui-se assim que, ao abrigo entendimento da Administração Fiscal anteriormente publicado a Recorrente e a sua participada B……. deram integral cumprimento aos requisitos do artº. 63º do Código do IRC, sendo válida a aplicação do RETGS a partir do exercício de 2007.

XVIIIª). E a interpretação aqui sustentada pelo Recorrente também é a que resulta das regras de interpretação da lei e da sua aplicação aos factos, a saber: constantes dos artºs. 11º da LGT e 9º do Cód. Civil.

XIXª). A detenção de níveis de participação mínimos de 90% exigidos pelo nº 2 do artigo 63º do Código do IRC (redação ao tempo) reporta-se ao início de aplicação ao regime e não, retroactivamente, a períodos anteriores.

XXª). De facto, uma coisa são os requisitos de opção pelo RETGS e que constituem os pressupostos legais de que depende a formulação da opção pela aplicação deste regime que constam elencados do nº 2 do nº 3 do artº. 63º do Código do IRC e outra coisa, e diferente, são os requisitos para a inclusão de sociedades no âmbito do RETGS e que são os que constam do nº 4 da mesma disposição legal.

XXIª). No caso da Recorrente estavam verificados todos os requisitos do RETGS aquando da aplicação do regime, nada tendo as Autoridades Tributárias referenciado quando a mesma declarou tal opção.

XXIIª). Quer do elemento literal, quer do elemento lógico e histórico da norma, resulta ilegal a interpretação do Tribunal recorrido da alínea c) do nº. 4 do artº. 63º do Código do IRC na medida em que exige, nos dois anos anteriores ao da aplicação do regime níveis de participação superiores a 90%, pois introduz um requisito de incidência que só a lei poderia impor.

XXIIIª). De onde se conclui que tal interpretação viola diretamente o artº. 103º, nº 2 da CRP e, concretamente, os princípios aí positivados, designadamente os da legalidade e da tipicidade.

XXIVª). Do ponto de vista da mens legis, convém trazer à consideração que o diploma legal que introduziu o regime de tributação pelo lucro consolidado na legislação portuguesa, posteriormente designado RETGS, foi o DL 414/87 de 31.12, cujo intróito diz o seguinte: “com a publicação do código das sociedades comerciais foi estabelecida a regulamentação das sociedades coligadas. (...) Deu-se, assim, tratamento no direito comercial a uma realidade económica (...). Importa agora retirar dessa disciplina as consequências fiscais necessárias (...) como uma unidade económica para efeitos de tributação nos impostos sobre o rendimento.” (sublinhado nosso).

XXVª). Posteriormente, o Código do IRC, na sua versão inicial, veio a acolher este mesmo regime de tributação do rendimento dos grupos de sociedade, tendo-o consagrado no seu artº. 59º e seguintes e cedo foram introduzidas alterações ao regime de consolidação, de que são exemplo as da Lei 71/1993, de 26 de novembro, da Lei 52-096 de 27 de dezembro, da Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro e da Lei 109-B/2001 de 27 de dezembro (apenas se referem, por pertinentes ao caso, as alterações ocorridas até ao ano em que a correção ora em crise foi efetuada). Também a Lei nº 53-A/2006, de 29 de dezembro (Lei do OE/07), introduziu alterações no regime que entraram em vigor em 01 de janeiro de 2007.

XXVIª). A exclusão do perímetro da consolidação das sociedades com prejuízos fiscais foi introduzida pela Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro no então artº. 59º do Código do IRC (posterior artº. 63º que vem sendo referido e que atualmente, após a renumeração do Decreto-Lei 159/2009 de 13 de julho, constitui o artº. 69º). Posteriormente a redação desta norma foi alterada pela Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro. Vejamos as duas redações da norma:
Redação da Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro: 4. Não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes: c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos;
Redação da Lei 109-B/2001 de 27 de dezembro (lei do Orçamento de Estado para 2002) - nos termos do artº 22º, nº. 2 da Lei 16-A/2002 de 31 de maio, a redação dada a esta norma tem natureza interpretativa:
4 - Não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes: c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos.

XXVIIª). De salientar que a Lei que introduziu esta norma, a Lei 30-G/2000, contém evidenciado de forma explícita o intuito do legislador, sem margem para dúvidas, porque ela própria o refere: “Reforma a tributação do rendimento e adota medidas destinadas a combater a evasão e fraude fiscais, alterando o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, o Estatuto dos Benefícios Fiscais, a Lei Geral Tributária, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o Código de Procedimento e de Processo Tributário e legislação avulsa”.

XXVIIIª). Afigura-se clara e pacificamente aceite a finalidade subjacente a esta medida: evitar situações de abuso fiscal em que a inclusão de sociedades no grupo apenas tinham como objetivo, por via da utilização dos respetivos prejuízos fiscais reportáveis, a diminuição do imposto devido pelo lucro e, em consequência, a diminuição da receita fiscal.

XXIXª). O regime introduzido com o RETGS passou a ser bastante mais favorecedor no que toca à dedução dos prejuízos fiscais gerados durante a aplicação do regime do que o anterior regime do lucro consolidado pois passou a permitir a compensação integral dos prejuízos fiscais gerados no ano mas passou a ser mais exigente e até restritivo para que uma sociedade possa integrar o grupo.

XXXª). Ora, entre as restrições de entrada de uma sociedade no perímetro do RETGS, passou, precisamente, a contar-se a que nos ocupa: a lei passou a impor um prazo mínimo para a inclusão no grupo de sociedades com prejuízos fiscais reportáveis, tendo-o positivado na alínea c) do número 4 do artº. 63º do Código do IRC: passou a impedir-se a integração no grupo fiscal de sociedades que, à data de início da aplicação do regime, registem prejuízos fiscais há mais de três exercícios, mas excecionou as sociedades dominadas, cuja participação pela sociedade dominante fosse detida há mais de dois anos.

XXXIª). Daqui resulta a conclusão de uma coisa são os requisitos de opção pelo RETGS e que constituem os pressupostos legais de que depende a formulação da opção pela aplicação deste regime que constam elencados do nº 2 do n.º 3 do artº. 63º do Código do IRC e outra coisa, e diferente, são os requisitos para a inclusão de sociedades no âmbito do RFTGS e que são os que constam do nº. 4 da mesma disposição legal, como já referido.

XXXIIª). O regime especial de tributação dos grupos de sociedade não se confina ao artº. 63º do Código do IRC: integra toda a Subsecção II (sob a epígrafe “regime especial de tributação dos grupos de sociedades”) da Secção VI (“Disposições comuns e diversas”) do Capítulo III (“Determinação da matéria coletável”) do Código do IRC, a qual é composta pelos artºs. 63º a 65º inclusive (atualmente pelos artºs 69º a 71º).

XXXIIIª). É certo que os Grupos numa relação de domínio absoluto, com uma participação superior a 90% é que podem optar pelo RETGS, tendo o legislador logo de início definido este requisito aquando da criação do regime de tributação pelo lucro consolidado, no artº. 1º do DL 414/87 de 31 de dezembro, mas no que respeita à integração no perímetro de consolidação de sociedade que apresentem prejuízos fiscais há mais de três anos, a lei apenas introduziu no sistema jurídico o requisito da detenção no ano de 2001 com a Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro, como referido.

XXXIVª). O que o legislador não fez - e faz a Administração Fiscal e o Tribunal recorrido, alterando a lei e criando um novo requisito que o legislador não introduziu - que a detenção na sociedade com prejuízos incluída no perímetro seja detida (i) há mais de dois anos (requisito que consta da lei) (ii) na proporção de montante superior a 90% do capital social (requisito que não está na lei).

XXXVª). Do elemento sistemático, e atendendo ao facto do intuito legal de prevenir a evasão e fraude fiscal, resulta que pretendeu-se com esta norma impedir a redução da carga fiscal e consequente perda de receita fiscal impondo um limite temporal de detenção da participada no caso de ela apresentar prejuízos há mais de três anos. Se o legislador quisesse também ter imposto um limite de detenção de percentagem do capital pelo período anterior ao do início da aplicação do regime, tê-lo-ia feito, e não fez.

XXXVIª). E a mesma conclusão se impõe recorrendo ao elemento histórico o qual se aduz dos sucessivos diplomas legislativos já aqui referidos.

XXXVIIª). De onde se conclui que a sentença recorrida vem sustentada em erro de facto e de direito, por errónea interpretação e aplicação do direito.

XXXVIIIª). A interpretação que o Tribunal a quo apresenta fere a unidade do sistema jurídico tributário pois é incompatível com todo o regime legal relativo quer (i) aos demais aspetos do RETGS, constantes dos artºs. 63º a 65º do Código do IRC (atuais 69º a 71º do Código do IRC) e ao (ii) regime de dedução dos prejuízos fiscais, constante do artº. 47º do Código do IRC (atual artº 52) e (iii) da transmissibilidade de prejuízos fiscais constante do artº. 69º do Código do IRC (atual artº. 75º).

XXXIXª). O “regime específico de dedução dos prejuízos fiscais” no âmbito do RETGS consta do artº. 65º do Código do IRC (atual artº. 71º). O artº. 63º que aqui tem sido invocado reporta-se ao “âmbito e condições de aplicação”. E, ainda que por hipótese, a interpretação do Tribunal a quo estivesse correta, ela é incompatível com o regime legal especificamente estabelecido no artº. 65º (atual artº. 71º do Código do IRC e com as regras do artº. 47º do mesmo Código, relativas à dedução, em geral, de prejuízos fiscais. Como aqui se demonstra:

XLª). No art 65º do Código do IRC a lei prevê que, nas condições de aplicação do RETGS, ou seja, quando seja aplicável o regime estabelecido no artº. 63º, na dedução de prejuízos fiscais prevista no artº. 47º, observa-se ainda o seguinte, sem qualquer referência a percentagens de capital detido:
a) Os prejuízos das sociedades do grupo verificados em exercícios anteriores ao do início de aplicação do regime só podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da sociedade a que respeitam;
b) Os prejuízos fiscais do grupo apurados em cada exercido do período de aplicação do regime só podem ser deduzidos aos lucros tributáveis do grupo;
c) Terminada a aplicação do regime relativamente a uma sociedade do grupo, não são dedutíveis aos respetivos lucros tributáveis os prejuízos fiscais verificados durante os exercícios em que o regime se aplicou, podendo, porém, ainda ser deduzidos, nos termos e condições do nº 1 do artº. 47º, os prejuízos a que se refere a alínea a) que não tenham sido totalmente deduzidos ao lucro tributável do grupo;
d) Quando houver continuidade de aplicação do regime após a saída de uma ou mais sociedades do grupo, extingue-se o direito à dedução da quota-parte dos prejuízos fiscais respeitantes àquelas sociedades. 2- Quando, durante a aplicação do regime, haja lugar a fusões entre sociedades do grupo ou uma sociedade incorpore uma ou mais sociedades não pertencentes ao grupo, os prejuízos das sociedades fundidas verificados em exercícios anteriores ao do início do regime podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da nova sociedade ou da sociedade incorporante, desde que seja obtida a autorização prevista no artº. 69º.
3- Na dedução dos prejuízos fiscais devem ser primeiramente deduzidos os apurados há mais tempo.”

XLIª). Mais: numa perspetiva interpretativa ao abrigo da unidade do sistema jurídico-tributário (conforme consta dos artºs. 11º da LGT e 9º do Código Civil) não se justifica - nem se explica - que o legislador tivesse permitido a dedutibilidade de prejuízos de uma sociedade em que o respetivo capital social se alterou na percentagem de 50%, como o faz na norma do artº. 47º, nº 8 do Código do IRC (atual artº. 65º, nº 8) e impusesse, no caso de tributação de grupos, que a detenção tivesse de ser superior a 90% nos exercícios anteriores ao da aplicação do regime. Se assim fosse, o legislador estaria a permitir a dedução de prejuízos fiscais no ano de aquisição em percentagem superior a 50% e a impedir a dedução no caso de participadas no RETGS em percentagem a 90%! É que a utilização de prejuízos fiscais individuais e consolidados (no âmbito do RETGS) obedece aos requisitos estipulados nos artº. 47º e 65º do CIRC.

XLIIª). E, de acordo com a alínea a) do nº 1, do artº 65º do Código do IRC, os prejuízos fiscais das sociedades do grupo referentes a exercícios anteriores ao do inicio de aplicação do regime podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da sociedade a que respeitam e, por outro lado, de acordo com a alínea b), do nº 1, do mesmo artº, os prejuízos fiscais do grupo apurados em cada exercício de aplicação do regime só podem ser deduzidos aos lucros tributáveis do grupo. Em parte alguma a lei introduz a exigência da detenção de percentagens do capital.

XLIIIª). E, determinando-se que a Recorrente prestou garantia indevidamente, deverá ser-lhe reconhecida a peticionada indemnização, nos termos constantes do artº. 53º da LGT.

XLIVª). Do exposto se conclui que, devendo a sentença ser anulada, pelos vícios suficientemente demonstrados, deve também ser declarado ilegal o imposto em crise, assim se dando provimento ao recurso e se anulando o ato tributário.

Nestes termos e nos mais de direito aplicáveis, e sempre com o mui douto suprimento de VV. Exas. requer-se que seja dado provimento ao presente recurso, anulando-se a sentença recorrida, por estarem demonstrados os fundamentos de anulação da mesma e dos atos tributários ordenados manter por aquela.
Com o que se fará JUSTIÇA

2.O MºPº emitiu o parecer que consta de fls. 685 no qual se pronuncia pela incompetência deste STA, em razão da hierarquia, uma vez que na conclusão XI das alegações invoca que a relação de domínio com a participada foi sempre de domínio absoluto desde a sua aquisição, sendo certo que do probatório apenas resulta a aquisição de 70% do capital que depois passou para 69,58%. Assim, porque tal matéria não tem tradução no probatório, a questão não pode considerar-se exclusivamente de direito.

3. Ouvidas as partes sobre esta questão, veio a recorrente dizer que este STA é competente para conhecer do recurso, uma vez que a questão suscitada não traduz divergência com a prova dos autos, antes a mesma tendo suporte na sentença recorrida (v. fls. 692/694).

4. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:

A). A impugnante desenvolve a atividade de importação/comércio de veículos automóveis, tratando-se de sociedade anónima constituída em 17/05/1993, abrangida pelo regime especial de tributação de grupos de sociedades (REGTS), e enquadrada no regime normal com periodicidade mensal, a nível do IVA (Docs. 4 e 5 da RI e PAT apenso).

B). Optou pela aplicação do RETGS em 22/03/2007, com início no dia 01/01/2007, respeitante ao período de tributação de 2007 (Doc. 5 da P1 e PAT apenso).

C). Para efeitos de aplicação do RETGS, o grupo era composto pela impugnante e por sociedade por ela participada, na totalidade do seu capital social, designada “B…….., S.A.” (B……..) (Doc. 5 da P1 e PAT apenso).

D). Em todo o exercício de 2007, a percentagem de participação detida pela impugnante sobre a dominada “B…….” era de 100%, tendo comprado as respetivas ações no dia 22.03.2005 (Docs. 5 e 19 da P1 e PAT apenso).

E). A impugnante adquiriu a participação na “B……..”, quando esta se denominava “D…………, Lda.”, em 10/12/2003, por escritura pública de divisão, cessão de quotas e alteração parcial do contrato social, passando a pertencer-lhe na proporção de 70% (Docs. 5 e 20 da P1 e PAT apenso).

F). Em assembleia-geral da participada B……., deliberou-se aumentar o respetivo capital e alterar a firma, formalizado por escritura pública de 04/03/2005, passando a impugnante a deter a proporção de 69,58% (Docs. 5 e 22 da P1 e PAT apenso).

G). Por virtude desta mesma escritura, a sociedade foi transformada em sociedade anónima, alterou a firma, passando a adotar a denominação social que ainda hoje apresenta, que é “B…….., S.A.” (B……..) (Docs. 7 e 22 da P1 e PAT apenso).

H). A B…… apresentou prejuízos fiscais do exercício de 2007 no valor de € 3.533.076,42, que evoluíram da seguinte forma:
1. No exercício de 2003: €25.031,47;
2. No exercício de 2004: €63.185,22;
3. No exercício de 2005: €219.101,46;
4. No exercício de 2006: €883.213,98.
5. No exercício de 2010: €3.533.076,42. (Doc. 25 da P1 e PAT apenso).

I). No cumprimento da ordem de serviço n.º 01200900105, datada de 06102/2009, a impugnante foi alvo de procedimento de inspeção interna à declaração de rendimentos modelo 22, referente ao exercício económico de 2007 (Doc. 4 da P1 e PAT apenso).

J). Na sequência deste procedimento e em cumprimento da Ordem de Serviço n.º OI200900255, datada de 18/05/2009, procedeu-se à inspeção interna, de âmbito parcial, aos elementos contabilístico-fiscais do grupo A’’……. referentes ao exercício de 2007 (Doc. 5 da P1 e PAT apenso).

K). Do respetivo relatório, constante de fls. 128/144, e que se dá aqui por integralmente reproduzido, juntamente com os respetivos anexos constantes do PAT apenso, destaca-se o seguinte:
“As sociedades A……. e B…….. optaram pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, comunicando-o à DGCI através da entrega, em 22103/2007, da competente declaração de opção, nos termos da alínea a) do nº 7 do artº. 63º do CIRC, atual art. 69º, conjugado com a circular nº 4/2001, de 14/02 da DGCI. Da declaração apresentada consta a opção por aquele regime, com início de aplicação em 01/01/2007, respeitante ao exercício de 2007, bem como a identificação das sociedades do grupo, cuja composição integra, para além da A……, na qualidade de sociedade dominante, a B…….. na qualidade de única sociedade dominada. De acordo com o regime especial de tributação dos grupos de sociedades, consignado no artigo 63.º e seguintes do CIRC, com a redação dada pela Lei nº 109-B/2001, de 29/12, atual artigo 69º, podem beneficiar deste regime os sujeitos passivos que reúnam os respetivos requisitos legais, bastando, para o efeito, e uma vez que a sua aplicação não carece de qualquer autorização, comunicar a respetiva opção nos termos da alínea a) do nº 7 daquele dispositivo legal. Sucede, porém, e no que concerne aos requisitos legais de aplicabilidade daquele regime especial de tributação, que a alínea c) do nº 4 do art. 63º do CIRC exclui do seu âmbito de aplicação as sociedades que registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da sua aplicação, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos. No que respeita à interpretação deste normativo, importa realçar que o regime especial de tributação dos grupos, inicialmente introduzido no sistema fiscal português através do DL 414/87, de 31/12, caracteriza-se por tratar os grupos de sociedades como uma unidade económica para efeitos de tributação. A sua fundamentação reside, assim, no princípio da neutralidade fiscal e da capacidade contributiva do grupo, enquanto concretizações do princípio da igualdade, de acordo com o qual se procura tributar de igual forma, em função da capacidade contributiva manifestada por uma determinada realidade económica e independentemente da estrutura funcional que lhe está subjacente. Este regime especial sofreu uma reformulação profunda com a reforma da tributação do rendimento, efetuada pela Lei nº 30-G/2000, de 29/12, a qual introduziu novos requisitos de aplicabilidade, aprovando a referida alínea c) do nº 4 do citado normativo legal, segundo a qual, não podem fazer parte do grupo as sociedades que registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos”, conforme redação dada pela Lei nº 109-B/2001, de 27/12, com natureza interpretativa de acordo com o nº 2 do art. 22º da Lei nº 16-A/2002, de 31/05. A introdução daquela alínea c) pela Lei nº 30-G/2000, de 29/12, teve em vista reforçar, no âmbito daquele regime especial de tributação dos grupos, o combate á evasão e fraude fiscais, de acordo com o princípio da igualdade que lhe está subjacente. Assim, e nos termos da referida alínea c) do nº4 do artº. 63º do CIRC, atual artº. 69º, as sociedades que tenham registado prejuízos nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades só podem fazer parte do grupo se forem detidas pela sociedade dominante há mais de dois anos. Ora, de acordo com o nº 2 do artº. 63º do CIRC, atual ad, 69º, existe um grupo de sociedades quando a sociedade dominante detém pelo menos 90% do capital de outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto. Assim sendo, e de acordo com a noção de grupo de sociedades relevante para efeitos do regime especial de tributação, entende-se que a participação a que se refere a alínea c) do nº 4 do art. 63º do CIRC, atual artº 69º, é de pelo menos 90% do capital social. Por fim, e para que a sociedade dominada não seja excluída do âmbito de aplicação daquele regime especial de tributação, é necessário que as suas participações sociais sejam detidas pela sociedade dominante nos moldes supra referidos há mais de dois anos a contar do inicio do respetivo período de tributação, no caso à data de 01/01/2007. No que respeita ao enquadramento jurídico-tributário da situação em análise, verifica-se que a sociedade B…….., na qualidade de sociedade dominada, registou prejuízos fiscais nos exercícios de 2004 a 2006, conforme tabela abaixo:




Quadro 7- Apuramento do Lucro Tributável
2004
2005
2006
2007
Resultado liquido do exercício
201
-63185,22
-284.129,85
-2.473.242,58
-1927.122,20
Prejuízo para efeitos fiscais
239
-63,185,22
-219.101,46
-883.213,98
-3.533.076,42
Lucro tributável
240
0,00
0,00
0,00
0,00


Mais se verifica que a 01/01/2007, data em que os sujeitos passivos pretendiam iniciar a aplicação daquele regime especial de tributação, o capital social da sociedade dominada B…… não era ainda detido pela sociedade dominante A…… na proporção de pelo menos 90% há mais de dois anos. Conforme os factos descritos no ponto anterior, só em 22 de março de 2005, a A…… passou a deter pelo menos 90 % do capital social da A.......IJ, pois foi nesta data que se realizou a venda de 14.910 ações da B……, entre a A…… SA e a C…….. e das 300 ações, detidas por pessoas singulares, passando a participação financeira da A…… na B……. de 70% para 100% do capital desta. Uma vez que a sociedade dominada só passou a ser detida pela sociedade dominante do grupo naquela proporção legal a partir de 22 de março de 2005, é forçoso concluir que a 01/01/2007, data de inicio do período de tributação em análise, ainda não tinham decorrido 2 anos sobre essa detenção. De acordo com as razões de facto e de direito supra expostas, conclui-se que no período de tributação de 2007 não estão preenchidos os requisitos legais para aplicação daquele regime especial de tributação às sociedades em apreço uma vez que a única sociedade dominada se encontra na situação expressamente prevista na alínea c) do n.º 4 do artigo 63º do CIRC, atual artº. 69º.

111.2 Consequências do enquadramento jurídico-tributário apresentado

O facto de não estarem reunidos os requisitos legais de aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades, nos moldes pretendidos pelo sujeito passivo, implica que a declaração de rendimentos modelo 22 apresentada para o Grupo não produza quaisquer efeitos, devendo liquidar-se IRC na esfera individual de cada uma daquelas sociedades de acordo com o regime geral de tributação.
Sucede que a declaração modelo 22 entregue em nome da sociedade A……. foi objeto de correções propostas pela inspeção tributária efetuadas quer ao nível do lucro tributável, no montante de €24.579,34, quer ao nível do cálculo do imposto, no montante de € 28.215,12, aquando da realização do procedimento inspetivo na esfera individual, conforme discriminado no respetivo relatório de inspeção do qual se junta uma cópia no anexo 4.
Da análise à declaração modelo 22 do grupo entregue em 28-05-2008 pela sociedade A....., na qualidade de sociedade dominante, bem como às declarações Modelo 22 de cada uma das sociedades individuais, contemplando-se já aqui as correções efetuadas na esfera da sociedade A…… supra descritas, resulta que o lucro tributável das sociedades A…… e B……. individualmente e em grupo é o que se discrimina no quadro abaixo:


DESIGNAÇÃOA…… individual B……. individual A’’…. Grupo
NIPC…………....……………………..



LUCRO TRIBUTÁVEL/
PREJUIZO FISCAL
10.532.218,83
- 3.533.076,42
- 6.999.142,41


Atendendo a que o pretendido regime especial de tributação dos grupos de sociedades não é aplicável aos sujeitos passivos no período de tributação de 2007, conforme supra se concluiu, não poderá o prejuízo fiscal registado na esfera individual da sociedade B……, no valor de €3.533.076,42, ser integrado no lucro tributável da sociedade A……., no valor de € 10,532.218,83 (10.507.639,49 + 24.579,34), e gerar um lucro tributável agregado de €6.999.142,41 (tal como seria pretensão do sujeito passivo). Assim sendo, no exercício em referência, a A……. deverá ser tributada com base no lucro tributável obtido em termos individuais, ou seja no valor de € 10.532.218,83, enquanto que a B……. deverá reportar o prejuízo fiscal obtido, no valor de € 3.533.076,42, para exercícios posteriores, podendo vir a deduzi-los ao lucro tributável do grupo a partir de 2008 com as limitações impostas pela alínea a) do n.º 1 do artigo 65.º do mesmo diploma” (Doc. 5 da P1 e PAT apenso).

L). No dia 04/05/2010, foi emitida a demonstração de liquidação de IRC com o n.º 20108310002608, da qual resulta o valor a pagar pela impugnante de € 1.060.124,60 (Doc. 1 da P1).

M). No dia 05/05/2010, foram emitidas demonstração de liquidação de juros compensatórios nos valores de €68.063,13 e €3.709,73, e a demonstração de acerto de contas n.º 201000000242238, da qual resultou o valor a pagar pela impugnante de € 1.003.418,75, com data limite de pagamento voluntário no dia 14/06/2010 (Docs. 2 e 3 da P1).

N). Para cobrança coerciva do valor liquidado de € 1.003.418,75 e respetivos juros demora, foi instaurada a execução fiscal n.º 3522201001078453, no Serviço de Finanças de Oeiras -3 (Doc. 26 da P1).

O). No dia 27/07/2010, a impugnante recebeu notificação do Serviço de Finanças de Oeiras -3 para prestação de garantia idónea no âmbito da referida execução fiscal, no montante de € 1.285.773,39 (Doc. 27 da P1).

P). No dia 09.08.2010, a impugnante apresentou junto do Serviço de Finanças de Oeiras - 3 garantia bancária, no montante de € 1.285.773,39 (Doc. 28 da P1).

Q). A Direção de Serviços de IRC emitiu, no dia 08/04/2011 a informação n.º 750/11, sancionada pelo substituto do Diretor-Geral dos Impostos no dia 19/04/2011, da qual consta o seguinte:
“5. As viaturas ligeiras de competição são viaturas especiais porque se destinam ao desempenho de função diferente do normal transporte de passageiros (...)
6. Estas viaturas ligeiras de competição não podem circular na via pública uma vez que o Código da Estrada só admite a circulação de automóveis desde que matriculados e estas viaturas ao serem transformadas podem deixar de estar conformes com o Regulamento da Homologação CE de Modelos de Automóveis e Reboques Seus Sistemas e Unidades Técnicas.
7. Nestes termos estas viaturas ligeiras de competição são nos termos do Código da Estrada consideradas viaturas especiais porque não se destinam ao normal transporte de passageiros e não podem circular na via pública
8. O legislador fiscal ao referir-se, na legislação anteriormente indicada, a viaturas ligeiras de passageiros teve como intenção regular, para efeitos de reintegrações e tributação autónoma a situação normal de utilização destas viaturas ou seja quando são utilizadas no normal transporte de passageiros.
9 A limitação de um valor (custo de aquisição ou valor de reavaliação) na altura € 29.927,87 a partir do qual não se aceita a reintegração da viatura ligeira de passageiros e a tributação autónoma das respetivas despesas dedutíveis resultaram, respetivamente da limitação da dedutibilidade fiscal das reintegrações destes bens e da consequente diminuição do IRC devido até um valor de aquisição considerado razoável e do facto deste tipo de bens serem utilizados, em regra, não apenas para fins empresariais mas também para fins particulares dos seus utilizadores sócios e/ou trabalhadores.
10. Assim, não sendo admissível a utilização das viaturas de competição no normal transporte de passageiros parece-nos que não serão de enquadrar nos referidos normativos legais (artigos 33º e 81º do CIRC).
11. Atendendo que para estas viaturas não se encontram fixadas taxas de reintegração nas tabelas anexas ao DR 2/90, de 12/1, deve-lhes ser aplicável o n.º 3 do artigo 5º deste diploma.
12. Tem sido entendido como razoável (Proc. 1177/2000 Despacho de 2002109/23 do SDG), para este tipo de Viaturas, considerar-se o período de utilidade esperada de três anos pelo que poderá ser praticada e aceite uma taxa de reintegração máxima de 33,33%.
13. A aceitação fiscal da reintegração destas viaturas de competição nos termos do artigo 23º do OIRO mostra-se assegurada no caso concreto por a marca das viaturas de competição ser Idêntica ás viaturas comercializadas e com a sua participação em provas desportivas procura-se independentemente do resultado obtido, a obtenção de um incremento do numero de unidades vendidas.
14. Se no decurso do período de vida útil estas viaturas tivessem ficado inoperacionais devido ao maior desgaste a que se encontram sujeitas ou à perda de utilidade competitiva num espaço de tempo mais curto, provocando uma desvalorização física, poderia ter sido solicitada a sua reintegração excecional, nos termos do artigo 10º do DR 2/90, de 12/1, correspondente ao seu valor liquido contabilístico a data da desvalorização” (fls. 493/498).

5. Colhidos os vistos legais cabe agora decidir.

6. Antes de mais cabe conhecer da questão prévia da incompetência deste STA, em razão da hierarquia, para conhecer do recurso.

Ora, sem necessidade de grandes considerações, desde já se dirá que se acompanha o entendimento da recorrente constante de fls. 692/695

Na verdade, entende-se que a única questão a discutir nos autos é meramente de direito - saber se o artº 63º, nº 4, alínea c) do CIRC, em vigor à data dos factos, exigia também a detenção, por parte da recorrente, de pelo menos 90% do capital da sociedade dita dominada.

E, com o devido respeito, o probatório permite responder a essa questão, sendo certo que nenhuma outra se coloca no recurso.

Sendo assim, improcede a referida questão prévia.

7. Vejamos então se o artº 63º, nº 4, alínea c) do CIRC consente a interpretação que foi seguida na decisão recorrida ou, pelo contrário, é a tese da recorrente que tem apoio legal.
Da resolução desta questão depende ainda decidir sobre o pedido de indemnização por prestação de garantia indevida (v. conclusão XLIIIª) ).

7.1. Na decisão recorrida ficou escrito, para além do mais, o seguinte:

“Temos, assim, que para aplicação do RETGS se impõe:
- que a sociedade dominante detenha, direta ou indiretamente, pelo menos 90% do capital da sociedade dominada;
- que esta participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto.

Cumpre então saber se é aplicável ao caso dos autos o regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RETGS), em função da factualidade dada como assente.
Nesta sede, apurou-se com relevo que a impugnante optou pela aplicação do RETGS em 22.03.2007, com início no dia 01/01/2007, respeitante ao período de tributação de 2007, sendo o grupo composto por si e por sociedade por ela participada, na totalidade do seu capital social, designada “B…….., S.A.” (B……..). Mais se apurou que, em todo o exercício de 2007, a percentagem de participação detida pela impugnante sobre a dominada “B…….” era de 100%, tendo comprado as respetivas ações no dia 22/03/2005.
Anteriormente, em 10.12.2003, a impugnante adquiriu participação na “B…….”, quando esta se denominava “D…….., Lda.”, passando a pertencer-lhe na proporção de 70%.
Mais se provou que a sociedade dominada apresentou prejuízos fiscais nos anos de 2003, 2004, 2005 e 2006, atingindo no exercício de 2007 o valor de €3.533.076,42.
Decorre do já citado artigo 63.º, n.º 4, alínea c), do CIRC, que não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos.
Para a impugnante, não se extrai desta norma que a sociedade participada tenha de ser detida em mais de 90% do seu capital pela sociedade dominante, durante os dois anos precedentes ao da aplicação do regime, mas apenas que a participada seja detida pela sociedade dominante há mais de dois anos.
Já para a administração tributária, como antes assinalado, a leitura do n.º 4 tem de ser integrada e conjugada com a definição de participação que consta do n.º 2, a detenção superior a 90% do capital da participada.

Salvo o devido respeito, a posição que aqui vem sustentada pela impugnante quanto ao normativo em questão não é a que melhor apoio encontra na respetiva letra e espírito, considerando-se também a unidade do sistema jurídico, conforme já salientou a Digna Magistrada do Ministério Público no parecer antecedente.

…Isto posto, em primeiro lugar não se duvida que aquela alínea c) tem necessariamente de ser lida no contexto do artigo e regime em que se integra. Assim, desconstruindo a norma, para efeito da exclusão da sujeição ao regime especial, temos como pressupostos:
- a existência de prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime;
- tratando-se de sociedade dominada, a participação seja detida pela sociedade dominante há menos de dois anos.
Deste modo, passe a evidência, se a participação da sociedade dominante na sociedade dominada é detida há mais de dois anos, não ocorre a sobredita exclusão.
Ora, ao aludir-se a participação, da sociedade dominante na sociedade dominada, falamos de uma mera detenção do capital, ou de uma detenção nos termos previstos para a sujeição a este regime?
E a resposta mais adequada não pode deixar de ser a segunda, porquanto a sujeição a este regime especial está dependente, como já vimos e para além do mais, da detenção pela sociedade dominante de pelo menos 90% do capital da sociedade dominada.
Deste modo, existindo prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, o legislador instituiu um requisito adicional para se manter a sujeição ao RETGS, qual seja o da detenção da participação ocorrer há mais de dois anos.
Mas com isto não se olvidam os requisitos anteriores para efeito da sujeição a este regime especial mormente a sobredita detenção de pelo menos 90% do capital da sociedade dominada.
Nem se diga, com a impugnante, ser esta posição incompatível com o preceituado no artigo 65.º do CIRC.
É que, sendo verdade estar ali criado um regime específico de dedução de prejuízos fiscais aplicável ao referido RETGS, sem que se faça qualquer referência a percentagens de capital detido, o artigo 63º, nº 4, alínea c), prevê a ocorrência de uma circunstância distinta, qual seja, a da existência de prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime.
Na verdade, o que se afasta com a previsão da alínea c) do nº 4 do artigo 63º é o requisito previsto na alínea b) do nº 3, pois que aqui se prevê a necessidade da detenção da participação na sociedade dominada ocorrer há mais de um ano, por referência à data em que se inicia a aplicação do regime, enquanto ali se passa tal exigência para dois anos.

Mas da mesma forma que a verificação dos requisitos previstos no n.º 3 assenta na prévia existência dos pressupostos a que alude o n.º 2, a alínea c) do n.º 4 igualmente não pode deixar de pressupor que a participação seja aquela ali prevista, como pressuposto da sujeição ao RETGS.
De facto, como se observa no relatório da segunda ação inspetiva, pretendeu-se aqui evitar que a aquisição das participações sociais tivesse como principal motivação deduzir ao lucro tributável do grupo o prejuízo fiscal da nova sociedade, para obviar ao perigo de evasão fiscal.
Nem cremos que outra opção legislativa se poderia aqui equacionar, posto que cabia reforçar o balizamento deste regime especial, com a imposição de um requisito adicional sem olvidar os pressupostos da sujeição ao RETGS (e não de um requisito alternativo que afastasse a necessidade de se verificar aquele pressuposto), no caso de existirem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do inicio da aplicação do regime.
…Com isto somos de concluir que, não detendo a impugnante participação superior a 90% do capital da sociedade dominada há mais de dois anos a contar da aplicação do regime, tinha de se considerar excluída do grupo a sociedade participada.
Daqui resulta, sendo o grupo de sociedades constituído por esta e pela impugnante, como sociedade dominante, não ter aqui aplicação o regime especial de tributação dos grupos de sociedades”.

7.2. A recorrente, por sua vez, defende o entendimento contrário, louvando-se na seguinte argumentação:

A detenção de níveis de participação mínimos de 90% exigidos pelo nº 2 do artigo 63º do Código do IRC (redação ao tempo) reporta-se ao início de aplicação ao regime e não, retroactivamente, a períodos anteriores.

De facto, uma coisa são os requisitos de opção pelo RETGS e que constituem os pressupostos legais de que depende a formulação da opção pela aplicação deste regime que constam elencados do nº 2 do nº 3 do artº. 63º do Código do IRC e outra coisa, e diferente, são os requisitos para a inclusão de sociedades no âmbito do RETGS e que são os que constam do nº 4 da mesma disposição legal.

Ora, no caso da Recorrente estavam verificados todos os requisitos do RETGS aquando da aplicação do regime, nada tendo as Autoridades Tributárias referenciado quando a mesma declarou tal opção.

Este entendimento resulta quer do elemento literal, quer do elemento lógico e histórico da norma.

Do ponto de vista da mens legis, convém trazer à consideração que o diploma legal que introduziu o regime de tributação pelo lucro consolidado na legislação portuguesa, posteriormente designado RETGS, foi o DL 414/87 de 31.12, cujo intróito diz o seguinte: “com a publicação do código das sociedades comerciais foi estabelecida a regulamentação das sociedades coligadas. (...) Deu-se, assim, tratamento no direito comercial a uma realidade económica (...). Importa agora retirar dessa disciplina as consequências fiscais necessárias (...) como uma unidade económica para efeitos de tributação nos impostos sobre o rendimento.” (sublinhado nosso).

Posteriormente, o Código do IRC, na sua versão inicial, veio a acolher este mesmo regime de tributação do rendimento dos grupos de sociedade, tendo-o consagrado no seu artº. 59º e seguintes e cedo foram introduzidas alterações ao regime de consolidação, de que são exemplo as da Lei 71/1993, de 26 de novembro, da Lei 52-096 de 27 de dezembro, da Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro e da Lei 109-B/2001 de 27 de dezembro (apenas se referem, por pertinentes ao caso, as alterações ocorridas até ao ano em que a correção ora em crise foi efetuada). Também a Lei nº 53-A/2006, de 29 de dezembro (Lei do OE/07), introduziu alterações no regime que entraram em vigor em 01 de janeiro de 2007.

A exclusão do perímetro da consolidação das sociedades com prejuízos fiscais foi introduzida pela Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro no então artº. 59º do Código do IRC (posterior artº. 63º que vem sendo referido e que atualmente, após a renumeração do Decreto-Lei 159/2009 de 13 de julho, constitui o artº. 69º). Posteriormente a redação desta norma foi alterada pela Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro.
De salientar que a Lei que introduziu esta norma, a Lei 30-G/2000, contém evidenciado de forma explícita o intuito do legislador, sem margem para dúvidas, porque ela própria o refere: “Reforma a tributação do rendimento e adota medidas destinadas a combater a evasão e fraude fiscais, alterando o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, o Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas, o Estatuto dos Benefícios Fiscais, a Lei Geral Tributária, o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o Código de Procedimento e de Processo Tributário e legislação avulsa”.

Afigura-se clara e pacificamente aceite a finalidade subjacente a esta medida: evitar situações de abuso fiscal em que a inclusão de sociedades no grupo apenas tinham como objetivo, por via da utilização dos respetivos prejuízos fiscais reportáveis, a diminuição do imposto devido pelo lucro e, em consequência, a diminuição da receita fiscal, já que o regime introduzido com o RETGS passou a ser bastante mais favorecedor no que toca à dedução dos prejuízos fiscais gerados durante a aplicação do regime do que o anterior regime do lucro consolidado pois passou a permitir a compensação integral dos prejuízos fiscais gerados no ano mas passou a ser mais exigente e até restritivo para que uma sociedade possa integrar o grupo.

E, assim, entre as restrições de entrada de uma sociedade no perímetro do RETGS, passou, precisamente, a contar-se a que nos ocupa: a lei passou a impor um prazo mínimo para a inclusão no grupo de sociedades com prejuízos fiscais reportáveis, tendo-o positivado na alínea c) do número 4 do artº. 63º do Código do IRC: passou a impedir-se a integração no grupo fiscal de sociedades que, à data de início da aplicação do regime, registem prejuízos fiscais há mais de três exercícios, mas excecionou as sociedades dominadas, cuja participação pela sociedade dominante fosse detida há mais de dois anos.

Daqui resulta a conclusão de uma coisa são os requisitos de opção pelo RETGS e que constituem os pressupostos legais de que depende a formulação da opção pela aplicação deste regime que constam elencados do nº 2 do n.º 3 do artº. 63º do Código do IRC e outra coisa, e diferente, são os requisitos para a inclusão de sociedades no âmbito do RFTGS e que são os que constam do nº. 4 da mesma disposição legal, como já referido.

É certo que os Grupos numa relação de domínio absoluto, com uma participação superior a 90% é que podem optar pelo RETGS, tendo o legislador logo de início definido este requisito aquando da criação do regime de tributação pelo lucro consolidado, no artº. 1º do DL 414/87 de 31 de dezembro, mas no que respeita à integração no perímetro de consolidação de sociedade que apresentem prejuízos fiscais há mais de três anos, a lei apenas introduziu no sistema jurídico o requisito da detenção no ano de 2001 com a Lei 30-G/2000 de 29 de dezembro, como referido.

O que o legislador não fez - e faz a Administração Fiscal e o Tribunal recorrido, alterando a lei e criando um novo requisito que o legislador não introduziu - que a detenção na sociedade com prejuízos incluída no perímetro seja detida (i) há mais de dois anos (requisito que consta da lei) (ii) na proporção de montante superior a 90% do capital social (requisito que não está na lei).

Também do elemento sistemático, e atendendo ao facto do intuito legal de prevenir a evasão e fraude fiscal, resulta que se pretendeu com esta norma impedir a redução da carga fiscal e consequente perda de receita fiscal impondo um limite temporal de detenção da participada no caso de ela apresentar prejuízos há mais de três anos. Se o legislador quisesse também ter imposto um limite de detenção de percentagem do capital pelo período anterior ao do início da aplicação do regime, tê-lo-ia feito, e não fez.

E a mesma conclusão se impõe recorrendo ao elemento histórico o qual se aduz dos sucessivos diplomas legislativos já aqui referidos.

De onde se conclui que a sentença recorrida vem sustentada em erro de facto e de direito, por errónea interpretação e aplicação do direito, sendo que a interpretação que o Tribunal a quo apresenta fere a unidade do sistema jurídico tributário pois é incompatível com todo o regime legal relativo quer (i) aos demais aspetos do RETGS, constantes dos artºs. 63º a 65º do Código do IRC (atuais 69º a 71º do Código do IRC) e ao (ii) regime de dedução dos prejuízos fiscais, constante do artº. 47º do Código do IRC (atual artº 52º) e (iii) da transmissibilidade de prejuízos fiscais constante do artº. 69º do Código do IRC (atual artº. 75º).

O “regime específico de dedução dos prejuízos fiscais” no âmbito do RETGS consta do artº. 65º do Código do IRC (atual artº. 71º). O artº. 63º que aqui tem sido invocado reporta-se ao “âmbito e condições de aplicação”. E, ainda que por hipótese, a interpretação do Tribunal a quo estivesse correta, ela é incompatível com o regime legal especificamente estabelecido no artº. 65º (atual artº. 71º do Código do IRC e com as regras do artº. 47º do mesmo Código, relativas à dedução, em geral, de prejuízos fiscais. Como aqui se demonstra:

No art 65º do Código do IRC a lei prevê que, nas condições de aplicação do RETGS, ou seja, quando seja aplicável o regime estabelecido no artº. 63º, na dedução de prejuízos fiscais prevista no artº. 47º, observa-se ainda o seguinte, sem qualquer referência a percentagens de capital detido:
a) Os prejuízos das sociedades do grupo verificados em exercícios anteriores ao do início de aplicação do regime só podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da sociedade a que respeitam;
b) Os prejuízos fiscais do grupo apurados em cada exercido do período de aplicação do regime só podem ser deduzidos aos lucros tributáveis do grupo;
c) Terminada a aplicação do regime relativamente a uma sociedade do grupo, não são dedutíveis aos respetivos lucros tributáveis os prejuízos fiscais verificados durante os exercícios em que o regime se aplicou, podendo, porém, ainda ser deduzidos, nos termos e condições do nº 1 do artº. 47º, os prejuízos a que se refere a alínea a) que não tenham sido totalmente deduzidos ao lucro tributável do grupo;
d) Quando houver continuidade de aplicação do regime após a saída de uma ou mais sociedades do grupo, extingue-se o direito à dedução da quota-parte dos prejuízos fiscais respeitantes àquelas sociedades.
2- Quando, durante a aplicação do regime, haja lugar a fusões entre sociedades do grupo ou uma sociedade incorpore uma ou mais sociedades não pertencentes ao grupo, os prejuízos das sociedades fundidas verificados em exercícios anteriores ao do início do regime podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da nova sociedade ou da sociedade incorporante, desde que seja obtida a autorização prevista no artº. 69º.
3- Na dedução dos prejuízos fiscais devem ser primeiramente deduzidos os apurados há mais tempo.”

Mais: numa perspetiva interpretativa ao abrigo da unidade do sistema jurídico- tributário (conforme consta dos artºs. 11º da LGT e 9º do Código Civil) não se justifica - nem se explica - que o legislador tivesse permitido a dedutibilidade de prejuízos de uma sociedade em que o respetivo capital social se alterou na percentagem de 50%, como o faz na norma do artº. 47º, nº 8 do Código do IRC (atual artº. 65º, nº 8) e impusesse, no caso de tributação de grupos, que a detenção tivesse de ser superior a 90% nos exercícios anteriores ao da aplicação do regime. Se assim fosse, o legislador estaria a permitir a dedução de prejuízos fiscais no ano de aquisição em percentagem superior a 50% e a impedir a dedução no caso de participadas no RETGS em percentagem a 90%! É que a utilização de prejuízos fiscais individuais e consolidados (no âmbito do RETGS) obedece aos requisitos estipulados nos artº. 47º e 65º do CIRC.

E, de acordo com a alínea a) do nº 1, do artº 65º do Código do IRC, os prejuízos fiscais das sociedades do grupo referentes a exercícios anteriores ao do início de aplicação do regime podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da sociedade a que respeitam e, por outro lado, de acordo com a alínea b), do nº 1, do mesmo artigo, os prejuízos fiscais do grupo apurados em cada exercício de aplicação do regime só podem ser deduzidos aos lucros tributáveis do grupo. Em parte alguma a lei introduz a exigência da detenção de percentagens do capital.

Vejamos então qual destes entendimentos, a nosso ver, colhe o apoio legal

8. O artº 63º do CIRC, em vigor à data dos factos, estabelecia nos seus nºs 2 e 4, alínea c), respetivamente, o seguinte:

“2- Existe um grupo de sociedades quando uma sociedade, dita dominante, detém, direta ou indiretamente, pelo menos 90% do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto”. (Redação da Lei nº. 30-G/2000, de 29 de dezembro)

“4 - Não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes: (Redação da Lei nº. 30-G/2000, de 29 de dezembro)
c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos”; (Redação da Lei n.º 109-B/2001, de 27/12)

Por sua vez, o nº 3 do mesmo artigo estabelecia, para a existência de um grupo de sociedades pretendendo beneficiar deste regime especial de tributação, os seguintes requisitos cumulativos (nº 3 do artº. 69º):
· As sociedades pertencentes ao grupo deviam ter todas, sede e direcção efectiva em território português e a totalidade dos seus rendimentos estar sujeita ao regime geral de tributação em IRC, à taxa normal mais elevada;

· A sociedade dominante devia deter a participação na sociedade dominada, há mais de um ano, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime, excepto quando se trate de sociedades constituídas pela sociedade dominante há menos de um ano;

· A sociedade dominante não devia ser considerada dominada por nenhuma outra sociedade residente em território português, que reúna requisitos para ser qualificada como tal;

· A sociedade dominante não devia ter renunciado à aplicação do regime, nos três anos anteriores, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime (nº 3, alínea b) ).


O nº 4 do mesmo artigo determinava ainda o seguinte:

“4 - Não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes:
a) Estejam inativas há mais de um ano ou tenham sido dissolvidas;
b) Tenha sido contra elas instaurado processo especial de recuperação ou de falência em que haja sido proferido despacho de prosseguimento da ação;
c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos;
d) Estejam sujeitas a uma taxa de IRC inferior à taxa normal mais elevada e não renunciem à sua aplicação;
e) Adotem um período de tributação não coincidente com o da sociedade dominante;
f) O nível de participação exigido de, pelo menos, 90 % seja obtido indiretamente através de uma entidade que não reúna os requisitos legalmente exigidos para fazer parte do grupo;
g) Não assumam a forma jurídica de sociedade por quotas, sociedade anónima ou sociedade em comandita por acções”.

Em face destes preceitos temos então que, uma coisa são os requisitos para a existência de um grupo de sociedades e outra a determinação das sociedades que podem integrar esse grupo de sociedades, isto é, de quais as sociedades elegíveis para efeitos da configuração do perímetro do Grupo de Sociedades que faz a opção pelo RETGS.

E, assim, para que um grupo de sociedades possa optar pelo regime especial de tributação necessário é que exista uma sociedade (dominante), isto é, que detém, directa ou indirectamente, pelo menos 90% do capital de outra ou outras sociedades (dominadas), desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de votos - nº 2 do artº. 69º do CIRC, há mais de um ano, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime, excepto quando se trate de sociedades constituídas pela sociedade dominante há menos de um ano.

Por outro lado, o próprio artº 63º define e explicita os conceitos de sociedade dominante e de sociedade dominada para efeitos de aplicação do RETGS revelando, desse modo, que por “sociedade dominante” se deve considerar apenas aquela que detém outra a 90% e por “sociedades dominadas” se devem considerar apenas aquelas que são detidas pelo menos em 90% do capital, isto é, cuja participação for detida pela sociedade dominante em, pelo menos, 90%.

E estes conceitos, definidos no nº 2, valem para todo o preceito, para a interpretação de todos os restantes números da norma, pelo que sempre que nelas são utilizados os conceitos de "sociedade dominante" e de "sociedade dominada" há que interpretá-los de harmonia com a definição constante do nº 2.

Ora, no início da opção pela aplicação do regime - 01.01.2007 - a recorrente detinha a dominada “B……” em 100%, tendo adquirido as respectivas acções em 22.03.2005 (v. alíneas C) e D) do probatório supra). Estão então verificados os requisitos constantes do nº 2 e da alínea c) do artº 63º (como, aliás, todos os restantes do mesmo nº 3).

Vejamos agora se ocorre também o requisito do nº 4, alínea c).

De acordo com esta norma, não podem fazer parte do grupo as sociedades que, no início ou durante a aplicação do regime, se encontrem nas situações seguintes:
c) Registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, no caso das sociedades dominadas, se a participação já for detida pela sociedade dominante há mais de dois anos.

A questão que aqui se coloca é então a de saber se a participação aqui referida é a referida no nº 2 ou se basta que a sociedade dominante tenha tido o domínio da participada há mais de dois anos.

Conforme bem refere a recorrente nas conclusões XXVIIIª) e XXIXª) a finalidade subjacente a esta norma é a de evitar situações de abuso fiscal em que a inclusão de sociedades no grupo apenas tinham como objetivo, por via da utilização dos respetivos prejuízos fiscais reportáveis, a diminuição do imposto devido pelo lucro e, em consequência, a diminuição da receita fiscal.

Isto porque o regime introduzido com o RETGS passou a ser bastante mais favorecedor no que toca à dedução dos prejuízos fiscais gerados durante a aplicação do regime do que o anterior regime do lucro consolidado pois passou a permitir a compensação integral dos prejuízos fiscais gerados no ano mas passou a ser mais exigente e até restritivo para que uma sociedade possa integrar o grupo.

Assim, entre as restrições de entrada de uma sociedade no perímetro do RETGS, passou, precisamente, a contar-se a que nos ocupa: a lei passou a impor um prazo mínimo para a inclusão no grupo de sociedades com prejuízos fiscais reportáveis, tendo-o positivado na alínea c) do número 4 do artº. 63º do Código do IRC: passou a impedir-se a integração no grupo fiscal de sociedades que, à data de início da aplicação do regime, registem prejuízos fiscais há mais de três exercícios, mas excecionou as sociedades dominadas, cuja participação pela sociedade dominante fosse detida há mais de dois anos.

Ora, apesar de a norma referir “participação sem indicar percentagem, ao contrário do que fez no nº 2 e no nº 4, alínea f), tal como se escreveu na sentença recorrida, tem de entender-se que essa participação é a referida no nº 2 do mesmo artigo.

Com efeito, não faria sentido exigir a participação de pelo menos 90% do capital para efeitos de constituição do grupo e depois aceitar outra percentagem inferior que, ao abrigo do artº 486º do Código das Sociedades Comerciais, permitisse o domínio da sociedade dominada.

Aliás, esta percentagem está bem evidente quer no nº 2, quer no nº 4, alínea f), não estando presente na alínea c) do nº 4 por desnecessária, pois resulta já das outras normas.

Ora, assim sendo, e resultando da alínea E) do probatório que só a partir de 22.03.2005 a recorrente passou a deter 100% da participada, não ocorre o requisito exigido pelo artº 63º, nº 4, alínea c) para que esta pudesse fazer parte do grupo de sociedades em 2007.

Temos então, em conclusão, que:

a) Para a existência de um grupo de sociedades para efeitos fiscais é necessário que uma sociedade, dita dominante, detenha, direta ou indiretamente, pelo menos 90% do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto, há mais de um ano à data em que se inicia a aplicação do regime.

b) Relativamente às sociedades dominadas, não podem fazer parte do grupo as que, no início ou durante a aplicação do regime, registem prejuízos fiscais nos três exercícios anteriores ao do início da aplicação do regime, salvo, se a participação (exigida à sociedade dominante) já for detida há mais de dois anos, o que no caso dos autos não ocorre quanto à sociedade dominada que, registando prejuízos nos três anos anteriores ao início do regime, era detida há menos de dois anos (v. alíneas C) a F) e H) do probatório supra.

Este regime especial de tributação reveste, assim, um aspeto dinâmico podendo cessar se deixarem de se verificar as respetivas condições, mas podendo também vir a ter lugar quando as condições não reunidas em determinado momento passarem a verificar-se.

Refere a recorrente que a interpretação da sentença recorrida - e que aqui se acompanha - viola os nºs 2 e 3 do artº 103º da nos termos do qual “os impostos são criados por lei” e “ninguém pode ser obrigado a pagar impostos (...) cuja liquidação e cobrança se não façam nos termos da lei”, por considerar que na lei estão requisitos relativos a tributação que dela não constam, ou seja, que a detenção das participações nos dois anos anteriores ao da aplicação do RETGS tem de ser igual ou superior a 90%.

Ora, pelas razões acima referidas, entendemos que tal interpretação não viola aquela norma constitucional, pois os requisitos para a aplicação do regime e que estão expressamente previstos no nº 3 do artº 63º, não têm nada a ver com a determinação das sociedades que podem integrar o Grupo de Sociedades.

E, no caso concreto, porque a sociedade dominada tinha prejuízos nos três anos anteriores ao do início da aplicação do regime, e não era detida na percentagem legalmente exigida de pelo menos de 90% há mais de dois anos, não reunia condições para a aplicação do regime.

Pelo que ficou dito, a decisão recorrida merece confirmação.

Em face desta confirmação da decisão, a outra questão fica prejudicada, uma vez que só faria sentido a sua apreciação em caso de vencimento do recurso.

10. Nestes termos e pelo exposto, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela recorrente.
Lisboa, 12 de Março de 2014. – Valente Torrão (relator) – Dulce Neto – Ascensão Lopes.