Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0111/21.9BECTB
Data do Acordão:01/13/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PROVIDÊNCIA CAUTELAR
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Justifica-se a admissão do recurso de revista para uma melhor aplicação de direito se o juízo feito in casu se apresenta como não isento de dúvidas e, nessa medida, carecido de reanálise.
Nº Convencional:JSTA000P28801
Nº do Documento:SA1202201130111/21
Data de Entrada:12/14/2021
Recorrente:A............
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A……………, invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 20.10.2021 do Tribunal Central Administrativo Sul [doravante TCA/S] [cfr. fls. 321/344 - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que concedeu provimento ao recurso interposto pelo MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA [MAI] e revogou a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco [doravante TAF/CTB] [que havia julgado procedente a pretensão cautelar deduzida pelo ora recorrente contra o mesmo e outros e que suspendeu os «atos de (re)colocação do Requerente no Comando Metropolitano de Lisboa»], julgando totalmente improcedente a pretensão cautelar instaurada.

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 352/378], ao que se infere das alegações produzidas, numa «melhor aplicação do direito» [fundada no erro de julgamento quanto à aplicação dos conceitos de «expetativa jurídica», de «expetativa de facto» e de «ato administrativo»/«ato administrativo impugnável», dada a violação do disposto, nomeadamente, nos arts. 148.º do Código de Procedimento Administrativo (CPA/2015), 51.º, n.º 1, e 120.º do CPTA], pugnando pelo deferimento da pretensão cautelar requerida já que preenchidos os requisitos previstos nos n.ºs 1 e 2 do art. 120.º do CPTA.

3. O ente requerido devidamente notificado produziu contra-alegações [cfr. fls. 408/417], nelas pugnando, desde logo, pela não admissão da revista.
Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TAF/CTB concedeu parcialmente a tutela cautelar peticionada pelo aqui recorrente, tendo considerado que in casu estavam preenchidos os requisitos previstos e exigidos pelos n.ºs 1 e 2 do art. 120.º do CPTA quanto à pretensão de suspensão de eficácia do despacho do Chefe de Divisão dos Recursos Humanos da Direção Nacional da PSP, remetido por correio eletrónico e concretizado com comunicação pessoal na sequência do despacho do Superintendente Comandante do Comando Distrital de Castelo Branco da PSP de 25.03.2021, no qual é determinada a apresentação do Requerente no Comando Metropolitano de Lisboa, no dia 05.04.2021, por ter terminado a colocação a título excecional [cfr. fls. 249/281].

7. O TCA/S revogou tal juízo e negou a tutela cautelar peticionada, considerando in casu que, por um lado, que o requerente cautelar não é detentor de uma qualquer expetativa jurídica dado a «permanência do Recorrido no Comando Distrital de Castelo Branco … não foi autorizada, nem tacitamente, nem de forma não escrita pelo órgão competente, mas apenas tolerada até ao dia em que este entendeu não continuar a tolerar, determinando a sua apresentação no Comando Metropolitano de Lisboa», pelo que estamos ante uma mera expetativa de facto desprovida de qualquer tutela jurídica, e que, por outro lado, «não inexiste qualquer ato jurídico referente à apresentação do Recorrido no Comando de origem, suscetível de ser suspenso», termos em que a pretensão cautelar carece ou se mostra desprovida de objeto.

8. O requerente cautelar, aqui ora recorrente, funda a necessidade de admissão da presente revista para uma melhor aplicação do direito, acometendo-o de incurso em erro de julgamento, sustentando estarem verificados os requisitos para a decretação da pretensão cautelar.

9. O carácter excecional deste recurso tem sido reiteradamente sublinhado pela jurisprudência desta Formação, com especial destaque para os processos cautelares em que se tem afirmado a exigência de um rigor acrescido.

10. Com efeito, a orientação jurisprudencial desta Formação de Admissão Preliminar tem sido a de que não se justifica admitir revista de decisões de segunda instância, salvo quando se discutam aspetos do regime jurídico específicos ou que exclusivamente digam respeito ou se confinem à tutela cautelar, ou quando a decisão contenda com situações de relevância comunitária particularmente intensa ou de inobservância de princípios processuais fundamentais.

11. Entrando na análise do preenchimento dos pressupostos da revista sub specie temos que, presente a motivação expendida pelo recorrente e o quadro normativo posto em crise, e sem prejuízo da muito diversa valia ou bondade da motivação aduzida nesta sede, o juízo impugnado do TCA/S apresenta-se primo conspectu como dubitativo e não dotado de óbvia plausibilidade, a ponto de firmemente afastar a necessidade da intervenção do órgão de cúpula da jurisdição.

12. Com efeito, a motivação explicitada e que serviu de fundamentação ao juízo impugnado mostra-se carecida de um melhor e mais esclarecido aprofundamento e reanálise por este Supremo, dissipando as dúvidas e assegurando a boa administração da justiça em sentido amplo e objetivo, cientes de que o objeto de dissídio acaba por contender com o próprio regime jurídico da tutela cautelar, envolvendo, também e nessa sede, matéria relevante que, como vimos, foi tratada pelas instâncias de forma contraditória já que alvo de juízo diametralmente divergente.

13. Flui do exposto que se justifica o afastamento, in casu, da regra da excecionalidade das revistas para garantia de uma mais exata aplicação do direito, impondo-se a necessidade de admissão do recurso.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em admitir a revista.
Sem custas.
D.N..


Lisboa, 13 de janeiro de 2022. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.