Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0270/14.7BELSB
Data do Acordão:11/27/2018
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
NOTIFICAÇÃO POR CARTA REGISTADA
PRESUNÇÃO
Sumário:Não é de admitir a revista do acórdão confirmativo do despacho da 1.ª instância que indeferira o pedido de que se repetisse a notificação da sentença se a razão básica invocada no aresto consistiu no facto de uma reclamação apresentada nos CTT não bastar para ilidir a presunção de que a notificação por carta se processara regularmente.
Nº Convencional:JSTA000P23871
Nº do Documento:SA1201811270270/14
Data de Entrada:11/12/2018
Recorrente:S.N.B.P. - SINDICATO NACIONAL DE BOMBEIROS PROFISSIONAIS
Recorrido 1:ESTADO PORTUGUÊS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
O SNBP - Sindicato Nacional de Bombeiros Profissionais, representando trezentos e trinta e dois associados, interpôs a presente revista do acórdão do TCA Sul confirmativo de um despacho do TAC de Lisboa que - após declarar a incompetência do tribunal, «ratione materiae», para conhecer a acção que o aqui recorrente movera ao Estado - indeferiu o pedido de que se repetisse a notificação ao autor daquela sentença, absolutória da instância.

O recorrente pugna pela admissão da revista por ela tratar de questão relevante, repetível e mal decidida pelo tribunal «a quo».

O Estado, representado pelo MºPº, considera a revista inadmissível.

Cumpre decidir.

Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA's não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150°, n.º 1, do CPTA).

Na acção movida pelo sindicato autor contra o Estado, o TAC proferiu sentença - absolutória do réu da instância, por incompetência «ratione materiae» - que foi notificada à mandatária do autor, subscritora da petição, por carta registada dirigida para o seu escritório e que veio devolvida.

Mais tarde, e alegando que nunca fora avisado da existência da carta, o autor requereu que a sentença fosse notificada àquela mandatária e à própria parte - pretensão que o TAC indeferiu. O autor apelou desse indeferimento, reiterando que a notificação pelo correio não se perfizera porque o agente dos CTT não deixou qualquer aviso para levantamento da carta.

Todavia, o aresto recorrido negou provimento à apelação porque - estando o âmbito do recurso limitado à notificação da dita mandatária - o autor não indicara prova susceptível de ilidir a presunção (inserta no art. 249°, n.º 1, do CPC e analogicamente aplicável) de que a notificação através da carta registada efectivamente ocorrera.

Nesta revista, o autor diz que agiu por forma a ilidir a presunção. Aduz ainda que a secretaria, ao receber a carta devolvida, tinha a obrigação de contactar a mandatária, designadamente por telefone, para aferir do que se passara. E acrescenta que o indeferimento sempre seria ilegal porque a sentença não foi notificada à outra mandatária constituída nem à própria parte.

A questão relativa à falta destas notificações não foi alegada no tribunal «a quo» nem foi alvo de análise pelo acórdão recorrido. Portanto, esse assunto não pode ser tratado no recurso de revista - que é de mera revisão.

O aresto «sub specie» mostra-se acertado ao recusar que a secretaria, por não ter contactado a advogada após a devolução da carta, tivesse cometido uma nulidade. Esta só existiria se aí houvesse a omissão de um acto ou de uma formalidade «que a lei prescreva» (art. 195º, n.º 1, do CPC). Mas a lei processual não prevê nem impõe tais diligências às secretarias nesse tipo de casos; e o silêncio da lei nesse domínio, aliás facilmente explicável, não pode ser substituído pelo recurso a distantes princípios constitucionais.

No seu fundamental, o aresto recorrido considerou que o autor, apesar de onerado com o «onus probandi» respectivo, não fizera a prova bastante para ilidir a presunção de que a notificação por carta se realizara. Essa presunção - cuja existência não vem questionada e que é, aliás, inquestionável - não abrange apenas o resultado (e a data) da actividade notificadora, mas também a regularidade do seu processo. De modo que ela pode ser ilidida alegando-se e demonstrando-se que o «iter» da notificação pelo correio enfermou de alguma anomalia.

Ora, o recorrente alegou um vício nesse processo - o facto do carteiro não ter deixado um aviso para levantamento da carta. Mas o TCA ripostou-lhe que o meio usado para prova do vício – a junção da cópia de uma reclamação apresentada nos CTT - era insuficiente para o revelar.

Esta posição do TCA corresponde a um genuíno julgamento de facto - o qual não é sindicável num plano técnico-jurídico, visto que a reclamação apresentada nos correios não prova, plenamente e «ex vi legis», a ocorrência da anomalia invocada. E este pormenor desaconselha de imediato uma admissão do recurso, pois o tribunal de revista só conhece de matéria de direito (art. 150º do CPTA).

O recorrente também diz que o assunto envolve problemas de inconstitucionalidade. Mas tais matérias não são objecto próprio dos recursos de revista; até porque os interessados podem colocá-Ias directamente junto do Tribunal Constitucional.

Nestes termos, acordam em não admitir a revista.

Custas pelo recorrente (art. 4°, ns.º 1, al. f), e 5, do RCP).

Porto, 27 de Novembro de 2018. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.