Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0711/14
Data do Acordão:08/20/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FONSECA CARVALHO
Descritores:GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS
PRIVILÉGIO IMOBILIÁRIO ESPECIAL
IMPOSTO MUNICIPAL SOBRE IMÓVEIS
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
CRÉDITO EXEQUENDO
Sumário:*
Nº Convencional:JSTA00068866
Nº do Documento:SA2201408200711
Data de Entrada:06/17/2014
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:BANCO A... SA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF BRAGA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:CPC13 ART789 N1.
CCIV66 ART744 N1 ART733 ART822.
CPPTRIB99 ART241.
Referência a Doutrina:LOPES CARDOSO - MANUAL DA ACÇÃO EXECUTIVA PAG516.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I. Relatório

1. Banco A……………, S.A., identificado nos autos, reclamou no Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, do acto do órgão de execução fiscal proferido no PEF nº. 3590200801059220 e apensos, que proferiu decisão de verificação e graduação de créditos, que procedeu à graduação de créditos de IMI em 1º lugar pelo motivo desses créditos gozarem de privilégio imobiliário especial, por força do disposto nos artigos 122º, nº. 1 do Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (CIMI) e nº. 1 do artigo 744º do Código Civil (CC) relativamente ao crédito do aqui reclamante, sem que os referidos créditos de IMI tivessem sido reclamados no processo executivo supra referido.

Naquele Tribunal foi decidido julgar totalmente procedente, por provada, a reclamação, anulando-se a decisão que graduou em segundo lugar os créditos reclamados pelo autor e procedendo-se à graduação da seguinte forma:
- em primeiro lugar, o crédito reclamado pelo Banco A……………., S.A. (funcionando a garantia, para os juros, com o limite de três anos), sem prejuízo das custas da execução, nos termos do artigo 262º do CPPT;
- em segundo lugar, os créditos provenientes da quantia exequenda e respectivos juros de mora, com o limite legal.
2. Inconformada, a Fazenda Pública veio interpor recurso para este STA, apresentando as seguintes conclusões das suas alegações:

A - O privilégio creditório, consiste na faculdade que a lei substantiva concede, em relação à causa do crédito, de ser pago com preferência em relação a outros credores.
B - O art. 240º do CPPT deve ser interpretado no sentido de conferir dimensão lata à expressão credores que gozem de garantia real, por forma a abranger não apenas os credores que gozem de garantia real “stricto sensu”, mas também aqueles a quem a lei atribui causas ilegítimas de preferência, como os privilégios creditórios imobiliários especiais.
C - Assim sendo, e uma vez que, no caso vertente a penhora do imóvel foi efectuada no ano de 2012, o crédito por dividas de IMI inscritos para cobrança no ano corrente da penhora - 2012- e nos dois anos anteriores (2010 e 2011), gozam de privilégio imobiliário especial sobre o imóvel penhorado, nos termos previstos nas disposições combinadas do art. 122º do CIMI e arts. 733º e 744º, n.º1 do CC.
D - A douta sentença recorrida ao não graduar o crédito de IMI dos anos de 2010 e 2011 em primeiro lugar, violou o disposto no art. 122º do CIMI, os arts. 733º e 744º do CC e o art. 8º do DL n.º 73/99 de 16 de Março.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, substituindo-a por outra que verifique, admita e gradua todos os créditos garantidos por privilégio imobiliário especial, de acordo com o disposto nos arts. 122º do CIMI e 744º do CC, com o que se fará Justiça.

3. O Banco A…………… veio contra-alegar, nos termos que se seguem:

O presente recurso foi interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, que julgou procedente a reclamação da decisão de verificação e graduação de créditos, que procedeu à graduação de créditos de IMI com prioridade sobre o crédito do A……………., sem que os referidos créditos de IMI tivessem sido reclamados ou sequer façam parte da quantia exequenda do processo de execução fiscal.
O Banco A……………….., SA., ora Recorrido, vem pugnar pela manutenção da douta decisão, a qual, quer na sua fundamentação, quer na sua decisão, é escorreita e aplica criteriosamente o direito.
Aliás, é a douta sentença, além de justíssima, de uma meridiana clareza, sendo absolutamente inconcebível que se diga que não se fez Justiça, antes pelo contrário, foi feita a mais sã e diáfana Justiça.
Na verdade, não assiste razão à Recorrente.
O Recorrido está convicto que Vossas Excelências, reapreciando a matéria de facto e, subsumindo-a nas normas legais aplicáveis, tudo no mais alto e ponderado critério, não deixarão de confirmar a decisão recorrida.
A Recorrente interpôs recurso da sentença proferida nos presentes autos (que julgou procedente, por provada, a reclamação efetuada pelo A…………….. à decisão de verificação e graduação de créditos que graduou os créditos por dividas de IMI não reclamados no processo executivo, à frente do crédito hipotecário do Banco, pelo produto da venda do bem imóvel penhorado na ação executiva e relativamente ao qual o Banco possui hipoteca), visando a revogação da mesma.
Vistas as conclusões da Recorrente, que delimitam o âmbito do recurso, verifica-se que a questão que se coloca é a de saber se o órgão de execução fiscal pode proferir decisão de verificação e graduação de créditos a graduar créditos de IMI sobre o imóvel penhorado e vendido em sede de execução fiscal sem que estes tenham sido reclamados ou sequer façam parte da quantia exequenda.
Vejamos,
Em Julho de 2012, na presente execução fiscal foi penhorado, o prédio urbano, destinado a armazém de rés-do-chão, sito no Lugar …………….. ou …………., da freguesia de …………….., do concelho de Vila Nova de Famalicão, descrito na CRP de Vila Nova de Famalicão sob o n° 719 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2439 (Ap. 1145 de 2012/07/10).
Em Janeiro de 2013, o A……………. foi citado, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 239.° do C.P.P.T., para querendo, nos termos do nº 2 do artigo 865.° e n°4 do artigo 864°, ambos do C.P.C., reclamar no prazo de quinze dias o pagamento do seu crédito com garantia real sobre o bem imóvel penhorado na acção executiva supra referida.
Tempestivamente o Banco Recorrido apresentou a sua reclamação de créditos devidamente documentada, alegando, em síntese, os seguintes factos com interesse para a boa decisão da causa:
1. O Banco é credor do Executado B………………. do montante global de Eur.378.357,18 (trezentos e setenta e oito mil trezentos e cinquenta e sete euros e dezoito cêntimos) crédito garantido por hipoteca, do bem móvel penhorado no processo, prédio urbano, destinado a armazém de rés-do-chão, sito no Lugar …………… ou …………., da freguesia de …………….., do concelho de Vila Nova de Famalicão, descrito na CRP de Vila Nova de Famalicão sob o n°719 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 2439.
2. O Banco A……………….., S.A., no exercício da sua actividade creditícia, concedeu ao falecido B………………. e a C……………….. dois financiamentos, (i) Contrato n.° 1003032289 - por escritura notarial de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca, lavrada no dia 25 de Outubro de 1999, no Cartório Notarial do notário D……………….., na cidade de Guimarães, de fls.110 a fls.112, do livro de notas para escrituras diversas 112-E, o Banco emprestou a quantia de Esc.43.500.000$00 (quarenta e três milhões quinhentos mil escudos), actualmente Eur.216.977,09 (duzentos e dezasseis mil novecentos e noventa e sete euros e nove cêntimos), que aqueles se confessaram devedores; (ii) Contrato n.° 1003003406 - por escritura notarial de Compra e Venda e Mútuo com Hipoteca, lavrada em 28 de Fevereiro de 1996, no 1° Cartório Notarial de Guimarães, o Banco Reclamante emprestou a quantia de Esc.50.000.000$00 (cinquenta milhões de escudos), actualmente Eur.264.362,89 (duzentos e sessenta e quatro mil trezentos e sessenta e dois euros e oitenta e nove cêntimos) que aqueles se confessaram devedores.
3. Em garantia do bom pagamento da quantia mutuada, juros e todas as demais despesas inerentes, bem como de todas e quaisquer outras responsabilidades assumidas ou a assumir por qualquer outra forma, os mutuários constituíram hipoteca voluntária a favor do Banco Reclamante, sobre o bem imóvel anteriormente descrito.
4. A hipoteca encontra-se registada a favor do banco Reclamante pela inscrição C, correspondente à Ap.60 de 1995/01/03, até ao montante máximo de capital e acessórios de Esc.80.687.200$00, equivalente a Eur.402.466,06 (quatrocentos e dois mil e quatrocentos e sessenta e seis euros e seis cêntimos).
5. No que concerne aos supra aludidos empréstimos, encontra-se em dívida a quantia de Eur.250,759,99, referente ao capital, a que acresce o montante de Eur.127.597,19, relativo aos juros remuneratórios, moratórios e ao imposto de selo, perfazendo, assim, a quantia global em dívida de Eur.378.357,18 (trezentos e setenta e oito mil trezentos e cinquenta e sete euros e dezoito cêntimos).
Posto isto,
O crédito hipotecário reclamado pelo Banco, no montante de Eur.378.357,18 (trezentos e setenta e oito mil trezentos e cinquenta e sete euros e dezoito cêntimos), não foi impugnado, pelo que foi julgado verificado, nos termos do disposto no artigo 868.° n° 4 do Código de Processo Civil.
Foi designado o dia 4 de Abril de 2013 para a abertura de propostas.
O imóvel foi adjudicado ao Banco Expoente pelo valor de Eur.138.061,00 (cento e trinta e oito mil e sessenta e um euros).
O crédito exequendo, da Fazenda Nacional respeita a IVA, IRS e coimas de 2004, 2008, 2009 e 2010, estando garantido por penhora de 10/07/2012.
O crédito da Fazenda Nacional, no presente processo executivo, não decorre de dívidas de IMI.
Uma vez que, as dívidas decorrentes de IMI, apesar de beneficiarem de privilégio creditório especial, não fazem parte do crédito exequendo garantido pela penhora objeto da presente execução fiscal não podem ser objeto de graduação.
Não era possível ao Banco, aquando da apresentação da proposta de adjudicação efectuada, antever que existiam dívidas decorrentes de IMI porquanto as mesmas não foram reclamadas no presente processo de execução nem sequer faziam parte da quantia exequendaAliás, contacto o Serviço de Finanças, antes da apresentação de proposta, foi transmitido que não existiam dívidas de IMI.
Ou seja, sacrificar a este ponto os princípios da segurança jurídica e da igualdade seria introduzir um factor de iniquidade que não pode ter sido querido por um legislador que se tem de presumir sensato.
Só os créditos que tenham sido reclamados no processo de execução fiscal podem ser objecto de verificação e graduação!
Na verdade, não se contesta o facto de os créditos com privilégio imobiliário especial se poderem sobrepor aos que são garantidos por hipoteca, desde que os mesmos sejam objecto de reclamação de créditos ou façam parte da quantia exequenda que serviu de base ao registo da inscrição penhoraticia.
Pelo que, bem andou o Tribunal da 1ª instância ao afirmar que, de acordo com o disposto no n°2 do artigo 240º do CPPT, o crédito exequendo não necessita de ser reclamado, contudo aí não constam dívidas de IMI.
A Fazenda Pública, aqui recorrente, não procedeu à reclamação de créditos de IMI, logo se não foram reclamados não podem ser considerados, verificados e, consequentemente, graduados.
Não basta ao OEF invocar a existência de créditos de IMI, como o faz na informação prestada, nos termos do artigo 208º do CPPT, desvalorizando por completo a existência de reclamação dos mesmos. Não seria assim, se os mesmos fizessem parte das quantias exequendas.
Assim,
Está vedada a possibilidade ao OEF proferir decisão de verificação e graduação de créditos que gradue créditos de IMI sobre o imóvel penhorado sem que estes tenham sido reclamados no processo de execução fiscal ou façam parte da quantia exequenda. Esmorecem, portanto, todas as conclusões da alegação da Recorrente, que terão, necessariamente, que conduzir ao não provimento da Apelação e à manutenção da douta sentença recorrida.
Bem andou o Tribunal “a quo”, pois que, decidindo como decidiu, interpretou correctamente os factos e aplicou o Direito de forma adequada, não violando quaisquer normas jurídicas, designadamente, as invocadas pela Recorrente.
Nestes termos, e nos que Vossas Excelências mui doutamente suprirão, não deixarão de negar provimento ao recurso e, em consequência, confirmar, integralmente a douta decisão recorrida, fazendo, como sempre, inteira e sã JUSTIÇA.

4. Cumpre apreciar e decidir:

II. Fundamentos

De facto

A) No Serviço de Finanças de V.N.Famalicão 2, foi instaurada a execução fiscal n° 3590200801059220 e apensos, contra B…………….., NIF ……………;
B) O crédito exequendo na execução mencionada em A. respeita a IVA, IRS e coimas fiscais dos anos de 2004, 2008, 2009 e 2010, no valor de € 30.641,54 e acréscimos legais, estando garantido por penhora de 10/07/2012;
C) O imóvel penhorado a constituir a penhora mencionada na al. anterior é o prédio urbano sito no lugar ……………., freguesia de ………………, concelho de V.N.Famalicão, inscrito na matriz predial sob o artigo 2439.° e descrito na CRPredial sob o n.° 719;
D) O aqui Reclamante procedeu à reclamação de um crédito hipotecário no montante de € 378.357,18, acrescido dos juros de mora e imposto de selo, na execução identificada em A.;
E) O crédito hipotecário reclamado pelo Banco, no montante de € 378.357,18, não foi impugnado;
F) Não foram reclamadas dívidas de IMI em relação ao imóvel penhorado;
G) No dia 6/6/2013 o Chefe de Finanças de V.N.Famalicão-2 proferiu decisão sobre a verificação e graduação de créditos reclamados nos autos;
H) Na decisão referida na al. imediatamente anterior, foram graduados os créditos, nos seguintes termos:
1.º - Créditos por dívidas de IMI;
2.° - Crédito hipotecário do A…………….

*

A única questão a conhecer é a de saber se os créditos de IMI por não serem exequendos deveriam ou não ter sido reclamados
O Processo de verificação de créditos é formalmente um processo enxertado no processo de execução.
A reclamação neste processo corresponde à petição inicial e nessa medida o reclamante que goze de garantia real sobre o bem penhorado pede que o seu crédito seja reconhecido e graduado se para tanto for necessário, O reclamante tem por isso de identificar o seu crédito.
No caso dos autos sobre a Fazenda pública cabia o especial dever de o identificar tendo em conta a origem, o ano a que respeitava e a especial relação com o imóvel penhorado. No caso dos autos nem houve reclamação nem a notificação desse crédito aos restantes credores reclamantes.

Será que o facto de a Fazenda Pública ser a entidade exequente a exime de proceder á reclamação daquele crédito?

Entendemos que não.
No fundo como diz o Prof. Alberto dos Reis citando Garbagnati in II concorso di creditori nella espropriazione singolare” no concurso o que está em causa é a participação no mesmo processo executivo duma pluralidade de credores que se propõem obter através do processo a realização forçada dos seus direitos de crédito insatisfeitos na consideração do princípio de que o património do devedor é garantia comum de todos os credores.
A lei apenas admite ao concurso os credores que gozem de garantia real sobre o bem penhorado
Mas como sabe o processo de concurso contempla dois momentos: o da verificação dos créditos reclamados e o da graduação dos mesmos.
Ora o primeiro momento é essencial pois da verificação do crédito e do seu reconhecimento decorre o direito ao quociente que é um direito de natureza processual. A sentença de verificação transmuta o processo executivo já que dele faz beneficiar todos os credores cujos créditos sejam reconhecidos.
Daí que como bem acentua o ilustre professor a reclamação de créditos se afigure como uma verdadeira acção de dívida proposta pelo reclamante contra o executado e contra os outros credores.
Não tendo ocorrido esta fase em relação ao crédito de IMI por não ter sido reclamado o mesmo não pode ser graduado pois esta graduação pressupõe o anterior momento
E esta fase era importante para aferir do limite temporal da preferência decorrente do privilégio imobiliário e eventualmente da sua existência que podia sempre ser objecto de impugnação nos termos do preceituado no artigo 789 do CPC.
Como se sabe o processo de verificação e graduação de créditos destina-se a verificar a legitimidade da reclamação, a natureza do crédito reclamado e ainda qual a posição que lhe cabe no pagamento aquando da distribuição do montante da venda do bem penhorado, garante do pagamento desses créditos.
Importa por isso consideramos a natureza dos privilégios creditórios em presença,

O privilégio creditório é nos termos do disposto no artigo 733 do Código Civil a faculdade que a lei, em atenção à causa do crédito, concede a certos credores, independentemente do registo, de serem pagos com preferência a outros.
É também uma excepção ao princípio da igualdade dos credores
Relativamente aos créditos de IMI o artigo 122 do CIMI remetendo para o regime da antiga contribuição predial constante do artigo 744 do Código Civil confere-lhe o privilégio imobiliário especial sobre o bem sujeito a este imposto inscrito para cobrança ano corrente na data da penhora e nos dois anos anteriores,

Preceitua o artigo 744 n.º1 do Código Civil:
“Os créditos por contribuição predial (agora de IMI) devida ao Estado ou às autarquias locais inscritos para cobrança no ano corrente na data da penhora, ou acto equivalente, e nos dois anos anteriores têm privilégio sobre os bens cujos rendimentos estão sujeitos àquela contribuição”

Resulta do exposto que o limite temporal dos créditos garantidos por estes privilégios têm como ponto de referência a data da penhora o que significa que os créditos de IMI inscritos para cobrança ou nascidos posteriormente à data da penhora não gozam desta garantia.
O privilégio que no caso é um privilégio imobiliário especial constitui-se aquando da constituição da obrigação do imposto sem necessidade de o credor ter que realizar outras formalidades.
Essas formalidades são meramente as registrais
Assim sendo e relativamente a este privilégio se a penhora não interfere na constituição do privilégio já o mesmo se não pode dizer quanto à eficácia desse privilégio.
Como refere Salvador Costa in “O Concurso de Credores” pp 171 o privilégio creditório «surge com a constituição do direito de crédito que garante, mas a sua eficácia depende do acto de penhora sobre os bens que são objecto da sua incidência o que significa que a sua constituição se verifica quando ocorrem os factos ou o facto de que a lei faz depender a sua atribuição e que se concretizam nos bens penhorados na acção executiva» cfr in “O concurso de Credores” pp 171.

A oponibilidade a terceiros deste privilégio especial afere-se assim na execução pendente a partir de qualquer das penhoras efectuadas e dela constantes desde que anteriores à penhora efectuada pela Fazenda Pública pois sendo este o momento que fixa a efectivação do privilégio é também a partir dela que se define limite temporal desse mesmo privilégio.

Assim sendo, e uma vez que o privilégio imobiliário especial de que gozam os créditos de IMI se constitui com o nascimento do crédito, importava que o OEF o tivesse reclamado e notificado aos restantes credores nos termos do artigo 789/ 1 do CPC
Não o tendo feito a graduação operada pelo OEF não pode manter-se por não ter respeitado as regras atinentes à reclamação de créditos.
A reclamação é pressuposto da graduação e sem que esse requisito processual se não verifique não há possibilidade de o crédito do IMI poder estar em concurso e beneficiar do processo executivo.
E só o registo da penhora os torna oponível a terceiros sendo a partir da data do registo que se determina a prioridade do pagamento a que se refere o artigo 822 do Código Civil.
E isto porque como refere Lopes Cardoso In “Manual da Acção Executiva” pp 516 pouco serviria o direito de reclamar um crédito com garantia real se não fosse acompanhado do direito de atacar a prioridade de outros.
A reclamação, num concurso de credores, parte duma situação de igualdade na reclamação para a constatação de eventual desigualdade quanto ao pagamento garantido pelo bem onerado pois, como é sabido, uma garantia posteriormente constituída de natureza idêntica a uma anteriormente constituída não pode deixar de ser menor
É que se a determinado crédito em concurso for atribuída prioridade de pagamento e tal for reconhecido a satisfação deste pode prejudicar a daquele.

Andou por isso bem o mº juiz ao desconsiderar essa graduação

No caso dos autos resulta provado que o crédito de IMI não foi reclamado
Entende a recorrente que o artigo 240 deve ser interpretado no sentido de abranger também os privilégios creditórios imobiliários especiais
Mas se é certo que o crédito exequendo não tem de ser reclamado o certo é que o crédito de IMI não foi o objecto da execução em curso.
E se é verdade que o pode reclamar o certo é que neste caso o não fez nem deu cumprimento ao preceituado no artigo 241 do CPPT não tendo notificado os reclamantes da existência de tal crédito

DECISÃO
Por todo o exposto acordam os juízes da Secção do Contencioso Tributário em negar provimento ao recurso.
Custas pela recorrente.
Notifique

Lisboa, 20 de Agosto 2014. –
Fonseca Carvalho (relator) – Fernanda MaçãsTeresa de Sousa.