Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:028/16
Data do Acordão:04/20/2016
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS
REQUISITOS
Sumário:A admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito, o que pressupõe a identidade substancial das situações de facto subjacentes aos arestos em confronto.
Nº Convencional:JSTA000P20414
Nº do Documento:SAP20160420028
Data de Entrada:01/13/2016
Recorrente:Z............
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – Z…………, com os sinais dos autos, não se conformando com o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul de 10 de Julho de 2015, que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgara improcedente o pedido de anulação da venda executiva de prédio urbano, vem, nos termos dos artigos 30.º al. b) do ETAF e 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso para este Supremo Tribunal, por alegada oposição com o acórdão também do Tribunal Central Administrativo Sul de 26 de Junho de 2014, proferido no recurso n.º 0007768/14, transitado em julgado.
O recorrente conclui as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
Com efeito, com o devido respeito e como se procurará demonstrar, andou mal a posição vencedora do Acórdão recorrido (com voto de vencido) ao considerar não ter havido um “erro essencial” provocado pela Autoridade Tributária (abreviadamente, AT) acerca da coisa/objecto transmitido.
Na verdade,
1.ª Na sequência de um processo de execução fiscal, em 29/9/2008, O Serviço de Finanças de Alcobaça, anunciou o bem a vender, descrevendo-o como sendo “…Prédio urbano, sito na Rua …….., n.º ……, ……, afecto à indústria… tem 140 m2 de superfície coberta. O valor patrimonial é de €36.300,00. O valor base para venda é de €25.410,00 (…) – (cfr. fls. 211 do processo de execução fiscal apenso)”. (al. “R” dos Factos Provados do Acórdão recorrido) (o negrito é nosso)
2.ª Anteriormente e na sequência de avaliação determinada em 1/2/2008 pelo Chefe de Serviço de Finanças de Alcobaça, constava desse processo de execução fiscal, a seguinte informação acerca desse imóvel “… verifica-se que na avaliação não foi considerada a área dos 2 pisos, mas apenas a área referente a um piso (…)”. – (cfr. fls. 190 dos autos de execução fiscal apenso)”. (al. “O” dos Factos Provados do Acórdão recorrido) (o negrito é nosso)
3.ª Pelo que, “…Área de implantação do edifício (era de) 223,3500m2…” conforme constava da respectiva matriz, tendo o “…Mod 1 do IMI n.º 1806559 (sido) Entregue em 16/05/2008… (cfr. fls. 204 dos autos de execução fiscal apenso). (al. “P” dos Factos Provados do Acórdão recorrido) (o negrito é nosso).
4.ª No entanto e apesar do SF de Alcobaça ter de antemão conhecimento próprio da divergência de áreas, entre a que constava da respectiva descrição predial junto da Conservatória do Registo Predial de Alcobaça – 140 m 2, cfr. al. “D” dos Factos Provados” do Acórdão recorrido – e a que constava do respectivo artigo matricial – 223, 35 ms-.
5.ª Ainda assim, “…Em 12-09-2008 o Chefe (desse) Serviço de Finanças de Alcobaça determinou o prosseguimento da execução fiscal e designou o dia 15-01-2009 para venda do bem penhorado, pelo valor base de €36.300,00. – cfr. fls. 208 e 209 do processo de execução fiscal apenso)”. (al. “Q” dos Factos Provados do Acórdão recorrido) (o negrito é nosso).
6.ª Incontroverso é que no anúncio de 29/9/2008 de publicitação da venda «não há referência à existência de 223,35 m2». (al. “R” dos Factos Provados do Acórdão recorrido) (o negrito é nosso).
7.ª Nem há referência «ao licenciamento camarário ou falta dele relativamente a tais 223,35 m2».
8.ª Tal como também não há qualquer referência, «ao licenciamento camarário ou falta dele em relação a 83,35 m2» que eram, ou seriam, parte integrante dos reais 223,35m2.
9.ª Por outro lado, ficou assente no Acórdão fundamento a seguinte matéria de facto:

C) Foram emitidos pelo Serviço de Finanças do Seixal 2 "Edital de Venda e Convocação de credores", e Anúncios de publicitação da venda constando quanto à identificação do bem o seguinte:

"IDENTIFICAÇÃO DO(S) BEM(NS)

Fracção Autónoma designada pela letra B, correspondente ao R/C Esq., destinado a habitação, do prédio urbano em regime de Prop. Horiz., sito na Rua ... ... , N° …, ………, (…) inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4234, (…)Topologia/Divisões: T3 (…)” (negrito nosso).

H) A 7 de Junho de 2013, e na sequência de requerimento (…), o Município do Seixal emitiu Certidão com o seguinte teor:

(…)

----Mais se certifica que para a fração “B” referente ao lado esquerdo existe mais um piso que não se encontra licenciado, e anexos que deverão ser demolidos.”.

(negrito nosso)

J) Em 20 de Junho de 2013, foi emitida informação pela Chefe do Serviço de Finanças do Seixal 2 onde consta, designadamente, o seguinte:

“INFORMAÇÃO

O Artigo matricial n° 4234 da freguesia de ……… foi participado à matriz em 19/07/1985 tendo sido avaliado para efeitos de IMI em 11/08/2006. No processo do imóvel (IMI) e dos documentos apresentados para avaliação, emitidos pelo Município do Seixal, consta que embora exista projecto de arquitectura de ampliação em mais um piso, para a fracção B (rés do chão esquerdo) este não se encontrava licenciado (certidão emitida em 4/08/2006). (negrito nosso).

Este facto, devendo ser conhecido deste SF pois constava do processo de avaliação, não constava da descrição da matriz, que se encontra incorrecta, o veio a reflectir-se no anúncio da venda do imóvel, que também ficou com a descrição incorrecta. (negrito nosso).

L) A 7 de Agosto de 2013, foi proferida informação pelo Inspector Tributário da Direcção de Finanças de Setúbal, relativamente ao pedido de anulação de venda referido na alínea l), constando do seu teor …o seguinte:

" (...) II - OS FACTOS

Na Informação de 2013-06-20, o SF entende que o imóvel está incorrectamente descrito quer na matriz quer na publicitação da venda, referindo que tanto do processo matricial como do processo de avaliação consta uma certidão emitida pela C.M. Seixal em 4/08/2006 que atesta que «existe projecto de arquitectura de ampliação para a fracção esquerda [fracção B referente ao lado esquerdo) em mais um piso que não se encontra licenciado»; (negrito nosso).

10.ª Dessa matéria de facto decorre que, tanto no Acórdão recorrido, como no Acórdão fundamento, os respectivos Serviços de Finanças publicitaram a venda de imóveis que foram descritos nos respectivos anúncios de forma incorrecta, porquanto:

- No Acórdão recorrido, o Serviço de Finanças (doravante, SF) publicitou, em 29/9/2008 (cfr. al. R. dos factos provados), a venda de um prédio urbano “afecto à indústria” como detendo uma área de 140 m2 de superfície coberta, quando anteriormente a esse anúncio, já bem sabia desde 16/05/2008 que essa área era apenas referente a um piso, não tendo, como tal, sido considerados os dois pisos (cfr. al. O. Dos factos provados), na sequência de avaliação oficiosa por si determinada em 1/02/2008 (cfr. al. N. dos factos provados) que, afinal, tal área desses dois pisos era de 223,35 m2 (cfr. al. P. dos factos provados). Como tal, sabia pois e de antemão, que existia uma divergência entre esta última área real de 223,35m2 que constava da matriz e aquela outra de 140 m2 que foi anunciada e constava na conservatória.

Ou seja, embora tivesse o SF pleno conhecimento dessa divergência entre a área real que constava na matriz (223,35 m2) e aquela outra área que constava na conservatória (140 m2), ocultou-a no teor da publicitação de venda, sendo também indesmentível que esse acréscimo de área não está, nem nunca esteve, licenciado para indústria.

- No Acórdão fundamento, o SF, no teor dos editais e dos anúncios de publicitação de venda, não fez também qualquer referência à existência de mais um piso e anexos que não se encontravam licenciados e, do mesmo modo que no Acórdão recorrido, bem sabia também de antemão – conforme a avaliação que constava do processo – que esse piso a mais não estava licenciado, nem constava da respectiva descrição da matriz, desconformidade e incorrecção essa que também foi omitida no anúncio de venda do imóvel.

11.ª São substancialmente idênticas as situações fácticas apreciadas no Acórdão recorrido e no Acórdão fundamento.

12.ª A questão de Direito colocada em qualquer um dos dois recursos em que foram proferidos o Acórdão recorrido e o Acórdão fundamento, foi a de se saber se a reconhecida desconformidade entre o bem anunciado e o real, constitui uma falta de informação que é relevante para a formação da vontade, livre e esclarecida do comprador.

13.ª Sucedeu que dos respectivos anúncios publicitados em qualquer um dos arestos não constava a real área dos respectivos imóveis a serem vendidos.

14.ª De antemão, qualquer dos respectivos Serviços de Finanças bem sabia que o que anunciavam não correspondia ao que era real, tanto assim que nos respectivos processos de avaliação aí constava tal desconformidade entre as qualidades e características do objecto a vender e o que era anunciado, desconformidade esta que não dizia apenas e tão só respeito acerca da identificação do objecto a vender.

15.ª Em ambos os casos, a falta de elementos sobre as qualidades e características do objecto a vender eram ignoradas pelo comprador.

16.ª Em ambos os casos, tal discrepância não era coisa de somenos importância, nem era sanável através de simples rectificação de registos ou matrizes, ou seja, não era coisa sem riscos e encargos.

17.ª Tanto assim que os respectivos Serviços de Finanças em causa, conhecendo tal discrepância, não assumiram nem puseram termo à mesma, assumindo, como tal, o encargo de nesse sentido diligenciarem perante a Conservatória do Registo Predial e a Edilidade Camarária aqui obtendo o respectivo licenciamento.

18.ª Em ambos os casos, tais Serviços de Finanças, sabendo da existência de um piso que não estava licenciado (Acórdão recorrido) ou de um piso e anexos que não estavam licenciados (acórdão fundamento), nada disseram nos respectivos anúncios.

19.ª Ou seja, omitiram essa informação e não estavam desonerados de a publicitaram nos respectivos anúncios.

20.ª Existe, pois, uma identidade da questão de Direito, ou seja, a mesma questão foi colocada no Acórdão recorrido e no recurso que deu origem ao Acórdão fundamento.

21.ª Ambos os Acórdãos assentaram em situações de facto idênticas nos seus contornos essenciais estando em causa em qualquer um desses Acórdãos o mesmo fundamento de Direito, a saber: a ocultação de publicitação das qualidades do objecto transmitido que por si só acarretou o erro, no qual se baseou a intenção de contratar.

22.ª Manifesto é que no âmbito do mesmo quadro legislativo foi perfilhada solução oposta em cada um desses arestos, impondo-se agora decidir entre essas decisões antagónicas qual a solução que se deve considerar de harmonia com a ordem jurídica, se a do Acórdão recorrido, se a do acórdão fundamento, como é aqui reclamado pela Recorrente, sem prejuízo do acórdão recorrido não estar também em sintonia com a Jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

23.ª Incontroverso é que nas anunciadas publicitações de venda não havia referência à área de dois pisos, mas apenas à área de um piso (no que diz respeito ao caso Acórdão recorrido), não havendo também referência à existência de um piso e dois anexos (no que diz respeito ao caso do Acórdão fundamento).

24.ª Incontroverso é que no caso do Acórdão recorrido, nas publicitações de venda não havia referência ao licenciamento camarário para indústria ou à falta dele em relação a um dos dois pisos, com uma área de 83,35m2, nem no caso do Acórdão fundamento havia qualquer não havia referência ao licenciamento camarário ou à falta dele em relação a um dos pisos e dois anexos.

25.ª Incontroverso é também que em ambos os casos, os respectivos Serviços de Finanças sabiam de antemão e na sequência de avaliações ocorridas antes das respectivas publicitações de venda, que, no caso do Acórdão recorrido, a área de venda anunciada de 140 m2, afecta à indústria, não correspondia à área real, nem, no caso do Acórdão fundamento, o rés-do-chão afecto à habitação detinha licenciamento em relação a um dos pisos e anexos.

26.ª Tais informações tinham de constar dos anúncios, mas, na verdade, não constavam.

27.ª Tais informações “… que naturalmente, não são apreensíveis pelo exame do bem imóvel, …( e a sua) omissão, consubstancia uma desconformidade entre o bem anunciado e o real que não pode deixar de ser relevante para efeitos de anulação da venda, nos termos previstos no artigo 257º, nº 1, alínea a) do CPPT…”, conforme consta de II do Sumário do douto Acórdão fundamento proferido em 22/06/2014 (negrito nosso).

28.ª Aliás, “…(S)endo os anúncios…aqui referidos os únicos meios previstos para proporcionar aos potenciais compradores informação sobre as características do bem a vender, deverá entender-se que daqueles deverá constar toda a informação relevante para formação da vontade do comprador que não seja possível obter através do exame dos próprios bens. Trata-se de uma exigência manifestamente imposta pelas regras da boa fé que deve caracterizar a generalidade das relações contratuais (art. 227.º, n.º l, do Código Civil) e toda a actividade da administração pública (arts. 266.°, n.° 2, da CRP). (...) Pela mesma razão, deverão constar dos anúncios … todos os elementos que possam influenciar o valor do bem a vender (...) Por outro lado, da alínea a) do n.º 1 do art. 257.° deste Código. (...), deduz-se que as qualidades do objecto a vender, e não apenas a sua identificação, devem ser anunciados" (Jorge Lopes de Sousa - Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado e Comentado, vol IV, 6ª Ed., Áreas Editora, Lisboa, 2011, pp. 121 e 122 - sublinhados nossos).

29.ª Fundamento este que erradamente não foi sequer tido em consideração na posição vencedora do Acórdão recorrido.

30.ª Se no Acórdão fundamento, nos anúncios de publicitação da venda do rés-do-chão aí em causa, era incontroverso que não tinha sido feita “…qualquer referência à existência de anexos nem ao licenciamento camarário ou falta dele…”, mutatis mutandis,

31.ª Também no caso do Acórdão recorrido, nele não foi feita qualquer referência à existência da área adstrita a um piso, nem ao licenciamento camarário para indústria ou à falta dele em relação a esse piso, e à acrescida área de 83,35m2 correspondentes à diferença entre os anunciados 140 m2 para indústria e os reais 223,35 m2.

32.º Tal como no Acórdão fundamento em que, não obstante constar do processo de avaliação, que o piso superior do imóvel não se encontrava licenciado, factualidade essa que não foi objecto de publicitação,

33.ª Também no Acórdão recorrido, apesar de haver informação de que existia uma área de dois pisos, isso não foi objecto de publicitação.

34.ª Da lei não resulta que o teor dessas informações “…não careçam de ser publicitadas. Bem pelo contrário. Dito de outro modo, a venda pode ser efectuada com dispensa de licença de utilização, porém o adquirente tem de estar na posse de todos esses elementos, ou seja, tem de ser prevenido de que o imóvel carece de licença de utilização. E isto para, desde logo, poder decidir se pretende ou não avançar com a compra e com a subsequente legalização do bem (…).

Trata-se de um elemento que deveria constar dos editais e anúncios, porquanto influencia o valor do bem a vender e não tem a ver com as características físicas do objecto, apreensíveis pelo seu exame externo, mas sim com características jurídicas.

(…)

Conforme reconhece o Serviço de Finanças … esses elementos constavam do processo de avaliação e, portanto, deveriam ter sido reflectidos nos anúncios e editais de venda.

(…)

Este facto, devendo ser conhecido (pelo) … SF … veio a reflectir-se no anúncio da venda do imóvel, que também ficou com a descrição incorrecta.

(…) não colhe o argumento avançado … de que a Reclamante deveria ter visualizado o bem antes da sua aquisição, desde logo porque tal argumentação assenta no juízo de valoração ético e de censura, o qual não releva para efeitos de anulação de venda (Do mesmo modo que não releva a diferença para mais – que a área real detinha em relação à área anunciada – era um factor que em princípio favorece o comprador, como se argumenta no Acórdão recorrido). Acresce, outrossim, que tal característica não tem a ver com o exame físico do bem, mas com uma questão jurídica.

O erro sobre as qualidades que releva para efeitos de anulação (...) tem de se consubstanciar em divergência entre as qualidades do objecto e o teor dos …anúncios. (...) [T]ambém em qualquer destes casos de erro, para justificar a anulação não será necessário que o erro seja essencial, bastando o mero erro incidental (se não fosse o erro, a compra não teria sido efectuada pelo preço que foi) e será indiferente que o comprador tenha culpa na ocorrência do erro", podendo esta, no entanto, relevar a nível da indemnização prevista no artigo 908.° do CPC. (Jorge Lopes de Sousa, ob. citada, p.179).

In casu, a omissão … no anúncio, da falta de licenciamento camarário do piso superior da fracção autónoma e anexos (ou, no caso do acórdão recorrido, da falta de licenciamento camarário para indústria da área de um de 2 pisos) levou a uma situação de erro sobre as qualidades do objecto, porquanto (o recorrente) não teria feito a proposta pelo preço que fez se tivesse pleno conhecimento de todos os elementos relevantes, dado que o elemento omitido, como é facto notório, influencia o preço de mercado do bem imóvel e inviabiliza a sua venda e arrendamento a terceiros.

Acresce sublinhar, a final, que a ratio da anulação com base em erro sobre o objecto transmitido, por falta de conformidade com o anunciado, se coaduna com a protecção do comprador e com a segurança, certeza e boa fé que devem nortear os negócios jurídicos.

Note-se que se trata de venda em processo judicial, logo com uma segurança acrescida.

Compreensivelmente, à luz dos princípios da segurança, da confiança e da boa fé que há-de reger a actuação do alienante, deposita-se uma superior confiança na identificação correcta e totalmente transparente do bem objecto da venda.

Ora, não constando dos … anúncios de publicitação da venda todas as características evidenciadas anteriormente resulta, assim, que (o Recorrente) foi induzido a formar uma convicção errada sobre (o imóvel que adquiriu). Conclui-se, portanto, que o (Recorrente) foi prejudicado por estar em erro sobre o objecto transmitido, por desconformidade entre o que foi anunciado e o adquirido.

Adquiriu, portanto, um imóvel com características diferentes daquelas para o qual se propôs comprar, e ao qual era alheio quando efectuou a compra…”, tudo conforme e bem se argumenta ao longo do Acórdão fundamento, a fls. 18 a 20.

35.ª Para além de nada ter sido dito acerca desta fundamentação que se acaba de evidenciar, erradamente, no Acórdão recorrido, a posição aí vencedora não se pronunciou acerca da ocultação de publicitação das qualidades do objecto transmitido, nem acerca da respectiva desconformidade entre o bem anunciado e o real, nem referiu se esse circunstancialismo era ou não relevante para efeitos de anulação da venda – pronúncia essa que, todavia, consta do voto de vencido-,

36.ª Limitando-se a dizer essa posição vencedora no acórdão recorrido, em parcas e conclusivas palavras, que “… parece ser excessivo concluir que estamos perante um erro sobre a coisa transmitida que mereça relevância em termos de fundamentar a anulação da venda por parte do comprador…”, acrescentando que essa “…divergência entre a área coberta anunciada e a área real para mais, …constitui(a) um factor que em princípio favorece o comprador aqui recorrente …” pelo que “…não (tinha) a referida divergência aptidão para configurar o erro sobre a coisa transmitida.”, cf. consta do parágrafo 3º a fls. 28 do Acórdão recorrido.

37.ª O assim fundamentado pelo sentido vencedor do Acórdão recorrido (contariado e bem pelo fundamentado voto de vencido), não foi sequer defendido de modo assertivo e peremptório, afirmando-se, por exemplo: «é excessivo» ou a «divergência é apta» para configurar erro sobre a coisa transmitida. Pelo contrário, bastou-se toda a argumentação com um «parece ser excessivo», ou «não tem a referida divergência aptidão para configurar o erro sobre a coisa transmitida.».

38.ª Ainda e com o devido respeito, que é muito, esta posição vencedora do Acórdão recorrido, não constitui o melhor entendimento ou fundamentação de Direito, senão e para tanto, relembre-se, na esteira do Acórdão fundamento, o que é referido no voto de vencido desse mesmo Acórdão recorrido:

“… a decisão de manutenção do julgado assentou em dois pressupostos de facto …(…)

(…)o da existência de uma divergência entre a área coberta anunciada e a área coberta real, concluindo pela sua irrelevância por, sendo “uma diferença para mais, a mesma constituir um factor que em princípio favorece o comprador e aqui recorrente.

O segundo, o de que a falta de licenciamento da parte da área do mesmo prédio (omitida no anúncio)…

(…) tendo ficado provada a divergência objectiva entre as anunciadas qualidades do prédio e as que efectivamente possui tal é o bastante para que a venda fosse anulada, carecendo de sentido o juízo de oportunidade ou princípio sobre as mais valias que daí (das referidas e efectivas diferenças) possam resultar para o adquirente, por constituírem ilações subjectivas, sendo que o recorrente afirmou perentoriamente que desse facto para si não advinha nenhum benefício pelas razões que aduziu.

É essa desconformidade que, de resto, vem constituindo fundamento de anulação em múltiplos arestos dos nossos Tribunais Superiores.

(…)

Relativamente à questão da falta de licenciamento … não está apurado nos autos que nessa data o Recorrente já sabia da inexistência de licenciamento …Acresce que, aquela falta de licenciamento constitui um factor directamente conexionado com a própria divergência apurada (a parte alegadamente não licenciada corresponde precisamente à parte omitida no anúncio) e, consequentemente, capaz de atribuir um acréscimo de relevância à diferença entre o que foi anunciado e as qualidades do bem transmitido …”.

Donde, pelo exposto, em nosso entender, a decisão recorrida deveria ser revogada.” (negrito nosso).

39.ª Tal como o evidenciado no Acórdão fundamento, a solução jurídica a ser adoptada deve ser a de que a ratio da anulação com base em erro sobre o objecto transmitido, por falta de conformidade com o anunciado, tem como primado a protecção do comprador, a segurança, certeza e boa fé que devem nortear os negócios jurídicos, devendo essa segurança ser acrescida quando se trata de venda em processo judicial, para mais sendo quem é, in casu, uma entidade pública responsável pela venda.

40.ª À luz dos princípios da segurança, da confiança e da boa fé que hão-de reger a actuação do alienante, deposita-se uma superior confiança na identificação correcta e totalmente transparente do bem objecto da venda.

41.ª Não é indiferente para quem adquire o imóvel saber dessa discrepância, sendo certo que, em relação a, pelo menos, 83,35m2, não se sabe sequer se essa área cumpre ou não os parâmetros urbanísticos para o local, se cumpre ou não as normas imperativas do RGEU,

42.ª A informação, na posse do SF, relativamente à acrescida área, respectiva discrepância de áreas e de qual seria o seu fim, deveria constar do anúncio da venda, ou seja, carecia de publicitação mas foi omitida, não estando o SF desonerado disso informar.

43.ª Trata-se de uma informação essencial para quem pondera adquirir o bem em causa, para o cálculo do valor da proposta, podendo determinar, até, o desinteresse pelo negócio face às limitações a um bem em tais circunstâncias.

44.ª Prevenir e dar a conhecer ao potencial interessado na aquisição, as circunstâncias relativas à falta de registo da real área, ou à falta de licenciamento, ou não, em relação a parte dessa real área, influencia o valor do bem.

45.ª Contrariamente ao invocado pelo Tribunal recorrido, o prédio sub juditio ao deter uma área acrescida de 83,35 m2, que à revelia do direito registral e do aplicável às edificações urbanas não se encontrava registada, não “…favorece em princípio…” o recorrente, desde logo e se mais não fosse, conforme o evidenciado pelo voto de vencido, por esse acréscimo mais não constituir que uma ilação subjectiva.

46.ª Acresce que o recorrente só quis para si um imóvel afecto à indústria com a área dos 140 m2 anunciados. Nunca quis ficar com qualquer tipo de encargo inerente à legalização da acrescida área.

47.ª Nunca quis ficar com a obrigação, de entre outras, de apresentar projectos (como, por exemplo, de arquitectura), para legalizar perante a edilidade camarária essa área por si não querida.

48.ª Nunca quis, inclusive, correr o risco de lhe ser determinada a demolição do piso ilegalmente edificado que detém a ára correspondente aos «acrescidos 83,35m2», desembolsando, para o efeito, os respectivos custos.

49.ª Adquiriu, portanto, um imóvel com características diferentes daquelas para o qual se propôs comprar, e ao qual era alheio quando efectuou a compra.

50.ª Daí que não se compreenda como possa a posição vencedora no Acórdão recorrido, ter concluído por aquele “favorecimento em princípio”, quando certo e sabido é que custos e encargos acrescidos, de todo incalculáveis, sempre teriam de ser suportados por virtude de ter sido escondida ao recorrente a existência de uma área ilegal de 83,35 m2, v.g. os custos atinentes à sua demolição, uma vez que não se conhece, sequer, o fim a que essa área se destina.

51.ª Ainda e, citando J. Lopes de Sousa, deverão constar dos anúncios…todos os elementos que possam influenciar o valor do bem a vender (…) Por outro lado, (…) as qualidades do objecto a vender, e não apenas a sua identificação, devem ser anunciados. OU,

52.ª Tal como também implícito na posição jurídica do Acórdão fundamento “não podemos esquecer que, cada vez mais, vivemos numa sociedade de informação onde as aquisições de bens e outros negócios jurídicos se apresentam e fazem à velocidade da vida moderna e dos actuais meios de comunicação social o que é compreensível e universalmente aceite. Daí, o mais rigor que se deve exigir na publicitação a quem apresenta para venda bens em meios de comunicação, incluindo os Jornais e a Internet”, conforme a este propósito se refere no Acórdão do STA, de 7/12/11 (processo n.º 0598/10, relatado pelo Conselheiro Ascensão Lopes).

53.ª Elucidativo é ainda o sumário deste douto acórdão:

“I - Ainda que a Administração Fiscal não esteja obrigada a efectuar uma descrição exaustiva do bem a vender, bastando que sumarie a mesma, há que verificar caso a caso se os elementos divulgados são suficientes para que o potencial interessado forme uma exacta e correcta ideia sobre o mesmo bem, nos seus aspectos quantitativos e qualitativos.

II - Tendo sido omitida a afectação do bem a vender constante da matriz e ocorrendo discrepância entre a descrição matricial e a do registo predial, e sucedendo que tais divergências não foram suficientemente esclarecidas numa visita ao local onde ao comprador, ora recorrente, foi indicado outro bem que igualmente tinha sido penhorado ao mesmo executado, o recorrente de boa fé, pensou estar a adquirir uma casa térrea quando efectivamente estava a adquirir um armazém ou equivalente construído clandestinamente sobre uma casa térrea.

III - Tal omissão e divergências de descrição, ditas em II), criaram erro na representação do objecto, cuja culpa não pode ser atribuída ao recorrente que agiu com a diligência normal e esperada.

IV - Numa sociedade de informação onde as aquisições de bens e outros negócios se apresentam e fazem à velocidade da vida moderna e dos actuais meios de comunicação, o que é compreensível e universalmente aceite, exige-se maior rigor na publicitação a quem apresenta para venda bens em tais meios, incluindo os Jornais e a Internet.” (negrito nosso).

54.ª Ambos os acórdãos foram proferidos no mesmo quadro legislativo, acerca de situações fácticas idênticas, e não está o acórdão recorrido em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada pelo Supremo Tribunal Administrativo.

55.ª O aresto recorrido (com voto de vencido), incorreu em erro de julgamento de Direito, fazendo uma errada interpretação, de entre outros, do disposto no art.º 257º, n.º 1, alínea a) do Código de Procedimento e Processo Tributário (CPPT), devendo, no nosso modesto entendimento, adoptar-se o entendimento constante do Acórdão fundamento proferido pela Secção do Contencioso Tributário do Tribunal Central administrativo Sul, no Processo n.º 007768/14, com data de 26/06/2014, já transitado em julgado, relatado pela Senhora Desembargadora Catarina Almeida e Sousa, e publicado em www.dgsi.pt.

Deverá o presente recurso por oposição de Acórdãos, atentas as situações fácticas substancialmente idênticas que constam no Acórdão recorrido e no Acórdão fundamento, ser julgado procedente, por provado, sendo adoptada por este Tribunal a solução jurídica adoptada pelo supra identificado Acórdão fundamento proferido pela Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul, no Processo n.º 007768/14, com data de 26/06/2014, já transitado em julgado, relatado pela Senhora Desembargadora, Catarina Almeida e Sousa, sendo deste modo anulada a venda (art. 257.º, n.º 1, al. a) do CPPT) e levantada a penhora que recai sobre o imóvel identificado no doc. n.º 3 junto à P.I. (fls. 9 e 10 do Vol. “outros incidentes da execução fiscal”), como é de Lei e de Direito, e sendo desta forma feita a costumada JUSTIÇA!

2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Supremo Tribunal emitiu o parecer de fls. 423/424 nos autos, no qual conclui que o recurso deve ser julgado findo porquanto as situações fácticas subjacentes aos dois acórdãos não são substancialmente idênticas, já que embora estejam em causa situações fácticas com contornos algo semelhantes, ou seja, a divergência entre as áreas de construção cobertas que constavam do registo predial/matriz predial e que tinham sido publicitadas e as áreas reais dos prédios, que em ambos os casos eram superiores (…) enquanto no caso do acórdão fundamento essa divergência de área coberta resultava da existência de mais um piso e anexos que comprovadamente não se encontravam licenciados, no caso do acórdão recorrido a divergência a divergência é apenas da volumetria das áreas.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

- Fundamentação –

4 – Questões a decidir
Importa verificar se, no caso dos autos, estão reunidos os requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, cuja não verificação impede o conhecimento do presente recurso. Concluindo-se no sentido da verificação daqueles requisitos, haverá então que conhecer do seu mérito.

5 – Matéria de facto
No acórdão recorrido encontram-se fixados os seguintes factos:
A) Em 19-01-2001, o Serviço de Finanças de Alcobaça, instaurou contra X…………, Lda., NIPC ………, o processo de execução fiscal n.º 1309200101001060 por dívida de IVA do ano de 2000, na quantia de €3.352,97. – (cfr. processo de execução fiscal apenso).
B) Em 08-01-2002, O Serviço de Finanças de Alcobaça, no processo de execução fiscal mencionado na alínea anterior apensos, lavrou auto de penhora para pagamento da quantia de €7.539,76, do prédio urbano registado na matriz predial sob o n.º 2316 da freguesia de …… sito na Rua ………, n.º ……, ……, com a seguinte descrição: “Prédio urbano, para indústria, que se compõe de rés do chão e 1.º andar, com cinco divisões e três casas de banho, a confrontar do norte com Travessa da ………, sul com ………, nascente com Rua ……… e poente com ………, com a área de s.c. 140 m2 e valor patrimonial de €35.913,45, sendo única titular X…………, Lda.”. – (cfr. fls. 9 do processo de execução fiscal apenso).
C) No auto de penhora referido na alínea anterior consta ainda que “Os quais bens penhorados foram entregues juntamente com a cópia deste auto a W…………, morador na Rua ………, n.º 5, ……, Alcobaça, depositário idóneo por mim escolhido (…).” – (cfr. fls. 9 do processo de execução fiscal apenso).
D) Encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcobaça sob o n.º 02150/020115 o prédio urbano sito na Rua ………, n.º ….., edifício de rés do chão e 1.º andar, para indústria, com 140m2, artigo 2316. – (cfr. fls. 13 do processo de execução fiscal apenso).
E) Em 15-05-2003, no processo de execução fiscal descrito em A) e apensos foi lavrado auto de penhora de bens móveis da sociedade executada, correspondentes a maquinaria e utensílios da indústria de panificação, conforme descrito a fls. 25 e 26 do processo de execução fiscal apenso.
F) Em 20-11-2006 o Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça proferiu despacho de marcação da venda do imóvel identificado em B) para o dia 10-01-2007, mediante proposta em carta fechada, fixando o valor base da venda em €125.000,00.- (cfr. fls. 56 do processo de execução fiscal apenso).
G) Na mesma data o Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça designou o dia 10-01-2007 para venda por propostas em carta fechada dos bens móveis referidos em E) – cfr. fls. 57 do processo de execução fiscal apenso).
H) Com data de 21-11-2006, o Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça emitiu Anúncio e Éditos de 20 dias para a venda referida em F), constando a seguinte descrição do bem a vender: “Verba Única Prédio urbano, sito na Rua ………, n.º …… – ……, afecto à indústria, inscrito na respectiva matriz predial urbana da freguesia de ……, sob o art.º 2316, composto de rés do chão e 1.º andar, com cinco divisões e três casas de banho, tem 140 m2 de superfície coberta. O valor patrimonial é de €42.018,73. O valor base para venda é de €125.000,00 (…) – (cfr. fls. 62 a 65 do processo de execução fiscal apenso).
I) Em 22-11-2006, o Serviço de Finanças de Alcobaça notificou W…………, na qualidade de fiel depositário do imóvel referido na alínea anterior, além do mais, da data da venda e da obrigação de mostrar o bem penhorado aos interessados. – (cfr. fls. 76 do processo de execução fiscal apenso).
J) Na mesma data o Serviço de Finanças de Alcobaça notificou a sociedade executada, na pessoa do sócio gerente V…………, para proceder à entrega das chaves do imóvel penhorado. – (cfr. fls. 78 do processo de execução fiscal apenso).
K) Por ofício recebido no Serviço de Finanças de Alcobaça em 11-12-2006, o Centro Distrital de Segurança Social de Leiria comunicou que sobre o bem penhorado descrito em H), encontra-se pendente a execução ordinária n.º 397/2000, que corre termos no 3.º Juízo do Tribunal Judicial de Alcobaça, onde foi penhorado em 22-03-2001 o mesmo imóvel, requerendo a suspensão da execução quanto ao bem penhorado. – (cfr. fls. 97 a 99 do processo de execução fiscal em apenso).
L) Em 14-12-2006 o Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça determinou a suspensão da venda dando sem efeito o despacho mencionado em G). – (cfr. fls. 97 do processo de execução fiscal em apenso).
M) Por despacho de 4-01-2008 do Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça foram adjudicados à sociedade U…………, Lda., os bens móveis referidos em E), pelo preço de €2.975,00. – (cfr. fls. 175 do processo de execução fiscal apenso).
N) Em 01-02-2008 o Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça determinou a avaliação oficiosa do imóvel penhorado, identificado em H). – (cfr. fls. 180 dos autos de execução fiscal em apenso).
O) Em 16-05-2008, no processo de execução fiscal identificado em A) e apensos, foi prestada informação onde consta, além do mais, o seguinte:
“Depois de concluída a avaliação do referido imóvel, do qual resultou o valor patrimonial de €21.960,00, no entanto após a análise à caderneta predial e à certidão do registo predial verifica-se que na avaliação não foi considerada a área dos 2 pisos, mas apenas a área referente a um piso. (…)” (cfr. fls. 190 dos autos de execução fiscal em apenso).
P) Constam da caderneta predial urbana, impressa em 08-09-2008, respeitante ao artigo matricial n.º 2316 da freguesia de ……, concelho de Alcobaça, sito na Rua ………, n.º ……, as seguintes indicações:
“Áreas
Área total do terreno: 223,3500m2; Área de implantação do edifício: 223,3500 m2; área bruta de construção: 250,3500m2; Área bruta dependente: 27,000m2; área bruta privativa: 223,3500m2; Dados da avaliação
Ano de inscrição na matriz: 1997; Valor patrimonial actual (CIMI): €36.300,00; Determinado no ano: 2008. (…).
Mod 1 do IMI n.º 1806559; Entregue em 16-05-2008; Ficha de avaliação n.º 2238715; Avaliada em: 2008-05-20. (…).”.(cfr. fls. 204 dos autos de execução fiscal em apenso).
Q) Em 12-09-2008 o Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça determinou o prosseguimento da execução fiscal e designou o dia 15-01-2009 para venda do bem imóvel penhorado, pelo valor base de €36.300,00. – cfr. fls. 208 e 209 do processo de execução fiscal em apenso.
R) Com data de 29-09-2008, o Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça emitiu Anúncio para a venda referida na alínea anterior, constando a seguinte descrição do bem a vender:
“Verba Única
Prédio urbano, sito na Rua ………, n.º …… – ……, afecto à indústria, inscrito na respectiva matriz predial urbana da freguesia de ……, sob o art.º 2316, composto de rés do chão e 1.º andar, com cinco divisões e três casas de banho, tem 140 m2 de superfície coberta. O valor patrimonial é de €36.300,00. O valor base para venda é de €25.4100,00 (…). – (cfr. fls. 211 do processo de execução fiscal apenso).
S) Em 15-01-2009 o Serviço de Finanças de Alcobaça lavrou auto de abertura e aceitação de propostas, sendo a proposta de maior valor a apresentada por Z…………, no montante de €79.900,00. – (cfr. fls. 279 do processo de execução fiscal apenso).
T) Em 29-01-2009 o Serviço de Finanças de Alcobaça notificou Z………… de que havia sido aceite a proposta apresentada e para efectuar o depósito do preço no prazo de 15 dias. – (cfr. fls. 292 e 292-V do processo de execução fiscal apenso).
U) Na mesma data foi lavrado auto de arrombamento do imóvel identificado em R). – (cfr. fls. 293 do processo de execução fiscal apenso).
V) Em 18-02-2009, o Chefe do Serviço de Finanças determinou o prosseguimento da execução fiscal contra o proponente Z…………, por falta de pagamento do preço da venda. - (cfr. fls. 298 dos autos de execução fiscal em apenso).
W) Em 16-04-2009 o ora requerente apresentou junto do Serviço de Finanças de Alcobaça requerimento invocando uma desconformidade entre o anúncio da venda e a realidade física do bem e requerendo a anulação da venda. - (cfr. fls. 302 a 305 dos autos de execução fiscal em apenso).
X) Em 29-04-2009 o Serviço de Finanças de Alcobaça lavrou auto de penhora do imóvel identificado pela Fração J do prédio urbano com o artigo matricial n.º 7415 da freguesia de …… (……) sito na Rua ………, destinado a habitação, para pagamento da quantia de €79.900,00 respeitante ao preço da venda do imóvel referido em R), não paga pelo adquirente Z…………. – (cfr. fls. 306 dos autos).
Y) Em 07-05-2009 o Serviço de Finanças de Alcobaça notificou o ora requerente da penhora do imóvel referido na alínea anterior. – (cfr. fls. 315 do processo de execução fiscal apenso).
Z) Em 08-05-2009 o Serviço de Finanças de Caldas da Rainha emitiu, a solicitação do ora requerente, caderneta predial do imóvel identificado em R).- (cfr. fls. 9 e 10 dos autos).
AA) Em 21-05-2009, o Serviço de Finanças de Alcobaça citou o ora requerente para a execução fiscal referida em A) e apensos e para o pagamento da quantia de €79.900,00, por falta de pagamento do preço de venda. – (cfr. fls. 316 do processo de execução fiscal apenso).
BB) Na mesma data deu entrada no Serviço de Finanças de Alcobaça a petição inicial do presente incidente de anulação da venda. – (cfr. fls. 4 dos autos).
Encontra-se ainda provado que:
CC) Em 27-05-2009, no processo de execução fiscal identificado em A) e apensos foi prestada informação onde consta designadamente o seguinte: “(…) Assim e dado o exposto por o adjudicatário, tenho a informar que o imóvel em causa não apresenta sinais de destruição, encontrando-se unicamente sujo por ter estado bastante tempo fechado, tendo por esse facto um estado deplorável interiormente, mas que em nada tem a ver com referido e exposto pelo adjudicatário, pois os bens móveis de lá retirados eram móveis de madeira, balcões e máquinas que se removeram facilmente pois não se encontravam agarrados à estrutura do imóvel. (…)”. – (cfr. fls. 19 dos autos).
DD) Com data de 3-06-2009, no processo de execução fiscal identificado em A) e apensos foi prestada por ………, Perito Avaliador, a seguinte informação:
“Assunto: Áreas do artigo Urbano 2316 da freguesia de ……
Por ter sido solicitado pelo Chefe do Serviço de Finanças de Alcobaça, com vista à justificação das áreas do prédio inscrito sob o artigo 2316, da matriz urbana da freguesia de ……, concelho de Alcobaça, cumpre-me informar o seguinte:
1 – As áreas que se reporta à ficha de avaliação do prédio em questão, resultam das medidas a que procedi no local e encontram-se rigorosamente coincidentes com o prédio existente, que tem dois pisos.
2 – Os erros apontados na Conservatória do Registo Predial e Artigo Matricial, em meu entender, resultam de erros de medições quando participados para aquele efeito.
3 – A área total do terreno onde está implantado o prédio é de 223,35 m2. A área bruta privativa é de 223,35m2, como se define no n.º 2 do art. 40.º do CIMI e a área bruta dependente é de 27 m2, como define o n.º 3 do mesmo artigo.
Deste modo, confirmo os elementos e valores que serviram de base à avaliação do prédio.”. – (cfr. doc. de fls. 18 destes autos).
EE) Em data não determinada mas antes da proposta de compra, o requerente deslocou-se ao imóvel em causa nos autos tendo apenas visualizado o interior de uma das divisões do rés do chão. – (facto comprovado pelo depoimento da testemunha T…………).
FF) O ora requerente acedeu ao interior do imóvel apenas na data do arrombamento do mesmo, o que ocorreu em 29-01-2009, conforme referido em T). – (facto comprovado pelo depoimento da testemunha T…………).

Por sua vez, é do seguinte teor o probatório fixado no Acórdão fundamento:

A) No âmbito do processo de execução fiscal nº369720010101029940 e apensos do Serviço de Finanças do Seixal 2, instaurado contra "... , SOCIEDADE DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA, LDA", revertida contra ... ... e ... ... ... ... , foi penhorada, em 31 de Março de 2009, a fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente ao R/C Esq, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ... ... , n° ……, ………, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4234, da Freguesia de ………, Concelho de Seixal (documento fls. 36, 42, 47 e 151 do processo de execução fiscal (PEF) apenso; fls. 28 e 31 do PEF apenso);

B) A 7 de Abril de 2009, foi efectuada a inscrição Ap. 2153 de 2009/04/07, na Conservatória do Registo Predial de Amora, da penhora referida em A) (documento junto a fls. 151 do PEF apenso);

C) Foram emitidos pelo Serviço de Finanças do Seixal 2 "Edital de Venda e Convocação de credores", e Anúncios de publicitação da venda constando quanto à identificação do bem o seguinte:

"IDENTIFICAÇÃO DO(S) BEM(NS)

N° da Venda: 3697.2012.275 Fracção Autónoma designada pela letra B, correspondente ao R/C Esq., destinado a habitação, do prédio urbano em regime de Prop. Horiz., sito na Rua ... ... , N° ……, ………, 2855-…… ………, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4234, da Freguesia de ………, Concelho de Seixal Tipologia/Divisões: T3, com sala, 3 quartos, cozinha, instalação sanitária, corredor, varanda e garagem no logradouro comum, destina-se a habitação. Ampliado com 3 assoalhadas, cozinha, ... de banho, vestiário e despensa. N° de pisos da Fracção: 2, Área do terreno integrante: 54,400 m2, Área bruta privativa:187,7100m2, Área bruta privativa: 187,7100m2, Área bruta dependente:23,4900m2. O bem penhorado encontra-se descrito na Conservatória do Registo Predial de Amora, sob o número 4880/20070619-B, da Freguesia de ………. Tem o valor patrimonial de €157.883,25" (cfr. fls. 207 e seguintes do PEF apenso; facto não controvertido-facto que se extrai dos factos descritos na informação instrutora a fls. 364 a 374 dos autos; facto que se extrai da informação do órgão periférico local a fls. 380 do PEF apenso);

D) Foi emitida por ... , Técnico da Administração Tributária Adjunto, do quadro da Direcção Geral dos Impostos a desempenhar Funções no Serviço de Finanças do Seixal certidão de afixação de três editais de teor igual ao referido na alínea antecedente nos lugares públicos determinados na Lei. (cfr. fls. 207 verso do PEF apenso);

E) A 4 de Março de 2013, o Chefe do Serviço de Finanças de Seixal 2, procedeu à abertura das propostas em carta fechada, do bem imóvel penhorado e descrito em C) (cfr. fls. 236 do PEF apenso);

F) A Reclamante adquiriu, através de venda judicial por proposta em carta fechada, referida na alínea antecedente, a fracção autónoma designada pela letra "B", correspondente ao R/C Esq, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Rua ... ... , n° ……, ………, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4234, da Freguesia de ………, Concelho de Seixal, pelo preço de € 81.699,99 (cfr. título de adjudicação de bens imóveis-fls. 244 do PEF apenso);

G) A 6 de Maio de 2013, foi proferido despacho pela Chefe do Serviço de Finanças do Seixal 2 de cancelamento dos registos dos direitos reais que incidem sobre a fracção penhorada e vendida do qual consta, designadamente, o seguinte:

" Despacho

Da informação que antecede e da informação dos autos, constata-se que já foi paga a totalidade do valor devido pelo adquirente do bem vendido no processo de execução fiscal acima indicado, através da Proposta em Carta Fechada.

Face à competência que me é conferida pelo artigo 260.º do CPPT, ordeno o levantamento das penhoras e o cancelamento dos direitos reais que incidem sobre a fracção B do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia de ………, sob o artigo 4234, descrito na Conservatória do Registo Predial de Amora sob o n° 4880/20070619-B (...)" (cfr. despacho a fls. 283 do PEF apenso);

H) A 7 de Junho de 2013, e na sequência de requerimento da Reclamante, o Município do Seixal emitiu Certidão com o seguinte teor:



Requerimento Nº 29001
CERTIDÃO

... , Assistente Técnico na Divisão Administrativa de Urbanismo, de acordo com o solicitado no requerimento n°29001 de 23/05/2013 por ... , LDA., contribuinte nº... , e depois de compulsado o processo de obras 203/B/75, certifica que:------------------------------------------------------------------------------------

------Para o prédio construído na Rua ... ... , nº …… (fração direita), …… (fração esquerda), ... , freguesia de ……… deste município, foi emitida a licença de utilização n°331 em 19 de julho de 1985.-------------------------------------------------------------------------------

----Mais se certifica que para a fração “B” referente ao lado esquerdo existe mais um piso que não se encontra licenciado, e anexos que deverão ser demolidos.------------------------------------------------------------------------

------Por ser verdade e ter sido requerida passo a presente certidão, que assino e autêntico com o selo branco em uso nesta Câmara Municipal.----------------------------------------------------------------------------

----- Divisão Administrativa de Urbanismo, ao sétimo dia do mês de junho de dois mil e treze.----



DIVISÃO ADMINISTRATIVA DO URBANISMO

(Assinatura)”



(cfr. certidão a fls. 318 do PEF apenso);

I) Em face da emissão da certidão referida na alínea antecedente e tendo a Reclamante tomado conhecimento, nessa data, da falta de licenciamento camarário da fracção autónoma adquirida apresentou, em 11 de Junho de 2013, requerimento de anulação de venda junto do Serviço de Finanças do Seixal 2, com o seguinte teor:

Exmo Sr(a) Chefe de Finanças do Seixal 2

A ... , LDA., contribuinte nº... , vêm pelo presente requerer que seja anulada a venda nº 3697.2013.33, e que nos seja devolvido a totalidade do valor pago e o respectivo imposto de selo liquidado.

Este pedido resulta do facto de o imóvel em causa carecer de licenciamento camarário no que se refere ao 1º piso, e em anexos também existentes no logradouro do mesmo.

Segundo informação transmitida pela respectiva câmara do Seixal, é ILEGAL A CONSTRUÇÃO DO PRIMEIRO PISO QUE SE ENCONTRA EFECTUADA, assim como dos anexos instalados no logradouro que deverão ser demolidos.

Uma vez que esta se trata de uma informação de elevada importância e de todo crucial pois impossibilita futura venda ou arrendamento e que nunca foi indicada pelo vosso serviço de finanças nem estava presente no anúncio de venda, vimos solicitar a restituição da totalidade do valor da compra e impostos pagos.

Sem outro assunto de momento, com os meus cordiais cumprimentos,

Seixal, 11 de Junho de 2013

(cfr. requerimento a fls. 317 do PEF apenso; facto não controvertido-facto alegado nos artigos n.°, 12.° 13.° e 14.º da p.i. e não impugnado; facto que se extrai da informação do Serviço de Finanças a fls. 380 do PEF apenso);

J) Em 20 de Junho de 2013, foi emitida informação pela Chefe do Serviço de Finanças do Seixal 2 onde consta, designadamente, o seguinte:


“INFORMAÇÃO

O Artigo matricial n° 4234 da freguesia de ……… foi participado à matriz em 19/07/1985 tendo sido avaliado para efeitos de IMI em 11/08/2006. No processo do imóvel (IMI) e dos documentos apresentados para avaliação, emitidos pelo Município do Seixal, consta que embora exista projecto de arquitectura de ampliação em mais um piso, para a fracção B (rés do chão esquerdo) este não se encontrava licenciado (certidão emitida em 4/08/2006).

Este facto, devendo ser conhecido deste SF pois constava do processo de avaliação, não constava da descrição da matriz, que se encontra incorrecta, o veio a reflectir-se no anúncio da venda do imóvel, que também ficou com a descrição incorrecta.

O adjudicatário ao solicitar certidão actualizada das licenças vigentes no município, verificou que na mesma constava que o piso superior do imóvel que adquiriu não se encontra licenciado e terá de ser demolido (certidão emitida a 7/06/2013).

O preço foi depositado e pago o IMT e o I. Selo.

O procedimento da reclamação de créditos não se concluiu e encontra-se suspenso.

O executado foi considerado insolvente em 27/05/2013 Pº n° 2952/13.1 TBSXL-2º Juízo-

Por tudo o referido sou do parecer de que deverá ser dado provimento ao adjudicatário no pedido de anulação da venda.

Remeta-se à Direcção de Finanças de Setúbal para os efeitos do n° 4 do art° 257.º do CPPT. Juntando-se as cópias dos documentos processuais relevantes” (cfr. informação a fls. 380 do PEF apenso);

K) De Ofício n° 1412, datado de 20 de Junho de 2013, a Chefe do Serviço de Finanças do Seixal 2, remeteu à consideração superior o requerimento de anulação de venda, juntamente com a informação referida na alínea antecedente (cfr. ofício a fls. 375 do PEF apenso);

L) A 7 de Agosto de 2013, foi proferida informação pelo Inspector Tributário da Direcção de Finanças de Setúbal, relativamente ao pedido de anulação de venda referido na alínea l), constando do seu teor, designadamente, o seguinte:

" (...) II - OS FACTOS

A) A execução fiscal n° 3697200101029940 Aps,, instaurada contra ... -... , SOCIEDADE DE MEDIAÇÃO IMOBILIÁRIA LDA, nif ... , foi revertida contra (i) ... ... , nif ... e (ii) ... ... ... ... , nif ... .

B) Na execução fiscal referida em A) foi penhorada a fracção autónoma B do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da freguesia do ………, no concelho do Seixal, sob o artigo 4234 (penhora nº 3697.2009.955), composta por 2 pisos (piso térreo, e ampliação com piso superior) com a descrição tal como consta da matriz.

C) Em 2009-04-07, foi registada na CRP a penhora do imóvel a favor da FP.

D) Frustrada a venda por leilão electrónico (venda nº 3697.2012.275), realizou-se a 28 (sic) tentativa de venda que se processou na modalidade de venda por propostas em carta fechada, cuja abertura ocorreu no dia 04 de Março de 2013 (venda n.º 3697.2013.33).

E) A venda foi publicitada na Internet e por editais, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido, onde consta que o imóvel tem a composição referida na matriz para que se remeteu em B), onde não há referência à existência de anexos nem ao licenciamento camarário ou falta dele.

F) A ... apresentou uma proposta aquisitiva do imóvel identificado em B) no valor de € 81.699,99, que foi aceite pelo SF, tendo aquele valor sido depositado em 2013-05-02.

G) A ... pagou ainda € 653,60 de I.Selo, tendo ficado isento de IMT.

H) Em 2013-05-17, foi lavrado o Auto de Adjudicação do imóvel

I) Na Informação de 2013-06-20, o SF entende que o imóvel está incorrectamente descrito quer na matriz quer na publicitação da venda, referindo que tanto do processo matricial como do processo de avaliação consta uma certidão emitida pela C.M. Seixal em 410812006 que atesta que «existe projecto de arquitectura de ampliação para a fracção esquerda [fracção B referente ao lado esquerdo) em mais um piso que não se encontra licenciado»;

J) Em 2013-06-11, o ora Requerente apresentou o pedido de anulação da venda, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido, juntando certidão emitida pela C.M. Seixal em 7/06/2013 que atesta que «para a fracção B referente ao lado esquerdo existe mais um piso que não se encontra licenciado, e anexos que deverão ser demolidos»;

K) Foram os interessados notificados para se pronunciarem sobre o pedido referido em G), vindo somente o credor ... SA pronunciar-se pelo indeferimento nos termos de requerimento entrado em 15/07/2013 cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido.

L) Em 2013-05-28, no âmbito do processo n.° 2952/13. 1TBSXL, a tramitar no Tribunal de F.M.C, do Seixal - 2° Juízo Cível, foi proferida sentença de declaração da insolvência dos executados por reversão identificados em A). (...)

3.2.3. Análise da tempestividade do pedido

O Adquirente, com base nos fundamentos legais previstos no n.º 1-a do art 257.º do CPPT, pode requerer a anulação da venda no prazo de 90 dias, contados da data da venda ou da data em que o requerente comprovadamente teve conhecimento do facto, conforme estatuído no n° 2 conjugado com a cit. disposição legal.

Tendo-se verificado que o preço foi depositado em 2013-05-02, seguido do Auto de Adjudicação lavrado em 2013-05-17;

Afigure-se tempestivo o Pedido de Anulação de Venda apresentado em 2013-06-11.

3.2.4. Análise dos fundamentos invocados

No caso em apreço verifica-se que a FP vendeu determinado imóvel (fracção B do artigo 4234, melhor id. nos autos), cuja construção urbana é composta por 2 pisos com a descrição tal como consta da matriz, e nesta não há qualquer referência à existência de anexos nem ao licenciamento camarário ou falta dele (vendeu-se, pois, um imóvel com 2 pisos, sem anexos).

O Requerente alega que o imóvel tem l piso [piso superior] e anexos que carecem de licenciamento camarário, sem que tal facto constasse da publicitação da venda.

A certidão camarária que o Requerente juntou refere que «existe mais um piso que não se encontra licenciado, e anexos que deverão ser demolidos», ou seja, temos l piso não licenciado, temos ainda anexos (que não foram vendidos) não licenciados e só estes deverão ser demolidos.

Ora, o fundamento invocado (falta de licenciamento de construção urbana, no caso, o piso superior e anexos) não configura qualquer dos fundamentos do nº 1-a do art 257.° do CPPT.

Ou seja, não se enquadra em «ónus real que não tenha sido tomado em consideração e não haja caducado», nem em «erro sobre o objecto transmitido», nem sequer em «erro sobre as qualidades do objecto transmitido] por falta de conformidade com o que foi anunciado».

Assim, a falta de licenciamento de um piso e anexos não constitui uma nulidade determinante da anulação da venda, nos termos do nº 1-a do art..° 257.° do CPPT.

Efectivamente, o disposto no n.º 6 do artigo 905.º do CPC permite a venda de imóvel ou de fracção (autónoma) dele, ainda que tenha construção urbana em curso, no estado em que se encontre, com dispensa da licença de utilização ou de construção, devendo, contudo, a venda realizar-se no âmbito de um processo executivo.

A citada disposição legal estatui ainda que sobre o Adquirente recai o ónus de legalização da respectiva construção urbana não licenciada.

Este normativo constitui uma excepção à regra geral de obrigatoriedade da existência e apresentação da licença de construção ou de utilização na venda de prédios urbanos, cujo regime jurídico vem regulado pelo Decreto-Lei nº 281/99 de 26/07.

IV - CONCLUSÃO

Face ao exposto, com base na factualidade enunciada e nas disposições legais supra, designadamente a norma habilitante de venda executiva de prédio urbano não licenciado, é nosso parecer que o presente pedido de anulação de venda deve ser indeferido.

Aproveita-se para informar/esclarecer o SF que o Tribunal Tributário de 1ª instância é o tribunal normalmente competente, cabendo somente a este aferir de que é eventualmente incompetente face ao Tribunal de Insolvência.

Assim sendo, da notificação da decisão aos interessados deve constar a menção de que aqueles podem reclamar da decisão, querendo, para Tribunal Tributário de 1ª instância nos termos dos art°s 276.º e segs. do CPPT, sendo a petição entregue no SF.

À consideração superior.

Setúbal, em 07-08-2013.” (cfr. informação instrutora a fls. 364 a 374 do PEF apenso);

M) Em 9 de Agosto de 2013, foi proferido parecer pelo Chefe de Divisão da Divisão de Justiça Tributária, com o seguinte teor "Parecer. Confirmo. Parecendo-me que o presente pedido de anulação de venda, deve ser indeferido, tal como vem proposto, nesta informação. À consideração superior " (cfr. fls. 364 do PEF apenso);

N) Por despacho da Directora de Finanças Adjunta da Direcção de Finanças de Setúbal, datado de 12 de Agosto de 2013 e de acordo com a fundamentação constante na alínea L), o pedido de anulação de venda foi indeferido, constando do seu teor o seguinte:

" Concordo.

Com os fundamentos invocados na informação prestada, indefiro o pedido de anulação de venda infra identificado.

Devolva-se ao SF de Seixal 2 para diligências subsequentes"

A Directora de Finanças (em substituição) " (fls. 364 do PEF apenso);

O) De ofício n° 16933, do Serviço de Finanças do Seixal 2, datado de 4 de Setembro de 2013, expedido para a sede da Reclamante por carta registada com aviso de recepção com indicação alfanumérica RO926396711 PT, foi a Reclamante notificada, em 10 de Setembro de 2013, do despacho de indeferimento expresso do pedido de anulação de venda e da informação instrutora referidos nas alíneas L) e N) (cfr. ofício a fls. 37 e 38 dos autos; facto que se confirma da consulta ao site oficial dos CTT mediante inserção do Código Alfanumérico na pesquisa de objectos; facto expressamente reconhecido pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública no artigo 3.° da contestação a fls. 161 dos autos);

P) Em 20 de Setembro de 2013, deu entrada, via fax, junto do Serviço de Finanças do Seixal 2, a presente reclamação (fls-54 do PEF apenso; facto expressamente reconhecendo pelo Ilustre Representante da Fazenda Pública no artigo 3.° da contestação a fls. 161 dos autos e doc 1 a fls. 165 dos autos; cfr. quanto à remessa dos originais -expedição postal registada a fls. 56 dos autos);

Q) Em 27 de Julho de 2006, foi emitido pelo Município de Seixal, certidão com o seguinte teor:

" ... , Assistente Administrativo Principal na Secção de Licenciamento de Obras Particulares, compulsado o processo de obras número 203/B/75, certifica que para o prédio construído na Rua ... ... , n° …… (fracção direita), …… (fracção esquerda), ... , freguesia de ……… deste município, foi emitida a licença de utilização n° 331, em 19 de Julho de 1985.

Obs: Existe projecto de arquitectura de ampliação, para a fracção esquerda em mais um piso que não se encontra licenciado. 2006-08-04" (cfr. fls. 389 e verso do PEF apenso);

R) Em 28 de Maio de 2013, foi proferida sentença de insolvência do Executado revertido ... ... e ... ... ... , pelo Tribunal de Família e Menores e de Comarca do Seixal, no âmbito do processo n° 2952/13.1 TBSXL, tendo sido nomeado Administrador de Insolvência ... (cfr.fls. 425 do PEF apenso);


7 – Apreciando.
7.1 Dos requisitos de admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos
Importa verificar do preenchimento dos requisitos de admissibilidade do presente recurso por oposição de julgados, pois que não obstante o Relator do acórdão recorrido ter proferido despacho - de fls. 378 dos autos - no sentido de se lhe afigurar existir a invocada oposição de julgados, importa reapreciar se a mesma se verifica, já que tal decisão, como vem sendo jurisprudência pacífica e reiterada deste Supremo Tribunal (vide, entre outros, o Acórdão de 7 de Maio de 2003, rec. n.º 1149/02), não só não faz caso julgado, como não impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar (cfr. art. 685.º-C, n.º 5 do Código de Processo Civil - CPC) – cfr. também neste sentido JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5.ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284.º do CPPT).
O presente processo iniciou-se no ano de 2009, pelo que lhe é aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos artigos 2.º, n.º 1, e 4.º, n.º 2, da Lei n.º 13/2002 de 19 de Fevereiro, na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 107-D/2003 de 31 de Dezembro.

Assim, a admissibilidade dos recursos por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27.º, alínea b) do ETAF, 284.º do CPPT e 152.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), depende de existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito e que não ocorra a situação de a decisão impugnada estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.

No que ao primeiro requisito respeita, como tem sido inúmeras vezes explicitado pelo Pleno desta Secção relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição, quais sejam:

- identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;

- que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;

- que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;

- a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (Acórdãos do Pleno desta Secção do STA de 26 de Setembro de 2007, 14 de Julho de 2008 e de 6 de Maio de 2009, recursos números 452/07, 616/07 e 617/08, respectivamente).

A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se «sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica» (v. Acórdãos do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA de 19 de Junho de 1996 e de 18 de Maio de 2005, proferidos nos recursos números 19532 e 276/05, respectivamente).

Por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas subjacentes, pois sem esta identidade substancial não se verifica oposição de julgados.

Vejamos, então, se tais requisitos se verificam.

Há inequívocas semelhanças entre os arestos em confronto, pois que, como alegado, ambos versam, no âmbito do mesmo quadro legislativo de referência, sobre incidentes de anulação de venda executiva deduzidos pelo adquirente do bem com fundamento em desconformidade entre o anunciado e o bem vendido, tendo ambos confirmado as sentenças de 1.ª instância: de não anulação da venda, no caso do acórdão recorrido, de anulação da venda, no caso do acórdão fundamento.

Não obstante, às decisões expressas opostas tomadas num e noutro acórdão não subjazem, contrariamente ao alegado pelo recorrente, situações de facto substancialmente idênticas, pois que o motivo invocado pelo requerente e determinante da anulação da venda no caso do acórdão fundamento foi o de que o imóvel tem 1 piso [piso superior] e anexos que carecem de licenciamento camarário, sem que tal facto constasse da publicitação da venda, enquanto no acórdão recorrido o único motivo apreciado pelo tribunal de recurso foi a divergência na área coberta entre os docs. oficiais e a realidade do prédio resultante do facto de não ter sido considerada a área do segundo piso, entretanto rectificada na matriz pelo Serviço de Finanças e carecendo só de ser objecto de rectificação em sede de registo predial (cfr. art. 18 do CRP).

É certo que o recorrente alegara também no recurso como motivo para a anulação da venda a falta de licenciamento do piso superior do imóvel, mas quanto a este motivo, entendeu o Tribunal Central Administrativo Sul dele não poder conhecer, pois não fora invocado na petição inicial e apreciada pela decisão recorrida, nem resultava do teor do probatório fixado (cfr. o acórdão recorrido, a fls. 319/320 dos autos), sendo, aliás, esse um dos motivos pelos quais o Supremo Tribunal Administrativo se julgara incompetente para conhecer do recurso da sentença que o recorrente para ele interpusera (cfr. Despacho de fls. 261 a 273 dos autos).

Os arestos em confronto não se pronunciaram, pois, de forma oposta sobre situações de facto substancialmente idênticas, como aliás salienta o Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste STA no seu parecer junto aos autos, razão pela qual não deve o recurso prosseguir para conhecimento do respectivo mérito, sendo de o julgar findo.


- Decisão -

8 Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em julgar findo o recurso.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 20 de Abril de 2016. - Isabel Cristina Mota Marques da Silva (relatora) José da Ascensão Nunes Lopes - Francisco António Pedrosa de Areal Rothes - Pedro Manuel Dias Delgado Ana Paula da Fonseca Lobo - Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia José Maria da Fonseca Carvalho Joaquim Casimiro Gonçalves.