Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0828/12
Data do Acordão:03/06/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:JUROS INDEMNIZATÓRIOS
TERMO FINAL
Sumário:I - O manifesto lapso que possa ocorrer na sentença é passível de rectificação, desde que esta seja solicitada ao tribunal que proferiu a decisão ou decorra de iniciativa desse tribunal, até ao momento da subida do recurso que dela venha a ser interposto. Nesta matéria, o tribunal de recurso apenas pode apreciar questão que lhe seja colocada sobre a posição assumida pelo tribunal recorrido quanto a rectificação anteriormente neste suscitada.
II - A exigência de fundamentação das decisões judiciais encontra previsão no art.º 158º do Código de Processo Civil, constituindo, aliás, imperativo constitucional que decorre do n.º 1 do art. 205.º da Constituição da República Portuguesa. Todavia, a nulidade da sentença por falta de fundamentação só ocorre quando se verifica falta absoluta de fundamentação, e não quando a fundamentação enunciada é insuficiente, medíocre, contraditória ou errada.
III - Para que a fundamentação de direito de um acto tributário se considere suficiente não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível.
IV - Ao disciplinar, no art. 96º do CIRC, apenas a matéria referente ao termo inicial da contagem de juros indemnizatórios, o legislador pretendeu que o respectivo termo final ficasse na alçada do regime geral constante da legislação tributária e, por conseguinte, que lhe fosse aplicado o disposto na Lei Geral Tributária e na parte final do nº 3 do art. 61º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Nº Convencional:JSTA000P15421
Nº do Documento:SA2201303060828
Data de Entrada:07/16/2012
Recorrente:MINISTÉRIO DAS FINANÇAS
Recorrido 1:A......, SA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. O MINISTÉRIO DAS FINANÇAS interpôs o presente recurso jurisdicional da decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, de parcial procedência da acção para reconhecimento do direito ao pagamento de juros indemnizatórios, no montante de € 62.498,84, instaurada por A………, S.A., restringindo o recurso ao segmento decisório que fixou o termo final do prazo de contagem de juros indemnizatórios na data de emissão do cheque de reembolso do imposto.
Terminou a sua alegação enunciando as seguintes conclusões:
A) Decidiu-se no douto aresto que o termo final do prazo de contagem dos juros indemnizatórios é o dia da emissão do cheque.
B) Determinou-se, em consequência, que cumpria à Administração proceder ao pagamento de juros indemnizatórios “desde o dia 05/03/2004 (como vimos o dia da emissão da nota de crédito) ao dia de emissão do cheque através do qual foi efectuado o reembolso de IRC” (parêntesis nosso).
C) O presente recurso jurisdicional tem por objecto a douta sentença nessa parte em que decidiu serem devidos juros indemnizatórios até à data da emissão do cheque de reembolso do imposto.
D) O douto aresto padece de nulidade, nos termos da alínea b) do n°1 do artigo 668° do CPC, por não especificação dos fundamentos de direito que justificam a decisão.
E) Isso porque a douta sentença recorrida não refere qual o fundamento legal para decidir que o termo final do prazo de contagem dos juros indemnizatórios é o dia da emissão do cheque.
F) Desconhecendo, assim, a Administração qual a norma que serve de base legal à escolha do dia da emissão do cheque como data elegível para este efeito.
G) A douta sentença padece, também, de erro em matéria de direito.
H) O artigo 43º da LGT indica as situações em que são devidos juros indemnizatórios, aí se incluindo a situação em que não é “cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos”.
I) O artigo 61° do CPPT, por seu turno, determina a forma como os juros indemnizatórios se devem contabilizar.
J) No caso de ser devido reembolso do IRC por “excesso” dos pagamentos por conta, o termo inicial da contagem dos juros indemnizatórios por atraso na restituição oficiosa do imposto tinha de ser encontrado por conjugação do disposto nos números 3 e 6 do artigo 96º do Código do IRC (fim do terceiro mês imediato ao da apresentação da declaração), com os números 1 e 3 do artigo 61º do CPPT.
K) Já o termo final da contagem dos juros indemnizatórios é — apenas e só — regulado na 2ª parte do n.º 3 do artigo 61º do CPPT, que o define como sendo o da emissão da nota de crédito.
L) Ora, por determinação do n.º 1 da mesma norma, esta aplica-se quer às situações em que há uma decisão (da Administração ou do Tribunal) da qual decorre o direito a juros, quer àquelas em que esse direito resulta de ter sido ultrapassado o termo do prazo legal de restituição oficiosa do tributo.
M) Assim sendo, a definição do termo final da contagem de juros efectuada na 2ª parte do n.º 3 do artigo 61º do CPPT tem de ser considerada para todos os juros regulados na norma.
N) Pelo que os juros indemnizatórios ora em causa são devidos até à emissão da nota de crédito.
O) E, com todo o respeito por opinião diversa, não se pode entender de outro modo, pois a ratio legis deste regime legal encontra-se no facto de ser na nota de crédito que se fixa o montante a pagar ao contribuinte (de seguida, apenas têm lugar procedimentos de execução daquela nota de crédito, designadamente as diligências de emissão (informática/automática) do cheque e do respectivo envio pelo correio).
P) Ao assim não entender, a douta sentença recorrida apresenta-se ilegal, por desconforme aos preceitos acima referenciados e, em consequência, não merece ser confirmada.

Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Ex.ªs. deverá ser considerado procedente o recurso e, em consequência, deverá ser revogada a douta sentença na parte recorrida, ou seja, na parte em que decidiu serem devidos juros indemnizatórios até à data da emissão do cheque de reembolso do imposto. Assim será feita por V. Ex.ªs. a costumada Justiça.


1.2. A Recorrida apresentou contra-alegações, que concluiu da seguinte forma:
A. No Tribunal a quo discutia-se o direito da então Impugnante receber juros indemnizatórios por a Administração fiscal ter excedido por 18 dias o prazo legal de restituição oficiosa do IRC relativo ao exercício de 2002.
B. Na fundamentação de direito da sentença, o Tribunal a quo reconheceu o direito a juros indemnizatórios por atraso na restituição oficiosa do tributo, “desde o termo do prazo para o reembolso, até à expedição do cheque para reembolso”.
C. No dispositivo da sentença recorrida, a Mmª Juiz a quo reconhece o direito a juros indemnizatórios, não desde o termo do prazo para reembolso - dia 29 de Fevereiro de 2004 - mas desde o dia 5 de Março de 2004 (data em que alegadamente foi emitida a nota de crédito) até ao dia da emissão do cheque através do qual foi efectuado o reembolso.
D. Trata-se de um manifesto lapso que deve ser relevado, pois é facilmente perceptível da fundamentação da sentença que a Mmª Juiz a quo queria referir-se não à data de 5 de Março de 2004, mas sim à data de 29 de Fevereiro de 2004, data do termo do prazo para reembolso.
E. A Administração Tributária e Aduaneira insurge-se no presente recurso contra o dies ad quem de contagem dos juros indemnizatórios por entender que esse dia termina não na data da emissão do cheque, como decidiu a sentença recorrida, mas na data da emissão da nota de crédito, por aplicação do disposto no artigo 61º, nº 3, do CPPT (na numeração em vigor à data dos factos).
F. Daí a Administração fiscal entender que a sentença recorrida deve ser anulada por erro em matéria de direito por ter interpretado erradamente o disposto na norma supra referida e por nulidade uma vez que não especifica os fundamentos de direito que justificaram a decisão de considerar o termo do prazo de cômputo dos juros indemnizatórios o dia da emissão do cheque de reembolso do imposto.
G. O artigo 61º, nº 3, do CPPT (actualmente inserido com o mesmo conteúdo no número 5) dispunha que “Os juros serão contados desde a data do pagamento do imposto indevido até à data da emissão da respectiva nota de crédito”.
H. Ora, in claris non fit interpretation. Esta norma que regula sobre o dies a quo e o dies ad quem da contagem dos juros aplica-se aos casos de pagamento indevido de imposto.
I. Os casos de pagamentos por conta e retenções na fonte superiores à responsabilidade final devida — que são os casos que dão lugar à restituição oficiosa dos impostos sobre o rendimento — não vêm regulados no artigo 61º, nº 3, do CPPT, uma vez que esses pagamentos e retenções são legalmente devidos.
J. De outra forma, i.e. se se considerasse que os casos de restituição oficiosa dos tributos vinham também regulados no artigo 61º, nº 3, do CPPT, então o dies a quo de contagem dos juros seria o dia em que foi efectuado um pagamento por conta ou uma retenção na fonte na qual foi ultrapassada a responsabilidade final de imposto do contribuinte.
K. Para os casos de restituição oficiosa dos tributos existe norma expressa, nomeadamente o artigo 96º do CIRC (104º na numeração actual) que versa directamente sobre o assunto e estabelece que caso o reembolso do imposto não seja efectuado até ao fim do 3º mês seguinte ao da autoliquidação, acrescem juros indemnizatórios, pelo que é essa norma aplicável na determinação do dies a quo de contagem dos juros.
L. Todavia, nenhuma regra vem consagrada na legislação fiscal para a determinação do dies ad quem de contagem dos juros nestas situações, como bem apontou a Mmª Juiz a quo (e ao contrário do que sucedia na vigência da legislação anterior — cfr. artigo 24º, nº 3, do CPT).
M. Pelo que andou bem a Mmª Juiz a quo quando fundamentou que “é certo que o nº 3 do artigo supra citado refere expressamente a emissão da nota de crédito, conforme defende a entidade demandada, porém, da letra daquele texto normativo se retira que o âmbito de aplicação objectiva da norma não é o de falta de restituição oficiosa do tributo, mas sim o pagamento do imposto indevido. Ora, se esta disposição fosse interpretada no sentido de se aplicar à falta de restituição oficiosa de tributos, então ter-se-ia também de retirar a consequência quanto ao momento inicial, que ainda assim seria desde a data do pagamento do imposto indevido”. (p. 5 da sentença)
N. E conclui: “tanto basta, para afastar a aplicação do nº 3 do artigo 61.º do CPPT, ao caso dos autos”.
O. Pelo que fica assim afastado o erro de direito apontado pela Recorrente à sentença recorrida,
P. E demonstrado o acerto da decisão recorrida que na ausência de uma norma legal criou uma norma para o caso concreto.
Q. Com efeito, sendo o direito a juros indemnizatórios uma emanação do direito à indemnização por responsabilidade civil extracontratual do Estado consagrado no artigo 22º da Constituição que é unanimemente considerado pela doutrina e pela jurisprudência como um direito análogo aos «direitos, liberdades e garantias», na ausência de norma expressa, o juiz criou a norma do caso, como lhe é expressamente permitido pela aplicação dos artigos 17º e 18º, nº 1, da Constituição, normas de aplicação directa e imediata aos direitos análogos aos «direitos, liberdades e garantias».
R. Norma do caso concreto essa que se alicerçou no fundamento jurídico dos juros indemnizatórios, i.e. o direito a ser indemnizado pela indisponibilidade do tributo até à data em que cessou essa indisponibilidade (e não meramente até à data da emissão de uma suposta nota de crédito interna que nem sequer é notificada ao contribuinte).
S. Aliás, nos termos da Lei e do Direito (cfr. nomeadamente os artigos 13º da CRP, 5º e 40º, nº 4, da LGT, 262º, nº 2, do CPPT e 785º do CC), a existir erro da decisão recorrida foi apenas em não ter reconhecido que o montante que foi oficiosamente restituído com 18 dias de atraso deveria ter sido imputado primeiramente aos juros indemnizatórios legalmente devidos e que, sobre o remanescente de imposto ainda não restituído, continuariam a vencer-se juros até efectivo e integral pagamento.

Nestes termos e nos melhores de direito que V. Exas. por certo suprirão não pode deixar de ser negado provimento aos fundamentos de recurso apresentados pela Recorrente, pois só assim se fará a costumada e sempre reclamada Justiça!

1.3. O Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu douto parecer no sentido de que devia ser concedido provimento ao recurso, advogando que, embora não padeça de nulidade por falta de fundamentação de direito, a sentença recorrida deve ser revogada na parte que se refere ao período de contagem de juros indemnizatórios e substituída por acórdão que declare serem tais juros devidos desde o termo do prazo para reembolso (29/02/2004) até à data da emissão da nota de crédito (5/03/2004), argumentando que a tese acolhida na sentença não pode ser sufragada pelo seguinte:
«a) recusa sem argumentação convincente do regime geral constante do art. 61º nº 3 CPPT, aplicável ao caso de incumprimento do prazo legal de restituição oficiosa dos tributos, segundo doutrina qualificada (Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 5ª edição 2006 Vol. I p. 83).
b) é de difícil execução prática, na medida em que não supera o obstáculo da inevitável dilação temporal (medida em dias) entre a data da emissão da nota de crédito e a data do envio do cheque ou da transferência para a conta bancária do beneficiário, operações materiais realizadas por serviços distintos da administração tributária

1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Juízes Conselheiros Adjuntos, cumpre decidir em conferência.

2. Na sentença recorrida julgou-se como provada a seguinte matéria de facto:
a) A 28/11/2003 foi entregue declaração de substituição Modelo 22, de IRC, da ora impugnante, relativa ao exercício de 2002 (cfr. comprovativo de entrega de Declaração Modelo 22 de IRC, documento nº 3 junto pelo impugnante, a fls. 35 dos autos);
b) A 18/12/2003 foi efectuada a liquidação nº 26103866900, resultando num total a reembolsar de € 31.683.440,24 (cfr. cópia de nota de liquidação, a fls. 37 dos autos);
c) A 05/03/2004 foi decidido o reembolso € 31.683.440,24 a favor da autora (cfr. documento, página 3 do Processo Administrativo Tributário, e informação constante da invólucro-mensagem, através da qual foi enviado cheque, documento nº 1 junto pelo impugnante, a fls. 33 dos autos);
d) Entre o dia 10 e dia 20 foi emitido o cheque nº 6617155204, no valor de € 31.683.440,24 a favor da autora (cfr. cópia cheque, documento n.° 1 junto pelo impugnante, a fls. 33 dos autos);
e) A 18/03/2004 foi recebido, pela impugnante, o cheque nº 6617155204, do Tesouro, com o valor € 31.683.440,24 (cfr. cópia cheque, documento nº 1 junto pelo impugnante, a fls. 33 dos autos);
f) A 07/04/2009 foi promovida a liquidação manual de juros indemnizatórios, referentes ao período de 29/02/2004 a 05/03/2004, sobre a quantia € 31.683.440,24 (cfr. ofício enviado por fax, a 07/05/2009, do Contencioso de IR, para a Direcção de Serviços Jurídicos e do Contencioso de DGCI, a fls. não numeradas do PAT);
g) A 09/05/2009 os juros indemnizatórios, a que se refere a alínea anterior, no valor de € 20.832,95, foram aplicados, na compensação de dívida em cobrança coerciva, pelo processo de execução fiscal nº 3247200901014072 (cfr. ofício enviado por fax, a 20/05/2009, do Contencioso de IR, para a Direcção de Serviços Jurídicos e do Contencioso de DGCI, a fls. não numeradas do PAT);

3. A presente acção para o reconhecimento do direito ao pagamento de juros indemnizatórios e moratórios foi instaurada pela sociedade A………, S.A., com fundamento em atraso da Administração Tributária na devolução do IRC que pagou em excesso face aos termos da declaração de substituição relativa à consolidação de contas do exercício de 2002, que entregou em 28/11/2003, acção onde solicitou que lhe fosse reconhecido o direito a juros indemnizatórios contados desde 29/2/2004 (art. 96º do CIRC) até 18/3/2004 (data da devolução do imposto), no montante de € 62.498,84, bem como o direito a juros moratórios, vencidos e vincendos, contados sobre a referida quantia e até efectivo pagamento, desta forma se insurgindo contra o facto de a Administração só lhe ter pago juros indemnizatórios referentes ao período de 29/02/2004 a 05/03/2004.

A sentença recorrida julgou a acção parcialmente procedente, reconhecendo o direito da Autora a ser paga dos peticionados juros indemnizatórios, contados desde 5/03/2004 até à data da expedição do cheque referente ao reembolso.
Todavia, a Recorrida dá conta, nos pontos A., B., C. e D., das conclusões das suas contra-alegações, de que a sentença recorrida, na sua parte dispositiva, terá incorrido em manifesto lapso ao determinar que os juros indemnizatórios em causa são devidos desde 5/3/2004 e não, como decorre da respectiva fundamentação, desde 29/2/2004, instando para que tal lapso seja corrigido e relevado por este Tribunal de recurso.
Determina o art. 666º do CPC, no seu nº 1, que, «Proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa», estabelecendo o seu nº 2 que, «É lícito, porém, ao juiz rectificar erros materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas existentes na sentença e reformá-la nos termos dos artigos seguintes.». Assim, sob a epígrafe «Rectificação de erros materiais», o art. 667º do CPC prevê, no seu nº 1, que «Se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexactidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz», disciplinando, no seu nº 2, que «Em caso de recurso, a rectificação só pode ter lugar antes de ele subir, podendo as partes alegar perante o tribunal superior o que entendam de seu direito no tocante à rectificação.».
Significa isto que o eventual erro material da sentença é passível de rectificação, desde que esta seja solicitada ao tribunal que proferiu essa decisão, ou decorra de iniciativa desse tribunal, até ao momento da subida do recurso que dela venha a ser interposto (Cfr., neste sentido, ALBERTO DOS REIS, in Código de Processo Civil Anotado, vol. V, pág. 134) E o tribunal de recurso apenas pode apreciar questão que lhe seja colocada sobre a posição assumida pelo tribunal recorrido quanto a rectificação que neste tenha sido suscitada.
No caso vertente, a Recorrida invoca nas contra-alegações de recurso a existência de um lapso/erro de escrita na parte dispositiva da sentença, sem que haja, contudo, pedido a sua rectificação ao tribunal recorrido antes da subida do recurso.
Ora, não se podendo embora rectificar a sentença nos termos do art. 667º, nº 2, do CPC, nada obstaria a que este tribunal de recurso “relevasse”, conforme peticionado, o dito lapso caso este configurasse erro ostensivo, nos termos do art. 249º do Código Civil. (Cfr., neste sentido, o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 23/9/2008, no proc. nº 07B2469.)
Não se vê, todavia, que ocorra tal lapso na sentença recorrida.
Isto porque a Administração já pagou à Autora os juros indemnizatórios referentes ao período de 29/02/2004 a 05/03/2004 [quantia liquidado em 7/4/2009, conforme al. f) do probatório, e objecto de compensação operada em 9/5/2009, conforme al. g) do probatório], subsistindo em litígio apenas os juros que seriam devidos a partir de 5/03/2005. Razão por que, na decisão de procedência da acção só havia que determinar o pagamento de juros desde 5/3/2004, e não desde 29/2/2004.
Como se deixou dito na sentença, «Dúvidas assim não restam, em conformidade com a posição assumida por ambas as partes, que a AT tinha até ao dia 29/02/2004 para efectuar a respectiva restituição de imposto, atenta a data de envio da declaração [aliena a) dos factos assentes], sendo que não o fazendo passava desde esse momento a ser devedora de juros indemnizatórios, até ao efectivo reembolso», concluindo-se que, «Pelo exposto, cumpre reconhecer o direito da autora ao pagamento de juros indemnizatórios, à taxa legal em vigor no período em questão, 4% de acordo com a Portaria nº 91/2003, ex vi artigo 43º, nº 4, e artigo 35º, nº 10, ambos da LGT, desde o termo do prazo de reembolso até ao dia de emissão do cheque que o efectivou.
Sendo que, resulta provado, os juros indemnizatórios contados desde o termo do prazo para o reembolso, até ao dia 05/03/2004, foram já reconhecidos pela Entidade Demandada, que os aplicou na compensação de uma dívida em execução fiscal, reconhece-se o direito da autora ao pagamento de juros indemnizatórios, até ao dia da emissão do cheque através do qual foi efectuado o reembolso devido.». Daí que, na parte dispositiva da sentença, se reconheça «(…) o direito da autora ao pagamento de juros indemnizatórios desde o dia 05/03/2004(…)».
Termos em que não pode proceder a questão suscitada pela Recorrida.

3.1. Vem o presente recurso interposto do segmento da sentença que fixou o termo final do prazo de contagem de juros indemnizatórios na data da emissão do cheque para devolução do montante de imposto entregue em excesso, reconhecendo o direito da A. a receber esses juros com referência ao período compreendido entre as datas das emissões da nota de crédito e do respectivo cheque, respectivamente em 5/3/2004 e em 18/3/2004. E as questões que nele se colocam são as de saber se a sentença é nula por vício de falta de fundamentação em matéria de direito no que se refere ao termo do prazo de contagem dos juros, por não indicar a norma legal que sustenta a decisão, e se padece de erro de julgamento de direito, por incorrecta interpretação do artigo 61º, nº 3, do CIRC, ao decidir que esta disposição legal é inaplicável in casu.

3.2. DA NULIDADE DA SENTENÇA.
No entender do Recorrente a sentença recorrida, não indicando a norma legal que permite radicar o termo final do prazo da contagem de juros indemnizatórios na data da emissão do cheque referente à devolução do montante de imposto entregue em excesso, carece de fundamentação de direito, padecendo, por conseguinte, da nulidade a que se refere o art. 668º, nº 1, al. b), do CPC.
Vejamos.
A exigência de fundamentação das decisões judiciais encontra previsão no artigo 158º do Código de Processo Civil, constituindo, aliás, imperativo constitucional que decorre do n.º 1 do art. 205.º da Constituição da República Portuguesa, nos termos do qual «As decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei». É, aliás, nesse contexto, que o artigo 125.º do CPPT e o análogo artigo 668.º, nº 1, al. b), do CPC, estipulam que é nula a sentença quando falte a especificação dos fundamentos de facto e de direito da decisão, preceitos que são aplicáveis a quaisquer outras decisões judiciais por força do estipulado no nº 3 do art. 666º, do CPC.
Esta especificação dos fundamentos da decisão judicial refere-se à sua motivação ou fundamentação no plano factual e jurídico, cumprindo, uma dupla função: por um lado, impõe necessariamente ao juiz um momento de controlo crítico da lógica e da bondade da decisão; por outro, permite, pela via do recurso, o reexame da decisão por ele tomada.
Todavia, como vem entendendo uniformemente a doutrina ( Cfr. ALBERTO DOS REIS, in Código de Processo Civil Anotado, volume V, página 140.) e a jurisprudência ( Cfr., entre muitos outros, os acórdãos proferidos pelo STA em 10-10-90, no proc. nº 11946, em 31-1-90, no proc. nº 11921, em 29-5-91, no proc. nº 24722, em 22-2-1995, no proc. n.º 18494, em 5-2-1997, no proc. n.º 21024, em 12-7-2000, no proc. n.º 25056, em 21-1-2003, no proc. n.º 633/02, em 14-7-2008, no proc. n.º 510/08, e em 3-12-2008, no proc. n.º 540/08.), a nulidade prevista art. 668º, nº 1, alínea b), do CPC, só ocorre quando se verifica falta absoluta de fundamentação, e não quando a fundamentação enunciada é insuficiente, medíocre, contraditória ou errada.
De resto, em relação à fundamentação de direito, a jurisprudência deste Supremo Tribunal ( Entre tantos outros, os acórdãos proferidos pela 1ª Secção do STA em 27/02/1997, em 17/05/1998, e em 28/02/2002, nos processos n.º 36.197, 32.694 e 48071, respectivamente.) tem decidido que, para que a mesma se considere suficiente, não é sempre necessária a indicação dos preceitos legais aplicáveis, bastando a referência aos princípios pertinentes, ao regime jurídico ou a um quadro legal bem determinado, devendo considerar-se o acto fundamentado de direito quando ele se insira num quadro jurídico-normativo perfeitamente cognoscível.
Ora, na sentença recorrida explicita-se que, «(…) estando em causa uma indemnização, aquela corresponderá ao período em que ocorreu o dano, a ilicitude e a culpa, isto é, entre o período desde o fim do prazo para o reembolso, até à data em que aquela falta de reembolso já não seja culposa por parte da Administração Tributária» e, entendendo, pelos motivos que expõe, que o art. 61º, nº 3, do CPPT não é aplicável em caso de restituição oficiosa de imposto, conclui, em clara aplicação dos princípios gerais da responsabilidade civil, que «(…) os juros indemnizatórios são devidos (…) desde o termo do prazo para o reembolso, até à expedição do cheque para reembolso, ou até à data de extinção da obrigação (…)».
Neste enquadramento, a sentença contém claramente a motivação que levou o julgador a proferir a decisão. Se, eventualmente, essa motivação é desacertada, estar-se-á perante erro de julgamento e não ante nulidade da sentença por falta de fundamentação.
Razão por que não se verifica a invocada nulidade.

3.3. DO ERRO DE JULGAMENTO
Propugnando a aplicação do disposto no artigo 61º, nº 3, do CPPT na fixação do termo final do prazo de contagem de juros indemnizatórios, ou seja, na data da emissão da nota de crédito referente ao imposto entregue em excesso, o Recorrente imputa à sentença o vício de erro de julgamento de direito, pondo, assim, em crise o segmento da sentença que, afastando a aplicação do referido preceito legal, fixou tal termo na data da emissão do cheque para devolução do montante do dito imposto.
Segundo o entendimento vertido na sentença, «Os juros indemnizatórios são devidos em virtude de estar em causa o instituto da responsabilidade civil extracontratual (facto ilícito, culpa, dano, e nexo de causalidade entre o facto e o dano), sendo que, no caso, se encontra preenchido o pressuposto da conduta ilícita e culposa, com o incumprimento do prazo para reembolso, e se presume o nexo de causalidade e o dano - os juros - uma vez que está em causa uma obrigação pecuniária.
Assim sendo, e estando em causa uma indemnização, aquela corresponderá ao período em que ocorreu o dano, a ilicitude e a culpa, isto é, entre o período desde o fim do prazo para o reembolso, até à data em que aquela falta de reembolso já não seja culposa por parte da Administração Tributária.
É certo que o nº 3 do artigo supra citado refere expressamente a emissão da nota de crédito, conforme defende a Entidade Demandada, porém, da letra daquele texto normativo retira-se que o âmbito de aplicação objectiva da norma não é o de falta de restituição oficiosa do tributo, mas sim o pagamento do imposto indevido. Ora, se esta disposição fosse interpretada no sentido de se aplicar à falta de restituição oficiosa de tributos, então ter-se-ia também de retirar a consequência quanto ao momento inicial, que assim seria desde a data do pagamento do imposto indevido.
Tanto basta, para afastar a aplicação do nº 3 do artigo 61º do CPPT, ao caso dos autos

Atentos os termos em que se configura o dissídio, importa, então, apurar da aplicabilidade do art. 61º, nº 3, in fine, do CPPT ao caso dos juros indemnizatórios devidos por atraso na devolução oficiosa de imposto.
Vejamos.
Sobre a obrigação de pagamento de juros indemnizatórios, escreve JORGE LOPES DE SOUSA, in “Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado”, 5ª ed., vol. I, anotação 2 ao art. 61º, pág. 470: «Os juros indemnizatórios vencem-se a favor do contribuinte, destinando-se a compensá-lo do prejuízo provocado por um pagamento indevido de uma prestação tributária art. - 43º da LGT).
Neste mesmo artigo prevê-se que sejam pagos juros indemnizatórios nos seguintes casos:
- quando, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, se determine que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento de tributo em montante superior ao legalmente devido;
- quando não seja cumprido o caso legal de restituição oficiosa de tributos;
- em caso de anulação de acto tributário por iniciativa da Administração Tributária, a partir do 30º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada nota de crédito;
- quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido, se o atraso for imputável à Administração Tributária.».

Com efeito, o art. 43º da LGT, sob a epígrafe «Pagamento indevido da prestação tributária», determina o seguinte:

«1. São devidos juros indemnizatórios quando se determine, em reclamação graciosa ou impugnação judicial, que houve erro imputável aos serviços de que resulte pagamento da dívida tributária em montante superior ao legalmente devido.

2.Considera-se também haver erro imputável aos serviços nos casos em que, apesar de a liquidação ser efectuada com base na declaração do contribuinte, este ter seguido, no seu preenchimento, as orientações genéricas da administração tributária, devidamente publicadas.

3. São também devidos juros indemnizatórios nas seguintes circunstâncias:

a) Quando não seja cumprido o prazo legal de restituição oficiosa dos tributos;
b) Em caso de anulação do acto tributário por iniciativa da administração tributária, a partir do 30º dia posterior à decisão, sem que tenha sido processada a nota de crédito;
c) Quando a revisão do acto tributário por iniciativa do contribuinte se efectuar mais de um ano após o pedido deste, salvo se o atraso não for imputável à administração tributária.

4. A taxa de juros indemnizatórios é igual à taxa dos juros compensatórios.».

Já o art. 61º do CPPT fixa o modo de cálculo dos juros indemnizatórios, prescrevendo o seguinte:
1- Os juros indemnizatórios serão liquidados e pagos no prazo de 90 dias contados a partir da decisão que reconheceu o respectivo direito ou do dia seguinte ao termo do prazo legal de restituição oficiosa do tributo.
2- Se a decisão que reconheceu o direito a juros indemnizatórios for judicial, o prazo de pagamento conta-se a partir do início do prazo da sua execução espontânea.
3- Os juros serão contados desde a data do pagamento do imposto indevido até à data da emissão da respectiva nota de crédito.
4- Os juros indemnizatórios poderão ser reclamados ou impugnados autonomamente caso o pagamento do tributo seja efectuado após o termo dos prazos gerais de reclamação ou impugnação.».

No caso vertente, a divergência que deu causa ao recurso decorre da interpretação do nº 3 do art. 61º do CPPT, no que tange ao termo final da contagem dos juros indemnizatórios devidos à Autora por força do que dispõe, genericamente, o art. 43º, nº 3, al. a), da LGT e, especificamente, o art. 96º, nºs 3 e 6, do CIRC (na versão introduzida pelo Dec.Lei nº 198/2001, de 3 de Julho), tendo-se entendido na sentença que aquele preceito legal do CPPT é inaplicável in casu, por não se tratar aqui da devolução de um imposto indevidamente liquidado, mas antes da restituição oficiosa de imposto pago nos termos do art. 96º do CIRC, e, por conseguinte, de imposto que à data do seu pagamento se mostrava devido. Em defesa da sua teoria, aduz ainda o argumento de que da aplicação daquele regime resultaria que o termo inicial da contagem dos juros haveria, então de se situar na data do pagamento do imposto indevido.
O mencionado art.º 96º do CIRC disciplina as regras de pagamento e de reembolso do IRC tendo havido pagamentos por conta. Ora, a imposição dos pagamentos por conta enquadra-se no jus imperii do Estado, que, na prossecução do interesse público, visa assegurar o pagamento dos impostos, na suposição de que o contribuinte irá obter rendimentos tributáveis semelhantes àqueles que obteve em exercício anterior – como decorre da sua forma de cálculo, ínsita no art. 97º do CIRC -, não obedecendo, por conseguinte, a uma mera lógica civilística.
De resto, o art. 96º do CIRC não trata do imposto em si mesmo, mas tão-só da sua forma de pagamento e de reembolso - como se retira, aliás, na sua epígrafe – nas situações de pagamento por conta do imposto que, a final, vier a ser efectivamente liquidado em face do real rendimento tributável anual, pelo que o eventual excesso só é determinável, e consequentemente, reembolsável, após a entrega da declaração periódica de rendimentos, como resulta do que dispõem os seus nºs 2 e 3.
Assim, o nº 3 da citada disposição legal determina que «O reembolso é efectuado, quando a declaração periódica de rendimentos for enviada ou apresentada no prazo legal e desde que a mesma não contenha erros de preenchimento, até ao fim do 3º mês imediato ao da sua apresentação ou envio» e o nº 6 prescreve que a falta de reembolso neste prazo dá lugar a pagamento de juros indemnizatórios.
Por esta razão, não colhe o argumento de que a aplicação do art. 61º, nº 3, do CPPT, implicaria que o termo inicial de contagem desses juros fosse diverso daquele que é consagrado na sentença recorrida.
Com efeito, ainda que fosse discutível, em teoria, que, no caso em apreço, os juros indemnizatórios se pudessem contar a partir da data do pagamento por conta, atento o que vem disposto no art. 61º, nº 3, do CPPT, a verdade é que, em face da expressa determinação da regra específica contida no art. 96º, nº 6, do CIRC, que se sobrepõe à regra geral da norma do CPPT, é fora de dúvida que, no que toca ao termo inicial da contagem de juros indemnizatórios, haverá que atender ao que dispõe o art. 96º do CIRC, ou seja, que os juros indemnizatórios se contam a partir do final do 3º mês imediato ao da apresentação ou envio da declaração periódica de rendimentos.
Daqui não se pode concluir, porém, que a mencionada disposição legal do CPPT não seja aplicável quanto ao termo final de contagem desses juros, e, por conseguinte, não podemos concordar com a argumentação expendida pelo julgador no sentido de que, tendo o legislador, no art. 96º, do CIRC, disposto quanto ao termo inicial dos juros, pretendeu que nestes casos fosse aplicado um regime globalmente diverso do vertido no art. 61º do CPPT, e que, na ausência de regra específica quanto ao termo final desses juros, fossem aplicadas as regras gerais da responsabilidade civil.
Como se sabe, o artigo 9º, nº 3, do Código Civil diz que «Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados.». Ora, o que se conclui da leitura e análise das mencionadas disposições contidas no art. 96º do CIRC é que o legislador quis apenas estabelecer uma regra especial nesta específica matéria – o termo inicial da contagem dos juros – o que bem se compreende, atenta a especial forma de pagamento prevista nesta norma, que mal se coadunaria com a previsão da primeira parte do nº 3, do art. 61º do CPPT, a qual permitiria extrair conclusões semelhantes àquela que transparece na sentença recorrida, de que o início da contagem dos juros indemnizatórios teria de radicar na data do pagamento do imposto.
Foi certamente para evitar a controvérsia que esse tipo de argumento poderia gerar que no o nº 6 do art. 96º do CIRC veio estabelecer, sem margem para dúvidas, que os juros indemnizatórios são devidos a partir do incumprimento do prazo fixado no seu nº 3. Com efeito, o art. 96º, nº 6, do CIRC apenas tende a acautelar, nos termos expostos, a fixação do termo inicial da contagem de juros indemnizatórios, dada a especificidade do pagamento deste imposto, sem contudo, definir, por desnecessidade quanto ao demais, contornos diversos daqueles que resultam das regras contidas na Lei Geral Tributária e no art. 61º do CPPT.
Isto é, ao disciplinar no art. 96º do CIRC apenas a matéria referente ao termo inicial da contagem destes juros indemnizatórios, o legislador pretendeu que o respectivo termo final continuasse na alçada do regime contido na regra geral em sede de legislação tributária e, por conseguinte, que lhe fosse aplicado o que vem disposto na parte final do nº 3 do art. 61º do CPPT.
Como refere JORGE LOPES DE SOUSA, ob. cit., nota 10 ao art. 61º, pág. 483, « (…) No caso de não cumprimento do prazo de restituição oficiosa dos impostos [situação prevista na alínea a) do nº 3 do artigo 43º], devendo estes juros, pela sua natureza indemnizatória, corresponder ao período em que o sujeito passivo esteja privado de quantias que deveriam estar em seu poder se não se verificasse uma situação ilegal, eles são devidos desde o termo do prazo legal para a restituição até ao momento em que seja elaborada a nota de crédito. (…)».
Por outro lado, a obrigação de pagamento de juros indemnizatórios que decorre do art. 43º da LGT e é regulada nos termos do art. 61º do CPPT, não se prende, primacial ou exclusivamente, com a legalidade da liquidação do imposto, mas sim com o excesso do imposto liquidado. Aliás, “indevido” não é sinónimo de “ilegal”.
Com efeito, nem o art. 43º, nº 3, al. a), da LGT, referindo-se à restituição oficiosa de tributos, nem o art. 61º, nº 1, do CPPT, referindo-se ao prazo de liquidação e pagamento na restituição oficiosa do tributo, fazem qualquer distinção entre tributos legal ou ilegalmente liquidados, e nem o nº 3 deste último preceito legal, que fixa o período de contagem dos juros indemnizatórios na sequência do que vem dito no nº 1, pode ser lido e interpretado à margem do normativo em que se insere.
Assim sendo, o nº 3 do art. 61º do CPPT é aplicável à situação de falta de restituição oficiosa de tributos, expressamente contemplada no seu nº 1.
Acresce que, não há restituições oficiosas (ou outras) de imposto devido, e, por conseguinte, não é possível operar a distinção referida na sentença recorrida entre as restituições no pagamento devido e indevido do imposto. É que, nas restituições do imposto pago por conta, também há, necessariamente, um pagamento indevido.
Na verdade, enquanto na generalidade dos impostos, o pagamento incide sobre matéria colectável já determinada, e, neste caso, pode, por erro, ocorrer pagamento indevido, no pagamento do imposto por conta previsto no CIRC, sendo a matéria colectável (rendimento anual) determinada, necessariamente, após aquele pagamento, havendo excesso de imposto há também um pagamento indevido que, contudo, não se deve a qualquer erro, mas antes a “um encontro de contas”. Em ambos os casos existe um pagamento que se mostra indevido, ab initio ou a posteriori.
O quadro legal em análise, maxime o art. 61º, nº 3, do CPPT, refere-se, simplesmente, ao pagamento indevido, e, por conseguinte, não pode deixar de abarcar as duas situações referidas. E, nesta circunstância, não se pode concordar com a tese expendida na sentença recorrida de que a situação fáctica dos autos, em que se trata de imposto devido à data do pagamento, não é subsumível ao regime jurídico contido no art. 61º, nº 3, do CPPT.
Ao contrário, o que decorre da letra e do espírito da lei é que aquela disposição legal tem plena aplicação no caso em apreço, pelo que o atraso na restituição oficiosa de tributos confere ao contribuinte o direito de receber juros indemnizatórios contados a partir do final do 3º mês imediato ao da apresentação ou envio da declaração periódica de rendimentos até à data da emissão da nota de crédito referente ao imposto entregue em excesso.
Torna-se, assim, claro que, no caso vertente, o termo final de contagem dos juros indemnizatórios ocorre na data da emissão da nota de crédito referente ao imposto a restituir, e, por conseguinte, a sentença que assim não decidiu não pode manter-se, impondo-se a sua revogação nesta parte.

5. Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso e revogar a sentença recorrida na parte em que reconheceu à Autora direito a juros indemnizatórios contados até à data da emissão do correspondente cheque, em tal medida se julgando improcedente a acção.
Custas a cargo da Recorrida.

Lisboa, 6 de Março de 2013. - Dulce Manuel Neto (relatora) - Isabel Marques da Silva - Lino Ribeiro.