Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0367/15.6BECBR
Data do Acordão:11/06/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:PAULO ANTUNES
Descritores:CUSTAS
CONTENCIOSO DA SEGURANÇA SOCIAL
OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO FISCAL
Sumário:O processo de oposição, originado em execução fiscal que foi utilizado por perda de direito a subsídio vitalício, conforme consta da certidão executiva, por parte da Caixa Geral de Aposentações, insere-se no “contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social”, a que se refere a al. c) do n.º 1 do art. 12.º do R.C.P..
Nº Convencional:JSTA000P25117
Nº do Documento:SA2201911060367/15
Data de Entrada:06/17/2019
Recorrente:CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES
Recorrido 1:HERANÇA ABERTA POR ÓBITO DE A............
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1. CAIXA GERAL DE APOSENTAÇÕES (CGA), inconformada com o despacho proferido no T.A.F. de Coimbra, que indeferiu requerimento “que seja dada sem efeito a obrigatoriedade de liquidação, do remanescente da taxa de justiça que não é devida”, vem recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo (STA), tendo produzido alegações com as duas conclusões que a seguir se reproduzem:
“A - Conforme melhor se demonstra em alegações supra, o facto de que a CGA tem por missão gerir o regime de segurança social público em matéria de pensões de aposentação, reforma e sobrevivência e outras de natureza especial determina que a autoliquidação da taxa de justiça inicial decorra da alínea c) do n.º 1 do artigo 12.º do Regulamento das Custas Processuais, o que fez.

B – Pelo que deve ser determinada a revogação do despacho que inferiu a reclamação.”

O despacho recorrido é do teor que se reproduz:

“Requerimento de 15/1/2018:

Nos termos dos artigos 529.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (CPC) e 6.º n.º 1 do Regulamento das Custas Processuais (RCP), a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o Regulamento das Custas Processuais, aplicando-se, na falta de disposição especial os valores constantes da Tabela I-A, que faz parte integrante do Regulamento.

Quanto aos casos especiais, estes encontram-se previstos no art. 12.º do RCP.

No caso sob apreciação, cumpre determinar se deve ser aplicado o artigo 12°, n.º 1, al. c), segundo o qual deve atender-se ao valor indicado na I.1 da tabela I-B nos processos de contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social.

Como se refere no ac. do TCAS de 26/1/2012, proc. n.º 06230/10, também mobilizado pela Exm.ª Procuradora no parecer emitido em 29/1/2018, «(...) Por contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social” deve entender-se os litígios que corram nos tribunais que tenham por objeto relações jurídicas reguladas por legislação sobre segurança social, isto é, os processos em que intervenham instituições de segurança social ou de previdência social (critério do sujeito) e que versem sobre diferendos a que se aplique ou sejam regulados por legislação sobre a segurança social (critério material). (...)» (neste sentido, veja-se, igualmente, o ac. do TCAN de 20/2/2015, proc. n.º 00318/14).

O litígio em causa nos autos não se inscreve no referido artigo do RCP na medida em que, apesar de envolver uma instituição de segurança social ou de previdência social, não exigiu a aplicação de legislação sobre segurança social. De facto, para apreciação das questões em causa (a alegada prescrição da dívida exequenda e a invocada preterição de audiência prévia), foram mobilizadas normas do Código Civil e normas da Lei Geral Tributária.

Pelo que não é de aplicar o artigo 12.º, n.º 1, do RCP, mas sim o artigo 15°, n.º 2, do mesmo diploma legal, razão pela qual se indefere o requerimento apresentado CGA.

Consequentemente, notifique a CGA para que proceda ao pagamento, no prazo de 10 (dez) dias, da taxa de justiça devida, remetendo-lhe cópia do presente despacho e do douto parecer que a antecede.”

Nos autos, de oposição a execução fiscal, foi proferida sentença cuja fundamentação de facto consta a fls. 135 a 137, a qual se dá aqui por reproduzida e que foi concretizada na seguinte decisão:

Face ao exposto, julgo a presente oposição:

a) Parcialmente provada, na parte relativa aos juros de mora contabilizados entre 01.09.2000 e 08.02.2010, em virtude da respectiva prescrição, devendo ser extinta a execução fiscal nesta parte;

b) Parcialmente improcedente, na parte restante, devendo prosseguir a execução fiscal.

Fixo o valor da causa em € 29.706,17.

Condeno em custas a Opoente e a CGA na proporção de 55% e 45%.

Registe e notifique.

Coimbra, 30.12.2017”.

Encontra-se junto aos autos DUC e o correspondente “Comprovativo de Registo”, constando ainda deste último as seguintes menções: “Identificação do pré-pagamento”, “montante de 51,00 Eur”, “Data: 11-8-2015”, “descritivo: “Taxa de Justiça” e “depositante”: “Caixa Geral de Aposentações” (fls. 83).

Admitido o recurso, não foram produzidas contra-alegações.

O magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer em que conclui “no sentido da improcedência do recurso”.

2. Objeto do recurso:

O objeto do recurso reconduz-se às seguintes questões:

- Taxa de justiça devida no processo, ou seja, se a mesma se enquadra na al. c) do n.º 1 do art. 12.º do Regulamento das Custas (RCP), ou no seu n.º 2, conforme foi decidido no despacho recorrido;

- Se, tendo sido autoliquidado, pela recorrente, o montante da taxa de justiça inicial, nos termos previstos na alínea c) do n.º 1 do artigo 12.º do Regulamento das Custas (RCP), é de revogar o decidido por nada mais haver a esse título a pagar.

A controvérsia resulta do entendimento tido quanto ao “contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social” constante na al. c) do n.1 do dito art. 12.º, razão pela qual nos iremos começar por pronunciar sobre o entendimento a dar a tal inciso.

3. Fundamentação.

Dúvidas não têm existem quanto a ser de englobar no dito contencioso os processos referentes a pensões de aposentação, reforma e sobrevivência e outras de natureza análoga - assim, em vários acórdãos proferidos quer pelo T.C.A. do Sul (de que é exemplo o referido, de 26.01.2012, proc.06230/10), quer pelo T.C.A. do Norte (o de 20.02.2015, proc. n.º 00318/14).

Também não é posto em causa que o subsídio vitalício a que se refere a certidão de dívida que dá origem à execução se englobe naquele tipo de prestações.

A divergência radica, segundo a fundamentação utilizada de acordo com a constante daqueles acórdãos, em o dito “contencioso” se encontrar dependente da verificação dos seguintes dois elementos: um, de ordem subjetiva, respeitante à intervenção processual das ditas instituições; outro, de ordem material, relativo aos ditos processos versarem sobre legislação de segurança social.

De tal dá nota Salvador da Costa, Regulamento das Custas Processuais Anotado e Comentado, 2018, 7.ª. ed. Almedina, a pág. 171, nota 48, por referência, aliás, ao primeiro referido acórdão do TCA do Sul.

De acordo com o artigo 9.º, n.º 1, do Código Civil, é de recorrer não só à “letra da lei, mas reconstituir-se o pensamento legislativo, tendo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada”.

Ora, a norma contida na al. c) do n.º 1 do art. 12.º do R.C.P. tem uma formulação não restritiva, contrariamente ao que ocorria no art. 8.º, alínea dd) do revogado Código das Custas Judiciais. Neste dispositivo previa-se a fixação de valor no caso dos processos do contencioso das instituições de segurança social e abono de família por referência à alçada do tribunal do trabalho, o que levava a admitir ser aplicável apenas no foro laboral.

Aliás, segundo Salvador da Costa: “Os processos das instituições de segurança social e de previdência social relativos a litígios entre elas e os seus beneficiários, quando respeitem às referidas matérias, inscrevem-se na competência dos tribunais do trabalho ou dos tribunais da ordem administrativa, conforme a respetiva especificidade”- assim, na obra citada, a pág. 171, referindo ainda na nota 46 que tal se deveu ao entendimento tido no parecer do CC da PGR n.º 63/94 e na jurisprudência, nomeadamente, no acórdão do Tribunal de Conflitos n.º 296/96.

Contudo, assim sendo, não é de excluir o processo de execução fiscal, fundado em certidão executiva referente à perda do direito a subsídio vitalício, enquadrando-se no art. 148.º do C.P.P.T., bem como na jurisdição administrativa e fiscal (artigos 1.º e 4.º do E.T.A.F.).

Acresce que o entendimento restritivo que resulta do despacho recorrido não colhe aplicação nas condições específicas do tempo em que a lei é aplicada.

Com efeito, o legislador manifesta fortes preocupações na sustentabilidade do sistema público de pensões, o que de algum modo seria afetado com esse entendimento restritivo, pois do mesmo resulta que a CGA tem a pagar mais taxa de justiça.

Assim, consideramos abrangido no “contencioso das instituições de segurança social ou de previdência social”, a que se refere a al. c) do n.º 1 do art. 12.º do R.C.P., o processo de oposição originado em execução fiscal que foi utilizado por perda de direito a subsídio vitalício, conforme consta da certidão executiva.

Consideramos ainda que a norma contida no artigo 12.º, n.º 1 c) do R.C.P. não se limita a fixar o valor da causa, conforme a referida anterior norma do C.C.J., por ao remeter no seu corpo para o “valor indicado na I.1 da tabela I-B”, prever a incidência de “0,5” quanto a “taxa de justiça (UC)” – em sentido semelhante, veja-se Salvador da Costa na obra já citada a pág. 170, ponto 12.1; e ainda sobre a tabela aplicável pág. 287.

O despacho recorrido não pode subsistir e, uma vez que, conforme foi referido no ponto 1 do presente acórdão, consta comprovativo de se encontrar já depositado o correspondente valor (51 €), consideramos ser não só de revogar o despacho recorrido como dispensar a recorrente do pagamento do remanescente da taxa de justiça, por não ser devida.

4. Decisão:

Nos termos expostos, os Juízes Conselheiros do STA acordam em conceder provimento ao recurso, revogar o despacho recorrido e dispensar a recorrente do pagamento do remanescente da taxa de justiça, por não ser devida.

Custas na proporção já fixada na sentença recorrida, levando-se em conta, quanto à taxa de justiça, que a recorrente se encontra abrangida pelo previsto no art. 12.º n.º 1 c) do R.C.P. e que a recorrida não contra-alegou.

Lisboa, 6 de Novembro de 2019. - Paulo Antunes (relator) - Ascensão Lopes - José Gomes Correia.