Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0970/18.2BELSB
Data do Acordão:05/30/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:PEDIDO
PROTECÇÃO INTERNACIONAL
PROCEDIMENTO ESPECIAL
RESPONSABILIDADE DO ESTADO
AUDIÊNCIA PRÉVIA
Sumário:No quadro do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela apreciação do pedido de proteção internacional, ao requerente, na entrevista/relatório ou após a mesma e chegada da resposta do Estado requerido, assiste o direito de ser ouvido, ou de lhe ser dada a possibilidade de produzir defesa, de emitir ou tomar posição, quanto à decisão a tomar em decorrência da aceitação ou de uma eventual aceitação da responsabilidade pelo Estado requerido da tomada ou retoma a cargo, explicitando, em sede da entrevista ou até mesmo em momento posterior à mesma, a sua motivação sobre o Estado-Membro que entende dever apreciar o pedido pelo mesmo formulado, mediante a alegação ou explicitação daquilo que constitui a sua situação jurídica e factual no Estado-Membro para o qual o requerente é transferido, conferindo-se-lhe, assim, a possibilidade de afastar a aplicação dos critérios de responsabilidade, em especial por razões humanitárias e compassivas [cfr. arts. 03.º, 05.º, 07.º, 17.º, e 24.º, todos do Regulamento (UE) n.º 604/2013, 16.º e 37.º da Lei n.º 27/2008, 02.º, n.º 5, e 121.º, ambos do CPA, e 267.º, n.º 5, da CRP].
Nº Convencional:JSTA000P24616
Nº do Documento:SA1201905300970/18
Data de Entrada:03/29/2019
Recorrente:A.............
Recorrido 1:DIRECTOR NACIONAL DO SEF
Votação:UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Aditamento:
Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
RELATÓRIO
1. A………., devidamente identificado nos autos, instaurou no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa [doravante «TAC/L»] a presente ação administrativa contra o “MINISTÉRIO DA ADMINISTRAÇÃO INTERNA” [doravante «MAI»], tudo nos termos e com a motivação aduzida na petição inicial de fls. 01 e segs. dos autos [paginação «SITAF» - paginação essa a que se reportarão ulteriores referências à mesma], impugnando o despacho da Senhora Diretora Nacional Adjunta do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras [SEF], datado de 17.04.2018, e peticionando a sua anulação, com as devidas e legais consequências, «devendo ser ordenado o prosseguimento da tramitação do processo de proteção internacional» em Portugal.

2. O «TAC/L», por sentença de 25.06.2018 [cfr. fls. 103/108], julgou totalmente improcedente a pretensão e, em consequência, absolveu o R. do pedido.

3. O A. interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul [doravante «TCA/S»] que, por acórdão de 04.10.2018, negou provimento ao recurso e manteve a sentença recorrida [cfr. fls. 169/188].

4. Invocando o disposto no art. 150.º, n.º 1, do CPTA [na redação introduzida pelo DL n.º 214-G/2015 - redação essa a que se reportarão todas as demais citações de normativos deste Código sem expressa referência em contrário], o mesmo A., inconformado com o acórdão proferido pelo «TCA/S», interpôs, então, o presente recurso de revista, produzindo alegações [cfr. fls. 195 a 208], com o seguinte quadro conclusivo que se reproduz:
«
A) O Recorrente intentou, no TAC de Lisboa, contra o Ministério da Administração Interna, ação em que requer a anulação da decisão do Diretor Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de 17 de abril de 2018 - que considerou inadmissível o pedido de proteção internacional que havia formulado e determinou a sua transferência para a Alemanha.
B) Apresentou o pedido de proteção internacional cujo procedimento foi instruído e finalizado sem ter sido notificado do relatório final, o que o impediu de se pronunciar sobre o projeto de indeferimento do seu pedido e sobre os respetivos fundamentos.
C) Esse indeferimento viola, desse modo, o disposto nos arts. 16.º e 17.º da Lei n.º 27/2008 (não «2006»), de 30/06, na redação que lhe foi dada pela Lei n.º 26/2014, de 5/05, interpretados em conformidade com o que dispõem o artigo 41.º, n.º 2, alínea a), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e art. 267.º, n.º 5 da CRP.
D) O TAC de Lisboa não se pronunciou sobre a questão da violação do art. 17.º da Lei de Asilo por parte do SEF e invocada pelo Recorrente, vindo a julgar a ação totalmente improcedente.
E) No Tribunal Central Administrativo do Sul, para quem o Recorrente apelou, não teve melhor sorte - independentemente de considerar nula a sentença proferida pelo TAC de Lisboa, por omissão de pronúncia nos termos da alínea d) do n.º 1 do art. 615.º, veio o douto Tribunal ad quem colmatar essa lacuna,
F) Proferindo então decisão que considerou improcedente o recurso e absolve o Réu Ministério da Administração interna do pedido.
G) Desse Acórdão e nos termos do art. 150.º do CPTA vem o Recorrente apresentar a presente revista.
H) Os factos dados como provados são os constantes do Acórdão recorrido para que se remete.
I) O Autor, ora Recorrente, pretende a anulação da decisão do Diretor Nacional do SEF que, face à aceitação pelas autoridades alemãs do pedido que ele aí apresentou - considerou inadmissível o pedido de proteção internacional que ele havia formulado e determinou a sua transferência para a Alemanha.
J) Entende o Tribunal ad quem que não assiste razão ao Recorrente e que, o SEF e o TAC não violaram o artigo 17.º, n.º 1 e 2 da Lei de Asilo, porque tal disposição legal não se aplica ao caso concreto.
L) O Tribunal ad quem, ao decidir como decidiu, mantém na ordem jurídica ato administrativo ilegal por preterição de uma formalidade essencial que a lei prescreve - o direito ao direito de audiência do interessado.
M) O artigo 17.º da Lei do Asilo determina que, após a realização das diligências cabíveis (e no caso houve lugar às declarações previstas no art. 16.º), o SEF elabora um relatório escrito do qual constam as informações essenciais do processo, sendo sobre este último relatório que ao requerente deve ser facultada a possibilidade de se pronunciar, no prazo de 5 dias, sendo ainda esse relatório comunicado ao representante do ACNUR e ao CPR, desde que o requerente, para isso, tenha dado o seu consentimento, para que aquelas organizações, querendo, se pronunciem no mesmo prazo,
... Tal significa que o Requerente do pedido de proteção internacional, tem o direito a ser ouvido sobre as informações essenciais do seu pedido (que no caso concreto não podiam deixar de ser a inadmissibilidade do pedido e o subsequente procedimento especial que teve lugar), constantes de um relatório escrito que as indique, assim se assegurando a audiência do interessado.
… No entanto, no procedimento administrativo (que se encontra descrito nos factos considerados provados), verifica-se que não foi elaborado o relatório contemplado no artigo 17.º, n.º 1 da Lei do Asilo, sobre o qual o Requerente se pudesse pronunciar, não podendo considerar-se como “relatório”, o “Auto de Declarações” do Requerente prestadas em 06 de abril de 2018.
... A falta da elaboração desse relatório, tem que ser considerada como preterição de uma formalidade essencial que a lei prescreve e que determina, consequentemente, que não tenha sido possível ao requerente pronunciar-se, nos termos do n.º 2 do referido art. 17.º.
... Tendo o Recorrente impugnado o ato administrativo com os fundamentos supra descritos, o douto Tribunal ad quem só poderia ter constatado que se está perante uma notória violação do previsto no artigo 17.º, n.ºs 1 e 2 da Lei 27/2008 de 30/06, com as alterações introduzidas pela Lei 26/14 de 05/05 e tal facto conduz à anulação do ato impugnado e declaração de nulidade da sentença, nos termos do art. 153.º e 162.º do CPA.
... Além disso e porque a falta desse relatório foi considerada, pelo Douto Acórdão do STA de 18 de maio 2017 proferido no Proc. n.º 0306/17, disponível em www.dgsi.pt como preterição de uma formalidade essencial que, consequentemente, determinou que não tinha sido possível ao recorrente pronunciar-se nos termos n.º 2 do art. 17.º da Lei do Asilo.
... Contra tal entendimento não se invoque que não tem cabimento o procedimento relativo ao disposto no art. 17.º da Lei do Asilo, designadamente nas situações em que é aplicável o procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional, pois,
... Não só a Lei de Asilo não permite tal interpretação, como ainda não existe qualquer disposição legal que dispense a elaboração do referido relatório,
... Bem como, a decisão recorrida tem de ser considerada como relativa ao pedido de proteção internacional, uma vez que o considera inadmissível, nos termos do artigo 19.º-A al. a) da Lei do Asilo,
... Ora, tal decisão está, como tal, sujeita aos procedimentos vertidos nos artigos antecedentes, mormente às formalidades ínsitas no art. 17.º da Lei de Asilo.
... Ao decidir como decidiu, o Tribunal ad quem omite este facto considerado essencial para a pretensão do Recorrente, divergindo assim da jurisprudência uniformizada imposta, entre outros, pelo Acórdão supra referido.
N) Assim, decisão do Diretor Nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras de 17 de abril de 2018 viola os artigos 16.º e 17.º da Lei n.º 27/2006 de 30 de junho, com a redação que lhe foi dada pela Lei n.º 26/2014, de 5 de maio, interpretado em conformidade com o que dispõe designadamente o artigo 41.º, n.º 2 alínea a) da Carta dos Direitos fundamentais da União Europeia e do artigo 267.º, n.º 5 da Constituição, sendo por isso anulável nos termos do artigo 163.º, n.º 1 do CPA.
O) A questão que ora se coloca a esse Colendíssimo Tribunal é, por consequência, o saber-se se o Acórdão recorrido decidiu ou não contra jurisprudência uniformizada pelo Supremo Tribunal Administrativo, incorrendo ainda em violação da Lei, nos termos da alínea c) do n.º 3 do art. 142.º do CPTA, bem como se incorre em vício de violação de lei, por errada interpretação e aplicação do art. 17.º n.º 1 e 2 da Lei do Asilo …».

5. Devidamente notificado o R., aqui ora recorrido, não veio produzir contra-alegações [cfr. fls. 209 e segs.].

6. Pelo acórdão da formação de apreciação preliminar deste Supremo Tribunal, prevista no n.º 6 do art. 150.º do CPTA, datado de 01.03.2019, o presente recurso de revista foi admitido [cfr. fls. 216/217].

7. Notificado nos termos e para os efeitos do disposto nos arts. 146.º, n.º 1, e 147.º do CPTA [cfr. fls. 223], o digno Magistrado do Ministério Público junto deste Supremo Tribunal não emitiu qualquer parecer [cfr. fls. 224 e segs.].

8. Sem vistos, atento o disposto nos arts. 36.º, n.ºs 1 e 2, e 147.º do CPTA, o processo foi submetido à Conferência, cumprindo apreciar e decidir.


DAS QUESTÕES A DECIDIR
9. Constitui objeto de apreciação nesta sede o aferir se o acórdão do «TCA/S», ao haver negado provimento ao recurso de apelação deduzido pelo A., ora recorrente, incorreu, conforme alegado, em erro de julgamento, por errada interpretação e aplicação do disposto, mormente, nos arts. 16.º e 17.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 27/2008, de 30.06 [na redação pela lhe foi introduzida pela Lei n.º 26/2014, de 05.05] [diploma através do qual se procede ao estabelecimento de condições e procedimentos de concessão de asilo ou proteção subsidiária e os estatutos de requerente de asilo, de refugiado e de proteção subsidiária, transpondo para a ordem jurídica interna diversas diretivas comunitárias, nomeadamente, as Diretivas n.º 2003/09/CE, n.º 2004/83/CE, n.º 2005/85/CE, n.º 2011/95/UE, n.º 2013/32/UE, e n.º 2013/33/UE], em articulação com os arts. 41.º, n.º 2, al. a), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [CDFUE], 267.º, n.º 5, da Constituição da República Portuguesa [CRP], 153.º e 162.º, do Código de Procedimento Administrativo [CPA] [na redação introduzida pelo DL n.º 4/2015 - redação essa a que se reportarão todas as demais citações de normativos deste Código sem expressa menção em contrário] e do art. 142.º, n.º 3, al. c), do CPTA [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].


FUNDAMENTAÇÃO
DE FACTO
10. Resulta apurado nas instâncias o seguinte quadro factual:
I) O A. pediu asilo em Portugal em 26.02.2018, tendo tal pedido originado o processo de asilo n.º 632/18 PT.
II) A decisão impugnada é do seguinte teor:
«PROCESSO N.º 632/18PT
De acordo com o disposto na alínea a) do n.º 1, do artigo 19.º-A e no n.º 2 do artigo 37.º, ambos da Lei n.º 27/08, de 30 de junho, alterada pela Lei n.º 26/2014, de 05 de maio, com base na informação n.º 0626/GAR/2018 do Gabinete de Asilo e Refugiados do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, considero o pedido de proteção internacional apresentado pelo cidadão que se identificou como A…………, nacional de Senegal, inadmissível.
Proceda-se à notificação do cidadão nos termos do artigo 37.º, n.º 3, da Lei n.º 27/08, de 30 de junho, com as alterações introduzidas pela Lei n.º 26/2014 de 5 de maio, e à sua transferência, nos termos do artigo 38.º do mesmo diploma, para a Alemanha, Estado Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional nos termos do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho.
Lisboa, 17-04-2018,
…. Pelo’ Diretor Nacional …».
III) O A. foi notificado da decisão no dia 19.04.2018 - cfr. doc. junto à «p.i.».
IV) Da informação base sobre a qual recaiu a decisão impugnada consta o seguinte:
«
Dos motivos invocados no pedido de transferência
Aos 06.04.2018, o GAR apresentou um pedido de retoma a cargo às autoridades alemãs ao abrigo do artigo 18.º, n.º 1 b), do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho.
Consultado o sistema EURODAC, foi detetado dois Hit positivos com os "Case ID DE1131227MUC00354 e DE1150806MUC00903", inseridos pela Alemanha.
Aos 17.04.2018, as autoridades alemãs aceitaram o pedido de retoma a cargo do (a) cidadão (à), ao abrigo do artigo 18.º, n.º 1, d), do Regulamento (UE) 604/2013 do PE e do Conselho, de 26 de junho.
Pelo exposto, propõe-se que a Alemanha seja considerada o Estado responsável pela retoma a cargo, ao abrigo do artigo 18.º, n.º 1, d) do Regulamento (UE) n.º 604/2013 do Conselho de 26 de junho.
GAR, 17.04.2018
A Técnica Superior …».

«*»

DE DIREITO
11. Presente o quadro factual antecedente passemos, então, à apreciação do objeto de recurso e questões no mesmo suscitadas.

12. Insurge-se o A., aqui ora recorrente, contra o juízo firmado pelo «TCA/S» no acórdão recorrido, assacando a este erro de julgamento por interpretação e aplicação incorreta do disposto nos arts. 16.º e 17.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 27/2008 em articulação com os arts. 41.º, n.º 2, al. a), da CDFUE, 267.º, n.º 5, da CRP, 153.º e 162.º, do CPA e, bem assim, do art. 142.º, n.º 3, al. c), do CPTA, já que, como sustenta, foi preterido o seu direito de audiência no quadro do procedimento desenvolvido, direito esse cujo reconhecimento constituiria jurisprudência uniformizada deste Supremo Tribunal que foi infringida.

13. Refira-se, desde logo, que não procede minimamente a invocada infração da al. c) do n.º 3 do art. 142.º do CPTA e o consequente erro de julgamento acometido ao acórdão recorrido com tal fundamento, porquanto nem sobre a matéria em questão foi produzida uma qualquer jurisprudência uniformizada por este Supremo [cfr. art. 152.º do CPTA], nem o aludido preceito, enquanto contendo um mero elenco e definição das decisões judiciais que independentemente do valor da causa e da sucumbência são suscetíveis de recurso jurisdicional, permite fulminar com o vício de erro de julgamento uma decisão judicial que, alegadamente, esteja contra jurisprudência uniformizada pelo Supremo Tribunal Administrativo.

14. Convocando e cotejando o demais quadro normativo posto em evidência temos que, mostrando-se garantido o direito de asilo aos estrangeiros e aos apátridas perseguidos ou gravemente ameaçados de perseguição, em consequência de atividade exercida no Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual em favor da democracia, da libertação social e nacional, da paz entre os povos, da liberdade e dos direitos da pessoa humana, e, bem assim, aos estrangeiros e os apátridas que, receando com fundamento de serem perseguidos em virtude da sua raça, religião, nacionalidade, opiniões políticas ou integração em certo grupo social, não possam ou, por esse receio, não queiram voltar ao Estado da sua nacionalidade ou da sua residência habitual [cfr., nomeadamente, o art. 03.º da Lei n.º 27/2008], o procedimento destinado ao reconhecimento daquele direito terá de operar através de pedido de proteção internacional apresentado perante o SEF [cfr. arts. 10.º, 13.º e 23.º, do mesmo diploma legal], procedimento esse que pode gerar a necessidade de organização de procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional se, no seu âmbito, se vier a considerar que a responsabilidade pela análise daquele pedido pertence a outro Estado Membro, de acordo com o previsto no Regulamento (UE) n.º 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26.06.2013 [doravante Reg. (UE) n.º 604/2013 - e também denominado «Regulamento Dublim III»] [cfr. seus arts. 18.º, 19.º-A, 36.º e segs.].

15. E cabendo ao diretor nacional do SEF a competência para a apreciação de cada pedido de proteção internacional, tendo em conta o descrito no n.º 2 do art. 18.º da mesma Lei, se necessário com sujeição a tramitação acelerada [cfr. art. 19.º], temos que, quanto à análise que a decisão liminar dos mesmos faça, os pedidos podem ser considerados fundamentados [admissíveis] ou então, ao invés, infundados e inadmissíveis [cfr. arts. 18.º, 19.º, 19.º-A, e 20.º, n.ºs 1 a 3, do mesmo diploma], sendo que os primeiros, tendo prosseguido o procedimento com a devida instrução, serão depois objeto de decisão de concessão ou de recusa de proteção internacional [cfr. arts. 20.º, n.ºs 4 e 5, 27.º, 28.º e 29.º, do mesmo diploma].

16. Na situação sub specie constata-se que, em face do pedido de proteção internacional apresentado pelo aqui recorrente, deduzido em 26.02.2018 [cfr. n.º I) da matéria de facto apurada], e relativamente ao qual a Diretora Nacional do SEF dispunha de um prazo de 30 dias, contado da data de apresentação do pedido de proteção, para emitir decisão liminar de rejeição do mesmo por falta de fundamento ou inadmissibilidade [cfr. os referidos arts. 18.º, 19.º, 19.º-A, e 20.º, n.ºs 1 a 3], decisão essa que teria de ser devidamente fundamentada [cfr. o referido n.º 1 do art. 20.º], foi determinada a abertura de procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do referido pedido de proteção internacional [cfr. os referidos arts. 18.º, 19.º-A, 36.º e segs.], tendo o SEF no referido procedimento especial, através do seu Gabinete de Asilo e Refugiados, enviado, em 06.04.2018, pedido de tomada a cargo do requerente às autoridades alemãs, ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art. 18.º do Reg. (UE) n.º 604/2013, pedido esse que foi aceite em 17.04.2018 [cfr. n.ºs II) e IV) da mesma matéria de facto], e, em decorrência desta aceitação, foi proferida pela Diretora Nacional Adjunta do SEF a decisão impugnada, datada de 17.04.2018, a considerar o pedido de proteção como inadmissível [cfr. n.º II) da mesma matéria de facto].

17. Está em discussão nos autos o determinar se ocorreu ou não preterição do direito de audiência do A. no quadro do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do referido pedido de proteção internacional pelo mesmo formulado, em particular, determinar da aplicação ao referido procedimento daquilo que é o regime normativo decorrente dos arts. 16.º e 17.º, n.ºs 1 e 2, da Lei n.º 27/2008 em articulação com os arts. 41.º, n.º 2, al. a), da CDFUE, 267.º, n.º 5, da CRP, 153.º e 162.º, do CPA.
Analisemos, cotejando previamente o quadro normativo tido por pertinente.

18. O procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional mostra-se sujeito, como vimos, no plano interno à disciplina contida na Lei n.º 27/2008 [cfr. seu Capítulo IV, nomeadamente, os arts. 36.º e 37.º] e no plano do direito da União ao que se mostra previsto no Regulamento (UE) n.º 604/2013 [cfr., nomeadamente, no que releva para os autos aos seus arts. 03.º, 04.º, 05.º, 20.º e segs.].

19. Assim, estipula-se no art. 36.º daquela Lei [preceito inserido tal como o seguinte no Capítulo IV do diploma e relativo ao «procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional»] que «[q]uando haja lugar à determinação do Estado responsável pela análise de um pedido de proteção internacional é organizado um procedimento especial regulado no presente capítulo», derivando do art. 37.º, no que para aqui ora releva, que «[q]uando se considere que a responsabilidade pela análise do pedido de proteção internacional pertence a outro Estado membro, de acordo com o previsto no Regulamento (UE) n.º 604/2013 …, o SEF solicita às respetivas autoridades a sua tomada ou retoma a cargo» [n.º 1], e que uma vez aceite «a responsabilidade pelo Estado requerido, o diretor nacional do SEF profere, no prazo de cinco dias, decisão nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 19.º-A e do artigo 20.º, que é notificada ao requerente, numa língua que compreenda ou seja razoável presumir que compreenda, e é comunicada ao representante do ACNUR e ao CPR enquanto organização não governamental que atue em seu nome, mediante pedido apresentado, acompanhado do consentimento do requerente» [n.º 2], sendo que «a notificação prevista no número anterior é acompanhada da entrega ao requerente de um salvo conduto, a emitir pelo SEF segundo modelo a aprovar por portaria do membro do Governo responsável pela área da administração interna» [n.º 3], na certeza de que «[e]m caso de resposta negativa do Estado requerido ao pedido formulado pelo SEF, nos termos do n.º 1, observar-se-á o disposto no capítulo III» [n.º 7].

20. Resulta, ainda, do art. 17.º do mesmo diploma [preceito inserido no Capítulo III, relativo ao «procedimento», Secção I «disposições comuns»], que «[a]pós a realização das diligências referidas nos artigos anteriores, o SEF elabora um relatório escrito do qual constam as informações essenciais relativas ao pedido» [n.º 1], e que o referido relatório é «notificado ao requerente para que o mesmo se possa pronunciar sobre ele no prazo de cinco dias» [n.º 2] e «comunicado ao representante do ACNUR e ao CPR enquanto organização não governamental que atue em seu nome, desde que o requerente tenha dado o seu consentimento, para que aquela organização, querendo, se pronuncie no mesmo prazo concedido ao requerente» [n.º 3], sendo que «[o]s motivos da recusa de confirmação do relatório por parte do requerente são averbados no seu processo, não obstando à decisão sobre o pedido» [n.º 4].

21. Extrai-se, por seu turno, do art. 03.º do Regulamento (UE) n.º 604/2013, relativo ao acesso ao procedimento de análise de um pedido de proteção internacional, que «[o]s Estados-Membros analisam todos os pedidos de proteção internacional apresentados por nacionais de países terceiros ou por apátridas no território de qualquer Estado-Membro, inclusive na fronteira ou nas zonas de trânsito. Os pedidos são analisados por um único Estado-Membro, que será aquele que os critérios enunciados no Capítulo III designarem como responsável» [n.º 1], e que «[c]aso o Estado-Membro responsável não possa ser designado com base nos critérios enunciados no presente regulamento, é responsável pela análise do pedido de proteção internacional o primeiro Estado-Membro em que o pedido tenha sido apresentado. Caso seja impossível transferir um requerente para o Estado-Membro inicialmente designado responsável por existirem motivos válidos para crer que há falhas sistémicas no procedimento de asilo e nas condições de acolhimento dos requerentes nesse Estado-Membro, que impliquem o risco de tratamento desumano ou degradante na aceção do artigo 4.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o Estado-Membro que procede à determinação do Estado-Membro responsável prossegue a análise dos critérios estabelecidos no Capítulo III a fim de decidir se algum desses critérios permite que outro Estado-Membro seja designado responsável. Caso não possa efetuar-se uma transferência ao abrigo do presente número para um Estado-Membro designado com base nos critérios estabelecidos no Capítulo III ou para o primeiro Estado-Membro onde foi apresentado o pedido, o Estado-Membro que procede à determinação do Estado-Membro responsável passa a ser o Estado-Membro responsável» [n.º 2], sendo que «[o]s Estados-Membros mantêm a faculdade de enviar um requerente para um país terceiro seguro, sem prejuízo das regras e garantias previstas na Diretiva 2013/32/UE» [n.º 3].

22. E no art. 5.º do mesmo Regulamento mostra-se prevista a existência entrevista pessoal e sua disciplina, ali se dispondo que «[a] fim de facilitar o processo de determinação do Estado-Membro responsável, o Estado-Membro que procede à determinação realiza uma entrevista pessoal com o requerente. A entrevista deve permitir, além disso, que o requerente compreenda devidamente as informações que lhe são facultadas nos termos do artigo 4.º» [n.º 1], que «[a] realização da entrevista pode ser dispensada se: a) O requerente for revel; ou b) Depois de ter recebido as informações referidas no artigo 4.º, o requerente já tiver prestado por outros meios as informações necessárias para determinação do Estado-Membro responsável. Se a realização da entrevista for dispensada, o Estado-Membro deve dar ao requerente a oportunidade de apresentar novas informações relevantes para se proceder corretamente à determinação do Estado-Membro responsável antes de ser adotada uma decisão de transferência do requerente para o Estado-Membro responsável nos termos do artigo 26.º, n.º 1» [n.º 2], sendo que a entrevista pessoal deve realizar-se «em tempo útil e, de qualquer forma, antes de ser adotada qualquer decisão de transferência do requerente para o Estado-Membro responsável nos termos do artigo 26.º, n.º 1» [n.º 3], «numa língua que o requerente compreenda ou que possa razoavelmente presumir-se que compreenda, e na qual esteja em condições de comunicar. Caso necessário, os Estados-Membros designam um intérprete que esteja em condições de assegurar uma comunicação adequada entre o requerente e a pessoa que realiza a entrevista» [n.º 4] e «em condições que garantam a respetiva confidencialidade e é conduzida por uma pessoa competente ao abrigo da legislação nacional» [n.º 5], sendo que «[o] Estado-Membro que realiza a entrevista pessoal deve elaborar um resumo escrito do qual constem, pelo menos, as principais informações facultadas pelo requerente durante a entrevista. Esse resumo pode ser feito sob a forma de um relatório ou através de um formulário-tipo. O Estado-Membro assegura que o requerente e/ou o seu advogado ou outro conselheiro que o represente tenha acesso ao resumo em tempo útil» [n.º 6].

23. No quadro do regime do procedimento decorre do art. 20.º do mesmo Regulamento, no que releva, que «[o] processo de determinação do Estado-Membro responsável tem início a partir do momento em que um pedido de proteção internacional é apresentado pela primeira vez a um Estado-Membro» [n.º 1], considerando-se que «um pedido de proteção internacional foi apresentado a partir do momento em que as autoridades competentes do Estado-Membro em causa recebam um formulário apresentado pelo requerente ou um auto lavrado pela autoridade. No caso de um pedido não escrito, o período que medeia entre a declaração de intenção e a elaboração de um auto deve ser tão breve quanto possível» [n.º 2] e que «[o] Estado-Membro a que tiver sido apresentado pela primeira vez o pedido de proteção internacional é obrigado, nas condições previstas nos artigos 23.º, 24.º, 25.º e 29.º e a fim de concluir o processo de determinação do Estado-Membro responsável pela análise do pedido de proteção internacional, a retomar a cargo o requerente que se encontre presente noutro Estado-Membro sem título de residência ou aí tenha formulado um pedido de proteção internacional, após ter retirado o seu primeiro pedido apresentado noutro Estado-Membro durante o processo de determinação do Estado responsável» em que «[e]ssa obrigação cessa se o Estado-Membro que deve finalizar o processo de determinação do Estado-Membro responsável puder comprovar que o requerente abandonou, entretanto, o território dos Estados-Membros durante um período mínimo de três meses, ou obteve um título de residência emitido por outro Estado-Membro» e «[o]s pedidos apresentados depois do período de ausência referido no segundo parágrafo são considerados novos pedidos e dão lugar a um novo procedimento de determinação do Estado-Membro responsável» [n.º 5].

24. E tratando-se in casu de «pedido de retomada a cargo», já que estamos em face de situação abrangida pela al. b) do n.º 1 do art. 18.º do aludido diploma [ou seja, obrigação de retoma «a cargo, nas condições previstas nos artigos 23.º, 24.º, 25.º e 29.º, o requerente cujo pedido esteja a ser analisado e que tenha apresentado um pedido noutro Estado-Membro, ou que se encontre no território de outro Estado-Membro sem possuir um título de residência»], impõe-se atentar no disciplinado no seu art. 24.º, preceito onde se dispõe que «[s]e o Estado-Membro em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa referida no artigo 18.º, n.º 1, alíneas b), c) ou d), e em que não foi apresentado nenhum novo pedido de proteção internacional, considerar que o Estado Membro responsável é outro, nos termos do artigo 20.º, n.º 5, e do artigo 18.º, n.º 1, alíneas b), c), ou d), pode solicitar a esse outro Estado-Membro que retome essa pessoa a seu cargo» [n.º 1], que «[e]m derrogação do artigo 6.º, n.º 2, da Diretiva 2008/115/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 2008, relativa a normas e procedimentos comuns nos Estados-Membros para o regresso de nacionais de países terceiros em situação irregular, se o Estado-Membro, em cujo território se encontre, sem possuir um título de residência, a pessoa, decidir pesquisar o sistema Eurodac nos termos do artigo 17.º do Regulamento (UE) n.º 603/2013, o pedido de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.º, n.º 1, alíneas b) ou c) do presente regulamento, ou de uma pessoa referida no artigo 18.º, n.º 1, alínea d), cujo pedido de proteção internacional não tenha sido indeferido por decisão definitiva, é apresentado o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, no prazo de dois meses após a receção do acerto do Eurodac, nos termos do artigo 17.º, n.º 5, do Regulamento (UE) n.º 603/2013. Se o pedido de retomada a cargo se basear em elementos de prova diferentes dos dados obtidos através do sistema Eurodac, deve ser enviado ao Estado-Membro requerido no prazo de três meses a contar da data em que o Estado-Membro requerente toma conhecimento de que outro Estado-Membro pode ser responsável pela pessoa em causa» [n.º 2], sendo que «[o]s pedidos de retomada a cargo de uma pessoa referida no artigo 18.º, n.º 1, alíneas b), c) ou d), são feitos num formulário-tipo e devem conter as provas ou indícios descritos nas duas listas a que se refere o artigo 22.º, n.º 3, e/ou os elementos relevantes das declarações da pessoa em causa, que permitam às autoridades do Estado-Membro requerido verificar se é responsável, com base nos critérios definidos no presente regulamento …» [n.º 5], derivando, ainda, do artigo seguinte, respeitante à resposta ao pedido de retomada a cargo, que «[o] Estado-Membro requerido procede às verificações necessárias e toma uma decisão sobre o pedido de retomar a pessoa em causa a cargo o mais rapidamente possível e, em qualquer caso, dentro do prazo de um mês a contar da data em que o pedido foi recebido. Quando o pedido se baseie em dados obtidos através do sistema Eurodac, o prazo é reduzido para duas semanas» [n.º 1], e que «[a] falta de uma decisão no prazo de um mês ou no prazo de duas semanas referidos no n.º 1 equivale à aceitação do pedido, e tem como consequência a obrigação de retomar a pessoa em causa a cargo, incluindo a obrigação de tomar as providências adequadas para a sua chegada» [n.º 2].

25. E no quadro das garantias processuais, previstas na Secção IV do Regulamento em referência, extrai-se do seu art. 26.º que «[c]aso o Estado-Membro requerido aceite a tomada ou retomada a cargo de um requerente ou de outra pessoa referida no artigo 18.º, n.º 1, alíneas c) ou d), o Estado-Membro requerente deve notificar a pessoa em causa da decisão da sua transferência para o Estado-Membro responsável e, se for caso disso, da decisão de não analisar o seu pedido de proteção internacional. Se a pessoa em causa for representada por um advogado ou por outro conselheiro jurídico, os Estados-Membros podem optar por notificar a sua decisão ao representante, em vez de o fazerem à pessoa em causa, e, se for caso disso, comunicar a sua decisão à pessoa em causa» [n.º 1], e que «[a] decisão a que se refere o n.º 1 deve conter informações sobre as vias de recurso disponíveis, nomeadamente sobre o direito de requerer o efeito suspensivo, se necessário, e sobre os prazos aplicáveis para as utilizar, indicações precisas sobre os prazos para a execução da transferência, incluindo se necessário informações relativas ao local e à data em que a pessoa em causa se deve apresentar no caso de se dirigir para o Estado-Membro responsável pelos seus próprios meios» e «[o]s Estados-Membros asseguram que as informações sobre as pessoas ou entidades que possam prestar assistência jurídica à pessoa em causa lhes sejam comunicadas juntamente com a decisão referida no n.º 1, caso não tenham já sido comunicadas» [n.º 2], na certeza de que se a pessoa em causa «não for assistida ou representada por advogado ou outro conselheiro jurídico os Estados-Membros informam-na dos principais elementos da decisão, que deve sempre incluir informações sobre as vias de recurso disponíveis e os prazos aplicáveis para as utilizar, numa língua que compreenda ou que possa razoavelmente presumir-se que compreenda» [n.º 3], consagrando-se no art. 27.º aquilo que são as exigências e garantias a observar em sede de impugnação judicial.

26. Da análise do quadro normativo e diplomas convocados ressalta que no âmbito do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional não resulta uma expressa ou uma concreta previsão de um direito de defesa/audiência conferido ao requerente, ao invés do que decorre do regime procedimental comum previsto, nomeadamente, nos arts. 16.º, 17.º e 17.º-A da Lei n.º 27/2008 ainda em sede da fase de controlo liminar do pedido de proteção internacional e previamente à emissão da decisão fundamentada sobre os pedidos infundados e inadmissíveis [cfr. arts. 19.º a 20.º do mesmo diploma] e, depois, no art. 29.º, n.º 2 da referida lei após decurso da fase de instrução do procedimento e antes de emissão da decisão final de concessão ou de recusa de proteção internacional [arts. 21.º, 27.º a 29.º], nas situações em que havia sido proferida decisão liminar de admissibilidade do pedido de proteção internacional, e, bem assim, no art. 24.º, n.º 2, da mesma lei para o regime especial referente aos pedidos apresentados nos postos de fronteira.

27. Mas será que de uma tal conclusão poderemos inferir que no âmbito do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional se mostra afastado o direito de defesa/audiência do requerente daquele pedido?

28. A questão da preterição do direito de audiência no quadro dos procedimentos relativos aos pedidos de proteção internacional não é nova neste Supremo Tribunal, tendo o mesmo afirmado a necessidade de observância daquele direito e para tal fazendo apelo à aplicação, mormente, do disposto no citado art. 17.º da Lei n.º 27/2008 [cfr. os Acs. de 18.05.2017 - Proc. n.º 0306/17, de 04.10.2017 - Proc. n.º 01727/17.BELSB e de 20.12.2018 - Proc. n.º 0275/18.9BELSB (quanto à aplicabilidade do referido preceito também no quadro do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional); vide, ainda, o Ac. de 28.03.2019 - Proc. n.º 01143/18.0BELSB (quanto à aplicabilidade do mesmo normativo no quadro do procedimento comum relativo aos pedidos de proteção internacional);, todos consultáveis in: «www.dgsi.pt/jsta» - sítio a que se reportarão também todas as demais citações de acórdãos deste Tribunal sem expressa referência em contrário].

29. Consideramos ser de manter o entendimento de que no procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional se deve observar o direito de audiência.

30. Motivando e explicitando nosso juízo temos que o princípio da audiência prescrito, no plano interno, nos arts. 121.º e segs., do CPA, enquanto princípio estruturante de cada procedimento administrativo, assume-se como uma dimensão qualificada do princípio da participação a que se alude no art. 12.º do mesmo código, e surge na sequência e em cumprimento da diretriz constitucional inserta no art. 267.º, n.ºs 1 e 5, da CRP, constituindo uma manifestação do princípio do contraditório/defesa através da possibilidade não só do confronto dos critérios da Administração com os dos administrados de modo a poderem ser obtidas plataformas de entendimento, mas, também, da possibilidade de estes apontarem razões e fundamentos, quer de facto quer de direito, que invalidem o caminho que a Administração intenta percorrer e levem a que outro seja o sentido da decisão, na certeza de que o seu afastamento, ou a sua dispensa, exigem que a concreta situação tenha ou encontre enquadramento na previsão do art. 124.º do CPA.

31. Por sua vez, temos, também, que, no plano do direito da União, o princípio do respeito dos direitos de defesa constitui um seu princípio geral e fundamental [hoje consagrado nos arts. 48.º e 49.º da CDFUE e, também, no art. 41.º da mesma Carta] e que é aplicável sempre que a Administração se proponha adotar, relativamente a uma pessoa, um ato lesivo dos seus interesses, sendo que, por força do mesmo princípio, os destinatários de decisões que afetam de modo sensível os seus interesses devem ter a possibilidade de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre os elementos com base nos quais a Administração tenciona tomar a sua decisão, na certeza de que esta obrigação incumbe às Administrações dos Estados-Membros, sempre que estas tomem decisões que entram no âmbito de aplicação do direito da União, e mesmo que a legislação da União aplicável não preveja expressamente essa formalidade [cfr. entre outros, os Acs. do TJUE de 28.03.2000, «Krombach» (C-7/98, § 42), de 18.12.2008, «Sopropé» (C-349/07, §§ 33, 36 e 49), de 22.11.2012, «M.» (C-277/11, §§ 49, 81 a 83, 86/87), de 18.07.2013, «Comissão e o./Kadi» (C-584/10 P, C-593/10 P e C-595/10 P, §§ 98 e 99), de 10.09.2013, «G. e R.» (C-383/13 PPU, §§ 32 e 35), de 03.07.2014, «Kamino International Logistics» (C-129/13, §§ 28 e 29), de 05.11.2014, «Mukarubega» (C-166/13, §§ 43 a 47, 49/50), de 11.12.2014, «Boudjlida» (C-249/13, §§ 30 a 37, 39/40), de 17.12.2015, «WebMindLicenses» (C-419/14, § 84 e jurisprudência referida), e de 09.11.2017, «Ispas» (C-298/16, § 26), todos consultáveis in: «https://curia.europa.eu/jcms/jcms/j_6/pt/» - sítio a que se reportarão também todas as demais citações de acórdãos daquele Tribunal sem expressa referência em contrário].

32. Atente-se que o sentido e o entendimento sustentados quanto à necessidade de observância do direito de audiência e de defesa, encontram fundamentação, também, no que se mostra expresso nos considerandos 17.º a 19.º do Reg. (UE) n.º 604/2013, quando ali se refere, nomeadamente, que «[o]s Estados-Membros deverão ter a possibilidade de afastar a aplicação dos critérios de responsabilidade, em especial por razões humanitárias e compassivas, a fim de permitir reunir membros da família, familiares ou outros parentes, e de analisar um pedido de proteção internacional que lhes tenha sido apresentado, ou a outro Estado-Membro, mesmo que tal análise não seja da sua responsabilidade nos termos dos critérios vinculativos previstos no presente regulamento» e que «[d]everá ser realizada uma entrevista pessoal com o requerente a fim de facilitar a determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional. Logo que o pedido de proteção internacional seja apresentado, o requerente deverá ser informado da aplicação do presente regulamento e, para facilitar o processo de determinação do Estado-Membro responsável, da possibilidade de, durante a entrevista, facultar informações acerca da presença de membros da família, de familiares ou de outros parentes nos Estados-Membros», bem como de que a fim de garantir a proteção efetiva dos direitos das pessoas em causa «deverão ser previstas garantias legais e o direito efetivo de recurso contra as decisões de transferência para o Estado-Membro responsável, nos termos, nomeadamente, do artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. A fim de garantir o respeito do direito internacional, o direito efetivo de recurso contra essas decisões deverá abranger a análise da aplicação do presente regulamento e da situação jurídica e factual no Estado-Membro para o qual o requerente é transferido».

33. E o mesmo sentido perpassa expresso no considerando 25.º da Diretiva n.º 2013/32/UE [disciplinadora dos procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional] onde se pode ler que «[p]ara que seja possível identificar corretamente as pessoas que necessitam de proteção enquanto refugiados na aceção do artigo 1.º da Convenção de Genebra ou enquanto pessoas elegíveis para proteção subsidiária, os requerentes deverão ter acesso efetivo aos procedimentos, a possibilidade de cooperarem e comunicarem devidamente com as autoridades competentes de forma a exporem os factos relevantes da sua situação e garantias processuais suficientes para defenderem o seu pedido em todas as fases do procedimento», a que «[a]cresce que o procedimento de apreciação de um pedido de proteção internacional deverá normalmente proporcionar ao requerente, pelo menos, o direito de permanecer no território na pendência da decisão do órgão de decisão, o acesso aos serviços de um intérprete para apresentação do caso se for convocado para uma entrevista pelas autoridades, a oportunidade de contactar um representante do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e organizações que prestem aconselhamento aos requerentes de proteção internacional, o direito a uma notificação adequada da decisão, a fundamentação dessa decisão em matéria de facto e de direito, a oportunidade de recorrer aos serviços de um advogado ou outro consultor e o direito de ser informado da sua situação jurídica nos momentos decisivos do procedimento, numa língua que compreenda ou seja razoável presumir que compreenda, bem como, no caso de uma decisão de indeferimento, o direito a um recurso efetivo perante um órgão jurisdicional».

34. Ora presente os quadros principiológico e normativo acabados de explicitar entendemos que o direito de audição/defesa do aqui A. no âmbito do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela apreciação do pedido de proteção internacional, ainda que não expressamente previsto no regime procedimental definido no art. 37.º da Lei n.º 27/2008, deve ter-se, todavia, como imposto e de ser exigida a sua observância no seu seio, sob pena de infração dos comandos/princípios e normativos convocados.

35. Atente-se que quando as condições em que deve ser assegurado o respeito dos direitos de defesa dos nacionais de países terceiros em situação irregular não se mostram fixadas de modo expresso pelo direito da União essas condições e suas consequências terão, tal como constitui jurisprudência do TJUE, de ser regidas pelo direito nacional, desde que as medidas adotadas neste sentido sejam equivalentes àquelas de que beneficiam os particulares em situações de direito nacional comparáveis [princípio da equivalência] e não tornem, na prática, impossível ou excessivamente difícil o exercício dos direitos de defesa conferidos pela ordem jurídica da União [princípio da efetividade] [cfr., entre outros, os Acs. de 18.12.2008, «Sopropé» (C-349/07, § 38), de 18.03.2010, «Alassini» (C-317/08 e C-320/08, § 49), de 19.05.2011, «Iaia e o..» (C-452/09, § 16), de 10.09.2013, «G. e R.» (C-383/13 PPU, § 35), de 05.11.2014, «Mukarubega» (C-166/13, § 51), e de 11.12.2014, «Boudjlida» (C-249/13, § 41)].

36. Neste quadro e enquadramento temos que o respeito pelo direito a ser ouvido ou de audição cumprir-se-á se fizermos uma leitura articulada do art. 16.º da Lei n.º 27/2008, respeitante à tomada de declarações/entrevista, com o art. 05.º do Regulamento (UE) n.º 604/2013, também ele relativo à entrevista pessoal do requerente do pedido de proteção internacional e onde se prevê a possibilidade de o «resumo» da entrevista assumir a forma de «relatório» ou de um «formulário-tipo» e em que cada Estado-Membro terá de assegurar que o requerente e/ou o seu advogado ou outro conselheiro que o represente tenham «acesso ao resumo em tempo útil».

37. E dessa leitura articulada e conjugada ressalta a imposição, também, no quadro do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela apreciação do pedido de proteção internacional, e em que a referida entrevista constitui ato procedimental ou pelo menos peça documental, que ao requerente, na entrevista/relatório ou após a mesma e chegada da resposta do Estado requerido, o mesmo tenha sido ouvido, ou lhe tenha sido dada a possibilidade de produzir defesa, de emitir ou tomar posição, quanto à decisão a tomar em decorrência da aceitação ou de uma eventual aceitação da responsabilidade pelo Estado requerido da tomada ou retoma a cargo, explicitando, nessa sede da entrevista ou até mesmo em momento posterior à mesma, a sua motivação sobre o Estado-Membro que entende dever apreciar o pedido pelo mesmo formulado, mediante a alegação ou explicitação daquilo que constitui a sua situação jurídica e factual no Estado-Membro para o qual o requerente é transferido, conferindo-se-lhe, assim, a possibilidade de afastar a aplicação dos critérios de responsabilidade, em especial por razões humanitárias e compassivas, tudo tendo presente o regime que resulta definido, mormente, nos arts. 03.º, 05.º, 07.º, 17.º, e 24.º, todos do Regulamento (UE) n.º 604/2013, 02.º, n.º 5, e 121.º, ambos do CPA, e 267.º, n.º 5, da CRP.

38. No contexto de desenvolvimento e articulação dos procedimentos e questões nos mesmos debatidas temos que, de harmonia com o atrás referido e quadro normativo convocado, deve ser dada ao destinatário da decisão lesiva dos seus interesses a possibilidade de, antes de a mesma ser tomada, apresentar as suas observações ou invocar determinados elementos relativos à sua situação pessoal que militam num determinado sentido da decisão a ser proferida, ou a não o ser ou a ter determinado conteúdo, de modo a permitir que a autoridade competente tenha utilmente em conta todos os elementos pertinentes no momento em que e com que sentido vai decidir.

39. Com efeito, resulta do art. 05.º do Regulamento (UE) n.º 604/2013 em conjugação com o art. 16.º da Lei n.º 27/2008 que a entrevista pessoal/tomada de declarações «deve realizar-se em tempo útil e, de qualquer forma, antes de ser adotada qualquer decisão de transferência do requerente para o Estado-Membro responsável» e que o Estado-Membro que realiza a entrevista pessoal/tomada declarações «deve elaborar um resumo escrito do qual constem, pelo menos, as principais informações facultadas pelo requerente durante a entrevista», sendo que esse resumo «pode ser feito sob a forma de um relatório ou através de um formulário-tipo», impondo-se ao mesmo Estado-Membro o dever de assegurar que, quanto a esse resumo, «o requerente e/ou o seu advogado ou outro conselheiro que o represente tenha acesso … em tempo útil», diligências/procedimentos e exigências que se ancoram na necessidade de observância do dever de audiência e de defesa com o alcance definido e que estão presentes, inclusive, nas situações que no art. 05.º do mesmo Regulamento justificam a dispensa da entrevista, pois, mesmo nessas situações se impõe, ou se exige, que o Estado-Membro dê «ao requerente a oportunidade de apresentar novas informações relevantes para se proceder corretamente à determinação do Estado-Membro responsável antes de ser adotada uma decisão de transferência do requerente para o Estado-Membro responsável nos termos do artigo 26.º, n.º 1».

40. Cumpre referir que, ainda que segundo a jurisprudência assente do TJUE [cfr., entre outros, os Acs. de 18.03.2010, «Alassini» (C-317/08 e C-320/08, § 63), de 10.09.2013, «G. e R.» (C-383/13 PPU, § 33), de 26.09.2013, «Texdata Software» (C-418/11, § 84), de 05.11.2014, «Mukarubega» (C-166/13, §§ 53/54), e de 11.12.2014, «Boudjlida» (C-249/13, § 43)] «os direitos fundamentais, como o respeito dos direitos de defesa, não constituem prerrogativas absolutas, mas podem comportar restrições, na condição de estas responderem efetivamente a objetivos de interesse geral prosseguidos pela medida em causa e não constituírem, à luz da finalidade prosseguida, uma intervenção desmedida e intolerável que atente contra a própria substância dos direitos assim garantidos» e de que «a existência de uma violação dos direitos de defesa deve ser apreciada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto» [cfr., nomeadamente, os Acs. de 25.10.2011, «Solvay/Comissão» (C-110/10 P, § 63), e de 05.11.2014, «Mukarubega» (C-166/13, §§ 53/54)], nomeadamente, «da natureza do ato em causa, do contexto em que foi adotado e das normas jurídicas que regem a matéria em causa» [vide, entre outros, os Acs. do TJUE de 18.07.2013, «Comissão e o./Kadi» (C-584/10 P, C-593/10 P e C-595/10 P, § 102), de 10.09.2013, «G. e R.» (C-383/13 PPU, § 33), e de 05.11.2014, «Mukarubega» (C-166/13, § 54)], temos que, na concreta situação sub specie, presente a jurisprudência do TJUE relativa ao respeito dos direitos de audição/defesa e o quadro normativo do direito da União, mormente, o previsto no Regulamento (UE) n.º 604/2013, e, bem assim, o próprio quadro normativo no plano interno, não se descortina que dos mesmos se extraia, em função de outros princípios e interesses gerais que importasse considerar, a existência de um concreto propósito ou intenção de afastamento ou de restrição neste tipo de procedimento daqueles direitos.

41. Reiterado, pois e à luz da motivação ora exposta, o entendimento deste Supremo quanto à imposição de observância do direito de audiência no procedimento especial de determinação do Estado responsável pela análise do pedido de proteção internacional com o âmbito e alcance que ora se mostra explicitado [cfr. arts. 03.º, 05.º, 07.º, 17.º, e 24.º, todos do Regulamento (UE) n.º 604/2013, 02.º, n.º 5, e 121.º, ambos do CPA, e 267.º, n.º 5, da CRP] e revertendo ao caso sub specie temos que, analisada a matéria de facto apurada [cfr. n.ºs I) a IV)] e tendo presente aquilo que constitui o teor do procedimento administrativo desenvolvido, mormente o teor da entrevista/auto de declarações realizado ao A. e que se mostra documentado no «PA» incorporado nos autos [vide fls. 39/97 dos presentes autos, especialmente, fls. 62/66], ao A. não foi facultada ou conferida, nem em sede de entrevista/declarações [«auto de declarações»] nem posteriormente às mesmas, qualquer possibilidade de contraditório/defesa ou de pronúncia quanto à decisão ou eventual decisão a tomar no quadro do procedimento especial de determinação do Estado responsável pela apreciação do pedido de proteção internacional pelo mesmo formulado, permitindo-lhe alegar ou explicitar aquilo que constitui a sua situação jurídica e factual no Estado-Membro para o qual o mesmo será eventualmente transferido, e a possibilidade de afastar a aplicação dos critérios de responsabilidade, em especial o apelo ao regime derrogatório respeitante às «cláusulas discricionárias» [cfr. art. 17.º do Regulamento (UE) n.º 604/2013], mormente, por razões humanitárias e compassivas, razão pela qual se mostra infringido tal direito/princípio consagrado no quadro normativo supra convocado, padecendo o ato impugnado da ilegalidade de preterição do direito de audiência que resulta invocada nos autos.

42. Refira-se, por último, que a invocação ou o apelo feito pelo A. à infração do art. 41.º da CDFUE mostra-se, in casu, como improcedente, porquanto, tal preceito, como constitui jurisprudência reiterada do TJUE, não se dirige aos Estados-Membros, mas unicamente às instituições, órgãos e organismos da União, pelo que o requerente do pedido de proteção internacional no contexto do presente procedimento deduzido perante um Estado-Membro não pode retirar do n.º 2 do artigo em referência ou nele fundar a existência de um direito a ser ouvido no quadro do procedimento [cfr., entre outros, os Acs. do TJUE de 02.12.2011, «Cicala» (C-482/10, § 28), de 17.07.2014, «YS e o.» (C-141/12 e C-372/12, § 67), de 05.11.2014, «Mukarubega» (C-166/13, §§ 43/44), de 11.12.2014, «Boudjlida» (C-249/13, §§ 32/33)], entendimento este que não belisca ou afasta tudo o que supra se afirmou em termos da existência dos direitos de audição/defesa e do seu valor como princípio geral e fundamental nos vários planos dos ordenamentos jurídicos e do seu concreto assento normativo.

43. Assim, de harmonia com o exposto, não poderá manter-se o entendimento firmado pelas instâncias, impondo-se a revogação do acórdão recorrido, com as devidas e legais consequências.




DECISÃO
Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em:
A) conceder provimento ao recurso jurisdicional sub specie e revogar o acórdão recorrido;
B) julgar a presente ação administrativa procedente e, em consequência, anular o ato impugnado.
Não são devidas custas [cfr. art. 84.º da Lei n.º 27/2008].
DN.



Lisboa, 30 de maio de 2019. – Carlos Luís Medeiros de Carvalho (relator) – Maria Benedita Malaquias Pires Urbano – Jorge Artur Madeira dos Santos (com declaração de voto, que junto).
DECLARAÇÃO DE VOTO

Discordo da fundamentação do acórdão.
O direito de audiência não se exerce «no âmbito do procedimento especial de determinação do Estado responsável», como afirma o acórdão; pois, nesse «âmbito» (que corresponde ao teor do art. 37º da Lei n.º 27/2008), ele não está previsto. E o Reg. (EU) n.º 604/2013, até pela sua manifesta fluidez, também não contém essa previsão procedimental.
Tal direito de audiência exerce-se, sim, no procedimento principal, que não se extingue pela emergência, «a latere», do procedimento especial e incidental de determinação do Estado responsável - como claramente mostra o art. 39º do diploma (ao considerar a suspensão de prazos do procedimento principal).
E o «situs» adequado para o exercício de tal direito consta do art. 17º da Lei n.º 27/2008, onde se diz que o requerente se pode pronunciar sobre o «relatório» aí referido.
Tem sido esta, aliás, a jurisprudência do Supremo na matéria. E, ao menos por enquanto, não vejo razões concludentes que imponham a sua revisão.

Jorge Artur Madeira dos Santos