Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0343/15.9BALSB
Data do Acordão:03/28/2019
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CA
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:MAGISTRADO DO MINISTÉRIO PÚBLICO
PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
INFRACÇÃO DISCIPLINAR
DISPONIBILIDADE
RENOVAÇÃO
PROCEDIMENTO
REGRESSO À ACTIVIDADE
DEVER DE FUNDAMENTAÇÃO
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE DIREITO
PRESCRIÇÃO
Sumário:I - A previsão da al. b) do n.º 1 do art. 161.º do EMP reporta-se a situações de regresso de cumprimento de pena disciplinar firmada na ordem jurídica e cujos efeitos que não hajam implicado o desligamento do serviço ou a extinção do vínculo estatutário, visto a situação de «disponibilidade» ali prevista configurar uma situação transitória, ditada por razões de ordem prática, e que visa proteger o magistrado confrontado com uma das situações de ausência, ou de extinção de lugar previstas na lei.
II - Tem cabimento nessa norma, por interpretação extensiva, o caso de regresso de magistrado do Ministério Público [MºPº] à atividade, por ter sido anulada a decisão que o condenou em sanção disciplinar de aposentação compulsiva que estava a cumprir e em que haja possibilidade de reexercício do poder disciplinar, dado o autor deixar de estar em «cumprimento» de pena e ficar a aguardar o desfecho do processo disciplinar, impondo-se, no ínterim, a definição da sua situação jurídica e que caberá ser realizada pelo «CSMP».
III - O mecanismo de aproveitamento do procedimento disciplinar previsto no art. 63.º da Lei 58/2008 [vulgo ED/2008] apenas se mostra mobilizável pela entidade sancionadora se na ação administrativa ter sido invocado, como fundamento de ilegalidade assacado ao ato punitivo nela impugnado, a existência de uma preterição de formalidade essencial, sendo que o mesmo não acarreta, necessária e irreversivelmente, a inutilização do procedimento em que aquele foi praticado a ponto de impedir, em absoluto, a renovação do mesmo e a prática de um novo ato disciplinar punitivo.
IV - Ocorre erro sobre os pressupostos de facto, conducente à ilegalidade do ato, a constatação da existência de discrepância ou de divergência entre o acervo factual que serviu de motivação ou de base ao ato administrativo e a sua efetiva verificação ou real ocorrência na concreta situação, ou seja, quando forem tidos em consideração no ato administrativo factos que, ou não estariam provados, ou que se mostravam desconformes com a realidade.
V- O princípio da tipicidade particularmente em relação às penas não expulsivas não vale no direito disciplinar com intensidade idêntica à que é reclamada pelo princípio da legalidade na intervenção penal, não sendo, como tal, possível fazer uma simples transposição do princípio da tipicidade penal, em todo o seu rigor garantístico, para o domínio meramente disciplinar e, em especial, para o domínio do direito público disciplinar.
VI - Neste, estando ligado à realização das específicas necessidades e interesse do serviço público e tutelando-se o vínculo específico de lealdade, diligência e eficácia no desempenho de funções no âmbito daquele serviço, utiliza-se, na definição das infrações disciplinares, a técnica da cláusula geral com enumeração exemplificativa, mediante a definição das infrações através do incumprimento de «deveres» em vez da indicação de «factos», considerando-se ilícito o comportamento que atente contra tais deveres, e isso mesmo que a conduta adotada não esteja descrita na previsão de qualquer preceito.
VII - Para a determinação do «dies a quo» do prazo, previsto no art. 178.º, n.º 2, do ED/2008, de prescrição do procedimento disciplinar contra magistrados do MºPº, só releva o conhecimento das faltas por parte do PGR ou do CSMP, sendo irrelevante esse conhecimento por parte doutros superiores hierárquicos.
VIII - A anti juridicidade disciplinarmente relevante e decorrente dos incumprimentos dos prazos que se mostram fixados para a prática dos atos processuais, redundando em atrasos na tramitação e na conclusão dos processos, deve ser configurada como uma infração disciplinar duradoura e a contagem do prazo de prescrição do procedimento disciplinar relativamente à mesma só corre a partir do dia em que cessar a atividade ou omissão que constitui a infração.
IX - Do art. 11.º da Lei n.º 35/2014 não resulta que deva fazer-se uma aplicação retroativa da lei nova, mas sim uma aplicação imediata, para futuro, da lei nova a situações iniciadas anteriormente e ainda pendentes, pelo que, mostrando-se já instaurado o processo disciplinar em observância das regras de prescrição que no momento estavam vigentes, não podem posteriores regras de prescrição vir interferir com a validade e regularidade do processo em termos da sua tempestividade.
Nº Convencional:JSTA000P24392
Nº do Documento:SAP201903280343/15
Data de Entrada:06/07/2017
Recorrente:A......
Recorrido 1:CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência no Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1. A……….., devidamente identificado nos autos, intentou no Supremo Tribunal Administrativo contra o «CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO» [doravante, «CSMP»] ação administrativa especial peticionando, pelas razões aduzidas na petição inicial, a fls. 03/79 dos autos: a) a declaração de nulidade ou, se assim não se entender, a anulação do acórdão do Plenário do «CSMP», de 02.12.2014, na parte em que nele se determina que o A., ora Recorrente, após trânsito em julgado do acórdão proferido pela Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, em 30.10.2014, fique na situação de disponibilidade nos termos do art. 161.º, n.º 1, al. b), do Estatuto do Ministério Público [EMP]; b) a declaração de nulidade, ou, se assim não se entender, a anulação do acórdão da Secção Disciplinar do «CSMP» [«SD/CSMP»], de 16.12.2014, por via do qual foi novamente aplicada ao A., aqui Recorrente, a pena disciplinar de aposentação compulsiva; c) a declaração de nulidade, ou, se assim não se entender, a anulação do acórdão do Plenário do «CSMP», de 27.01.2015, por via do qual foi desatendida a reclamação apresentada pelo A. contra o acórdão mencionado em b), que por ele foi mantido na íntegra; d) a condenação do «CSMP» a adotar todos os atos e operações necessárias a reconstituir a situação que existiria se os atos impugnados não tivessem sido praticados [pedido cumulado com o de impugnação ao abrigo do art. 04.º, n.º 2, al. a), do CPTA - na redação anterior à que foi introduzida pelo DL n.º 214-G/2015 - redação a que se reportarão todas as ulteriores referências ao referido Código sem expressa menção em contrário]; e) a condenação do «CSMP» a pagar ao A., a título de indemnização por danos morais, quantia líquida nunca inferior a 100.000,00 €, bem como quantia, a liquidar, relativa a compensação pelos danos derivados de toda a conduta ilícita do R., materializada nos atos ilegais que praticou, tanto os ora impugnados como os já declarados nulos pelo STA [pedido cumulado com o de impugnação ao abrigo do art. 04.º, n.º 2, al. f), do CPTA].

2. Funda a sua pretensão nas ilegalidades assacadas aos atos impugnados, ilegalidades essa invocadas a título principal [cfr. arts. 75.º a 199.º da petição inicial] e a título subsidiário [cfr. art. 238.º do mesmo articulado], nos termos seguintes:
I) A título principal, aponta:
- à deliberação do Plenário do «CSMP» de 02.12.2014 as ilegalidades seguintes: i) violação do disposto no art. 161.º, n.º 1, al. b), do EMP; e ii) violação do conteúdo essencial do seu direito fundamental ao exercício da sua profissão, consagrado no art. 47.º da CRP.
- às deliberações do «SD/CSMP» de 16.12.2014, e do Plenário do «CSMP» de 27.01.2015, as ilegalidades seguintes: iii) violação do art. 63.º do Estatuto Disciplinar de 2008 [doravante ED/2008] publicado em anexo à Lei n.º 58/2008, de 09.09, ex vi do art. 216.º do EMP, ou do disposto no art. 228.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas [doravante LTFP - aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20.06], que mantém, em termos praticamente idênticos, a mesma redação daquele art. 63.º; iv) violação do conteúdo essencial do seu direito fundamental ao exercício da sua profissão, consagrado no art. 47.º da CRP; v) violação dos princípios da dignidade da pessoa humana e do Estado de direito democrático, previstos nos arts. 01.º e 02.º da CRP e, bem assim, do direito fundamental do A. a ser julgado em sede disciplinar no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa, consagrado no art. 32.º, n.ºs 2 e 10, da CRP.
II) A título subsidiário, imputa a estas duas últimas deliberações do «CSMP» ainda as seguintes ilegalidades: vi) falta de fundamentação [arts. 124.º e 125.º do CPA - na redação anterior à que foi introduzida pelo DL n.º 4/2015 - redação a que se reportarão todas as ulteriores referências ao referido Código sem expressa menção em contrário] geradora de nulidade insuprível do procedimento disciplinar por impossibilidade de audiência e defesa do A., ora Recorrente [art. 204.º do EMP]; vii) erro nos pressupostos de facto e de direito; viii) prescrição das infrações disciplinares e do direito de instauração de procedimento disciplinar, nos termos do disposto nos arts. 283.º, n.º 1, 277.º, n.º 1, 105.º, e 77.º, n.º 1, do CPP, 11.º, n.º 1, e 178.º, n.ºs 1 e 2, da LTFP.

3. Pelo acórdão da 1.ª Secção deste Supremo Tribunal Administrativo, de 16.03.2017, foi julgada improcedente a presente ação e absolvido o R. «CSMP» do pedido [cfr. fls. 502/543].

4. Inconformado, o A., ora Recorrente, dele veio interpor o presente recurso para o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, produzindo alegações [cfr. fls. 551/641] que culminaram com o seguinte quadro conclusivo [vide fls. 802/816, na sequência de convite formulado nos termos do despacho exarado a fls. 795/796 dos autos]:
«
A. O Recorrente não se conforma com o acórdão ora proferido, por entender que o mesmo padece de erro de julgamento quanto à matéria de direito e de nulidade por omissão de pronúncia, impondo-se a sua revogação e substituição por outro que julgue procedente a presente ação, nos termos peticionados na petição inicial (sem prejuízo da decisão, contida no despacho saneador, de rejeição da cumulação do pedido de indemnização, por danos morais, na parte em que ele inclui o ressarcimento de danos causados pelas deliberações do Recorrido de 14.07.2010 e de 04.06.2013).
B. No que se reporta às causas de ilegalidade imputadas ao acórdão do Plenário do CSMP de 02.12.2014, ao corroborar o entendimento do Recorrido no sentido da legalidade da colocação do Recorrente na situação de disponibilidade, o Tribunal a quo faz tábua rasa do último dos acórdãos proferidos por este STA, no âmbito do processo n.º 1169/13 (mas não só, atentos os anteriores acórdãos proferidos por este STA nos processos n.ºs 1214/09 e 772/10), bem como do disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 173.º do CPTA, e ainda do princípio da boa-fé (cfr. artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 6.º-A do CPA), do princípio da confiança (ínsito na ideia de Estado de direito democrático), do princípio do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares (cfr. artigo 266.º, n.º 1, da CRP), e do princípio da ética administrativa que fundamentam o artigo 173.º do CPTA, violando-os.
C. Assim, ao ter considerado que o segmento decisório do acórdão do Plenário do CSMP de 02.12.2014 não violou a alínea b) do n.º 1 do artigo 161.º do EMP, o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, tendo violado o disposto neste mesmo normativo, bem como o disposto no artigo 173.º, n.ºs 1 e 2 do CPTA e ainda o princípio da boa-fé previsto nos artigos 266.º, n.º 2, da CRP e 6.º-A do CPA, o princípio da confiança ínsito na ideia de Estado de direito democrático consagrada no artigo 2.º da CRP e o princípio do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares preceituado no artigo 266.º, n.º 1, da CRP, mais tendo violado o disposto no artigo 47.º da CRP e, por conseguinte, ofendido o conteúdo essencial do direito fundamental do Recorrente ao exercício da sua profissão constitucionalmente consagrado neste mesmo artigo 47.º.
D. Com efeito, sendo inaplicável ao caso, como é, o disposto no artigo 161.º, n.º 1, alínea b) do EMP, tendo o Tribunal a quo considerado aplicável esse mesmo normativo, o Tribunal a quo violou o disposto no artigo 47.º da CRP e, por conseguinte, o direito fundamental do Recorrente ao livre exercício da sua profissão de magistrado, pois, considerou válida uma ilegal restrição a este mesmo direito fundamental.
E. Finalmente, cumpre arguir, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido de que a reconstituição da situação atual hipotética a que alude o artigo 173.º do CPTA permite ao Recorrido colocar o Recorrente na situação de disponibilidade à luz do disposto no artigo 161.º, n.º 1 do EMP após ter sido jurisdicionalmente declarado nulo o ato punitivo que lhe havia sido aplicado, e que esta colocação não prejudica o Recorrente, antes o protege, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto no artigo 173.º do CPTA, pois, viola o princípio da boa-fé previsto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP, o princípio da confiança ínsito na ideia de Estado de direito democrático consagrada no artigo 2.º da CRP, o princípio do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares preceituado no artigo 266.º, n.º 1, da CRP e ainda o disposto no artigo 47.º da CRP, ofendendo, por conseguinte, o conteúdo essencial do direito fundamental do Recorrente ao exercício da sua profissão constitucionalmente consagrado neste mesmo artigo 47.º.
F. Igualmente nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, cumpre ainda arguir que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido de que apesar de as causas geradoras da situação de disponibilidade serem as tipificadas no artigo 161.º, n.º 1 do EMP, as mesmas poderem ser objeto de “uma interpretação extensiva” abrangendo situações como a do Recorrente que viu ser jurisdicionalmente declarado nulo o ato punitivo que lhe havia sido aplicado, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto nesse mesmo artigo 161.º, n.º 1, do EMP, pois, viola o princípio da boa-fé previsto no artigo 266.º, n.º 2, da CRP, o princípio da confiança ínsito na ideia de Estado de direito democrático consagrada no artigo 2.º da CRP, o princípio do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares preceituado no artigo 266.º, n.º 1, da CRP e ainda o disposto no artigo 47.º da CRP, ofendendo, por conseguinte, o conteúdo essencial do direito fundamental do Recorrente ao exercício da sua profissão constitucionalmente consagrado neste mesmo artigo 47.º.
G. No que se reporta às causas de ilegalidade imputadas aos acórdãos da Secção Disciplinar e do Plenário do CSMP, de 16.12.2014 e de 27.01.2015, respetivamente, incorreu, igualmente, o Tribunal a quo em erro de julgamento ao ter considerado que mesmo que a entidade sancionadora não tenha renovado a instauração do procedimento disciplinar, pode “o tribunal [aJ impor-lhe esse suprimento [entenda-se, da preterição de formalidade essencial]”, embora “com perdas a nível de eficácia e de poupança de tempo e de meios”.
H. Efetivamente, não tendo a entidade com competência disciplinar renovado a instauração do procedimento disciplinar - caso, naturalmente, tal lhe fosse possível à luz do artigo 63.º, n.º 2, da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro -, nunca poderia depois o tribunal impor-lhe o suprimento dessa mesma preterição, sob pena de completa violação deste mesmo normativo!
I. Tanto assim é, que este STA, no acórdão de 30.10.2014, proferido na anterior ação n.º 1169/13, não decidiu pela renovação do procedimento, simplesmente decidiu “julgar a ação procedente e, com os fundamentos acima invocados, declarar nulo o ato impugnado”.
J. Acresce que, o Tribunal a quo reconhece razão ao Recorrente no que se refere à teleologia da norma ínsita no artigo 63.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, bem como quando o Recorrente alega que este artigo dever-lhe-á ser aplicado se resultar concretamente mais favorável, e que os requisitos constantes do n.º 2 deste artigo não se verificam, porém, retira destas mesmas conclusões consequências contrárias àquelas que deveria retirar.
K. Com efeito, se o artigo 63.º visa que não obstante a preterição de formalidade essencial no decurso do processo disciplinar levada a cabo pela entidade com competência disciplinar, esta possa, ainda assim, renovar a instauração do procedimento disciplinar no limite temporal aí definido e desde que verificados os requisitos aí previstos - a fim, naturalmente, de retomar o procedimento desde o início, com o objetivo de proferir decisão final no procedimento (seja de aplicação de pena disciplinar ou não) -, e se se verificar, como se verificou no caso, que o Recorrido não renovou a instauração do procedimento disciplinar (nem tal poderia fazer atenta a não verificação dos requisitos constantes no n.º 2 do mesmo artigo!), outra conclusão não se pode retirar, em face da teleologia da norma ínsita no aludido artigo 63.º, que não seja a de que o Recorrido não mais poderia ter voltado a punir disciplinarmente o Recorrente!
L. Pelo que, e conforme o Recorrente alegou nos presentes autos, ou a entidade com competência disciplinar renova a instauração do procedimento disciplinar até ao termo do prazo para contestar jurisdicionalmente a ação impugnatória ou, caso não o faça ou caso não o possa legalmente fazer por não preenchimento dos requisitos constantes do n.º 2 do artigo 63.º e o ato punitivo venha a ser declarado nulo ou anulado por preterição de formalidades essenciais, não mais poderá proceder a tal renovação ou continuar o procedimento disciplinar já iniciado, não podendo, como tal, aplicar qualquer pena disciplinar ao arguido! E este é o regime concretamente mais favorável ao Recorrente, daí que, e à luz do artigo 4.º, n.º 1, da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, lhe seja diretamente aplicável!!!
M. O entendimento do Tribunal a quo no sentido de que a arguição da violação do citado artigo 63.º “poderia fazer sentido no âmbito da ação n.º 1169/13, suscitada, nomeadamente, em ‘sede de alegações’, a qual foi julgada pelo acórdão do STA de 30.10.2014, mas não no âmbito da presente ação onde a preterição de formalidade essencial do procedimento disciplinar não se suscitou” assenta em evidente erro de julgamento.
N. Com efeito, nenhum efeito jurídico retiraria o Recorrente, para a procedência da ação n.º 1169/13, e, por conseguinte, para a procedência dos vícios que assacou ao ato aí impugnado nessa mesma ação (note-se, o acórdão do Plenário do Recorrido de 04.06.2013), invocar, em sede de alegações escritas, a hipotética violação do artigo 63.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro pelo Recorrido, pois, o ato punitivo aí impugnado já estava praticado e não iria “absorver” uma ilegalidade que ainda nem sequer havia sido cometida! E que, aliás, foi cometida em sede de um novo ato praticado pelo Recorrido, objeto, naturalmente, de nova impugnação!!! - cfr. artigo 268.º, n.º 4 da CRP!
O. Pelo que, tal arguição nunca consubstanciaria um “novo fundamento do pedido” nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 91.º, n.º 5, do CPTA!
P. Também não se compreende a razão do Tribunal a quo para afirmar que a arguição da violação do artigo 63.º não faz sentido no âmbito da presente ação, na qual “a preterição de formalidade essencial do procedimento disciplinar não se suscitou”, pois que quer a anterior ação n.º 1169/13, quer a presente, são ações impugnatórias de atos punitivos praticados no âmbito do mesmo procedimento disciplinar!!!
Q. Na presente ação algo ainda mais grave do que a preterição de formalidade essencial do procedimento se suscitou: a completa impossibilidade legal de aproveitamento do procedimento e, por conseguinte, de ser praticado novo ato punitivo!!!
R. Em face de todo o exposto, ao ter julgado improcedente o vício de violação do disposto no artigo 63.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, ex vi do artigo 216.º do EMP (ou do disposto no artigo 228.º da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, que mantém, em termos praticamente idênticos, a mesma redação do artigo 63.º do anterior diploma legal), o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento, tendo violado o disposto neste mesmo normativo, bem como os princípios da dignidade da pessoa humana e do Estado de direito democrático, ínsitos nos artigos 1.º e 2.º da CRP, o artigo 32.º, n.ºs 2 e 10 da CRP, o princípio da tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da CRP, os princípios gerais inerentes à função jurisdicional previstos no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da CRP e ainda o disposto no artigo 47.º da CRP, pelo que, por conseguinte, ofendeu o conteúdo essencial do direito fundamental do Recorrente ao exercício da sua profissão constitucionalmente consagrado neste mesmo artigo 47.º.
S. Finalmente, cumpre arguir, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido de que i. o artigo 63.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro é aplicável ao Recorrente desde que o seu regime seja concretamente mais favorável, ii. que não se verificam, no caso, os requisitos constantes desse mesmo artigo para que pudesse ocorrer a renovação da instauração do procedimento disciplinar, e iii. que, ainda assim, o Recorrido não violou o disposto neste mesmo artigo ao ter voltado a punir disciplinarmente o Recorrente, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto nesse mesmo artigo 63.º, pois, viola os princípios da dignidade da pessoa humana e do Estado de direito democrático, ínsitos nos artigos 1.º e 2.º da CRP, o artigo 32.º, n.ºs 2 e 10 da CRP, e ainda o disposto no artigo 47.º da CRP, pelo que, por conseguinte, ofende o conteúdo essencial do direito fundamental do Recorrente ao exercício da sua profissão constitucionalmente consagrado neste mesmo artigo 47.º.
T. Igualmente nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, cumpre arguir que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido que é possível a um tribunal, após declarar a nulidade insuprível do procedimento disciplinar por preterição de formalidade essencial, impor à entidade com competência disciplinar que corrija essa mesma nulidade e que, assim, aproveite o procedimento disciplinar, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto no artigo 63.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro, pois, viola os princípios da dignidade da pessoa humana e do Estado de direito democrático, ínsitos nos artigos 1.º e 2.º da CRP, o artigo 32.º, n.ºs 2 e 10 da CRP, e ainda o disposto no artigo 47.º da CRP, pelo que, por conseguinte, ofende o conteúdo essencial do direito fundamental do Recorrente ao exercício da sua profissão constitucionalmente consagrado neste mesmo artigo 47°.
U. Ainda, igualmente nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, cumpre arguir que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido de que fazia sentido que o Recorrente arguisse a violação do artigo 63.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro em sede de alegações, nos termos do artigo 91.º, n.º 5, do CPTA, no processo n.º 1169/13, mas não no âmbito da presente ação, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto nesse mesmo artigo 63.º, bem como do disposto no artigo 91.º, n.º 5, do CPTA, pois, viola o princípio da tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da CRP, o princípio do Estado de direito democrático previsto no artigo 2.º da CRP e os princípios gerais inerentes à função jurisdicional previstos no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da CRP.
V. Incorre o Tribunal a quo em erro de julgamento quando considera que o Recorrente imputa, indiretamente, falta de clareza, precisão e detalhe à «acusação» que contra ele foi formulada e que não é essa acusação que ora está em causa, mas antes o acórdão punitivo.
W. Com efeito, se a acusação não elenca todas as circunstâncias conhecidas de modo, lugar e tempo, o ato punitivo, que se baseia naquela, não poderá cumprir esses mesmos requisitos, razão pela qual sempre padecerá de falta de fundamentação!
X. Ocorre falta de fundamentação à luz do disposto nos artigos 124.º e 125.º do CPA, dificultando ou mesmo impossibilitando uma defesa dirigida em termos eficazes, o que sempre equivaleria a falta de audiência do arguido, geradora da nulidade insuprível à luz do disposto no artigo 204.º do EMP.
Z. Incorre o Tribunal a quo em erro de julgamento quando considera que o Recorrente imputa, indiretamente, falta de clareza, precisão e detalhe à «acusação» que contra ele foi formulada e que não é essa acusação que ora está em causa, mas antes o acórdão punitivo.
AA. Com efeito, se a acusação não elenca todas as circunstâncias conhecidas de modo, lugar e tempo, o ato punitivo, que se baseia naquela, não poderá cumprir esses mesmos requisitos, razão pela qual sempre padecerá de falta de fundamentação!
BB. Ocorre falta de fundamentação à luz do disposto nos artigos 124.º e 125.º do CPA, dificultando ou mesmo impossibilitando uma defesa dirigida em termos eficazes, o que sempre equivaleria a falta de audiência do arguido, geradora da nulidade insuprível à luz do disposto no artigo 204.º do EMP.
CC. Acresce que, incorreu igualmente o Tribunal a quo em erro de julgamento quando afirma que as razões, as circunstâncias de tempo e de modo, em que as infrações tiveram lugar não são indispensáveis em procedimento como o presente.
DD. Finalmente, cumpre arguir, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido de que as razões, as circunstâncias de tempo e de modo em que as infrações tiveram lugar não são indispensáveis em procedimento como o presente, pois, as “condutas” “falam por si”, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto nos artigos 124.º e 125.º do CPA e, bem assim, do disposto no artigo 197.º, n.º 1, do EMP, pois, viola o princípio da salvaguarda das garantias de audiência e defesa do arguido consagrado nos artigos 32.º, n.ºs 1 e 10 e 269.º, n.º 3, da CRP e o princípio do Estado de direito democrático, ínsito no artigo 2.º da CRP.
EE. No que ao erro nos pressupostos de facto se reporta, não é verdade que o Recorrente não tenha problematizado a ocorrência das alegadas “informações erradas”: com efeito, o Recorrente alegou, nos presentes autos, que prestou sempre as informações à sua hierarquia que entendia estarem corretas. O Recorrido é que tem que provar que o Recorrente deu informações erradas à hierarquia, sendo certo que essa prova não se encontra efetuada.
FF. Em face do exposto, ao ter considerado que o Recorrente não problematizou a real ocorrência das “informações erradas”, que serviram de pressuposto factual das duas infrações, o Tribunal a quo incorreu em notório erro de julgamento.
GG. E também não é correto o entendimento vertido na decisão recorrida de que não se trata de «erro nos pressupostos de direito», porque tanto o regime jurídico como a normas jurídicas aplicadas pela entidade ré não só dispunham da respetiva base factual como foram corretamente convocadas.
HH. Por outro lado, é o próprio Tribunal a quo que dá razão ao Recorrente no que se reporta às dúvidas que se suscitam na subsunção da mesma factualidade a duas infrações disciplinares, tanto que refere expressamente o problema do «concurso ideal heterogéneo de infrações disciplinares» e do «concurso aparente» no âmbito do conhecimento deste vício e acaba por, deliberadamente, não o conhecer!!!
II. Por esta razão, a decisão recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia à luz do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA, pois, o Tribunal a quo deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, a qual ora se invoca para os devidos efeitos e com todas as suas legais consequências.
JJ. Ora, se o próprio Tribunal a quo tem dúvidas na subsunção da mesma factualidade a duas infrações disciplinares como pode afirmar, categoricamente, que o regime jurídico e as normas jurídicas aplicadas pelo Recorrido foram corretamente convocadas?!
KK. Ao ter considerado que o Recorrente violou quer o dever de obediência, quer o dever de correção, com base no facto de alegadamente ter prestado informação errónea à hierarquia, o Recorrido incorreu em erro nos pressupostos de direito na medida em que subsumiu erradamente a realidade ao direito (para além de ter, igualmente, errado quanto aos próprios factos que considerou verificados, conforme exposto), na medida em que mesmo que o Recorrente tivesse prestado qualquer informação errónea à hierarquia - o que não se concede - é óbvio que tal facto nunca poderia consubstanciar qualquer violação do dever de correção, pois o facto, por si só, de se prestar uma informação errónea a um superior hierárquico não significa, sem mais, que se esteja a desrespeitar esse mesmo superior!!!
LL. Para além de que não é por se prestar uma informação errada a um superior hierárquico, julgando-se tal informação correta, que um trabalhador não acata e, por isso, incumpre as ordens dos legítimos superiores hierárquicos, dadas em objeto de serviço e com a forma legal!!!
MM. Afirma o Tribunal a quo que o Recorrente deveria ter invocado um vício diferente do que invocou, porém, esquece-se o Tribunal a quo que, conforme é unanimemente sabido, vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio jura novit curia, o qual se traduz numa das vertentes do princípio geral da prevalência da substância sobre a forma e que se encontra expressamente previsto no artigo 5.º, n.º 3, do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA!
NN. Para além de que não é por se prestar uma informação errada a um superior hierárquico, julgando-se tal informação correta, que um trabalhador não acata e, por isso, incumpre as ordens dos legítimos superiores hierárquicos, dadas em objeto de serviço e com a forma legal!!!
OO. Afirma o Tribunal a quo que o Recorrente deveria ter invocado um vício diferente do que invocou, porém, esquece-se o Tribunal a quo que, conforme é unanimemente sabido, vigora no nosso ordenamento jurídico o princípio jura novit curia, o qual se traduz numa das vertentes do princípio geral da prevalência da substância sobre a forma e que se encontra expressamente previsto artigo 5.º, n.º 3, do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA!
PP. De acordo com esse mesmo normativo, o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito.
QQ. Se porventura o Tribunal a quo entendia que o vício de que padeciam os atos não era o que foi invocado pelo Recorrente, mas outro, deveria ter conhecido desse mesmo outro vício, à luz não só do disposto no indicado artigo 5.º, n.º 3, do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA, mas também dos artigos 95.º, n.º 2 e 7.º do CPTA!
RR. Não tendo conhecido do indicado vício de violação de lei, a decisão recorrida volta a padecer de nulidade por omissão de pronúncia, à luz do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA.
SS. Assim como, também à luz do disposto nos indicados artigos 95.º, n.º 2, do CPTA e 5.º, n.º 3, do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA, cabia ao Tribunal a quo ter-se pronunciado sobre o problema do «concurso ideal heterogéneo de infrações disciplinares» e do «concurso aparente» conforme exposto supra, pelo que, não o tendo feito, a decisão recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia, à luz do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA, já invocada para os devidos efeitos e com todas as suas legais consequências.
TT. Também não podemos deixar de repudiar, veementemente, o entendimento do Tribunal a quo no sentido de que a um qualquer arguido não interessa a qualificação jurídica de um determinado facto para efeitos de punição, pois, o mesmo vai contra os mais elementares princípios do Estado de direito democrático, como sejam o princípio da salvaguarda das garantias de audiência e defesa em processo disciplinar (cfr. artigos 32.º, n.ºs 1 e 10 e 269.º, n.º 3, da CRP) e o princípio da proporcionalidade (cfr. artigo 18.º, n.º 2, da CRP).
UU. Assim, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter considerado inexistente o vício de erro nos pressupostos de facto invocado pelo Recorrente, tendo, por conseguinte, violado o disposto no artigo 3.º, n.ºs 2, alíneas f) e h), 8 e 10 da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro (atual artigo 73.º, n.ºs 2, alíneas f) e h), 8 e 10 da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho).
VV. A decisão recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia à luz do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA, na medida em que o Tribunal a quo não conheceu do problema do «concurso ideal heterogéneo de infrações disciplinares» e do «concurso aparente», pelo que deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, a qual ora se invoca para os devidos efeitos e com todas as suas legais consequências.
WW. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter considerado inexistente o vício de erro nos pressupostos de direito tendo, por conseguinte, violado o disposto no artigo 3.º, n.ºs 2, alíneas f) e h), 8 e 10 da Lei n.º 58/2008, de 9 de setembro (atual artigo 73.º, nºs 2, alínea f) e h), 8 e 10 da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho).
XX. O Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento ao ter considerado que não podia conhecer de outros vícios de que padecessem os atos impugnados para além dos expressamente invocados pelo Recorrente, tendo, por conseguinte, violado o disposto nos artigos 95.º, n.º 2 e 7.º do CPTA e, por conseguinte, o princípio da promoção do acesso à justiça, o disposto no artigo 5.º, n.º 3, do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA e, consequentemente, o princípio jura novit curia e o princípio da prevalência da substância sobre a forma, e ainda o princípio da tutela jurisdicional efetiva consagrado no artigo 20.º da CRP, o princípio do Estado de direito democrático previsto no artigo 2.º da CRP e os princípios gerais inerentes à função jurisdicional previstos no artigo 202.º, n.ºs 1 e 2, da CRP.
ZZ. A decisão recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia à luz do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA, na medida em que o Tribunal a quo não conheceu, como era seu dever de oficio, de outros vícios de que padeciam os acórdãos impugnados para além dos invocados pelo Recorrente, pelo que deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, nulidade que ora se invoca para os devidos ....
AAA. Porque o Tribunal a quo olvidou o conhecimento da questão da prescrição relativamente às infrações por alegada i. não dedução de pedido de indemnização cível, ii. não instauração de procedimento criminal, iii. não promoção de extinção de medida de coação, iv. avocação de processos, v. não dedução de despachos no prazo de 10 dias, vi. não seguimento da linha investigatória que ao caso cabia, vii. não tramitação de processo urgente, e viii. prestação de informações erróneas à hierarquia, a decisão recorrida padece de nulidade por omissão de pronúncia, à luz do disposto (…) no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA, pois o Tribunal a quo deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, nulidade que ora se invoca para os devidos efeitos e com todas as suas legais consequências.
BBB. Também relativamente ao entendimento vertido na decisão recorrida de que o artigo 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho não é imediatamente aplicável no caso atenta a regra geral de aplicação de normas de alteração de prazos consagrada no artigo 297.º do CC, incorreu o Tribunal recorrido em erro de julgamento.
CCC. Também por outra razão, nunca o entendimento do Tribunal a quo poderia vingar: pelo simples facto de nos encontrarmos perante uma norma especial (o artigo 178.º, n.º 1, da LGTFP), prevista no âmbito do procedimento disciplinar, a qual, inserindo-se, como se insere, no direito sancionatório, tem regras próprias que se distanciam das regras do direito privado puro, como são as do CC, e que se aproximam - conforme já exposto e é unanimemente reconhecido pelas nossas Jurisprudência e Doutrina - do direito penal - cfr., a este respeito, o artigo 29.º, n.º 4, da CRP.
DDD. A considerar-se, como considera o Tribunal recorrido, que o disposto no artigo 178.º, n.º 2, da LGTFP, ex vi do artigo 216.º do EMP, não é aplicável nos procedimentos disciplinares de que são alvo os magistrados do Ministério Público, tal entendimento põe em causa a própria finalidade do instituto jurídico da prescrição, no caso, do procedimento disciplinar: impedir a eternização do exercício do poder disciplinar, findo que esteja determinado prazo, após o conhecimento da infração por qualquer superior hierárquico do magistrado, por forma a, essencialmente, permitir uma estabilização da situação jurídica, tendo em conta o lapso temporal decorrido deste o conhecimento da infração até ao término do aludido prazo prescricional, bem como o disposto no artigo 32.º, n.º 2, da CRP. Pelo que, também ao considerar inaplicável, no caso, o disposto no artigo 178.º, n.º 2, da LGTFP, ex vi do artigo 216.º do EMP, o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento.
EEE. Ao ter julgado inexistente quer a prescrição das infrações, quer a prescrição do procedimento disciplinar, o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento, tendo violado o disposto nos artigos 11.º, n.º 1 da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho e 178.º, n.º 1, da LGTFP, ex vi do artigo 216.º do EMP, 32.º, n.º 2, da CRP e o princípio da aplicação da lei de conteúdo mais favorável ao arguido consagrado no artigo 29.º, n.º 4, da CRP.
FFF. Finalmente, cumpre arguir, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido de que as infrações disciplinares por via de atrasos nos despachos de encerramento dos processos se mantêm desde o termo do prazo legal de 10 dias para finalizar os inquéritos até à data em que em que o magistrado despacha os processos ou deixa de ser o seu titular, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto nos artigos 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho e 178.º, n.º 1, da LGTFP, ex vi do artigo 216.º do EMP, pois, viola o princípio segundo o qual o arguido deve ser julgado no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa constante do artigo 32.º, n.º 2, da CRP.
GGG. Também cumpre arguir, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 280.º da CRP, que a interpretação que foi efetuada pelo Tribunal a quo no sentido de que o artigo 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, ex vi do artigo 216.º do EMP, não é imediatamente aplicável no caso atenta a regra geral de aplicação de normas de alteração de prazos consagrada no artigo 297.º do CC, é uma interpretação manifestamente inconstitucional do disposto nesse mesmo artigo 11.º, n.º 1 e ainda do disposto no artigo 178.º, n.º 1 da LGTFP, ambos ex vi do artigo 216.º do EMP, pois viola o princípio da aplicação da lei de conteúdo mais favorável ao arguido consagrado no artigo 29.º, n.º 4, da CRP …».

5. Devidamente notificado, o «CSMP», aqui Recorrido, veio produzir contra-alegações, formulando o seguinte quadro conclusivo [cfr. fls. 649/709, repetidas a fls. 713/773]:
«
A. O douto acórdão recorrido, que julgou a ação improcedente, não enferma das nulidades por omissão de pronúncia nem dos erros de julgamento que o Recorrente lhe atribui.
B. Com efeito, os impugnados acórdãos do Plenário do CSMP de 2 de dezembro de 2014 e de 27 de janeiro de 2015, o primeiro na parte que colocou o Recorrente na situação de disponibilidade e o segundo que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva, não enfermam de nenhum dos vícios que o Recorrente lhes atribui.
C. O Recorrente não tem razão, desde logo, na crítica que faz ao douto acórdão recorrido por ter considerado em conformidade com a lei aplicável o acórdão do Plenário do CSMP de 2 de dezembro de 2014 que o colocou na situação de disponibilidade, transitoriamente, enquanto aguardava colocação em vaga da sua categoria, em conformidade com o disposto no artigo 161.º, n.º 1, alínea b), do EMP.
D. Com efeito, nos termos do artigo 161.º, n.º 1, al. b), do EMP, consideram-se na situação de disponibilidade os magistrados do Ministério Público que aguardam colocação em vaga da sua categoria, por terem regressado à atividade após cumprimento de pena.
E. E o Recorrente não tem razão quando argumenta que a norma do n.º 1, al. b) não tem aplicação no seu caso, pois, esteve ausente do exercício de funções por lhe ter sido aplicada uma pena disciplinar expulsiva, e não é pelo facto dessa situação de ausência ter cessado em consequência de o ato que lhe aplicou a pena disciplinar ter sido anulado por decisão judicial que deixa de ter aplicação a indicada norma do artigo 161.º, n.º 1, alínea b), do EMP.
F. Esta norma é ditada por razões de ordem prática, consistentes na impossibilidade de obter uma vaga adequada em razão de vários aspetos, e no caso do Recorrente ainda acresce a particularidade de ter sido, entretanto, implementada uma nova organização judiciária que implicou a extinção de todos os lugares e a criação de novos lugares, muitos deslocalizados.
G. Isso obrigou à movimentação de todos os magistrados, e para colocação do Recorrente em efetivo exercício de funções sempre seria necessário que indicasse a sua ordem de preferências para a colocação num dos novos lugares criados pela nova organização judiciária.
H. No entanto, no caso do Recorrente não prosseguiu o procedimento conducente à sua colocação, o que se deveu única e exclusivamente ao facto de lhe ter sido aplicada, logo de seguida, nova pena disciplinar expulsiva.
I. Diga-se ainda que a situação de disponibilidade prevista no artigo 161.º do EMP está mais orientada para a proteção do magistrado ausente que regressa, designadamente assegurando-lhe de imediato o recebimento da remuneração, mesmo sem o efetivo cumprimento da contraprestação, enquanto se procura uma vaga apropriada.
J. Por isso, a colocação do Recorrente na situação de disponibilidade não constituiu qualquer consequência desfavorável, e foi a forma possível de imediatamente dar execução ao julgado em cumprimento do disposto no artigo 173.º, n.º 1, do CPTA.
K. Portanto, este enquadramento da situação do Recorrente nos fins e no campo de aplicação da norma do artigo 161.º do EMP que se fez no douto acórdão recorrido impõe-se pela lógica das coisas, que justifica e fundamenta a interpretação extensiva da norma que o Recorrente vem questionar.
L. E essa interpretação que se fez da norma do artigo 161.º, n.º 1, alínea b), do EMP não é inconstitucional, pois, contrariamente ao que diz o Recorrente, não constitui nenhuma violação dos princípios do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares, da boa-fé e da confiança, ínsito na ideia de Estado de direito democrático - artigo 266.º, n.º 1, n.º 2, e artigo 2.º da CRP.
M. Consequentemente, nenhuma razão assiste ao Recorrente, sendo de todo improcedente a sua alegação, quando, sobre esta questão da sua colocação na situação de disponibilidade, diz que o douto acórdão recorrido enferma de erro de julgamento.
N. Tal como se decidiu no douto acórdão recorrido, a impugnada deliberação do CSMP de dezembro de 2014 também não enferma da nulidade que o Recorrente lhe atribui sob alegação de que viola o artigo 47.º da CRP, segundo o qual “todos têm o direito de escolher livremente a profissão ou o género de trabalho, salvas as restrições legais impostas pelo interesse coletivo ou inerentes à sua própria capacidade e o direito de acesso à função pública, em condições de igualdade e liberdade, em regra por via de concurso”.
O. Em face do teor da norma, o Tribunal Constitucional até já entendeu que o artigo 47.º, n.º 1, da Constituição tem que ver com a “liberdade de escolha de profissão”, e já não com o exercício da profissão - acórdão n.º 672/96, Proc. n.º 216/91, de 08.05.1996.
P. No caso dos autos não estamos na esfera do artigo 47.º da Constituição, uma vez que este se refere à liberdade de escolha de profissão, mas sim na esfera do artigo 58.º da Constituição (direito ao trabalho, na vertente de liberdade de exercício de uma atividade profissional), que pertence ao grupo dos direitos económicos, sociais e culturais.
Q. Mesmo que se entenda que estes dois aspetos da liberdade de profissão (escolha e exercício) estão compreendidos na previsão da norma do artigo 47.º da CRP, há que distinguir esses dois aspetos da liberdade de profissão, justificando-se uma menor liberdade do cidadão no momento do exercício, pois, é o momento da escolha que se revela de uma importância suprema, quer para a subsistência física do indivíduo, quer para a sua realização pessoal.
R. Portanto, no quadro das restrições ressalvadas na norma do artigo 47.º da CRP, relativamente ao exercício da profissão temos um primeiro grau de maior liberdade do legislador, que legitima todas as restrições impostas estatutariamente ou por via do exercício do poder disciplinar.
S. Assim, a impugnada deliberação do Plenário do CSMP de 2 de dezembro de 2014, tendo sido proferida ao abrigo de uma norma estatutária, na sequência de uma situação criada no exercício do poder disciplinar, não constitui qualquer ofensa a norma do artigo 47.º da CRP.
T. Por isso, foi com todo o acerto que no douto acórdão recorrido se considerou, com referência à alegada violação do artigo 47.º da CRP, que “tendo-se concluído pela legalidade da aplicação da dita norma do EMP [artigo 161.º, n.º 1, alínea b)], perde a base etiológica esta última alegação, sendo certo que, não tendo o autor apontado qualquer «inconstitucionalidade» à norma estatutária não se impõe prosseguir mais, a este título, a sua apreciação”.
U. E que “de qualquer jeito, mesmo concedendo que o artigo 47.º da CRP comporta, para além da vertente da escolha da profissão ainda a vertente do exercício da mesma, mesmo assim não podíamos deixar de concluir que a situação de disponibilidade não visa impedir esse exercício, como deixamos dito, antes se direciona à sua real efetivação”.
V. Portanto, o douto acórdão recorrido também não sancionou qualquer violação do conteúdo do direito essencial do Recorrente exercício da sua profissão, pelo que também não violou o disposto no artigo 47.º da CRP.
W. Também foi com todo o acerto que no douto acórdão recorrido foram julgados improcedentes todos os vícios que o Recorrente tinha atribuído ao impugnado acórdão do Plenário do CSMP de 27 de janeiro de 2014, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva.
X. Com efeito, tal como se decidiu, no caso presente não tem aplicação o disposto no artigo 63.º do EDTFP a que corresponde atualmente o artigo 228.º da LTFP, que prevê a possibilidade de, estando pendente ação administrativa especial com fundamento em preterição de formalidade essencial, o procedimento disciplinar ser renovado, mas somente até ao termo do prazo para contestar a respetiva ação e, inclusivamente, é aproveitável a parte do procedimento não afetada por aquele vício.
Y. Esta renovação deverá ser entendida no sentido de a entidade sancionadora poder corrigir as arguidas preterições de formalidades essenciais, cuja inobservância implica a nulidade de todo o processo disciplinar, suprindo uma preterição de formalidades, e não é esta a situação no caso dos autos, em que, dando execução a um julgado anulatório, se praticou um novo ato em que foi expurgada toda a matéria que determinou a anulação do ato anterior.
Z. Pelo que relativamente ao ato punitivo que o Recorrente impugna na presente ação, nem sequer foi suscitada a preterição de formalidade essencial do procedimento disciplinar, como tinha acontecido no caso da ação anterior.
AA. E, por isso, conforme se afirma no douto acórdão recorrido a arguição da violação do artigo 63.º do EDTFP não faz sentido no âmbito da presente ação, na qual a preterição de formalidade essencial do procedimento disciplinar não se suscitou.
BB. Contrariamente ao que parece pressupor a alegação do recorrente, a anulação judicial de um ato administrativo não inutiliza irreversivelmente o procedimento em que foi praticado, pois é a própria lei - artigo 173.º, n.º 1, do CPTA - que prevê a possibilidade de “praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado”.
CC. O Recorrente vem apresentar uma pretensa interpretação do artigo 63.º, n.º 1, do EDTFP que manifestamente a norma não consente, como é a pretensa proibição de a entidade com poder disciplinar voltar a punir um trabalhador por factos relativamente aos quais no processo disciplinar não ocorreu a preterição de qualquer formalidade, nem ocorreu qualquer um outro vício.
DD. Certo é que o procedimento disciplinar, na parte que foi considerada para a punição do Recorrente, não enferma de qualquer vício ou invalidade, nem à luz dos mencionados artigos 204.º do EMP, 63.º, n.º 1, do EDTFP (ou 228.º da LTFP), 1.º, 2.º e 32.º, n.ºs 2 e 10, da CRP, nem à luz de qualquer outra norma legal ou constitucional aplicável.
EE. E porque assim se entendeu no douto acórdão recorrido, não incorreu este em qualquer erro de julgamento na decisão desta questão, sendo de todo improcedente a alegação do recorrente a este propósito.
FF. Consequentemente, e tal como se decidiu no douto acórdão recorrido, também não assiste a razão quando, a partir da alegada e suposta violação do artigo 63.º do EDTFP, alega que o impugnado acórdão do Plenário do CSMP de 27 de janeiro de 2015 é nulo por violar os artigos 1.º, 2.º, 32.º n.º 2 e n.º 10 e 47.º da CRP.
GG. Razão pela qual não enferma da nulidade cominada agora no artigo 161.º, n.º 2, alínea d) do CPA, e antes no artigo 133.º, n.º 2, al. d), do CPA de 1991, que o Recorrente lhe atribui.
HH. Mas além de não violar essas normas, o ato impugnado tem suporte constitucional nas normas dos artigos 219.º, n.º 4, e 271.º, n.º 1, da CRP, pois o Recorrente está sob alçada da ação disciplinar por via da responsabilidade disciplinar em que incorreu, nos termos do artigo 271.º, n.º 1, da CRP, resultante da “violação dos direitos ou interesses legalmente protegidos dos cidadãos”, como é o direito à boa administração da justiça.
II. E porque assim decidiu, o douto acórdão recorrido não ocorreu qualquer violação do artigo 63.º de EDTFP, nem das normas e princípios constitucionais que o Recorrente indica.
JJ. O Recorrente também não tem razão nas críticas que faz ao douto acórdão recorrido por ter julgado improcedente o alegado vício de falta de fundamentação do ato impugnado.
KK. O acórdão impugnado contém extensa fundamentação, perante a qual um destinatário normal não terá qualquer dificuldade em perceber quais foram as razões de facto e de direito que fundamentaram a decisão disciplinar proferida.
LL. Por isso, se entendeu no douto acórdão recorrido que da análise do conteúdo do ato impugnado “resulta a ‘convicção’ de que está lá tudo o que é indispensável para que um destinatário normal, colocado na posição do destinatário real, que é no caso o autor, possa entender, perfeitamente, aquilo que lhe imputam, e se possa defender com eficácia”.
MM. Também o Recorrente, perante essa fundamentação exaustiva, ficou a perceber perfeitamente quais as razões de facto e de direito por que foi punido pela Autoria, em concurso, por graves violações dos seus deveres funcionais.
NN. Isso mesmo não escapou à cognição do Tribunal, conforme resulta com toda a clareza quando nele se diz: “Aliás, os termos da presente ação [AAE 343/15] são bem a prova de que entendeu tudo o que importa: - as condutas ativas e omissivas que resultaram provadas; - a censura que lhe é dirigida pelas mesmas; - bem como a integração dessas condutas censuráveis nas respetivas hipóteses legais”.
OO. Logo, é sem razão alguma que o Recorrente alega que essa pretensa falta de fundamentação “dificulta ou mesmo impossibilita uma defesa dirigida em termos eficazes”, e que isso “equivale a falta de audiência do arguido, geradora de nulidade insuprível”, pois teve todas as oportunidades de contraditar os factos que lhe foram imputados e o respetivo enquadramento jurídico.
PP. Por isso, a alegação da existência no ato impugnado do vício de falta de fundamentação tinha de improceder, e nenhuma razão assiste ao Recorrente ao alegar que o douto acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento em violação do disposto nos artigos 124.º e 125.º do CPA, 204.º, n.º 1, do EMP, 32.º, n.ºs 1 e 10, 269.º, n.º 3 e 2.º da CRP por ter julgado improcedente a invocação desse inexistente vício de falta de fundamentação.
QQ. Também é sem razão que o Recorrente também vem reiterar a sua alegação de que o ato impugnado padece de erro nos pressupostos de facto e de direito - por ter considerado que o Recorrente, ao “prestar informação errada à hierarquia” violou os deveres de obediência e de correção.
RR. O ato impugnado não enferma de qualquer erro nos pressupostos de facto, pois, os factos considerados na decisão administrativa estão devidamente provados e não existe qualquer desconformidade do seu conteúdo com a realidade.
SS. E quanto aos pressupostos de direito, também não se verifica qualquer erro, pois, fez-se correto enquadramento dos fatos nas normas aplicáveis, que foram devidamente interpretadas e aplicadas.
TT. E também improcede a alegação do Recorrente quando, vem explorar o facto de no douto acórdão recorrido, a propósito deste invocado vício de erro nos pressupostos de direito, se terem tecido considerações acerca da qualificação, que mais corretamente seria o vício de violação de lei, para dizer que então o Tribunal devia ter julgado oficiosamente a existência do vício de violação de lei e, não o tendo feito, que padece da nulidade por omissão de pronúncia cominada pelo artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA.
UU. No douto acórdão recorrido procedeu-se a uma apreciação cuidada sobre um eventual erro de subsunção da respetiva conduta às normas que tipificam as infrações disciplinares por que foi punido o Recorrente, tendo-se concluído que a conduta concreta do Recorrente, considerada em si mesma, surge como conduta ilícita e censurável, a justificar a punição.
VV. Por isso, não se vê como imputar ao douto acórdão recorrido a alegada nulidade por omissão de pronúncia cominada no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, sendo manifesta a improcedência de tal alegação, pelo que também nenhuma razão assiste ao Recorrente ao alegar que o douto acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento e omissão de pronúncia em violação dos artigos 197.º, n.º 1 e 202.º do EMP, 95.º, n.º 2 e 7.º do CPTA, 5.º, n.º 3 do CPC, 2.º, 20.º, 32.º, n.ºs 1 e 10, 202.º, n.ºs 1 e 2, 269.º, n.º 3, 280.º e 18.º, n.º 2 da CRP.
WW. Finalmente, no que respeita à alegada prescrição de infrações e/ou do direito de instaurar o procedimento disciplinar, de igual modo não assiste a razão ao Recorrente na sua discordância com o decidido no douto acórdão recorrido, pois, efetivamente a sua alegação a este propósito também não podia proceder.
XX. Em primeiro lugar, o Recorrente incorre em erro crasso quando afirma que as infrações disciplinares por via de atrasos no despacho de encerramento dos processos se consumam quando termina no prazo de 10 dias em que deve ser proferido o despacho (cf. artigos 105.º, 277.º, n.º 1 e 283.º, n.º 1 do Código de Processo Penal), e que nessa data começa a correr o prazo de prescrição.
YY. Relativamente aos atrasos no despacho de encerramento dos processos, o Recorrente efetivamente incorreu na prática de infrações permanentes, pelo que o prazo de prescrição só começa a correr na data em que cessa a infração disciplinar permanente, e não na data em que se inicia.
ZZ. Assim, ao considerar que as infrações disciplinares por via dos atrasos nos despachos dos processos se mantêm desde o termo do prazo legal de 10 dias até à data em que o magistrado despacha os processos ou deixa de os ter na sua titularidade, o douto acórdão recorrido não incorreu em qualquer erro de julgamento, nem violou o disposto no artigo 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, nem o artigo 178.º, n.º 1, da LTFP, pelo que também não violou o artigo 32.º, n.º 2, da CRP.
AAA. Em segundo lugar, o Recorrente não tem razão ao defender a aplicação imediata e retroativa ao seu caso da norma do artigo 178.º, n.º 1, da LTFP - que veio estabelecer o prazo de um ano de prescrição da infração disciplinar - por efeito do disposto no artigo 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho;
BBB. Nestes casos em que uma norma inovadora estabelece um novo prazo, aplica-se o artigo 297.º, n.º 1, do Código Civil que, a propósito das alterações de prazo, dispõe que “a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar”.
CCC. Com efeito, conforme ensinamento dos Professores Pires de Lima e Antunes Varela (v. Código Civil Anotado, Volume I, 3.ª edição, p. 269, e jurisprudência aí citada), “deve entender-se para aplicação da regra do n.º 1 deste artigo, que se trata de um prazo mais curto, quando a lei antiga não estabelecia qualquer prazo para o exercício do direito e ele veio a ser estabelecido pela lei nova (…). É um caso implicitamente compreendido naquela regra”.
DDD. À luz deste entendimento, falece por completo a argumentação do recorrente no sentido de que o artigo 297.º do Código Civil não é aplicável pelo facto de não estarmos perante uma situação de alteração de prazos preexistentes.
EEE. Foi, pois, com todo o acerto que no douto acórdão recorrido se entendeu que “da alegada omissão no artigo 11.º da Lei n.º 35/2014, de 20.06, de norma equivalente ao n.º 3, do artigo 4.º, da Lei n.º 58/2008, de 09.09, não é legítimo concluir pela aplicação imediata, e irrestrita, do seu n.º 1, no tocante a prazos de prescrição, pois, que sempre deverá ser tida em conta a regra geral de aplicação das normas de alteração de prazos consagrada no Código Civil. Aliás, é porque essa regra geral existe, que se torna desnecessário repeti-la no artigo 11.º em referência”.
FFF. O Recorrente ainda incorre num terceiro erro, consistente em não atentar que o prazo de prescrição das infrações só corre até que seja instaurado o procedimento disciplinar.
GGG. Relativamente às infrações por que foi punido disciplinarmente o Recorrente, os respetivos prazos de prescrição já não estavam a correr, porque foi instaurado tempestivamente o procedimento disciplinar, pelo que não tem aplicação o artigo 178.º, n.º 1, da LTFP.
HHH. E também por esta razão, não colhe a alegação do Recorrente quando busca apoio para a sua tese no artigo 29.º, n.º 4, da CRP, pois, já não podia haver lugar à aplicação de uma lei mais favorável quanto à prescrição da infração, que impede a instauração do procedimento disciplinar, quando este já tinha sido instaurado tempestivamente.
III. O Recorrente não tem razão alguma ao imputar ao douto acórdão recorrido a nulidade por omissão de pronúncia também a propósito desta questão das prescrições, dizendo que olvidou o conhecimento da questão da prescrição relativamente a algumas infrações disciplinares.
JJJ. Com efeito, o douto acórdão recorrido começa por apreciar a questão da consumação das infrações disciplinares por via de atrasos nos despachos de encerramento dos processos, decidindo que o recorrente não tem razão, mas depois prossegue na apreciação da questão da aplicação do artigo 178.º, n.º 1, da LTFP ao caso do Recorrente, decidindo que também aqui não tem razão.
KKK. Ora, era na aplicação da norma do artigo 178.º, n.º 1, da LTFP que o Recorrente alicerçava a sua alegação a invocar a prescrição das demais infrações, e o douto acórdão recorrido não lhe deu razão, explicando devidamente as razões do seu entendimento no sentido de que a norma não tem aplicação no caso do Recorrente.
LLL. E concluiu inequivocamente que “sucumbindo estas duas razões fundamentais, em que o autor alicerça a questão da prescrição das infrações referidas, logicamente que deverá improceder esta última, por falta do seu suporte fundamentador”.
MMM. Por isso, é absolutamente destituída de fundamento a invocação da nulidade do douto acórdão recorrido por omissão de pronúncia (artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, ex vi do artigo 1.º do CPTA), também nesta parte do conhecimento da invocada prescrição das infrações.
NNN. O Recorrente também não tem razão na crítica que faz ao … ter considerado que no âmbito dos processos disciplinares de que são alvo os magistrados do Ministério Público o direito de instaurar o procedimento disciplinar não prescreve no prazo de 60 dias sobre o conhecimento da infração por qualquer superior hierárquico, apenas prescrevendo no aludido prazo após conhecimento da infração pelo Procurador-Geral da República ou pelo Conselho Superior do Ministério Público.
OOO. Relativamente aos magistrados do Ministério Público, a competência para instaurar o procedimento disciplinar está atribuída a dois órgãos diferentes: ao Procurador-Geral da República (artigo 12.º, n.º 2, al. f), do EMP) e ao Conselho Superior do Ministério Público (artigo 27.º, alíneas a) e g), do EMP).
PPP. Por isso, o prazo de prescrição do direito de instaurar o procedimento disciplinar só começa a correr com o conhecimento da infração tanto pelo Procurador-Geral da República como pelo Conselho Superior do Ministério Público, sendo relevante o conhecimento da infração que ocorrer em primeiro lugar.
QQQ. Este entendimento, que se reporta aos magistrados do Ministério Público assenta no pressuposto de que todos os prazos de prescrição têm por base a inércia no exercício de um direito por parte do seu titular, pelo que não faz sentido que um prazo do género se inicie se a inércia for de outrem, que não do titular do direito.
RRR. E é pacífico na jurisprudência do STA, pois, decorre inequivocamente do facto de o regime disciplinar geral só ser aplicável aos magistrados do Ministério Público subsidiariamente, por remissão do artigo 216.º do EMP, ou seja, em tudo o que não contrarie o Estatuto, como, de resto, consta expressamente nessa norma remissiva.
SSS. Pelo que a aplicabilidade do artigo 178.º, n.º 2, da LTFP à responsabilidade disciplinar dos magistrados do Ministério Público não é completa, pois, se o fosse - em termos de abranger o conhecimento da infração «por qualquer superior hierárquico» - tal norma estaria a ser subsidiariamente recebida pelo EMP de modo «contrário» ao que nele se prevê e, nessa medida, ao arrepio do que se estabelece no seu artigo 216.º, que determina a aplicação supletiva das normas aplicáveis aos trabalhadores em funções públicas, mas apenas na medida em que não forem contrárias a esse Estatuto.
TTT. Por isso, o douto acórdão recorrido não incorreu em qualquer erro de julgamento e omissão de pronúncia em violação dos artigos 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, de 20 de junho, e 178.º, n.º 1, da LTFP, ex vi do artigo 216.º do EMP, nem o disposto nos artigos 29.º, n.º 4, e 32.º, n.º 2, da CRP, sendo de todo improcedente a alegação do Recorrente nesse sentido.
UUU. Em suma: o douto acórdão recorrido não enferma de nenhum dos defeitos que o Recorrente lhe atribui, não violou as normas e princípios legais e constitucionais que o Recorrente lhe atribui, antes fez correta interpretação e aplicação do direito, pelo que não é merecedor de qualquer censura, devendo ser integralmente mantido, na total improcedência da alegação do Recorrente …».

6. Por acórdão do STA, proferido em 14.09.2017 [cfr. fls. 786/788], foi sustentada a decisão recorrida, tendo-se concluído pelo desatendimento das nulidades por omissão de pronúncia arguidas.

7. Colhidos os vistos legais foram os autos submetidos à Conferência para o seu julgamento.



DAS QUESTÕES A DECIDIR
8. Constituem objeto de conhecimento as questões que se prendem com:
A) as arguidas nulidades de decisão [cfr. art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC - na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 41/2013 (redação a que se reportarão todas as ulteriores referências ao referido Código sem expressa menção em contrário) ex vi do art. 01.º do CPTA - nulidades por omissão de pronúncia] por:
i) não conhecimento da questão de saber qual o tipo de concurso de infrações disciplinares referido no ponto 10 da parte III do acórdão recorrido [conclusões HH, II, SS e VV];
ii) não conhecimento oficioso de ilegalidade que o A./Recorrente, alegadamente, devia ter invocado [conclusões MM, OO a RR];
iii) não conhecimento, tal como era dever de ofício, de outros vícios de que padeciam os acórdãos impugnados, ocorrendo igualmente erro de julgamento [conclusões XX e ZZ];
iv) não conhecimento da prescrição por: (1) não dedução de pedido de indemnização cível; (2) não instauração de procedimento criminal; (3) não promoção de extinção de medida de coação; (4) avocação de processos; (5) não dedução de despacho no prazo de dez dias; (6) não seguimento da linha investigatória que ao caso cabia; (7) não tramitação de processo urgente; e (8) prestação de informações erróneas à hierarquia [conclusão AAA]; e
B) os demais erros de julgamento, por:
v) incorreta interpretação e aplicação dos arts. 161.º, n.º 1, al. b), do EMP, e 173.º, n.ºs 1 e 2, do CPTA, e, ainda, dos princípios da boa-fé [arts. 266.º, n.º 2, da CRP e 06.º-A, do CPA], da confiança ínsito na ideia de Estado de direito democrático [art. 02.º, da CRP], do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares [art. 266.º, n.º 1, da CRP], em ofensa, ainda, o conteúdo essencial do direito fundamental ao exercício da profissão [art. 47.º, da CRP], e consequente nulidade nos termos dos arts. 133.º, n.º 2, al. d), e 134.º, do CPA [conclusões B a F];
vi) incorreta interpretação e aplicação da norma ínsita no art. 63.º do ED/2008 ex vi do art. 216.º do EMP [atual art. 228.º da LTFP] e, ainda, dos arts. 01.º, 02.º, 20.º, 32.º, n.ºs 2 e 10, e 47.º, 202.º, n.ºs 1 e 2, da CRP e consequente nulidade nos termos dos arts. 133.º, n.º 2, al. d), e 134.º, do CPA [conclusões G a U];
vii) incorreta interpretação e aplicação dos arts. 124.º, 125.º do CPA, 197.º, n.º 1, do EMP e dos princípios do Estado de direito democrático [art. 02.º, da CRP] e da salvaguarda das garantias de audiência e de defesa do arguido [arts. 32.º, n.ºs 1 e 10, 269.º, n.º 3, da CRP] ao ter julgado improcedente a ilegalidade relativa à falta de fundamentação [conclusões V a DD];
viii) incorreção do juízo de improcedência das ilegalidades por erros nos pressupostos de facto e de direito, já que em violação, nomeadamente, dos arts. 03.º, n.ºs 2, als. f) e h), 8 e 10, do ED/2008 [atual art. 73.º, n.ºs 2, als. f) e h), 8 e 10, da LTFP] [conclusões EE a GG, JJ a LL, NN, TT, UU, WW];
ix) incorreção do juízo de improcedência das ilegalidades relativas à ocorrência de prescrição das infrações disciplinares em causa e do direito de instaurar o respetivo procedimento disciplinar, já que em violação, nomeadamente, dos arts. 178.º, n.ºs 1 e 2, da LTFP, ex vi do art. 216.º do EMP, 29.º, n.º 4, e 32.º, n.º 2, da CRP, 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, e 297.º do CC [conclusões BBB a GGG] [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].



FUNDAMENTAÇÃO
DE FACTO
9. Resulta como assente nos autos o seguinte quadro factual:
I) O A. é Procurador da República e exerceu funções no Círculo Judicial ………… até 25.01.2000 - Nota biográfica de folhas 77 e 78 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15], e aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
II) Em 28.01.2000, o A. tomou posse no DIAP …………. - Nota biográfica de folhas 77 e 78 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15], e aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
III) Em 17.02.2009, foi iniciado o inquérito disciplinar n.º …………, no qual o A. foi visado - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
IV) Esse inquérito foi convertido no processo disciplinar [«PD»] n.º ……….. - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
V) Em 13.04.2009, o A. foi transferido, a seu pedido, para o Círculo Judicial de ………….., passando a exercer funções no Tribunal ……….- aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
VI) Em 16.04.2009, foi elaborado o relatório final no âmbito do «PD» n.º ……….., tendo o Instrutor concluído que o A. havia incorrido na prática de violação continuada do dever profissional de zelo - por: a) não ter prestado informação e ter incumprido a obrigação de movimentar e despachar, em tempo útil o Processo ..............., cujo procedimento estava em risco de prescrição; b) não ter procedido às diligências de reforma de processos desaparecidos do seu gabinete em 2006; e c) não ter despachado os processos dentro dos prazos legalmente previstos, cujos procedimentos criminais se encontravam em risco de prescrição - propondo que lhe fosse aplicada a pena de transferência - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
VII) Por acórdão de 12.05.2009, a Secção Disciplinar do «CSMP» [«SD/CSMP»] procedeu a um «novo enquadramento da materialidade disciplinarmente censurável», tendo determinado que os autos fossem devolvidos ao Instrutor para realização de novas diligências e entendido como adequada a pena de inatividade, graduada, no seu máximo, em 02 anos - aceite pelo R. no artigo 29º da contestação.
VIII) Em 18.05.2009 foi prestada informação pelo Procurador-Geral Distrital [que constitui folhas 02 a 05 do «PD» n.º ……… e documentos que se lhe seguem, sobre o qual incidiu o despacho de folhas 96 e 97 do mesmo «PD» - ver artigos 32.º e 33.º da contestação a folha 163 destes autos].
IX) Em 17.06.2009 o A., notificado para o efeito, exerceu o seu direito de defesa - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
X) Em 30.06.2009, foi proferido despacho pelo Procurador-Geral da República que determina a instauração de inquérito ao A. «para averiguação da matéria de facto não abrangida pelo objeto» do «PD» n.º ……… - aceite pelo R. no artigo 29º da contestação.
XI) Em 14.07.2009, foi iniciado inquérito, que levou o n.º ………., determinado pelo referido despacho de 30.06.2009 - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XII) Por acórdão da «SD/CSMP» de 11.09.2009, proferido no âmbito do «PD» n.º ……….., foi aplicada ao A. a pena de inatividade por 18 meses - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XIII) Em 29.09.2009, o A. apresentou reclamação desse mesmo acórdão para o Plenário do «CSMP» - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XIV) Em 20.10.2009, foi proferido acórdão pelo Plenário do «CSMP», que desatendeu a reclamação e manteve o acórdão da «SD/CSMP» de 11.09.2009 - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XV) O A. impugnou este acórdão do Plenário do «CSMP» junto deste STA, através da ação administrativa especial [«AAE»] que levou o n.º 1214/09, bem como solicitou, por apenso à mesma, o decretamento de providência cautelar de suspensão daquele ato [processo cautelar n.º 1217/09], a qual foi decretada - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XVI) Em 16.12.2009, foi proferido acórdão pela «SD/CSMP» que determina a conversão da parte instrutória do inquérito n.º ………. em processo disciplinar [«PD»] que veio a levar o n.º ……… - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XVII) Em 06.04.2010, foi apresentado relatório final no âmbito do «PD» n.º ………., tendo sido proposta a aplicação ao A. da pena de aposentação compulsiva - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XVIII) Em 30.04.2010, foi proferido acórdão pela «SD/CSMP», no «PD» n.º …….., que aplicou ao A. a pena disciplinar de aposentação compulsiva - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XIX) O A. apresentou reclamação do acórdão da «SD/CSMP» para o Plenário do «CSMP», invocando diversas ilegalidades, designadamente, a violação do princípio ne bis in idem - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XX) Em 14.07.2010, foi proferido acórdão pelo Plenário do «CSMP» que desatendeu reclamação interposta pelo A., mantendo o acórdão da «SD» na parte que aplicou a pena de aposentação compulsiva, e efetuou o cúmulo jurídico das penas aplicadas ao A. no «PD» n.º ……….. e no «PD» n.º ……….. - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXI) O A. impugnou este acórdão do Plenário do «CSMP» junto deste STA, através da «AAE» que levou o n.º 772/10, bem como solicitou, por apenso à mesma, o decretamento de providência cautelar de suspensão daquele ato [processo cautelar n.º 637/10], a qual foi indeferida - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXII) Em 11.01.2011 foi proferido acórdão na «AAE» n.º 1214/09, que julgou a mesma parcialmente procedente - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXIII) Deste acórdão de 11.01.2011 foi interposto recurso para o Pleno da 1.ª Secção do STA, quer pelo A. quer pelo «CSMP», cuja decisão ainda se desconhece.
XXIV) Em 21.06.2011 foi proferido acórdão pela 1.ª Secção de Contencioso Administrativo do STA que julgou procedente a «AAE» n.º 772/10, [i] declarando nulo o acórdão do «CSMP», de 14.07.2010, nela impugnado, por violação do princípio ne bis in idem [ii] condenando o «CSMP» a reconstituir a situação atual hipotética, não recaindo nos vícios invalidantes se, ao proceder à reconstituição, voltar a punir disciplinarmente o A., e [iii] condenando o «CSMP» nas custas do processo - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXV) Na medida em que parte dos vícios que o A. invocou contra o acórdão do «CSMP» não foi procedente, o A. recorreu do mencionado acórdão de 21.06.2011 para o Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do STA - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXVI) O «CSMP» também recorreu - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXVII) Em 23.01.2013, foi proferido acórdão pelo Pleno da Secção Administrativa do STA que negou provimento aos dois recursos interpostos, mantendo, por conseguinte, a decisão de 21.06.2011, da Secção de Contencioso Administrativo, que julgara procedente a ação especial, declarando nulo o acórdão do «CSMP», de 14.07.2010, por violação do princípio ne bis in idem - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXVIII) Em 15.02.2013, o Plenário do «CSMP» proferiu acórdão no sentido da execução do acórdão do Pleno do STA de 23.01.2013, e nos termos do qual determinou sumariamente [i] que o A. estava, desde o dia 13.02.2013, em exercício de funções, no regime de disponibilidade, ao abrigo do artigo 161.º, n.º 1, alínea b), do «EMP», [ii] a imediata restituição de todas as quantias que tivessem sido retidas a título de execução da pena de aposentação compulsiva, anteriormente anulada, desde a data do início da sua execução, em 24.07.2010 até 12.03.2013, [iii] o processamento do vencimento e demais abonos do A., como se estivesse em efetivo exercício de funções, resultantes da remoção da materialidade considerada inutilizável para efeitos punitivos - aceite pelo R. no artigo 29.º da Contestação; ver documentos de folhas 30 a 31 do «PD»………….., Livro «RMP», Apenso …….., Execução do Julgado Anulatório.
XXIX) Em 15.02.2013, a «SD/CSMP» proferiu acórdão, em execução do acórdão do Pleno do STA de 23.01.2013, por via do qual aplicou novamente ao A. a pena de aposentação compulsiva no âmbito do «PD» n.º ……….. e, por via do disposto no artigo 188.º do Estatuto do Ministério Público [EMP], efetuou o cúmulo das penas impostas nesse «PD» e no «PD» n.º …….. - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver documento de folhas 32 a 87 do «PD» n.º ………., Apenso………, Execução do Julgado Anulatório.
XXX) Em 25.02.2013, o A. arguiu a nulidade do acórdão da «SD» de 15.02.2013, por preterição do exercício do seu direito fundamental de audiência e defesa - aceite pelo R. no artigo 29º da contestação; ver documento de folhas 97 e 98 do «PD» n.º ………., Apenso …….., Execução do Julgado Anulatório, e documento de folhas 90 e 91 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XXXI) Em 07.03.2013 o A. reclamou do acórdão da «SD/CSMP» para o Plenário do «CSMP» - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver documentos de folhas 102 a 126 e 128 a 151 do «PD» n.º……….., Apenso ………, Execução do Julgado Anulatório, e documento de folhas 92 a 103 verso dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XXXII) Em 04.06.2013, foi proferido acórdão pelo Plenário do «CSMP» que desatendeu a reclamação apresentada pelo A. contra o acórdão da «SD/CSMP» de 15.02.2013 - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver documento de folhas 159 a 160 verso do «PD» n.º ………., Apenso ……., Execução do Julgado Anulatório, e documento de folhas 107 a 109 verso dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XXXIII) O A. impugnou este acórdão do Plenário do «CSMP» junto deste STA, através da «AAE» que levou o n.º 1169/13 - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXXIV) Em 30.10.2014, foi proferido acórdão pela 1.ª Secção do STA - para cujo conteúdo se remete - que julgou procedente a «AAE» n.º 1169/13 e anulou o ato punitivo impugnado - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver documento de folhas 110 a 132 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XXXV) Deste acórdão de 30.10.2014 não foi interposto qualquer recurso jurisdicional - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação.
XXXVI) Em 02.12.2014, foi proferido acórdão pelo Plenário do «CSMP», em execução do julgado pelo acórdão do STA de 30.10.2014, no qual foi decidido: «1- Remeter à SD/CSMP o processo para que, uma vez transitado o acórdão, procedesse à reapreciação dos factos e da matéria ainda considerada utilizável pelo acórdão do STA para efeitos punitivos; 2- Determinar que o Procurador da República Lic. A…………, após trânsito em julgado do acórdão do STA, ficasse na situação de disponibilidade, nos termos do artigo 161.º, n.º 1, alínea b), do EMP; 3- Comunicar à Direcção-Geral de Administração da Justiça que deverá diligenciar, uma vez transitado o acórdão anulatório, pela restituição de todas as quantias que tenham sido retidas a título de execução da pena de Aposentação Compulsiva desde a data do início da sua execução, como se estivesse em efetivo exercício de funções, até à data de regresso à atividade do magistrado; 4- Determinar aos Serviços de Apoio ao Conselho Superior do Ministério Público que procedessem, após trânsito do acórdão do STA, à retificação do tempo de serviço do Procurador da República Lic. A………… e à correção do seu posicionamento na Lista de Antiguidade - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver ofícios de folhas 346 e 347, e acórdão de folhas 344 e 345, do «PD» n.º ……….., Livro «RMP», Apenso…….., volume II, AAE n.º 1169/13, Execução do Julgado Anulatório; documento junto a folhas 86 a 88 dos presentes autos, e folhas 135 a 137 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XXXVII) Por ofício datado de 09.12.2014, o A. foi notificado deste acórdão do Plenário do «CSMP» - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver ofícios de folhas 346 e 347, e acórdão de folhas 344 e 345, do «PD» n.º ……………, Livro RMP, Apenso …….., volume II, AAE n.º 1169/13, Execução do Julgado Anulatório; documento junto a folhas 86 a 88 dos presentes autos, e folhas 135 a 137 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XXXVIII) Em 16.12.2014, foi proferido acórdão pela «SD/CSMP» que procedeu à execução do julgado anulatório do STA/Pleno de 30.10.2014, procedendo à remoção da materialidade considerada inutilizável para efeitos punitivos, e fazendo incidir, sobre a materialidade remanescente, o seu juízo de censura disciplinar e aplicando a pena que se mostre adequada. Aplicou novamente a pena disciplinar de aposentação compulsiva ao A. - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver ofícios de folhas 391 e 392, e acórdão inserto a folhas 348 a 376 do «PD» n.º……….., Livro RMP, Apenso …….., volume II, AAE n.º 1169/13, Execução do Julgado Anulatório, e documento junto a folhas 89 a 119 dos presentes autos e 138 a 167 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XXXIX) Por ofício datado de 16.12.2014, o A. foi notificado deste acórdão da «SD/CSMP» - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver ofícios de folhas 391 e 392, e acórdão inserto a folhas 348 a 376 do «PD» n.º ………., Livro RMP, Apenso …….., volume II, AAE n.º 1169/13, Execução do Julgado Anulatório, e documento junto a folhas 89 a 119 dos presentes autos e 138 a 167 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XL) O A. reclamou para o Plenário do «CSMP» deste acórdão da «SD», proferido em 16.12.2014 - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver documento de folhas 400 a 418 verso do «PD» n.º ………, Livro «RMP», Apenso ………, volume II, AAE n.º 1169/13, Execução do Julgado Anulatório, e documento de folhas 169 a 187 verso dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XLI) Em 27.01.2015, foi proferido acórdão pelo Plenário do «CSMP» que indeferiu a reclamação do acórdão da «SD/CSMP» de 16.12.2014, feita pelo A., mantendo o acórdão na ordem jurídica - aceite pelo R. no artigo 29.º da contestação; ver acórdão inserto a folhas 433 a 462 do «PD» n.º ………, Livro RMP, Apenso ……, volume II, AAE n.º 1169/13, Execução do Julgado Anulatório, e documento de folhas 120 a 152 dos presentes autos, e de folhas 195 a 227 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XLII) O A. tem 60 anos de idade - Nota biográfica de folhas 77 e 78 dos autos de providência cautelar [Processo n.º 246/15].
XLIII) O A. tem quatro classificações de serviço, duas como delegado e duas como procurador da República - Nota biográfica de folhas 77 e 78 dos autos.
XLIV) Como delegado do procurador da República o A. foi, sucessivamente, classificado de «Bom com Distinção» e «Muito Bom», pelo seu serviço no ……. Juízo Criminal ………. e ………. Juízo Correcional ……….., por acórdãos do «CSMP» de 20.09.1988 e de 24.03.1993 - Nota biográfica de folhas 77 e 78 dos autos.
XLV) Como procurador da República o A. foi, também, sucessivamente classificado de «Bom com Distinção» e «Muito Bom» pelo seu serviço no Círculo Judicial ………….. e no «DIAP»…………, por acórdãos do «CSMP» de 03.05.2000 e de 29.10.2004 - Nota biográfica de folhas 77 e 78 dos autos.
XLVI) O A. foi considerado, pelo «PGD» …………. como «um magistrado de excelência» que «tem desenvolvido um trabalho notável na luta contra a criminalidade violenta, é um magistrado que mantém com todos os OPC’s uma relação corretíssima e que, não poucas vezes, o [nomeou], nos termos do artigo 73.º, n.º 1, alínea c), do EMP, para acompanhar até final processos de crimes violentos, o que sempre prontamente cumpriu» - páginas 49 dos documentos n.º 10 e n.º 12 juntos com o requerimento cautelar.
XLVII) O A. foi considerado pela Diretora do «DIAP» …………. como «um magistrado muito trabalhador, empenhado, competente, sério, leal e sempre disponível» e que «sempre se disponibilizou para que lhe fossem atribuídos os processos mais complexos de criminalidade violenta, de natureza Distrital que ele acompanhou e dirigiu, com êxito, muito tendo contribuído, com a sua atuação e colaboração com os OPC’s para o combate a este tipo de crimes, não só ………… como no Distrito Judicial ………., sendo-lhe atribuídos inúmeros processos desta natureza, atenta a eficácia do seu desempenho, muitos [dos quais] a seu pedido, por alguns dos arguidos estarem relacionados com outros processos, que acompanhou na fase de julgamento» - folhas 49 e seguintes dos documentos n.º 10 e n.º 12 juntos com o requerimento cautelar.
XLVIII) O A. foi considerado pela Diretora deste mesmo Departamento como «um magistrado que tem demonstrado grande competência funcional e conhecimentos sólidos e permanente disponibilidade para o serviço» - folhas 50 dos documentos n.º 10 e n.º 12 juntos com o requerimento cautelar.


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3. 2. DE DIREITO
Assente que se mostra o quadro factual antecedente passemos, então, à apreciação das questões atrás elencadas enquanto fundamentos recursivos.

10. Sustenta o A., aqui recorrente, que o acórdão recorrido enferma de nulidades por omissão de pronúncia [cfr. art. 615.º, n.º 1, al. d), do CPC ex vi do art. 01.º do CPTA], porquanto não tomou conhecimento i) da questão de saber qual o tipo de concurso de infrações disciplinares referido no ponto 10 da parte III do acórdão recorrido [conclusões HH, II, SS e VV]; ii) de modo oficioso da ilegalidade que o A./Recorrente, alegadamente, devia ter invocado e não fez [conclusões MM, OO a RR]; iii) de outros vícios de que padeciam os acórdãos impugnados tal como era seu dever de ofício efetuar nos termos dos arts. 07.º e 95.º, n.º 2, do CPTA, 05.º, n.º 3, do CPC [conclusões XX e ZZ]; iv) da prescrição por: 1) não dedução de pedido de indemnização cível; 2) não instauração de procedimento criminal; 3) não promoção de extinção de medida de coação; 4) avocação de processos; 5) não dedução de despacho no prazo de dez dias; 6) não seguimento da linha investigatória que ao caso cabia; 7) não tramitação de processo urgente; e 8) prestação de informações erróneas à hierarquia [conclusão AAA].

11. Por força do disposto nos arts. 613.º, n.º 2, 615.º, 616.º, n.º 2, 617.º e 666.º do CPC ex vi dos arts. 01.º e 140.º do CPTA, os acórdãos são suscetíveis da imputação não apenas de erros materiais, mas, também, de nulidades.

12. Estipula-se no art. 615.º do CPC, sob a epígrafe de “causas de nulidade” e na parte que ora releva, que as decisões judiciais são nulas «quando: … d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar …» [n.º 1], derivando ainda do mesmo preceito que as «nulidades mencionadas nas alíneas b) a e) do n.º 1 só podem ser arguidas perante o tribunal que proferiu a sentença - acórdão [cfr. n.º 1 do art. 666.º CPC] - se esta não admitir recurso ordinário, podendo o recurso, no caso contrário, ter como fundamento qualquer dessas nulidades ...» [n.º 4].

13. Caraterizando em que se traduz a nulidade da decisão por infração ao disposto na al. d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC temos que a mesma se consubstancia na infração ao dever que impende sobre o tribunal de resolver todas as questões que as partes hajam submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja ou fique prejudicada pela solução dada a outras [cfr. art. 608.º, n.º 2, CPC] ou, ainda, cujo conhecimento se mostre, entretanto, abrangido pelo efeito de caso julgado que se haja formado [cfr. arts. 619.º a 621.º do CPC] ou em que legalmente exista uma limitação/preclusão ao conhecimento de questões/exceções que obstem ao conhecimento de mérito da causa após prolação despacho saneador [cfr. art. 87.º, n.º 2, do CPTA].

14. Questões para este efeito são, assim, todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que exigem decisão do julgador, bem como, ainda, os pressupostos processuais [gerais e específicos] debatidos nos autos, sendo que não podem confundir-se aquilo que são as questões que os litigantes submetem à apreciação e decisão do tribunal com o que são as razões de facto ou de direito, os argumentos, ou os pressupostos em que cada a parte funda a sua posição nas questões objeto de litígio.

15. Daí que as questões suscitadas pelas partes e que justificam a pronúncia do tribunal terão de ser determinadas pelo binómio causa de pedir-pedido, pelo que não incorrerá na nulidade em referência o julgador que, apreciando na decisão todos os problemas/questões fundamentais objeto do litígio, não se pronunciou, todavia, sobre a bondade de todas as considerações, razões ou argumentos apresentados pelas partes.

16. Presentes os considerandos caraterizadores do fundamento de nulidade de decisão em crise temos que, no caso, não se descortina que haja ocorrido uma qualquer omissão de pronúncia por parte do acórdão recorrido, já que totalmente insubsistente se mostra a motivação do Recorrente.

17. Desde logo, e quanto à questão de saber qual o tipo de concurso de infrações disciplinares referido no ponto 10 da parte III do acórdão recorrido temos que a pronúncia firmada mostra-se proferida no contexto e apreciação da ilegalidade relativa ao «erro nos pressupostos de facto e de direito» suscitada pelo A., aqui Recorrente, sendo que a mesma surge no quadro da argumentação e fundamentação utilizada pelo Tribunal para demonstrar, no seu juízo, a improcedência da concreta ilegalidade já que deficientemente enquadrada, e sem que revestisse ou assumisse a formulação de uma nova questão em termos oficiosos e cujo conhecimento se impusesse ao tribunal.

18. Como com pleno acerto se afirma na decisão de sustentação, pretendeu-se tão-só «mostrar que o vício apontado não ocorria, e que, além disso, face à posição de fundo do autor, a sua alegação tinha sido deficientemente enquadrada».

19. Por outro lado, presentes os poderes do julgador administrativo insertos no art. 95.º do CPTA, e independentemente daquilo que constitui o seu âmbito e do que sejam os seus limites, temos que não gera nulidade por omissão de pronúncia o não conhecimento por parte do tribunal de ilegalidades que, eventualmente, se pudessem evidenciar [cfr., entre outros, o Ac. do STA de 13.07.2011 - Proc. n.º 01111/09 consultável in: «www.dgsi.pt/jsta» - sítio a que se reportarão todas as demais citações de acórdãos deste Tribunal sem expressa referência em contrário].

20. Como afirmou este Supremo no acórdão acabado de citar, o facto de o tribunal «não ter identificado outras causas de invalidade (…), não integra a pretendida nulidade por omissão de pronúncia, apenas podendo entender-se que o juiz não detetou o vício ou que o considerou como não verificado e não encontrou motivo para exercer a apreciação oficiosa», na certeza de que este entendimento em nada contende com aquilo que resulta disciplinado nos arts. 07.º e 95.º, n.º 2, do CPTA, 02.º, 20.º, 202.º da CRP, e 05.º, n.º 3, do CPC, que, desta feita, não saem também in casu minimamente beliscados, inexistindo, como tal, qualquer erro de julgamento.

21. Com efeito, a decisão que foi proferida não foi uma decisão de forma, mas antes uma decisão de mérito, decisão esta que, aliás, recaiu sobre a concreta pretensão impugnatória deduzida pelo A., e na qual o Tribunal, no uso dos seus poderes, fez aplicação do direito à factualidade fixada, conhecendo de todos os fundamentos de ilegalidade que foram acometidos à deliberação disciplinar punitiva impugnada pelo A., a quem e sobre quem impendia, à luz do princípio do dispositivo, o ónus de alegação dos factos essenciais que constituíam os fundamentos de ilegalidade e as razões de direito em que radicava a causa de pedir que serviu de fundamento à presente ação [cfr. arts. 02.º, 03.º, 50.º, n.º 1, 78.º, n.ºs 1 e 2, al. f), 95.º do CPTA, 03.º, n.º 1, e 05.º do CPC], cientes de que a dedução da mesma é demonstração cabal da observância do direito de ação para tutela do direito de que se arroga.

22. E, no mais, importa ainda ter presente que o poder afirmado no art. 95.º, n.º 2 do CPTA, por um lado, não se confunde com o princípio iura novit curia [cfr. n.º 3 do art. 05.º do CPC], pois ali não está em causa a sujeição ou não do julgador às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito, ou uma questão de diversa qualificação jurídica ou normativa dos fundamentos de ilegalidade invocados, e, por outro lado, não desonera o demandante dos deveres que decorrem do princípio do dispositivo e do princípio a ele inerente da autorresponsabilidade das partes, sendo que não é função, nem cabe ao tribunal o estar a «especular» ou a «conjeturar» sobre a ocorrência de eventuais ou de hipotéticos fundamentos de ilegalidade de que o ato impugnado pudesse ter para, de seguida, proceder ao seu tratamento jurídico.

23. Por fim, e ainda quanto à alegada omissão de pronúncia respeitante à questão da prescrição das infrações disciplinares pelas quais o A. foi punido a mesma terá de ser considerada igualmente improcedente, dado encontrar-se tratada no acórdão recorrido sob os pontos 12 e 13 da parte III [«De Direito»], aí se elencando, em súmula, as queixas apontadas pelo A. e nas quais o mesmo estriba a pretendida prescrição de infrações, e se condensa a sua argumentação em «duas ordens de razões» nucleares que suportam todas as outras, tendo sido depois, em torno destas razões, que o acórdão procedeu à análise da questão da prescrição, julgando-a improcedente, juízo este com o qual aquele não se conforma.

24. Ocorre que uma tal discordância não integra a previsão da al. d) do n.º 1 do art. 615.º do CPC, não gerando uma qualquer nulidade de decisão, termos em que, de harmonia com o exposto, não podendo imputar-se ao acórdão recorrido uma qualquer omissão de pronúncia, terá a arguida nulidade de soçobrar in toto, assim como o apontado erro de julgamento [conclusões HH, II, MM, OO a SS, VV, XX, ZZ e AAA].

25. Centremos, agora, à análise nos demais erros de julgamento acometidos ao acórdão recorrido pelo A., ora Recorrente.

26. Aponta este, como primeiro erro de julgamento do acórdão recorrido [conclusões B) a F)], a incorreta interpretação e aplicação feita no mesmo dos arts. 161.º, n.º 1, al. b), do EMP, e 173.º, n.ºs 1, 2, e 4, do CPTA, e, ainda, dos princípios da boa-fé [arts. 266.º, n.º 2, da CRP e 06.º-A, do CPA], da confiança ínsito na ideia de Estado de direito democrático [art. 02.º da CRP], do respeito pelos direitos e interesses legítimos dos particulares [art. 266.º, n.º 1, da CRP] e do direito fundamental ao exercício da profissão [art. 47.º da CRP].

27. Sustenta que ao haver julgado improcedente o fundamento de ilegalidade assacado à deliberação do Plenário do «CSMP» de 02.12.2014 - na parte em que na mesma se determina que o A. fique na situação de disponibilidade, nos termos do art. 161.º, n.º 1, al. b), do EMP - tal mostra-se feito em infração ao quadro normativo e principiológico supra convocado.

28. Extrai-se do art. 161.º do EMP, sob a epígrafe de “disponibilidade”, que «[c]onsideram-se na situação de disponibilidade os magistrados do Ministério Público que aguardam colocação em vaga da sua categoria: a) Por ter findado a comissão de serviço em que se encontravam; b) Por terem regressado à atividade após cumprimento de pena; c) Por terem sido extintos os lugares que ocupavam; d) Por terem terminado a prestação de serviço militar obrigatório; e) Nos demais casos previstos na lei» [n.º 1], sendo que a «situação de disponibilidade não implica a perda de antiguidade, de vencimento ou de remuneração» [n.º 2].

29. A deliberação do Plenário do «CSMP» de 02.12.2014, objeto de impugnação [n.º XXXVI) da factualidade apurada], mostra-se tomada em sede de execução do julgado anulatório firmado pelo acórdão deste STA de 30.10.2014, no qual, julgando-se procedente a «AAE» n.º 1169/13, declarou-se nulo o ato punitivo ali impugnado [deliberação de 04.06.2013 do Plenário do «CSMP» - cfr. n.ºs XXXII) a XXXV) da mesma factualidade], dada a infração do princípio ne bis in idem e do disposto no art. 204.º do EMP em articulação com o art. 134.º do mesmo Estatuto [não ter sido o A. notificado de uma acusação de onde constassem as normas legais que foram aplicadas no ato punitivo - dever de lealdade - al. g) do n.º 2 do art. 03.º da Lei n.º 58/2008].

30. Com a mesma deliberação visou-se, pois, dar início à execução ao acórdão anulatório, extraindo e determinando aquilo que eram, no imediato, os passos/trâmites e os atos a desenvolver pelos vários serviços envolvidos, sem que à mesma deliberação presidisse um propósito de com ela operar a plena e total execução daquela decisão, esgotando-a, propósito este que se mostra consonante com o disposto no art. 173.º do CPTA, o qual não exige, nem impõe que a execução da decisão judicial anulatória tenha de ser, ou só possa ser, concretizada através da emissão de um único e exclusivo ato exequendo.

31. Se é certo que a anulação de um ato administrativo constitui a Administração no «dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado», bem como no de «dar cumprimento aos deveres que não tenha cumprido com fundamento no ato entretanto anulado, por referência à situação jurídica e de facto existente no momento em que deveria ter atuado», e que impende sobre a mesma o «dever de praticar atos dotados de eficácia retroativa que não envolvam a imposição de deveres, a aplicação de sanções ou a restrição de direitos ou interesses legalmente protegidos, bem como no dever de remover, reformar ou substituir atos jurídicos e alterar situações de facto que possam ter surgido na pendência do processo e cuja manutenção seja incompatível com a execução da sentença de anulação» [cfr. n.ºs 1 e 2 do art. 173.º do CPTA], daí não deriva, nem tal se extrai do acórdão anulatório exequendo, que ao «CSMP» estivesse vedada, in casu, a possibilidade de reexercício do poder disciplinar e que tão-só lhe restasse a possibilidade de ter de imediatamente reintegrar/colocar no ativo o recorrente, procedendo à sua nomeação para o efetivo exercício de funções num determinado lugar.

32. Com efeito, num contexto como o em questão, em que o reexercício do poder disciplinar se mostra possível e legítimo, dado que, inclusive, não vedado pelos efeitos firmados na ordem jurídica pelo julgado anulatório, mostra-se insubsistente a tese esgrimida pelo recorrente ao fazer apelo ao regime previsto no n.º 4 do art. 173.º do CPTA, dado que não só o mesmo pressupõe uma estabilização definitiva da situação jurídica de reintegração ou de recolocação do demandante, o que não ocorre como vimos no caso sub specie, como também inexiste, em concreto, uma qualquer oposição de terceiros interessados na manutenção de uma situação incompatível tal como exigido pelo preceito.

33. Não deriva do regime convocado um qualquer impedimento ou restrição à emissão, em sede disciplinar, de ato destinado a assegurar os ulteriores trâmites necessários ao reexercício do poder disciplinar em momento posterior, reexercício esse que, também, não contende minimamente com os comandos e princípios convocados pelo recorrente, porquanto aquele poder, mostrando-se legitimamente fundado no plano constitucional e no quadro normativo infraconstitucional [cfr., entre outros, os arts. 219.º e 220.º, da CRP, 10.º, al. b), 15.º, n.º 1, 27.º, al. a), do EMP, 158.º e 173.º do CPTA, 63.º a 65.º do ED/2008, e 128.º do CPA (na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 4/2015)], mostra-se com eles compatível ou compatibilizável, a ponto de não se poder considerar que o seu exercício envolva ou acarrete uma qualquer ofensa da boa-fé, da confiança, da ética administrativa, ou que desrespeite direitos e interesses legítimos de particulares, ou, ainda, o direito ao exercício da profissão como magistrado do MP [arts. 02.º, 47.º, e 266.º, n.ºs 1 e 2, da CRP, e 06.º-A, do CPA], que, assim, não saem minimamente beliscados.

34. Presentes o quadro normativo enunciado e os termos do procedimento e do acórdão anulatório, temos que a execução deste não conferia, nem confere, ao recorrente o direito a um imediato exercício de funções, mediante a sua colocação num determinado lugar, nem poderemos falar, nesse domínio, na existência sequer de uma qualquer legítima expetativa minimamente fundada numa tal colocação, tanto mais que, em sede de reexercício do poder disciplinar e da decorrente reabertura do processo disciplinar, importa atender e atentar, também, aos interesses no mesmo prosseguidos e aos poderes que, nessa sede, são conferidos ao «CSMP», mormente, para defesa do prestígio dos serviços e do bom funcionamento dos mesmos [cfr. v.g., a possibilidade de suspensão preventiva do arguido - arts. 152.º, al. b), e 196.º do EMP], cientes de que o exercício de funções enquanto magistrado do MP não constitui um desempenho funcional e profissional que esteja à margem do direito e sem qualquer controlo, visto que sujeito a escrutínio, seja em termos avaliativos, seja em termos disciplinares, e sem que a existência desse escrutínio e o seu exercício pelo ente com competência para o efeito se traduza ou envolva uma violação do direito invocado.

35. Por outro lado, na sequência do que vimos referindo, também inexiste uma qualquer infração ao regime inserto na al. b) do n.º 1 do art. 161.º do EMP, já que no segmento sindicado da deliberação de 02.12.2014 o «CSMP» não visou, como referimos, proceder à execução total ou integral do acórdão anulatório, mas antes, em decorrência do que, no caso, foi a necessidade de haver lugar à reabertura do processo disciplinar, e o de, ulteriormente, ter de proceder ao reexercício do seu poder disciplinar com emissão de uma nova decisão, como veio a ocorrer em 27.01.2015 e se mostra igualmente sindicada, sendo esta e com esta que o «CSMP» procede à completa execução do acórdão anulatório.

36. Tal como referido com acerto no acórdão recorrido, «o CSMP não contornou a execução do acórdão exequendo com a colocação do autor na situação de disponibilidade», porquanto se a execução deveria ser realizada, nos termos ordenados no art. 173.º do CPTA, tal dever não o impedia de «poder de praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites decorrentes do caso julgado», cientes de que «a colocação do autor na situação de disponibilidade, nos termos em que o foi, traduz-se num passo executivo do acórdão anulatório, transitório», e de que a situação é «[t]ransitória, pois vigora apenas até que seja possível a colocação do magistrado em lugar adequado à sua categoria e antiguidade. O que tem obviamente a ver com a periodicidade dos concursos, e com a sua maior ou menor proximidade», e «[d]itada por razões de ordem prática, dada a dificuldade em arranjar de imediato ao magistrado, que se encontra numa das hipóteses legais, uma vaga que seja compatível e adequada à sua situação na respetiva carreira», não se estando «perante a colocação do autor em situação “que tenha uma conotação negativa”», ou com «efeitos negativos, e muito menos que vise de qualquer modo sancioná-lo».

37. Na verdade, até ao trânsito em julgado do acórdão anulatório deste Supremo proferido em 30.10.2014 o autor, aqui recorrente, mostrava-se sujeito à execução da pena disciplinar de aposentação compulsiva que lhe havia sido aplicada pelo «CSMP», encontrando-se afastado de funções dado tal pena implicar o imediato desligamento do serviço, mediante a imposição da aposentação, e a perda dos direitos e regalias conferidos pelo EMP [cfr. arts. 171.º e 177.º deste Estatuto].

38. Ocorre que, por efeito da invalidação da pena disciplinar decorrente do juízo firmado no referido acórdão e até à emissão de uma nova decisão disciplinar final definidora da situação jurídica do autor, importava que a situação do mesmo fosse feita, pelo menos em termos transitórios.

39. Nesse contexto, se é certo que a previsão da al. b) do n.º 1 do art. 161.º do EMP se reporta a situações de regresso de cumprimento de pena disciplinar firmada na ordem jurídica e cujos efeitos que não hajam implicado o desligamento do serviço ou a extinção do vínculo estatutário [cfr., no caso, as penas de suspensão de exercício e de inatividade (arts. 170.º, 175.º e 176.º do EMP), por contraposição com as penas de aposentação compulsiva e de demissão (arts. 171.º, 177.º e 178.º do mesmo Estatuto)], temos que as situações em que ocorra anulação da pena disciplinar expulsiva e em que haja possibilidade de reexercício do poder disciplinar, como é o caso da situação do autor, comportam alguma similitude com a previsão da norma em questão e que justificam o apelo à sua aplicação, porquanto o autor deixa de estar em «cumprimento» de pena e fica a aguardar o desfecho do processo disciplinar, impondo-se, no ínterim, a definição da sua situação jurídica e que caberá ser realizada pelo «CSMP».

40. E este, ponderados os referidos interesses prosseguidos com o processo disciplinar e tendo presente que o dever executivo de recolocar o magistrado no exercício efetivo de funções carece de existência de vaga, atual, para esse efeito, encontrou na colocação do magistrado na situação de disponibilidade um mecanismo que, sem perdas em termos «de antiguidade, de vencimento ou de remuneração» para o magistrado no período que tiver de durar [cfr. n.º 2 do art. 161.º do EMP], assegura uma resposta necessária, eminentemente prática e equilibrada aos fins e aos interesses em presença, e que, de modo transitório, acabou in casu por se traduzir e corresponder a um momento executivo do próprio acórdão anulatório.

41. Para além disso, comportando o art. 47.º da CRP não apenas uma vertente da escolha da profissão, mas, igualmente, uma vertente que se prende com o exercício da mesma [cfr., entre outros, o Ac. do STA/Pleno de 06.12.2005 - Proc. n.º 0217/03, Ac. STA/Secção de 01.02.2017 - Proc. n.º 0877/16; os Acs. do Tribunal Constitucional (TC) n.ºs 46/84, 446/91, 328/94, 187/01, 717/04, e 88/2012 consultáveis in: «www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/» - sítio a que se reportarão todas as demais citações de acórdãos do referido Tribunal sem expressa referência em contrário; Jorge Miranda e Rui Medeiros, in: «Constituição Portuguesa Anotada», Tomo I, págs. 963 e 965/968; J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, in: «Constituição da República Portuguesa Anotada», vol. I, 4.ª edição, págs. 653/655; Rogério E. Soares, em «A Ordem dos Advogados - Uma Corporação Pública», in: RLJ, Ano 124, pág. 228/229; João Pacheco Amorim, em «A liberdade de profissão» in: «Estudos em comemoração dos cinco anos da Faculdade de Direito da Universidade do Porto», págs. 741/746], não descortinamos que a situação de disponibilidade vise ou se traduza num impedimento a esse exercício, já que corresponde a mecanismo de natureza transitória e que radica a sua justificação em razões de ordem prática e operativa e dos interesses em presença, para efeito equiparando a posição do visado ao exercício efetivo da profissão e, assim, definir juridicamente o quadro situacional daquele num período temporal intermédio, de duração mínima e necessariamente a termo.

42. Daí que, tal como afirmado e concluído no acórdão recorrido, tenha de soçobrar este fundamento de ilegalidade acometido à deliberação do «CSMP» de 02.12.2014 no segmento em que a mesma se mostra impugnada, não ocorrendo nem o apontado erro de julgamento, nem as imputadas inconstitucionalidades ao juízo que nele foi firmado [conclusões B) a F)].

43. A divergência do recorrente quanto ao juízo firmado no acórdão recorrido radica, ainda, na incorreta interpretação e aplicação da norma ínsita no art. 63.º do ED/2008 ex vi do art. 216.º do EMP [atual art. 228.º da LTFP] e, ainda, dos arts. 01.º, 02.º, 20.º, 32.º, n.ºs 2 e 10, e 47.º, 202.º, n.ºs 1 e 2, todos da CRP, e consequente nulidade nos termos dos arts. 133.º, n.º 2, al. d), e 134.º, do CPA [conclusões G) a U)].

44. Afirmou-se no acórdão recorrido, em sede de análise do concreto fundamento de ilegalidade em questão, que a situação existente nos autos não seria a abrangida pela previsão do art. 63.º do ED/2008, porquanto o aresto punitivo [acórdão do Plenário do «CSMP» de 27.01.2015] visou «executar o julgado do STA constante do acórdão da Secção de Contencioso Administrativo de 30.10.2014, que (…) declarou nulo o acórdão punitivo de 04.06.2013, do Plenário do CSMP, com fundamento, além do mais, em “falta de audiência do arguido”», sendo que, no quadro da presente ação, não estaríamos «perante a tramitação de uma ação impugnatória em que se depare à entidade demandada a possibilidade de suprir a preterição de uma formalidade essencial nela apontada ao procedimento disciplinar», visto tal situação apenas poderia ter sido configurada «no âmbito da AAE n.º 1169/13, onde foi impugnado o ato punitivo de 04.06.2013 nomeadamente com fundamento na “falta de audiência do arguido”», mas «não na presente ação [343/15], em que se mostra impugnado (…) o acórdão punitivo de 27.01.2015 do Plenário do CSMP, proferido a título de “execução do julgado” (…) e sem que lhe tenha sido apontada qualquer preterição de formalidade essencial».

45. Contra este juízo se insurge o recorrente, o qual argumenta, para o efeito, que «se o artigo 63.º visa que não obstante a preterição de formalidade essencial no decurso do processo disciplinar levada a cabo pela entidade com competência disciplinar, esta possa, ainda assim, renovar a instauração do procedimento disciplinar no limite temporal aí definido e desde que verificados os requisitos aí previstos (…) e se se verificar, como se verificou no caso, que o Recorrido não renovou a instauração do procedimento disciplinar (nem tal poderia fazer atenta a não verificação dos requisitos constantes no n.º 2 do mesmo artigo!), outra conclusão não se pode retirar (…) que não seja a de que o Recorrido não mais poderia ter voltado a punir disciplinarmente o Recorrente», pelo que, ao assim não ter entendido, «andou mal o Tribunal a quo, pois a nenhum título poderia o Recorrido ter punido, novamente, o Recorrente», porquanto a isso obstaria o disposto no art. 63.º do ED/2008 visto que «não se verificando, como não se verificam no caso, os requisitos cumulativos previstos no n.º 2 do mesmo artigo, a única conclusão que se pode retirar é a de que o Recorrido precludiu, por via da ilegalidade cometida de preterição de formalidade essencial, a possibilidade de voltar a punir disciplinarmente o Recorrente», sendo que o citado preceito é «imediatamente aplicável no caso porque, em concreto, mais favorável ao Recorrente».

46. Preceituava-se no art. 63.º do ED/2008 [diploma e preceito revogados, entretanto, pela Lei n.º 35/2014 - cfr. seu art. 42.º, n.º 1] [atual art. 228.º da LTFP] - aplicável ex vi do art. 216.º do EMP -, sob a epígrafe de «renovação do procedimento disciplinar», que «[q]uando o ato de aplicação da pena tenha sido jurisdicionalmente impugnado com fundamento em preterição de formalidade essencial ao decurso do processo disciplinar, a instauração do procedimento disciplinar pode ser renovada até ao termo do prazo para contestar a ação jurisdicional» [n.º 1] e que «[o] disposto no número anterior é apenas aplicável quando, cumulativamente: a) O prazo referido no n.º 1 do artigo 6.º não se encontre ainda decorrido à data da renovação do procedimento; b) O fundamento da impugnação não tenha sido previamente apreciado em recurso hierárquico ou tutelar que tenha sido rejeitado ou indeferido; e c) Seja a primeira vez que se opere a renovação do procedimento» [n.º 2].

47. Trata-se de preceito no qual se disciplina a matéria da renovação procedimento disciplinar quando objeto de impugnação sustentada em alegada preterição de formalidade essencial permitindo-se que, até ao termo do prazo da contestação e, como tal, necessariamente antes da emissão de decisão judicial na ação, o órgão dotado de competência possa renovar o procedimento com emissão de novo ato sem incorrer na alegada violação, exigindo-se, todavia, que no caso se verifiquem cumulativamente os seguintes pressupostos: i) não ter ocorrido prescrição do direito de instaurar o procedimento disciplinar [cfr. art. 06.º, n.º 1, do ED/2008]; ii) não tenha sido deduzida prévia impugnação administrativa com tal fundamento; e iii) não tenha ainda ocorrido nenhuma outra renovação do procedimento.

48. Institui-se no mesmo um mecanismo de aproveitamento do procedimento disciplinar já processado e que se mostra conferido à entidade sancionadora uma vez esta confrontada com uma impugnação judicial fundada, nomeadamente, em preterição de formalidade essencial, permitindo-lhe o suprimento da formalidade preterida, evitando-se, assim, uma eventual decisão judicial a declarar a nulidade de todo o processo disciplinar.

49. Na tese do recorrente o «CSMP» ao não haver renovado a instauração do procedimento disciplinar até ao termo do prazo para contestar a ação, tanto mais que não se verificavam os requisitos cumulativos previstos no n.º 2 do art. 63.º do ED/2008, não poderia ter voltado a puni-lo, razão pela qual o aludido art. 63.º se mostra infringido pela deliberação disciplinar punitiva.

50. Ora não se descortina que assista razão ao recorrente nas críticas que dirige ao juízo de improcedência deste fundamento de ilegalidade firmado no acórdão recorrido.

51. A situação vertente e que aqui se mostra sub specie não se enquadra, nem integra, a previsão do art. 63.º do ED/2008, que, desta feita, não resulta infringido tal como se conclui acertadamente no acórdão recorrido.

52. Efetivamente, a deliberação punitiva do «CSMP» de 27.01.2015 [que indeferiu a «reclamação» do autor relativa ao acórdão do CSMP/SD, de 16.12.2014, que lhe aplicou a pena disciplinar de aposentação compulsiva], aqui objeto de impugnação, visou dar execução ao julgado anulatório constante do acórdão deste STA de 30.10.2014, julgado esse que declarou nula a deliberação disciplinar punitiva de 04.06.2013 do «CSMP», com fundamento, nomeadamente, na «falta de audiência do arguido».

53. À deliberação punitiva ora impugnada na presente ação administrativa não se mostra assacada pelo autor uma qualquer ilegalidade consubstanciada na preterição de formalidade essencial que a inquinasse e invalidasse, pelo que não resultam preenchidos os pressupostos operativos da aplicabilidade in casu da norma inserta no art. 63.º do ED/2008.

54. O mecanismo de aproveitamento do procedimento disciplinar previsto no preceito em questão apenas se mostraria mobilizável pela entidade sancionadora se na presente ação administrativa tivesse sido invocado, como fundamento de ilegalidade assacado ao ato punitivo nela impugnado, a existência de uma preterição de formalidade essencial, o que, como vimos, manifestamente não ocorre, não fazendo, assim, qualquer sentido conferir àquela entidade uma possibilidade de suprimento de preterição de formalidade essencial que não foi sequer apontada ou assacada ao procedimento disciplinar.

55. Para além disso importa atentar que a deliberação disciplinar punitiva do «CSMP» aqui impugnada, dando execução ao acórdão anulatório deste Supremo de 30.10.2014, excluiu todos os factos sobre os quais aquele acórdão considerou ter ocorrido a ilegalidade fundada na falta de audiência do arguido, pelo que a punição aplicada na deliberação ora sindicada nos autos encontra sua base ou sustentação na parte do procedimento disciplinar em que nesse mesmo acórdão não foi encontrada qualquer ilegalidade de natureza formal ou de procedimento.

56. Refira-se, ainda, que a anulação judicial de um ato disciplinar punitivo não acarreta necessária e irreversivelmente a inutilização do procedimento em que foi praticado, impedindo em absoluto a renovação do mesmo e a prática de novo ato, como parece defender o autor, visto tal consequência não ter de ser sempre essa, ou que essa consequência seja a única possível, pois, é a própria lei que, no art. 173.º, n.º 1, do CPTA, prevê essa possibilidade de renovação e reexercício, ao estipular que a constituição Administração no «dever de reconstituir a situação que existiria se o ato anulado não tivesse sido praticado» é feita sempre sem prejuízo da mesma poder «praticar novo ato administrativo, no respeito pelos limites ditados pela autoridade do caso julgado».

57. De igual modo, não se descortina que o juízo firmado no acórdão recorrido envolva ou traduza um qualquer desrespeito dos princípios e comandos constitucionais insertos nos arts. 01.º, 02.º, 32.º, n.ºs 2 e 10, e 47.º, da CRP.

58. Com efeito, tendo soçobrado a imputação de ilegalidade da deliberação punitiva fundada na alegada violação do art. 63.º do ED/2008, temos que a demais invocação que nela se ancora e daí parte terá também de improceder, por falha do respetivo suporte argumentativo, porquanto é no invocado prolongamento ilegal e ilegítimo do processo disciplinar, em pretensa ofensa do citado preceito, que o mesmo radica as violações atentatórias da sua dignidade [quer enquanto pessoa, quer como magistrado], daquilo que é o exercício da sua atividade profissional, e, bem assim, daquilo que são as garantias conferidas em matéria de defesa no âmbito de processo disciplinar num Estado de direito democrático.

59. De notar, por fim, que a deliberação punitiva impugnada estriba-se naquilo que é o exercício [reexercício] do poder disciplinar que se mostra conferido ao «CSMP» [cfr. arts. 219.º da CRP, 10.º, 15,º, 27.º a 29.º, do EMP, e 173.º do CPTA], não se descortinando, presente o quadro factual apurado, que a atuação daquele ente no âmbito do processo disciplinar e o tratamento nele dado ao autor, ali arguido, possam ser qualificados, em momento algum, como «degradantes» ou como «desumanos», nem que o juízo firmado no acórdão recorrido, quanto à improcedência da ilegalidade fundada na infração do art. 63.º do ED/2008 e admissibilidade do reexercício do poder disciplinar por parte do «CSMP» com a emissão da nova deliberação punitiva do autor, haja atentado contra tais princípios e comandos constitucionais [cfr. arts. 01.º, 02.º, 32.º, n.ºs 2 e 10, e 47.º, da CRP, 63.º do ED/2008, e 133.º, n.º 2, al. d), do CPA].

60. E o mesmo juízo não envolve, também, uma qualquer violação dos princípios da tutela jurisdicional efetiva, do Estado de direito, e do exercício da função jurisdicional [cfr. arts. 02.º, 20.º, e 202.º, n.ºs 1 e 2, da CRP, e 91.º, n.º 5, do CPTA], tanto mais que in casu, em nada, saíram e saem beliscados os direitos e garantias deles decorrentes, como se comprova pelo uso e dedução, perante um tribunal, dos meios processuais [cautelar e principal] que o ordenamento jurídico-contencioso confere ao autor, da invocação e uso nos mesmos meios daquilo que são os poderes e faculdades que legalmente lhe estão conferidos, bem como pelos julgamentos que foram realizados das suas pretensões [mormente, das impugnatórias dos atos disciplinares punitivos de que foi alvo] e pela impugnação dos atos jurisdicionais através de recurso jurisdicional.

61. Improcede, pois, totalmente também este fundamento de recurso [conclusões G) a U)].

62. Discorda o recorrente, igualmente, do juízo de improcedência firmado no acórdão recorrido quanto ao fundamento de ilegalidade estribado na violação dos arts. 124.º e 125.º, do CPA, e 197.º, n.º 1, do EMP, por entender que a deliberação punitiva padece de falta de fundamentação, e que, ao assim não se haver concluído, tal juízo atentou contra os princípios do Estado de direito democrático, e contra as garantias de audiência e de defesa do arguido [arts. 02.º, 32.º, n.ºs 1 e 10, e 269.º, n.º 3, da CRP] [conclusões V) a DD)].

63. Argumenta para o efeito que, padecendo a acusação contra o mesmo formulada de falta de clareza, precisão e detalhe relativamente às circunstâncias conhecidas de modo, lugar e tempo quanto às infrações que lhe são imputadas, a deliberação punitiva carece da fundamentação legalmente devida, mostrando-se, ainda, postergadas as suas garantias de audiência e de defesa, visto ter ficado impossibilitado de deduzir uma defesa eficaz em face da acusação que lhe foi movida.

64. Enquadrando a questão em discussão temos que fundamentar é enunciar explicitamente as razões ou os motivos que conduziram o órgão administrativo à prática de determinado ato, ato esse que deverá conter expressamente os fundamentos de facto e de direito em que assenta a decisão, e sem que a exposição dos fundamentos tenha de ser prolixa já que o que importa é que, de forma sucinta, se conheçam todos os motivos determinantes do conteúdo resolutório do ato enquanto premissas nas quais o mesmo se fundou, habilitando, assim, um destinatário normal a apreender o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão.

65. Conforme é jurisprudência uniforme e constante a fundamentação assume-se como um conceito relativo, que varia em função do tipo concreto de cada ato e das circunstâncias concretas em que o mesmo é praticado, cabendo ao tribunal, em cada caso, ajuizar da sua suficiência mediante a adoção de um critério prático que consiste na indagação sobre se um destinatário normal, face ao itinerário cognoscitivo e valorativo constante do concreto ato em causa, fica em condições de saber o motivo porque se decidiu num sentido e não noutro.

66. Se para se atingir este objetivo basta uma fundamentação sucinta, importa, todavia, que a mesma seja clara, concreta, congruente e que se mostre contextual.

67. A mesma será contextual quando se integra no próprio ato e dela é contemporânea, e é, por sua vez, clara quando tais razões permitem compreender sem incertezas ou perplexidades qual foi o referido iter cognoscitivo-valorativo da decisão, sendo congruente quando a decisão surge como a conclusão lógica e necessária das apontadas razões.

68. Cotejando o quadro legal aplicável ao julgamento do caso vertente estipulava-se, desde logo, no art. 124.º do CPA, tendo por epígrafe «dever de fundamentação», que «[p]ara além dos casos em que a lei especialmente o exija, devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente: a) Neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos ou interesses legalmente protegidos, ou imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções; b) Decidam reclamação ou recurso; c) Decidam em contrário de pretensão ou oposição formulada por interessado, ou de parecer, informação ou proposta oficial; d) Decidam de modo diferente da prática habitualmente seguida na resolução de casos semelhantes, ou na interpretação e aplicação dos mesmos princípios ou preceitos legais; e) Impliquem revogação, modificação ou suspensão de ato administrativo anterior» [n.º 1], e que «[s]alvo disposição da lei em contrário, não carecem de ser fundamentados os atos de homologação de deliberações tomadas por júris, bem como as ordens dadas pelos superiores hierárquicos aos seus subalternos em matéria de serviço e com a forma legal» [n.º 2], decorrendo do normativo seguinte, relativo aos requisitos da fundamentação e no que releva, que «[a] fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituirão neste caso parte integrante do respetivo ato» [n.º 1], sendo que «[e]quivale à falta de fundamentação a adoção de fundamentos que, por obscuridade, contradição ou insuficiência, não esclareçam concretamente a motivação do ato» [n.º 2].

69. E do n.º 1 do art. 197.º do EMP resulta, ainda, que «[c]oncluída a instrução e junto o registo disciplinar do arguido, o instrutor deduz acusação no prazo de 10 dias, articulando discriminadamente os factos constitutivos da infração disciplinar e os que integram circunstâncias agravantes ou atenuantes que repute indiciados, indicando os preceitos legais no caso aplicáveis».

70. Presentes os termos do processo disciplinar e dos autos sub specie, e aquilo que constitui a factualidade que nos mesmos resulta apurada, temos que o juízo de improcedência do fundamento de ilegalidade sob análise mostra-se acertado, não assistindo razão ao recorrente nas críticas que acomete ao mesmo.

71. Desde logo, importa aduzir que, tendo-se no acórdão recorrido afirmado que o autor terá imputado «indiretamente, falta de clareza, precisão e detalhe, à “acusação” que contra ele foi formulada» quando «o certo é que já não é essa acusação que ora está em causa, mas antes o acórdão punitivo, do qual constam os factos que, após instrução, resultaram provados, bem como o direito que aos mesmos foi aplicado», posicionamento este de novo reiterado em sede de alegações com a convocação do próprio art. 197.º, n.º 1, do EMP, respeitante à acusação disciplinar, temos que não procedem minimamente as críticas dirigidas pelo recorrente neste âmbito tanto mais que o acórdão ora sob impugnação não deixou de conhecer deste fundamento de ilegalidade e de o fazer de modo circunstanciado quanto aos termos e teor dos trâmites e atos desenvolvidos no processo disciplinar [cfr., nomeadamente, toda a motivação e o juízo expendido a esse propósito ao longo do ponto 9.º) em sede de apreciação de «De Direito»], cientes de que falhas como as apontadas pelo recorrente à acusação disciplinar integrarão e relevarão como ilegalidade própria conducente à sua nulidade por postergação dos direitos de audiência e de defesa do arguido por ela visado [cfr. arts. 02.º, 32.º, n.ºs 1 e 10, da CRP, 204.º, n.º 1, do EMP, 48.º do ED/2008] e já não em sede do concreto fundamento de ilegalidade ali sob análise [falta de fundamentação - arts. 124.º e 125.º, do CPA, e 55.º do ED/2008,].

72. Por outro lado, não se extrai do juízo firmado no acórdão recorrido uma qualquer relativização ou menorização daquilo que são as exigências devidas e legalmente impostas à dedução de acusação disciplinar e de quais são as consequências para o seu incumprimento ou não devida observância, não se tendo sequer posto em causa, minimamente, regras de ónus probatório e os direitos e as garantias de defesa devidas no quadro do processo disciplinar num Estado de direito a ponto de se mostrarem infringidos ou incorretamente interpretados e aplicados os comandos insertos nos arts. 02.º, 32.º, n.ºs 1 e 10, e 269.º, n.º 3, da CRP, comandos que, em sede de apreciação deste fundamento de ilegalidade, em momento algum foram convocados.

73. Daí que presente os termos e teor dos trâmites e atos praticados no processo disciplinar, mormente, relatório final, acórdão reclamado do «CSMP/SD» [de 16.12.2014] e acórdão punitivo impugnado do «CSMP/Plenário» [de 27.01.2015], dúvidas não se nos colocam quanto ao facto de esta deliberação punitiva conter fundamentação [de facto e de direito] clara, concreta, congruente e contextual que permitia ao seu efetivo destinatário, o aqui recorrente, entender a sua motivação/objeto e compreender o iter cognoscitivo-valorativo que presidiu à sua prolação e que, de facto, o habilitou a deduzir efetiva defesa, na certeza de que eventuais discordâncias com procedimentos, com pressupostos fácticos e com os entendimentos jurídicos não contendem ou integram este concreto fundamento de ilegalidade.

74. Mostra-se, assim, como acertada a motivação expendida no acórdão recorrido quando ali se afirma que as «razões, as circunstâncias de tempo e de modo, em que as infrações tiveram lugar, se bem que pormenorizadoras de condutas e facilitadoras da defesa, não são indispensáveis em procedimento como o presente, em que estão em causa, essencialmente, comportamentos que têm a ver com a tramitação, ou sua falta, de processos judiciais» em que «[t]anto o dever de instaurar processo criminal, como o de arquivar inquéritos, assim como atrasos na tramitação e avocação de processos resultam, objetivamente, das condutas encetadas ou omitidas, não lhes sendo indispensável, por regra, a pormenorização de razões e de circunstâncias» já que «nestes casos as “condutas”, ou a sua omissão, falam por si, pois se encontram plasmadas na tramitação dos respetivos processos», sendo que «num acórdão punitivo de natureza disciplinar o “essencial” é que estejam lá os factos relevantes para integrar as condutas nas infrações imputadas ao arguido, com a clareza e com a lógica indispensáveis para ele entender essa imputação, e, entendendo, poder reagir-lhe» e que isso se logrou observar no tocante aos conteúdos referidos pelo recorrente quanto às infrações que lhe foram imputadas e pelas quais foi punido, tendo sido feito de um modo que lhe permitiu «perceber o que está em causa, aquilo por que é sancionado, e os termos em que o é, abrindo-lhe a possibilidade, real, de reagir ao decidido da forma que entender e a lei lhe permitir» e que «os termos da presente ação (…) são bem a prova de que entendeu tudo o que importa: - as condutas ativas e omissivas que resultaram provadas; - a censura que lhe é dirigida pelas mesmas; - bem como a integração dessas condutas censuráveis nas respetivas hipóteses legais».

75. Nessa medida, terá de improceder o apontado erro de julgamento [conclusões V) a DD)], conclusão essa a que chegamos, igualmente, no que diz respeito ao assacado erro de julgamento dirigido ao juízo que desatendeu o pretenso erro sobre os pressupostos de facto e de direito.

76. Sustenta o recorrente que o acórdão recorrido errou ao haver considerado estar demonstrada no processo disciplinar a existência de prestação de informações incorretas à hierarquia e ao ter afirmado que a alegação feita não foi devidamente circunstanciada quanto aos concretos erros sobre os pressupostos de facto e de direito [cfr. o alegado quanto aos proc.(s) n.ºs ………., ………, ………, ………, ………, ……….., ……….., e o denominado de «expediente avulso»], bem como que incorreu em erro nos pressupostos de direito ao ter considerado que o recorrente violou quer o dever de obediência, quer o dever de correção, com base no facto de, alegadamente, ter prestado informação errónea à hierarquia, pois «tal facto nunca poderia consubstanciar qualquer violação do dever de correção» visto «o facto, por si só, de se prestar uma informação errónea a um superior hierárquico não significa, sem mais, que se esteja a desrespeitar esse mesmo superior», tudo se traduzindo em violação, nomeadamente, do art. 03.º, n.ºs 2, als. f) e h), 8 e 10, do ED/2008 [atual art. 73.º, n.ºs 2, als. f) e h), 8 e 10, da LTFP] [conclusões EE) a GG), JJ) a LL), NN), TT), UU), e WW)].

77. Passando ao conhecimento do apontado erro de julgamento temos que a ilegalidade respeitante ao erro sobre os pressupostos radica na exigência de que uma decisão final de um qualquer procedimento administrativo deve assentar em pressupostos de facto e de direito corretos e tidos como verificados.

78. Ocorrerá, por isso, erro sobre os pressupostos de facto, conducente à ilegalidade do ato, a constatação da existência de discrepância ou de divergência entre o acervo factual que serviu de motivação ou de base ao ato administrativo e a sua efetiva verificação ou real ocorrência na concreta situação, ou seja, quando forem tidos em consideração no ato administrativo factos que, ou não estariam provados, ou que se mostravam desconformes com a realidade [cfr., entre outros, os Acs. deste Supremo de 15.01.2002 - Proc. n.º 048119, de 19.12.2006 - Proc. n.º 01034/06, de 12.03.2009 - Proc. n.º 0545/08, de 09.09.2010 - Proc. n.º 076/10, de 22.03.2011 - Proc. n.º 0928/09].

79. Presentes os considerandos de enquadramento acabados de expender centremo-nos, então, na análise das críticas dirigidas ao juízo de improcedência firmado no acórdão recorrido quanto ao erro sobre os pressupostos de facto e para concluir pela sua insubsistência como já afirmado.

80. E este juízo de improcedência quanto ao apontado erro de julgamento radica, desde logo, no facto de que, a realidade factual posta em causa [cfr. n.º 46 dos factos considerados provados pela deliberação disciplinar punitiva], analisado o processo disciplinar e seus apensos, mormente o apenso K), resulta, como se afirmou e concluiu no acórdão recorrido, que, efetivamente, foram prestadas «informações erradas» à hierarquia pelo aqui recorrente [em número de 10], condutas essas que se mostram comprovadas, objetiva e com suficiência, através da análise do processo e apensos, e que resultam descritas, sequencial e historicamente, ao longo do referido n.º 46) da factualidade provada em que se estribou a deliberação punitiva impugnada, descrição essa donde resultam e ressaltam, ainda, omissões de resposta a pedidos insistentes que foram formulados pela hierarquia e incumprimentos de ordens que a mesma havia emitido e que não foram acatadas.

81. De referir, ainda, que não logra obter provimento a crítica dirigida ao acórdão recorrido de que, ao invés do que nele é afirmado, o recorrente havia problematizado e concretizado com suficiência os erros nos pressupostos de facto e que os mesmos ocorrem, já que a alegação que nessa sede foi expendida pelo mesmo ou não ataca devidamente a concreta conduta e imputação efetivamente em causa, ou, então, mostra-se totalmente insubsistente pela simples leitura e confronto com a factualidade em questão e respetivo suporte probatório em que a mesma se sustenta e que não resultou minimamente abalado ou infirmado como ali se concluiu.

82. Revela-se, pois, como acertado o juízo firmado no acórdão recorrido de improcedência deste fundamento de ilegalidade quando ali se sustenta não ter sido posto «realmente em causa que as “informações erradas” tenham ocorrido», e de que «as mesmas emergem, objetivamente, da análise dos processos», inexistindo, assim, no presente caso «divergência entre os pressupostos de facto que a entidade administrativa teve em conta para decidir como decidiu, e a sua real ocorrência».

83. E quanto ao erro sobre os pressupostos de direito temos, de igual modo, como improcedente a motivação em que o recorrente estriba o erro de julgamento.

84. Com efeito, independentemente das considerações tecidas a propósito do que seria a adequada e correta qualificação da concreta ilegalidade [se «erro sobre os pressupostos de direito» ou «vício de violação de lei»] e da problematização da existência de um «concurso ideal heterogéneo de infrações disciplinares» e se o mesmo poderia ser entendido, ou não, como «concurso aparente» de infrações, considerações e problematizações que, no contexto e para o efeito daquilo que veio a constituir a efetiva e expressa pronúncia firmada no acórdão recorrido, resultam como irrelevantes para a economia do julgado, ou mesmo constituem um seu obiter dictum, temos como acertado o juízo tecido em torno da apreciação do invocado erro de subsunção da conduta do arguido em causa às normas que tipificam as infrações disciplinares que ao mesmo foram imputadas.

85. Motivando o juízo temos que uma infração disciplinar é normalmente atípica e a mesma reporta-se, em exclusivo, à violação de deveres profissionais, dado partir da existência ou da verificação do incumprimento pelo servidor público dum dever funcional geral ou dum dever específico associado às concretas tarefas e funções desempenhadas.

86. Constitui, pois, pressuposto essencial de qualquer infração disciplinar a demonstração da existência de violação de um qualquer dever geral ou especial decorrente da função exercida pelo arguido, a ponto de que só serão disciplinarmente relevantes os factos [comportamentos ou condutas] que possam ser objeto dum juízo de ilicitude por referência à norma ou princípio jurídico que imponha ao mesmo um dever funcional geral ou especial [as condutas - ativas e omissivas - incompatíveis com o decoro e dignidade impostas ao exercício das funções de magistrado do MP - cfr. arts.03.º do ED/2008 (atual art. 73.º, da LTFP), 163.º, 76.º e 108.º, do EMP].

87. Ora decorre do art. 163.º do EMP que «[c]onstituem infração disciplinar os factos, ainda que meramente culposos, praticados pelos magistrados do Ministério Público com violação dos deveres profissionais e os atos ou omissões da sua vida pública, ou que nela se repercutam, incompatíveis com o decoro e a dignidade indispensáveis ao exercício das suas funções».

88. E estipulava-se no art. 03.º do ED/2008, no que releva, que «[c]onsidera-se infração disciplinar o comportamento do trabalhador, por ação ou omissão, ainda que meramente culposo, que viole deveres gerais ou especiais inerentes à função que exerce» [n.º 1], e após elencar os deveres de obediência e de correção entre os «deveres gerais dos trabalhadores» [n.º 2], definia-se o «dever de obediência» como consistindo no «acatar e cumprir as ordens dos legítimos superiores hierárquicos, dadas em objeto de serviço e com a forma legal» [n.º 8] e o de «dever de correção» no «tratar com respeito os utentes dos órgãos ou serviços e os restantes trabalhadores e superiores hierárquicos» [n.º 10].

89. Sustenta o A., aqui recorrente, ocorrer ilegalidade por verificação de erro sobre os pressupostos de direito na subsunção que foi feita pela deliberação disciplinar punitiva quando nesta se concluiu pela existência de infração dos deveres de obediência e de correção, pelo que o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento ao haver julgado improcedente tal fundamento de ilegalidade.

90. A subsunção e juízo em questão insertos na referida deliberação sob os pontos 47 e 48 assentam, como lastro factual, na realidade que resulta descrita na mesma no ponto 46 da matéria assente, realidade essa donde ressalta e resulta, como aludido supra, a prestação de informações incorretas à hierarquia [cfr., v.g., n.º 1) «Proc. n.º ………….»; n.º 2) «Expediente avulso»; n.º 3) «Proc. n.º ……….-Coordenação»; n.º 4) «reforma dos autos Proc. ……………»; n.º 5) «Proc. ………»; n.º 6) «Proc. ……….»; n.º 8) «………….»; n.º 9) «Proc. ………..»], mas, também, omissões de resposta a pedidos insistentes que foram formulados pela hierarquia e incumprimentos de ordens que a mesma havia emitido e que não foram acatadas [cfr., v.g., n.º 1) «Proc. n.º ……….»; n.º 3) «Proc. n.º ……-Coordenação» e «Proc. n.º ………..-Coordenação»; n.º 4) «reforma autos Proc. ………..…»; n.º 5) «Proc. ……….»; n.º 6) «Proc. ………..»; n.º 7) «Proc. ………»; n.º 9) «Proc. ………..» e n.º 10) «Proc. ………»].

91. Os incumprimentos havidos mostram-se, assim, concretizados pela e na descrição de vários comportamentos e condutas tidos pelo A. em diversos processos, em vários momentos e que se foram repetindo ou reiterando ao longo do tempo alvo de averiguação e de inspeção, comportamentos e condutas esses que, uma vez apurados, conduziram à sua subsunção e integração na violação dos deveres de obediência e de correção, subsunção essa que não padece da ilegalidade que lhe assaca o A..

92. Ao longo da descrição factual e temporal inserta nos n.ºs 1) a 10) do ponto 46 da factualidade tida por assente na deliberação punitiva impugnada resultam apurados comportamentos e condutas que, efetivamente, infringem, de forma continuada, os referidos deveres de correção e de obediência [art. 03.º, n.ºs 2, als. f) e h), 8 e 10, do ED/2008 - atual art. 73.º, n.ºs 2 als. f) e h), 8 e 10, da LTFP], já que corporizam não apenas a prestação de informações incorretas à hierarquia, mas, também, omissões de resposta a pedidos insistentes que foram formulados pela hierarquia e incumprimentos de ordens que a mesma havia emitido e que não foram acatadas, inexistindo, assim, qualquer erro sobre os pressupostos de direito, presente que analisados EMP e ED [LTFP] dos mesmos não se extrai que a violação ou infração pelo arguido de um determinado o concreto dever funcional [geral/especial] que nos mesmos se mostre enunciado gere, ou se mostre associada, ou implique o seu concreto sancionamento exclusivo com uma certa e específica pena disciplinar, a ponto de esta ver necessariamente soçobrar sua sustentação uma vez se retire a conclusão de que aquele comportamento não integra a violação daquele dever.

93. De notar ainda que, como vem sendo afirmado por este Supremo, o princípio da tipicidade particularmente em relação às penas não expulsivas não vale no direito disciplinar com intensidade idêntica à que é reclamada pelo princípio da legalidade na intervenção penal [cfr., entre outros, os Acs. de 11.11.2004 - Proc. n.º 957/02, de 22.02.2006 - Proc. n.º 0219/05, de 23.05.2006 (Pleno) - Proc. n.º 0957/02, de 23.09.2010 - Proc. n.º 058/10; vide, ainda, entre outros, os Acs. do TC n.ºs 666/94, 730/95, 383/04, 229/2012], não sendo, como tal, possível fazer uma simples transposição do princípio da tipicidade penal, em todo o seu rigor garantístico, para o domínio meramente disciplinar e, em especial, para o domínio do direito público disciplinar.

94. E de que no direito disciplinar, estando ligado à realização das específicas necessidades e interesse do serviço público, tutelando o vínculo específico de lealdade, diligência e eficácia no desempenho de funções no âmbito daquele serviço, diversamente do que se passa no direito penal, utiliza-se, na definição das infrações disciplinares, a técnica da cláusula geral com enumeração exemplificativa, mediante a definição das infrações dos magistrados através do incumprimento de «deveres» em vez da indicação de «factos», considerando-se ilícito o comportamento que atente contra tais deveres, e isso mesmo que a conduta adotada não esteja descrita na previsão de qualquer preceito.

95. Ora os diversos comportamentos faltosos do A. que se mostram descritos revelam, numa avaliação conjunta e unitária, a infração de ambos os deveres em crise, mostrando-se, assim, devidamente subsumidas as faltas havidas, inexistindo, como tal, erro de direito no juízo punitivo, nem com este entendimento resultam postergados quaisquer dos princípios e/ou comandos constitucionais invocados pelo A., dado assegurados e respeitados no procedimento os princípios, direitos e as garantias [nomeadamente, em sede de defesa], pelo que, nos termos expostos, é de manter o juízo de improcedência deste fundamento de ilegalidade firmado no acórdão recorrido [conclusões EE) a GG), JJ) a LL), NN), TT), UU), e WW)].

96. Por fim, o recorrente aponta ao acórdão recorrido incorreção no juízo nele firmado de improcedência das ilegalidades relativas à ocorrência de prescrição das infrações disciplinares em causa e do direito de instaurar o respetivo procedimento disciplinar, fruto de desacerto na interpretação e aplicação do que se mostra disposto nos arts. 178.º, n.ºs 1 e 2, da LTFP ex vi do art. 216.º do EMP, 29.º, n.º 4, e 32.º, n.º 2, da CRP, 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, 297.º do CC [conclusões BBB) a GGG)].
Vejamos.

97. Invocou o recorrente que as infrações pelas quais foi punido se mostram prescritas porquanto:
i) a infração disciplinar continuada, grave, por violação do dever de prossecução do interesse público [art. 03.º, n.ºs 2 al. a), e 3, do ED/2008 - atual art. 73.º, n.ºs 2 al. a), e 3 LTFP] relativamente aos factos descritos nos pontos 2 a 28 da materialidade assente [que envolve os processos n.º ………….; n.º ………….; n.º ………….; e n.º ………….], prescreveu nos termos do art. 178.º, n.º 1, da LTFP, porque se terá consumado no 1º dia posterior ao termo do prazo legal de 10 dias para finalizar os inquéritos [arts. 283.º, n.º 1, 277.º, n.º 1, e 105.º, todos do CPP];
ii) a infração disciplinar, continuada e grave, por violação do dever geral de prossecução do interesse público [art. 03.º, n.ºs 2, al. a), e 3, do ED/2008 - atual art. 73.º, n.ºs 2, al. a), e 3, da LTFP], relativamente aos factos descritos nos pontos 29 a 32 da materialidade assente [no tocante aos processos NUIPC n.º ………; n.º ………; n.º …….; da 1.ª Secção n.º ……….; e processo n.º ……….], prescreveu nos termos do art. 178.º, n.º 1, da LTFP, pois a infração quanto ao processo NUIPC n.º ………. se terá consumado em 26.04.2002, data em que o pedido cível não foi formulado, e, quanto aos demais, porque se terá consumado no 1º dia posterior ao termo do prazo de 10 dias para instauração de procedimento criminal [arts. 283.º, n.º 1, 277.º, n.º 1, e 105.º, todos do CPP];
iii) a infração disciplinar, continuada e grave, por violação do dever de lealdade [art. 03.º, n.ºs 2, al. g), e 9, do ED/2008 - atual art. 73.º, n.ºs 2, al. g), e 9, da LTFP], relativamente aos factos descritos nos pontos 33 a 36 da materialidade assente [no tocante aos processos n.º ………..; n.º ………..; n.º ……..; n.º ………; n.º ……….; n.º ………; n.º …………; n.º ………..; n.º ………….; n.º ………….; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; e n.º ………..], prescreveu nos termos do art 178.º, n.º 1, da LTFP, porque se terá consumado decorrido um ano sobre a data da respetiva avocação ou sobre a data da infração que consta da referência do processo;
iv) a infração disciplinar, continuada e grave, por violação do dever de zelo [art. 03.º, n.ºs 2, al. e), e 7, do ED/2008 - atual art. 73.º, n.ºs 2, al. e), e 7, da LTFP], relativamente aos factos descritos nos pontos 37 a 41 da materialidade assente [no tocante aos processos n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..], prescreveu nos termos do art. 178.º, n.º 1, da LTFP, pois que se terá «consumado» no 1º dia posterior ao termo do prazo legal de 10 dias para tramitar o processo;
v) a infração disciplinar grave, por violação do dever de atuar em obediência ao princípio da legalidade no exercício da ação penal [arts. 01.º, 03.º, n.º 1, al. c), e 163.º do EMP], relativamente aos factos descritos nos pontos 42 a 45 da materialidade assente [no tocante ao processo de inquérito n.º ………..] prescreveu por ter sido autorizado pelo PGD a despachar o processo «após o regresso de férias», tudo nos termos do art. 178.º, n.º 2, da LTFP;
vi) a infração disciplinar, continuada e grave, por violação do dever de obediência [art. 03.º, n.ºs 2, al. f), e 8, do ED/2008 - atual art. 73.º, n.ºs 2, al. f), e 8, da LTFP] e uma infração disciplinar, continuada e grave, por violação do dever de correção [art. 03.º, n.ºs 2, al. h), e 10, do ED/2008 - atual art. 73.º, n.ºs 2, al. h), e 10, da LTFP], relativamente aos factos descritos nos pontos 46 a 48 da materialidade assente [no tocante aos processos n.º ………..; «Expediente avulso»; n.º ………..-Coordenação» e n.º ………..-Coordenação; «reforma dos autos Proc. n.º ………..…»; n.º ………..»; n.º ………..»; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..], prescreveu, relativamente aos processos ora em causa, e nos termos do art. 178.º da LTFP, um ano após ter sido prestada a suposta informação errada, sendo que no tocante ao acompanhamento do inquérito n.º ……….. …….., e ainda nos termos do n.º 2 do referido artigo, sempre o direito de instaurar o respetivo procedimento disciplinar estaria prescrito 60 dias após o conhecimento da infração pela sua superiora hierárquica [a Diretora do DIAP].

98. O acórdão recorrido julgou improcedente este fundamento de ilegalidade juízo contra o qual o A., aqui ora recorrente, se insurge aduzindo para o efeito, por um lado, que ocorre erro de julgamento no segmento em que no mesmo se afirmou não ser aplicável aos procedimentos disciplinares de que são alvo os magistrados do MP o disposto no n.º 2 do art. 178.º da LTFP ex vi do art. 216.º do EMP e que, por outro lado, ocorre também erro de julgamento quando se considerou «que as infrações disciplinares por via de atrasos nos despachos de encerramento dos processos se mantêm desde o termo do prazo legal de 10 dias para finalizar os inquéritos até à data em que em que o magistrado despacha os processos ou deixa de ser o seu titular», e de que o mesmo entendimento não faz «qualquer sentido no que se reporta às infrações por não dedução de pedido de indemnização cível, não instauração de procedimento criminal, avocação de processos e prestação de informações erróneas à hierarquia» já que «estas infrações nunca poderiam ser consideradas como “permanentes”, pois elas esgotam-se no momento da sua prática», termos em que o julgamento feito infringe o disposto nos arts. 11.º, n.º 1 da Lei n.º 35/2014, 178.º, n.ºs 1 e 2, da LTFP, 29.º, n.º 4, e 32.º, n.º 2, da CRP, 297.º do CC [conclusões BBB) a GGG)].

99. Passando à análise da motivação aduzida como primeiro erro de julgamento temos que a mesma improcede, não ocorrendo o apontado erro.

100. Constitui entendimento reiterado deste Supremo Tribunal tecido em torno do art. 06.º, n.º 2, do ED/2008 [cfr., nomeadamente, os Acs. de 27.01.2011 - Proc. n.º 0600/09, de 21.06.2011 - Proc. n.º 0772/10, de 10.07.2012 - Proc. n.º 0803/11, de 23.01.2013 (Pleno) - Proc. n.º 0772/10, de 05.11.2013 - Proc. n.º 0642/13] e também já no do art. 178.º, n.º 2, da LTFP [cfr., entre outros, o Ac. de 08.03.2018 - Proc. n.º 04/17], o de que «o EMP é claro no sentido de que o direito de ordenar a instauração de processos disciplinares aos magistrados do Ministério Público cabe exclusivamente ao Procurador-Geral da República [artigo 12.º, n.º 2, alínea f)] ou ao CSMP [artigos 27.º, alínea a) e 214.º]», pelo que «se só esses órgãos são titulares do direito, só a inércia deles relativamente ao seu exercício pode explicar e causar a prescrição respetiva; e essa inércia, por sua vez, há-de partir do conhecimento da falta por algum dos dois referidos órgãos - e não por qualquer outro superior hierárquico do magistrado infrator», razão pela qual a aplicabilidade ao procedimento de aferição da responsabilidade disciplinar dos magistrados do Ministério Público do n.º 2 do art. 178.º da LTFP [anterior art. 06.º, n.º 2, do ED/2008] «não é completa; pois, se o fosse - em termos de abranger o conhecimento da infração “por qualquer superior hierárquico” - tal norma estaria a ser subsidiariamente recebida pelo EMP de modo “contrário” ao que nele se prevê e, nessa medida, ao arrepio do que se estabelece no seu artigo 216º», pelo que para os efeitos do disposto no referido normativo «são irrelevantes as datas em que a Diretora do DIAP ou o Procurador-Geral Distrital conheceram as infrações disciplinares por que o autor foi punido no PD n.º ………..» [cfr. o já decidido por este Supremo no citado Ac. de 21.06.2011 - Proc. n.º 0772/10], e, como tal, «a prescrição invocada pelo autor não pode fundar-se nesse conhecimento».

101. Ora presente a devida concatenação do quadro normativo em referência e fazendo apelo à interpretação jurisprudencial antecedente não se descortinam razões para divergir do entendimento que se mostra sufragado por este Tribunal, na certeza de que a argumentação expendida pelo recorrente não aporta motivação que o abale minimamente, tanto mais que a apontada finalidade do instituto jurídico da prescrição do direito a instaurar o procedimento disciplinar, traduzida no impedir a eternização do exercício do poder disciplinar após o conhecimento da infração por qualquer superior hierárquico do magistrado, não colhe, nem afasta, aquilo que constitui o quadro especial definido pelo EMP em matéria de exercício da ação disciplinar, daquilo que são os únicos órgãos na hierarquia do MP que se mostram dotados de competência para instauração de processo disciplinar a um magistrado do MP.

102. Improcede, por conseguinte e sem necessidade de outros desenvolvimentos, o alegado erro de julgamento, sendo de manter o juízo firmado no acórdão recorrido de considerar inaplicável, no caso, o disposto no art. 178.º, n.º 2, da LTFP ex vi do art. 216.º do EMP, julgando improcedente a alegada prescrição do direito de instaurar procedimento disciplinar contra o A., juízo esse abrangente da infração disciplinar descrita no antecedente § 97 sob n.º v) [violação do dever de atuar em obediência ao princípio da legalidade no exercício da ação penal (arts. 01.º, 03.º, n.º 1, al. c), e 163.º do EMP) - factos descritos nos pontos 42 a 45 da materialidade assente na deliberação punitiva - processo de inquérito n.º …..……..].

103. E a idêntico juízo de improcedência chegamos quanto aos demais fundamentos em que se sustenta o erro de julgamento ora sob apreciação.

104. Desde logo, é de manter o entendimento sustentado no acórdão de recorrido de que não é de acolher a tese sustentada pelo A. de que, mantendo um magistrado processos por despachar, durante meses, ou mesmo anos, o mesmo «cometeria uma infração instantânea, que se esgotava no dia seguinte ao termo do prazo legal de 10 dias» e de que a «partir daí não mais estava em falta», já que isso implicava que «o respetivo 11º dia seria o termo a quo de contagem do prazo de prescrição da infração, seja ele qual for» e que «terminado este prazo, mesmo durante a permanência do atraso, prescreveria a infração».

105. Tal como vem sendo afirmado por este Tribunal a anti juridicidade disciplinarmente relevante decorrente dos incumprimentos dos prazos que se mostram fixados para a prática dos atos processuais, redundando em atrasos na tramitação e na conclusão dos processos, deve ser configurada como uma infração disciplinar duradoura e a contagem do prazo de prescrição do procedimento disciplinar relativamente à mesma só corre a partir do dia em que cessar a atividade ou omissão que constitui a infração [cfr. art. 119.º, n.º 2, al. a), do Código Penal] [cfr., entre outros, os Acs. deste Supremo de 11.01.2011 - Proc. n.º 01214/09, de 12.01.2012 - Proc. n.º 0577/11, de 20.09.2012 (Pleno) - Proc. n.º 0577/11, de 03.11.2016 - Proc. n.º 0548/16].

106. Daí que, como ali afirmado, não podemos aceitar tais conclusões, porquanto o «termo do prazo legal de 10 dias - da lei processual penal - para despachar os processos, apenas constitui o “início” da infração disciplinar baseada no atraso, mas esta persiste até que o processo “seja despachado” ou que, por qualquer motivo deixe de estar na titularidade do magistrado. Trata-se assim de infração permanente, e não instantânea, como supõe o autor, e que se manteve desde o termo do prazo legal de 10 dias, para finalizar os inquéritos, até à data em que ele despachou os processos ou deixou de ser o seu titular - ver artigo 119.º, n.º 2 alínea a), do CP ex vi ao artigo 216.º do EMP», termos em que «o prazo de prescrição das respetivas infrações, e diferentemente do que entende o autor, não começa a correr na data em que se inicia o atraso, mas antes na data em que ele cessa, ou seja, na data em que cessa a infração disciplinar permanente».

107. O dever de tramitação e de decisão dos processos nos prazos legalmente previstos para esse efeito não deixa de existir ou de persistir, não é «eliminado» para o futuro, em decorrência do simples decurso daqueles prazos, pelo que os atrasos verificados na tramitação dos mesmos constituem uma única infração, permanente e duradoura, decorrente da manutenção de uma situação cuja anti juridicidade foi criada pelo próprio A., aqui recorrente, o qual se foi renovando continuamente em resultado deste não os tramitar e decidir.

108. Por isso, soçobra a crítica expendida pelo mesmo neste âmbito, inexistindo quanto a tal imputação [iv) infração disciplinar, continuada e grave, por violação do dever de zelo, relativamente aos factos descritos nos pontos 37 a 41 da materialidade assente na deliberação punitiva impugnada - atrasos (de meses/anos descritos e contabilizados) na emissão ou na falta de emissão de decisão nos processos n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; e n.º ………..] e decorrente punição disciplinar qualquer infração do art. 178.º, n.º 1, da LTFP.

109. Mas à mesma conclusão importa chegar quanto às demais imputações disciplinares pelas quais o A. veio a ser punido [infrações i), ii), iii), e vi) descritas sob o antecedente § 97], porquanto, em causa, estão descrições de conjuntos de condutas ilícitas ou de comportamentos faltosos tidos e repetidos pelo A., ao longo do tempo, em diversos processos, descrições essas integrantes, cada uma, do dever geral respetivo que resultou infringido [in casu, os deveres gerais de prossecução do interesse público (por falta de decisões de tramitação/investigação e de encerramento ou conclusão de inquéritos onde se investigavam alegadas «negligências médicas» - nos processos n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; e n.º ……….. - comportamentos descritos sob n.ºs 2 a 28 dos factos fixados na deliberação punitiva - e por falta de promoção dos necessários procedimentos daquilo que constituíam deveres estatutários e legais - arts. 03.º, n.ºs 1, als. a e c, 63.º, n.º 1, do EMP, 199.º, 215.º, 218.º, n.º 1, do CPP - v.g. falta de deduções de pedidos de indemnização civil nos processos NUIPC n.º ………..; n.º ………..; e n.º ……….., falta de promoção da instauração do procedimento criminal - proc. n.º ………..- ou de extinção de medida de coação de suspensão do exercício - proc. n.º ……….. - comportamentos descritos sob n.ºs 29 a 32 dos factos fixados na mesma deliberação); de lealdade (por avocação e direção de 17 processos à margem das matérias contempladas nos provimentos do DIAP e das regras de competência territorial e material do CPP - processos n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; e n.º ………..- comportamentos descritos sob n.ºs 33 a 36 dos factos fixados na mesma deliberação); de obediência e de correção (por prestação de informações incorretas à hierarquia, por omissões de resposta a pedidos insistentes que foram formulados pela mesma hierarquia e por incumprimentos de ordens que aquela havia emitido - processos n.º ………..; «Expediente avulso»; n.º ………..-Coordenação» e n.º ....... -Coordenação; «reforma dos autos Proc. n.º ………..…»; n.º ………..»; n.º ………..»; n.º ………..; n.º ………..; n.º ………..; n.º ……….. - comportamentos descritos sob n.ºs 46 a 48 dos factos fixados na deliberação punitiva)].

110. Efetivamente, em concreto, mostram-se imputados comportamentos ou condutas que, muito embora sejam constituídos por muitas faltas descritas, as mesmas formam conjuntos que compõem um todo juridicamente unificado, insuscetível não só de ser dividido como de cada um dos seus elementos poder ser objeto de valorização autónoma e descontextualizada, pelo que estamos em presença de infrações de natureza continuada/duradoura, como tal sujeitas à mesma regra de contagem do prazo prescricional, prazo este que não resulta transcorrido.

111. E em consonância com todo o entendimento que vimos expondo nos parágrafos antecedentes sobre o regime de prescrição e sua aplicação in casu não se vislumbra que o mesmo corporize ou belisque, minimamente, aquilo que são os direitos e garantias insertos no n.º 4 do art. 29.º e no n.º 2 do art. 32.º da CRP, porquanto, em momento algum, se negou ou fez incorreta do princípio de aplicação da lei penal [disciplinar] mais favorável naquilo que constitui o seu âmbito de proteção e disciplina, ou se atentou contra a presunção de inocência, nunca, aliás, posta em causa, e/ou contra aquilo que são as garantias de defesa do A., enquanto arguido no âmbito do processo disciplinar, que delas fez pleno uso como se extrai da análise do processo, cientes de que se mostra assegurada nos presentes autos a exigência de um julgamento no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa, inexistindo, desta feita, uma qualquer infração dos comandos constitucionais convocados na interpretação e aplicação que foram realizadas.

112. Resultam como insubsistentes, também, as críticas dirigidas ao acórdão recorrido no segmento em que o mesmo afastou a pretensão de prescrição disciplinar do A. fundada no regime previsto no art. 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014, cuja aplicabilidade ao procedimento disciplinar foi por aquele reclamada.

113. Decorre do referido preceito que «[o] regime disciplinar previsto na LTFP é imediatamente aplicável aos factos praticados, aos processos instaurados e às penas em curso de execução na data da entrada em vigor da presente lei, quando se revele, em concreto, mais favorável ao trabalhador e melhor garanta a sua audiência e defesa».

114. Do art. 04.º da Lei n.º 58/2008 [diploma que, como referido, havia aprovado o anterior ED/2008 e que, entretanto, foi revogado Lei n.º 35/2014] extraia-se, no que aqui releva, que «[s]em prejuízo do disposto nos números seguintes, o Estatuto é imediatamente aplicável aos factos praticados, aos processos instaurados e às penas em curso de execução na data da sua entrada em vigor, quando o seu regime se revele, em concreto, mais favorável ao trabalhador e melhor garanta a sua audiência e defesa» [n.º 1] e que «[o] regime referido no número anterior abrange as disposições normativas do Estatuto relativas aos deveres funcionais, à sua violação e sancionamento, bem como ao respetivo procedimento, designadamente no que respeita à não previsão do anteriormente vigente instituto da infração diretamente constatada» [n.º 2], sendo que «[o]s prazos de prescrição do procedimento disciplinar e das penas, bem como os de reabilitação e o período referido no n.º 4 do artigo 6.º do Estatuto, contam-se a partir da data da entrada em vigor do Estatuto, mas não prejudicam a aplicação dos prazos anteriormente vigentes quando estes se revelem, em concreto, mais favoráveis ao trabalhador» [n.º 3].

115. Na tese do A. da falta no art. 11.º da Lei n.º 35/2014 de um n.º 3 semelhante ao que constava daquele art. 04.º derivava a aplicação imediata e sem restrições do n.º 1 do art. 11.º às normas sobre prazos de prescrição, ou sejam, in casu dos n.ºs 1 e 2 do art. 178.º da LTFP.

116. Afirmou-se no acórdão recorrido que o mesmo «carece de razão na conclusão em que estriba o seu raciocínio quanto à aplicação, sem restrições, do novo regime de prazos de prescrição», porquanto, fazendo apelo ao disposto no art. 297.º do CC, este Código «dispõe de “regra geral” e, portanto, também aqui aplicável, que determina a contagem dos prazos em caso da sua alteração por leis sucessivas», termos em que «da alegada omissão no artigo 11.º da Lei n.º 35/2014 (…) de norma equivalente ao n.º 3, do artigo 4.º, da Lei n.º 58/2008 (…) não é legítimo concluir pela aplicação imediata, e irrestrita, do seu n.º 1, no tocante a prazos de prescrição, pois que sempre deverá ser tida em conta a regra geral de aplicação das normas de alteração de prazos consagrada no Código Civil. Aliás, é porque essa regra geral existe, que se torna desnecessário repeti-la no artigo 11º em referência».

117. Estipula-se no art. 297.º do CC que «[a] lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar» [n.º 1] e que «[a] lei que fixar um prazo mais longo é igualmente aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas computar-se-á neles todo o tempo decorrido desde o seu momento inicial» [n.º 2].

118. Ora o art. 11.º da Lei n.º 35/2014 constitui uma norma que visa disciplinar o regime transitório, regulando a problemática da sucessão de leis no tempo em matéria disciplinar.

119. Em decorrência e aplicação à situação dos princípios gerais em matéria de vigência e aplicação das leis [cfr. arts. 12.º e 297.º do CC na sua articulação com o referido art. 11.º] temos, por um lado, que o novo regime disciplinar constante da LTFP aplicar-se-á integral e plenamente a todos os factos que venham a ser praticados após a entrada em vigor daquela lei [01.08.2014] e que traduzam uma violação de qualquer dever geral ou especial por parte dos servidores públicos que estejam sujeitos à sua observância ou respeito.

120. E, por outro lado, quanto aos factos praticados antes daquela data de entrada em vigor da LTFP o novo regime disciplinar só será aplicável se, em concreto, se revelar mais favorável ao arguido e melhor garantir a sua audiência e defesa, ou seja, o princípio geral não é o da aplicabilidade daquela lei aos factos ilícitos que hajam sido praticados antes da sua entrada em vigor, dado aqueles continuarem a ser apreciados e sancionados no quadro do ED/2008, que apenas cede quando, em concreto, a nova lei se revelar mais favorável.

121. Nessa medida, não colhe a tese do A., porquanto independentemente do acerto quanto ao juízo que o mesmo faz da maior ou menor favorabilidade da aplicação do «novo prazo de prescrição das infrações disciplinares», não deriva sustentação na interpretação e aplicação que faz do regime normativo em crise.

122. É que se, naturalmente, aos factos se aplicam imediatamente as novas normas da prescrição da infração, aos processos instaurados se aplicam as novas normas sobre o procedimento disciplinar e às penas em curso de execução se aplicam as normas relativas à execução da pena disciplinar, importa, contudo, ter presente a distinção entre aplicação imediata da lei a factos passados e aquilo que é uma pura aplicação retroativa da lei, como se ela já existisse à data dos factos.

123. Do preceito em crise não resulta que deva fazer-se uma aplicação retroativa da lei nova, mas sim uma aplicação imediata, para futuro, da lei nova a situações iniciadas anteriormente e ainda pendentes, termos em que, mostrando-se já instaurado o processo disciplinar em observância das regras de prescrição que no momento estavam vigentes, não podem posteriores regras de prescrição vir interferir com a validade e regularidade do processo em termos da sua tempestividade.

124. Mostra-se, pois, como improcedente também este fundamento de recurso, inexistindo qualquer infração do disposto nos arts. 178.º, n.º 1, LTFP ex vi do art. 216.º do EMP, 297.º do CC, e 11.º, n.º 1, da Lei n.º 35/2014 [conclusões BBB) a GGG)].

125. E, de igual modo, em consonância com o entendimento expendido nos parágrafos antecedentes não se descortina que o mesmo atente ou infrinja, minimamente, aquilo que são os direitos e garantias insertos no n.º 4 do art. 29.º e no n.º 2 do art. 32.º da CRP, porquanto não se negou ou fez incorreta do princípio de aplicação da lei penal [disciplinar] mais favorável naquilo que constitui o seu âmbito de proteção e disciplina articulada com demais quadro normativo e principiológico; nem se atentou contra a presunção de inocência, presunção essa, aliás, nunca colocada em crise; nem, ainda, foram postergadas as garantias de defesa do A., enquanto arguido no âmbito do processo disciplinar, dado o mesma delas ter feito pleno uso como se comprova através da análise do processo, e na certeza de que se mostra assegurada nos presentes autos a exigência de um julgamento no mais curto prazo compatível com as garantias de defesa, inexistindo, desta feita, uma qualquer infração dos comandos constitucionais convocados na interpretação e aplicação que foram realizadas [conclusões BBB) a GGG)].

126. Sucumbindo, assim, todos os fundamentos nos quais o A., aqui recorrente, assentou as suas discordâncias quanto ao juízo que havia sido firmado no acórdão recorrido, logicamente que deverá improceder in toto o recurso, com todas as legais consequências.





DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes do Pleno da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em negar total provimento ao recurso jurisdicional sub specie e manter o acórdão recorrido.
Custas a cargo do A., aqui ora recorrente.
D.N..

Lisboa, 28 de Março de 2019. – Carlos Luís Medeiros de Carvalho (relator) – Jorge Artur Madeira dos Santos – António Bento São Pedro – Teresa Maria Sena Ferreira de Sousa – José Francisco Fonseca da Paz – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano – Maria do Céu Dias Rosa das Neves.