Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01359/18.9BELRS
Data do Acordão:04/03/2019
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FRANCISCO ROTHES
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL
RECLAMAÇÃO
ACTO LESIVO
Sumário:I - A mera informação recolhida pelo executado na sua área pessoal do Portal das Finanças relativamente a uma execução fiscal que pende contra ela não constitui uma decisão do órgão da execução fiscal, nem sequer um acto praticado nesse processo susceptível de lesar qualquer interesse legítimo ou direito do executado, motivo por que não pode ser objecto de reclamação deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do CPPT.
II - Através do expediente referido em I, não pode o executado reabrir o prazo para discutir judicialmente decisões do órgão da execução fiscal que se consolidaram na ordem jurídica por falta de oportuna impugnação judicial.
Nº Convencional:JSTA000P24401
Nº do Documento:SA22019040301359/18
Data de Entrada:03/12/2019
Recorrente:A......,S.A.
Recorrido 1:AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: 1. RELATÓRIO

1.1 A sociedade acima identificada (adiante Recorrente ou Executada) recorre para o Supremo Tribunal Administrativo da sentença por que o Tribunal Tributário de Lisboa absolveu a Fazenda Pública da instância na reclamação por ela deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) da decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa, no entendimento de que a reclamação carecia de objecto, uma vez que não se dirigia a acto lesivo susceptível de impugnação.

1.2 Com o requerimento de interposição do recurso apresentou a respectiva motivação, que resumiu em conclusões do seguinte teor:

«1- A Recorrente deduziu reclamação da notificação recebida, via Portal das Finanças para o pagamento da quantia exequenda constante do PEF 3247201301208080.

2- Foi relativamente a esse pedido e tão só relativamente ao mesmo e à sua manifesta ilegalidade que a Recorrente deduziu a sua reclamação, pelo que a mesma deveria ter sido apreciada pelo Tribunal recorrido não devendo ter sido considerada a excepção invocada pela AT.

3- Na medida em que está a correr um processo de impugnação da dívida exequenda qualquer pedido dessa natureza é desadequando e extemporâneo.

4- Dever por isso, ser revogada a decisão preferida pela 1.ª Instância e apreciado o pedido formulado pela Recorrente».

1.3 O recurso foi admitido a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito devolutivo.

1.4 Não foram apresentadas contra-alegações.

1.5 Recebidos os autos neste Supremo Tribunal Administrativo e dada vista ao Ministério Público, o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que seja negado provimento ao recurso, com a seguinte fundamentação: «[…]

Se bem interpretamos as conclusões da recorrente, esta imputa, também, à decisão recorrida o vício formal de omissão de pronúncia.
Existe omissão de pronúncia quando se verifica a violação do dever processual que o tribunal tem em relação às partes, de se pronunciar sobre todas as questões por elas suscitadas.
Para se estar perante uma questão é necessário que haja a formulação do pedido de decisão relativo a matéria de facto ou de direito sobre uma concreta situação de facto ou de direito sobre que existem divergências, formuladas com base em alegadas razões de facto e de direito (acórdão do STA, de 29/04/2008-recurso n.º 18150, AP-DR, de 30/11/2001, página 1311).
Nos termos do disposto no artigo 608.º/1 do CPC a sentença conhece, em primeiro lugar, das questões processuais que possam determinar a absolvição da instância, segundo a ordem imposta pela sua precedência lógica, sendo certo que nos termos do número 2 o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excepto aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
O Tribunal não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir o conhecimento oficioso de outras (artigo 608.º/2 do CPC), sob pena de nulidade por excesso de pronúncia.
Nos termos do estatuído no artigo 615.º/1/ d) do CPC a sentença é nula quando deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Ora, parece evidente que não ocorre o apontado vício de omissão de pronúncia.
De facto, o tribunal recorrido considerou que inexiste qualquer acto, nomeadamente lesivo dos direitos e interesses legítimos da recorrente, pelo que considerou verificada a excepção dilatória de falta de objecto da reclamação, o que consubstancia excepção dilatória, de conhecimento oficioso, determinante da absolvição da instância da entidade requerida.
Como parece claro, a procedência de tal excepção determina que não se possa conhecer do mérito da causa.
Não se verifica, pois, qualquer nulidade da decisão recorrida, por omissão de pronúncia.
Em nosso entendimento parece certo que a presente reclamação não tem por objecto qualquer acto contenciosamente sindicável.
Resulta do estatuído no artigo 276.º do CPPT que podem ser objecto de reclamação judicial quaisquer actos que tenham potencialidade lesiva praticados no processo de execução fiscal (Sobre o tema ver CPPT, anotado e comentado, 6.ª edição, 2011, IV volume páginas 267/272, Juiz conselheiro Jorge Lopes de Sousa).
Ora, como bem refere o MP junto da 1.ª instância, cujo discurso fundamentador se acompanha, o documento que, no entender da recorrente, consubstancia o alegado acto lesivo sindicado, não constitui qualquer notificação de acto praticado pela AT, tem natureza meramente informativa, nada inovando na esfera jurídica da reclamante/recorrente, não constituindo qualquer acto lesivo e, como tal sindicável contenciosamente».

1.6 Com dispensa dos vistos dos Conselheiros adjuntos, atento o carácter urgente do processo, cumpre apreciar e decidir a questão de saber se a sentença fez correcto julgamento quando entendeu que inexistia acto lesivo susceptível de ser sindicado judicialmente através da reclamação deduzida pela Executada ao abrigo do art. 276.º do CPPT, motivo por que esta carecia de objecto, a determinar a absolvição da Fazenda Pública da instância.


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2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1 DE FACTO

A Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa deu como provados os seguintes factos:

«a) Em 12/11/2013, o serviço de finanças de Lisboa-2 instaurou à sociedade A…….. S.A, o Processo de Execução Fiscal n.º 3247201301208080, para cobrança coerciva de uma dívida de IRC, relativa ao ano de 2011, no valor global de € 1.265.886,96 - autuação de fls. 1 do PEF e certidão de dívida de fls. 2 do PEF, apenso aos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais;

b) Por requerimento, apresentado no serviço de finanças em 18/12/2013, a ora Reclamante apresentou garantia bancária, emitida pelo Banco BNP PARIBAS, no valor de € 1.611.142,65 para efeitos de suspensão do processo de execução fiscal - documento, junto a fls. 10 do PEF, apenso aos autos, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

c) Mediante a qual o Banco, id. na alínea antecedente, se obrigava como fiador e principal pagador a proceder ao pagamento à AT das quantias devidas até ao valor máximo da garantia se a dívida se viesse a manter após a decisão sobre a reclamação/impugnação judicial/recurso, após trânsito em julgado - citado doc. junto a fls. 10 do PEF

d) Constava ainda do documento da garantia bancária prestada, pelo Banco, que esta seria válida “Até uma decisão final/trânsito em julgado da decisão sobre o procedimento administrativo e/ou procedimento judicial favorável à A……… S.A. - citado doc. junto a fls. 10 do PEF.

e) A Administração Tributária, por despacho proferido a 08/01/2014, devidamente notificado à ora Reclamante, aceitou a “título condicional” a garantia, a que se referem as alíneas anteriores, fazendo depender essa aceitação de uma correcção ao texto da garantia bancária, que seria a supressão da expressão “favorável”, do parágrafo transcrito na alínea d) antecedente ou a apresentação de nova garantia, redigida sem a referida expressão “favorável” - despacho de fls. 29 do PEF, apenso aos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido e facto admitido por acordo das partes.

f) Em 15/01/2014, foi instaurado pela ora Reclamante, processo de impugnação judicial que corre termos no TT de Lisboa sob o n.º 2399/13, no qual é sindicada a liquidação de IRC, subjacente à presente execução fiscal - consulta do SITAF e facto admitido por acordo das partes.

f) O processo de execução fiscal em apreço foi, entretanto, suspenso, situação na qual ainda hoje se mantém, porém, após vicissitudes várias, em 27/12/2016 foi revogado o despacho, identificado na alínea e), por despacho proferido pela Directora Adjunta da Direcção de Finanças de Lisboa, que indeferiu o pedido de prestação de garantia por idoneidade uma vez que aquela garantia só se aplicaria em caso de desfecho judicial favorável à Impugnante A…….. S.A. - despacho e restante documentação, junta aos autos pela F.P., a 05/11/2018, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

g) O referido despacho foi regularmente notificado à ora Reclamante por ofício registado, por esta recepcionado em 20/09/2017 - citados documentos, juntos aos autos a 05/11/2017.

h) A ora Reclamante não reclamou do despacho, id. na alínea antecedente, que considerou a garantia inidónea, “pois que, o mesmo obrigava a que a AT devolvesse a garantia que não considerava idónea, para que a Reclamante procedesse à sua substituição” - requerimento apresentado a 12/11/2018 cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido.

i) O doc. n.º 1, junto aos autos pela Reclamante, é um “print” extraído do Portal das Finanças, de local acessível apenas ao contribuinte, que informa, na data consultada pelo contribuinte: 18/06/2018 se encontrar pendente na rubrica “Dívidas à AT - Impostos englobados na conta corrente”, em sede do PEF em apreço, instaurado em 12/11/2013, a quantia de € 1.446.098,02 - documento, junto aos autos pela Reclamante como doc. n.º 1, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido.

j) Em 29/07/2018 foi enviado, por correio o presente meio processual ao serviço de finanças - doc. de fls. 2 dos autos, cujo conteúdo aqui se dá por reproduzido».


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2.2 DE DIREITO

2.2.1 A QUESTÃO A APRECIAR E DECIDIR

A questão que ora cumpre apreciar é apenas a de saber se a sentença decidiu correctamente quando absolveu a Fazenda Pública da instância na reclamação deduzida pela Executada ao abrigo do art. 276.º e segs. do CPPT, no entendimento de que naquela reclamação não era solicitada a sindicância judicial de acto lesivo algum praticado no âmbito da execução fiscal. Vejamos:
No âmbito de uma execução fiscal, a sociedade executada apresentou uma garantia bancária em ordem à suspensão do processo até que estivesse decidida a impugnação judicial que deduziu contra a liquidação do imposto que está na origem da dívida exequenda.
Essa garantia foi aceite “sob condição”, uma vez que o órgão da execução fiscal considerou que a mesma tinha um erro nos termos na sua redacção – no segmento em que afirmava que a manutenção da mesma era «Até uma decisão final/trânsito em julgado da decisão sobre o procedimento administrativo e/ou procedimento judicial favorável à A…….. S.A.» –, entendendo o órgão da execução fiscal que a aceitação da garantia dependia da correcção do texto, no qual deveria ser suprimida a expressão “favorável” ou ser apresentada nova garantia que respeitasse essa condição.
A Executada não reagiu contra essa decisão do órgão da execução fiscal.
Não obstante, a execução fiscal ficou suspensa e mantém-se suspensa – de acordo com a factualidade dada como assente [cfr. alínea f) dos factos provados] –, apesar do despacho de aceitação “sob condição” da garantia ter sido revogado por decisão da Directora Adjunta da Direcção de Lisboa, proferida em 27 de Dezembro de 2016 e notificada em 20 de Setembro de 2017 à Executada, decisão que esta não impugnou [cfr. alíneas f), g) e h) dos factos provados].
Entretanto, a Executada, na sequência de uma consulta efectuada em 18 de Junho de 2018 à sua área reservada no Portal das Finanças, verificou que aí constava como pendente, sob a rubrica “Dívidas à AT - Impostos englobados na conta corrente”, o processo de execução fiscal n.º 3247201301208080, instaurado em 12 de Novembro de 2013, e que prosseguia para cobrança coerciva de uma dívida de € 1.446.098,02, informação da qual extraiu uma impressão em papel [cfr. alínea i) dos factos provados].
Foi na sequência desse consulta e da informação por ela obtida que a Executada veio apresentar a presente reclamação, deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do CPPT, na qual identificou como acto reclamado o “pedido de pagamento” de que diz ter sido notificada através do Portal das Finanças em 18 de Junho de 2018. Com a petição inicial de reclamação apresentou como documento (com o n.º 1) a impressão que fez em papel da referida consulta.
Sustentou que esse documento corporizava a notificação que lhe foi efectuada para pagar, ao arrepio da suspensão do processo executivo.
O Tribunal Tributário de Lisboa, apreciando a reclamação, julgou verificada a excepção dilatória inominada de falta de objecto da acção, motivo por que absolveu a Fazenda Pública da instância.
A Execução discordou da sentença e dela recorreu para este Supremo Tribunal.
Se bem interpretamos a motivação do recurso, a Recorrente, desprezando ou, pelo menos, alheando-se da fundamentação aduzida na sentença, que não se esforça por rebater, reitera que a informação que obteve através da consulta ao Portal das Finanças constitui uma notificação para efectuar um pagamento, acto ilegal porque a execução está suspensa enquanto se discute a legalidade da liquidação que deu origem à dívida exequenda.
Cumpre, pois, averiguar se a sentença fez correcto julgamento quando, considerando que a reclamação carecia de objecto, por não se referir a uma decisão do órgão da execução fiscal nem a qualquer acto lesivo nela praticado, absolveu a Fazenda Pública da instância com fundamento nessa excepção dilatória inominada.

2.2.2 DA FALTA DE OBJECTO DA RECLAMAÇÃO

A sentença recorrida deu resposta adequada e bem fundamentada à pretensão que lhe foi apresentada pela Executada, não merecendo censura. Bem pelo contrário, revemo-nos plenamente da sua fundamentação, para a qual remetemos, reproduzindo-a aqui:
«Decorre do artigo 276.º do Código de Procedimento e Processo Tributário que são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância as decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado.
Também o artigo 97.º, n.º 1 do mesmo diploma legal prevê, como parte integrante do chamado processo judicial tributário, o recurso, no próprio processo, dos actos praticados na execução fiscal.
E o artigo 103.º, n.º 2 da Lei Geral Tributária garante aos interessados o direito de reclamação para o juiz da execução fiscal dos actos materialmente administrativos praticados por órgãos da administração tributária, nos termos do número anterior.
Do ponto de vista orgânico, os actos susceptíveis de reclamação serão, pois, aqueles que se exteriorizem mediante decisões proferidas pelo órgão de execução fiscal e outras autoridades da Administração Tributária e, do ponto de vista material, devem ser actos que afectem os direitos e interesses legítimos do executado (Neste sentido Joaquim Freitas Rocha, Lições de Procedimento e Processo tributário, 4.ª edição, pág. 357).
E, como refere Jorge Lopes de Sousa (in “Código de Procedimento e de Processo Tributário”, Áreas Editora, 2011, III Vol., pag. 305): “(…) a Constituição garante o direito à tutela judicial efectiva de direitos e interesses legítimos em matéria de contencioso administrativo (art. 268.º, n.º 4) em que se engloba o tributário. O alcance da tutela judicial efectiva, não se limita à possibilidade de reparação dos prejuízos provocados por uma actuação ilegal, comissiva ou omissiva, da Administração, exigindo antes que sejam evitados os próprios prejuízos, sempre que possível, como decorre da previsão naquele n.º 4 do artigo 268.º do direito à adopção de medidas cautelares adequadas.
Por isso, em todos os casos em que o diferimento da apreciação jurisdicional da legalidade de um acto lesivo praticado pela Administração puder provocar para os interessados um prejuízo irreparável, não pode deixar de admitir a possibilidade de impugnação contenciosa imediata, pois é a única forma de assegurar tal tutela (…)”.
“Já relativamente a omissões de actos, não será possível, em princípio, reclamar imediatamente para o juiz, pelo que o interessado deverá fazer a respectiva arguição de nulidade perante o órgão de execução fiscal e, só da decisão deste que não satisfaça a sua pretensão poderá reclamar” (Jorge Lopes de Sousa (em Código de Procedimento e Processo Tributário, anotado e comentado, Vol. IV, Áreas Editora, 6.ª Ed.ª, pág. 271).
Em igual sentido se tem pronunciado o Supremo Tribunal Administrativo que, vem entendendo que, relativamente a omissões de actos não será possível, em princípio, reclamar imediatamente para o juiz (acórdãos 340/11 de 07/12/2011, 643/10 de 25/08/2010, e 440/08 de 18/09/2008, todos em www.dgsi.pt).
Ora, nos presentes autos não está em causa nem uma omissão de actos, uma vez que a Administração Fiscal se pronunciou, oportunamente, sobre a idoneidade da garantia prestada, decisão que se encontra já transitada, uma vez que o Reclamante da mesma não reclamou, nem está em causa um acto ou decisão lesiva tomada pela Administração Tributária em 18/06/2018.
E, se a ora Reclamante pretendia ver “restituída” a garantia bancária prestada, terá que o peticionar, mediante simples requerimento, ao OEF, que é a entidade competente para se pronunciar sobre a referida matéria.
E, se pretende que o OEF mantenha a suspensão do PEF terá que prestar “nova garantia”, de acordo com o entendimento veiculado pelo OEF expresso no probatório e de cuja decisão, a ora Reclamante foi, a seu tempo, devidamente notificada.
Não pode é o Tribunal “anular o pedido de pagamento” efectuado, pela AT, pois que, com interesse para os autos, o único acto praticado em 18/06/018, foi a consulta, pela Reclamante da sua situação tributária, mediante acesso ao Portal de Cidadão.
Não existe pois qualquer acto que se exteriorize mediante uma decisão proferida pelo órgão de execução fiscal ou por outras autoridades da Administração Tributária, nem existe qualquer acto que afecte os direitos e interesses legítimos da Reclamante.
Ou, dito de outra forma, a presente Reclamação não possui qualquer objecto, porquanto o OEF ou a AT não praticaram qualquer acto lesivo nem tomaram qualquer decisão em 18/06/2018, pelo que a excepção, em epígrafe, procede».
Ou seja, como bem salientou a sentença recorrida, inexiste qualquer decisão do órgão da execução fiscal ou sequer qualquer acto praticado ou omitido no processo executivo que permita à Executada o exercício do direito de reclamação previsto no art. 276.º e segs. do CPPT nos moldes em que pretendeu exercê-lo.
A aludida notificação para pagamento, que a Recorrente pretendeu constituir um acto praticado pela AT em ordem a exigir-lhe o pagamento imediato da quantia exequenda e do acrescido – putativo acto que erigiu em objecto da reclamação –, não constitui notificação alguma, pois não se trata de um «acto pelo qual se leva um facto ao conhecimento de uma pessoa» (cfr. art. 35.º, n.º 1, do CPPT) e muito menos lhe impõe pagamento algum. Aliás, como bem salientou a Juíza do Tribunal a quo, qualquer acto de notificação haveria de conformar-se com os requisitos formais que lhe são impostos pelos arts. 35.º e 36.º do CPPT ( Maxime no n.º 2 do art. 36.º do CPPT, que prescreve: «As notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências».). O que resulta do documento apresentado com a petição inicial como documento n.º 1 não é senão o resultado impresso em papel da consulta efectuada pela Executada à sua situação tributária, designadamente no que respeita à pendência de execuções fiscais pendentes contra ela.
Ora, o resultado dessa consulta, por si só, não constitui uma decisão do órgão da execução fiscal, nem sequer consubstancia um acto praticado nesse processo ou permite concluir por qualquer omissão nele ocorrida; ela tem mero conteúdo informativo e não introduz modificação alguma na ordem jurídica, designadamente na órbita da Executada. Inexiste, pois, acto susceptível de lesar qualquer interesse legítimo ou direito da ora Recorrente que possa ser objecto de reclamação deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do CPPT ( Sobre o conceito de acto lesivo como objecto da reclamação judicial prevista no art. 276.º e segs. do CPPT, vide o seguinte acórdão da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- de 24 de Setembro de 2014, proferido no processo n.º 890/14, disponível em
http://www.dgsi.pt/jsta.nsf/35fbbbf22e1bb1e680256f8e003ea931/8303729693fbfe4280257d620030043a.
).
Por outro lado, se a pretensão da Executada era a de impugnar qualquer acto anterior, não é através deste expediente que conseguirá reabrir os prazos já precludidos para o exercício do direito de acção.
A sentença, que bem deu conta disso e decidiu em conformidade, não merece censura.

2.2.3 CONCLUSÕES

Preparando a decisão, formulamos as seguintes conclusões:
I - A mera informação recolhida pelo executado na sua área pessoal do Portal das Finanças relativamente a uma execução fiscal que pende contra ela não constitui uma decisão do órgão da execução fiscal, nem sequer um acto praticado nesse processo susceptível de lesar qualquer interesse legítimo ou direito do executado, motivo por que não pode ser objecto de reclamação deduzida ao abrigo do art. 276.º e segs. do CPPT.
II - Através do expediente referido em I, não pode o executado reabrir o prazo para discutir judicialmente decisões do órgão da execução fiscal que se consolidaram na ordem jurídica por falta de oportuna impugnação judicial.


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3. DECISÃO

Em face do exposto, os juízes do Supremo Tribunal Administrativo, em conferência, acordam em negar provimento ao recurso.

Custas pela Recorrente.

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Lisboa, 3 de Abril de 2019. – Francisco Rothes (relator) – Isabel Marques da Silva – Ana Paula Lobo.