Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:02302/16.5BEPRT
Data do Acordão:06/09/2021
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ANABELA RUSSO
Descritores:RECURSO PER SALTUM
OBJECTO DA CAUSA
OBJECTO DO RECURSO
VALOR DA CAUSA
COMPETÊNCIA
Sumário:I - No regime dos recursos jurisdicionais aplicável aos meios processuais comuns à jurisdição administrativa e tributária é aplicável o regime previsto no CPTA como legislação subsidiária, por força do disposto na alínea c) do artigo 2.º do CPPT.
II - O recurso per saltum previsto no art. 151.º do CPTA só é admitido desde que se encontrem preenchidos os requisitos seguintes: (i) o fundamento do recurso consista apenas na violação de lei substantiva ou processual; (ii) o valor da causa, fixado segundo os critérios estabelecidos nos artigos 32.º e seguintes, seja superior a 500,000 (euro) ou seja indeterminável (n.º 1 do artigo 151.º); (iii) incida sobre decisão de mérito; (iv) o processo não verse sobre questões de funcionalismo público ou de segurança social (n.º 2 do artigo 151.º).
III – Se ao processo em que vem interposto o recurso per saltum versa sobre a legalidade do acto administrativo que indeferiu a pretensão da Autora de não pagar contribuições à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores no valor de € 46.460, 29, há que concluir que não se mostra verificado nem o pressupostos determinante da competência do Supremo Tribunal Administrativo relativo ao valor da causa, previsto no n.º 1 do artigo 151.º do CPTA, nem o pressuposto excludente da sua competência relativo ao objecto do processo (acto administrativo relacionado com questões de protecção social), consagrado no n.º 2 do mesmo normativo e Código citados.
IV - A tal não obsta o disposto nos artigos 26.º e 38.º do ETAF, pois, sendo certo que a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos, em regra, se efectua nos termos daqueles preceitos, nada obsta a que outros preceitos, contidos em diploma legal com igual posição hierárquica, regulem de modo que conduza a resultado diverso (como sucede, v.g., no artigo 151.º do CPTA, quando aplicável no contencioso tributário por remissão do n.º 2 do artigo 279.º do CPPT).
Nº Convencional:JSTA000P27831
Nº do Documento:SA22021060902302/16
Data de Entrada:12/31/2020
Recorrente:A..........
Recorrido 1:CAIXA DE PROVIDÊNCIA DOS ADVOGADOS E SOLICITADORES
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral:
ACÓRDÃO

1. RELATÓRIO

1.1. A…………..intentou no Tribunal Administrativo do Porto acção administrativa contra a Caixa de Providência de Advogados e Solicitadores, pedindo, a final, que a acção fosse julgada procedente e, em conformidade “a) ser declarada a ilegalidade das normas jurídicas que constituem o teor dos artigos 29.º e 31.º do RCPAS, com efeitos circunscritos ao caso sub judice, qualificando-se o conteúdo jurídico dos artigos em causa como normas emanadas no exercício da função administrativa, com a consequente desaplicação das referidas normas, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 73.º, nº 2, do CPTA"; b) "Serem desaplicadas, por ilegais, as normas jurídicas que constituem o teor dos artigos 29.º e 31.º do RCPAS, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 73.º, nº 3, do CPTA"; c) "Ser declarada a invalidade (nulidade / anulação) do ato administrativo praticado pela Ré consubstanciada na deliberação constante da ata n.º 106 de 15.06.2016, na parte que indeferiu o pedido da A. de que fosse dada sem efeito a interpelação para pagamento das contribuições dos anos de 2004 a fevereiro de 2016, por considerar que não se encontra enquadrada no regime da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores"; d) "Ser declarada a invalidade (nulidade / anulação) de todos os atos consequentes, subsequentes e de execução do referido ato administrativo praticado pela Ré consubstanciado na deliberação constante da ata nº 106 de 15.06.2016, na parte que indeferiu o pedido da A. de que fosse dada sem efeito a interpelação para pagamento das contribuições dos anos de 2004 a fevereiro de 2016, por considerar que não se encontra enquadrada no regime da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores"; e) "Ser a Ré condenada a abster-se da prática de atos administrativos de conteúdo idêntico ao ora em crise e que serão ofensivos do direito da Autora».

1.2. Concretizando a sua pretensão, alegou a Autora na petição inicial, em resumo nosso, que com a instauração da presente acção pretende impugnar normas emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo, mormente os artigos 29.º e 31.º do Regulamento da CPAS e de ato administrativo praticado pela Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores e constante da deliberação da ata nº 106, na parte em que indeferiu o pedido da A. de que fosse dada sem efeito a interpelação para pagamento de contribuições dos anos de 2004 a Fevereiro de 2016, por considerar que não se encontra enquadrada no regime da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores; ter celebrado contrato de trabalho com o Hospital …………….., onde exerce as funções de advogada, representando aquele através de mandato forense, mercê do qual aufere a remuneração equivalente à categoria de técnica superior, efectuando os descontos legalmente devidos para a Segurança Social; que foi interpelada pela Ré para o pagamento de EUR 46.460,29 a título de contribuições vencidas, tendo requerido que essa interpelação fosse dada sem efeito, por se encontrar abrangida por outro regime de protecção social, o que veio a ser indeferido e, por fim, que os artigos 29.º e 31.º do Regulamento da CPAS, que impõe a obrigatoriedade de inscrição e pagamento de contribuições, é violador do princípio da igualdade para os trabalhadores abrangidos pelo regime da Segurança Social, e dos princípios de justiça e proporcionalidade, de dupla tributação e da liberdade do indivíduo.

1.3. O Tribunal Administrativo do Porto - depois de (i) afirmar que é manifesto que as normas jurídicas que a Autora pretende que sejam declaradas ilegais e se desapliquem ao seu caso, in casu os artigos 29.º e 31.º do Regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, por constarem de um Decreto-Lei, não são normas regulamentares emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo, por órgãos administrativos, mas sim normas legais emitidas ao abrigo do exercício do poder político e legislativo, pelo que, por força da alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º do ETAF, não podiam ser objecto de impugnação; (ii) admitir que, não obstante, ser ainda possível concluir-se, atento, designadamente, a conformação do objecto da acção realizada na “réplica”, que a Autora pretende a anulação do acto que indeferiu a sua pretensão por violação de preceitos constitucionais e que, neste contexto factual e jurídico, não está vedado ao Tribunal conhecer dessa pretensão e, verificando que lhe assiste razão, proceder à sua desaplicação no caso concreto e, por fim, (iii) após ter classificado as contribuições para a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, tributos, nomeadamente os parafiscais - declarou-se, por sentença de 24 de Março de 2017, incompetente em razão da matéria e competente para apreciar o seu mérito a “jurisdição tributária”, absolvendo, em conformidade, a Ré da instância.
1.4. Requerida e deferida a remessa dos autos ao Tribunal Tributário do Porto, foi a acção aí tramitada, tendo, por sentença de 30 de Setembro de 2020, sido julgados improcedentes o pedidos formulados e fixado, como valor da acção, € 30.000,01 (valor indicado pela Autora na petição inicial e não impugnado.
1.5. Interposto recurso pela Autora, doravante Recorrente, e apresentadas as respectivas alegações, conclui-se aí nos seguintes termos:
«1. Visa o presente recurso a revogação da sentença proferida pela Mma. Juiz a quo que, julgando a ação improcedente, absolveu a R. dos pedidos, decidindo pela manutenção do ato impugnado, não impedindo a R., ora, recorrida, da prática de atos administrativos idênticos ao sindicado.

2. É de vício de interpretação da Lei e, por isso, na aplicação do Direito que padece a sentença em crise! Funda-se, assim, o presente recurso exclusivamente em matéria de Direito!

3. A deliberação constante da Ata nº 106/2016 de 15.06.2016 tem por fundamento o disposto nos artigos 29.º, nº 1, 31.º do RCPAS;

4. Os artigos 29.º, nº 1, 31.º do RCPAS são normas que padecem do vício de ilegalidade;

5. Os artigos 29.º e 31.º, nº 1, do Regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, aprovado pelo Dec. Lei 119/2015 de 29 de Junho impõe à A./Recorrida a obrigatoriedade de inscrição e pagamento das contribuições à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, quando a A./Recorrida está sujeita, obrigatoriamente, a outro regime contributivo de segurança social, enquanto, trabalhadora subordinada e dependente, ao abrigo de um contrato de trabalho, em regime de exclusividade, no exercício das funções de advogada;

6. In casu, estamos face a um alegado tratamento igual de situações diferenciadas, o qual reside na sujeição a inscrição obrigatória e pagamento de contribuições à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, (CPAS) de advogados em regime de trabalho por conta de outrem, (trabalho dependente) cujos rendimentos são já sujeitos ao pagamento de contribuições para a segurança social, e de advogados por conta própria (trabalhador independente), cujos rendimentos são apenas sujeitos ao pagamento para o CPAS e isentos de pagamento para a segurança social, bem como tratamento diferenciado de situações laborais idênticas;

7. Todo e qualquer trabalhador dependente/subordinado, em regime de exclusividade, está obrigatoriamente enquadrado no regime da Segurança social e não obrigado a inscrição obrigatória/enquadramento em qualquer outro sistema previdencial público ou privado, o que não acontece na situação da A. que, com o mesmo vínculo jurídico (trabalhadora dependente/subordinada), em regime de exclusividade, está obrigatoriamente sujeita a duplo enquadramento: para a Segurança Social, e sujeita ao regime das contribuições para o CPAS, ou seja, a dois regimes contributivos de igual natureza e finalidade;

8. A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores é uma instituição de previdência autónoma e visa fins de previdência e de proteção social (art. 1.º do RCPAS), tendo por fim conceder pensões de reforma e subsídios por invalidez aos seus beneficiários (art. 3.º do RCPAS);

9. O sistema da segurança social, no âmbito do subsistema da solidariedade visa, entre outros fins de previdência (proteção na velhice - reforma) e de proteção social (art. 52.º, 54.º e 56.º da Lei de Bases da Segurança Social);

10. Não é economicamente comportável, nem de exigir que sobre o mesmo rendimento da A. incidam obrigatoriamente contribuições da mesma natureza, com o mesmo fim, nomeadamente invalidez e velhice, ainda que, para diferentes entidades (art. 1.º, nº 1 e art. 3, do RCPAS e art. 51.º, 53.º da Lei 4/2007 de 16 de Janeiro, que aprova as Bases Gerais do Sistema da Segurança Social);

11. Inexiste no regime jurídico Português qualquer Lei ou Regulamento que, para o exercício de qualquer outra atividade profissional, ainda que enquadrada ou não em qualquer outra ordem profissional, imponha a um trabalhador enquadramento contributivo e obrigatório em dois regimes;

12. A Segurança Social (art. 139.º, da Lei 110/2009 de 16 de Setembro) prevê expressamente que os advogados e solicitadores que exerçam atividade como trabalhadores Independentes, ou seja, como profissionais liberais, estejam isentos de contribuir para o regime da segurança social, por já terem um regime contributivo obrigatório- CPAS;

13. A A. está sujeita a uma duplicação contributiva que incide sobre um único rendimento (proveniente do trabalho dependente/subordinado auferido com base num contrato de trabalho) o que não sucede com os restantes trabalhadores por conta de outrem, em regime de subordinação e em exclusividade, ou advogado profissional liberal, o que consubstancia numa nítida violação do Princípio Constitucional da Igualdade, justiça e proporcionalidade;

14. A contribuição para a CPAS funciona, ou terá sido pensada, como um modo de proteção do advogado/solicitador profissional liberal contribuinte na situação de reforma e invalidez, em abstracto funciona como um aliud de benefício futuro do interessado e as normas que a preveem terão esse escopo;

15. Em caso algum, um benefício pode ser imposto ao destinatário da norma, in casu à A./Recorrente, criando-lhe um verdadeiro estado de sujeição, se este não estiver colocado na mira dos seus pressupostos e especialmente se ele não quiser colocar-se na fattispecie normativa e como tal, um tal regime nunca pode ser entendido como obrigatório, sob pena de atentar contra os próprios direitos e interesses;

16. As normas contidas nos artigos 29.º e 31.º do RCPAS e, por conseguinte, também a própria deliberação ora impugnada padece do vício da injustiça: injustiça na criação da norma e injustiça na aplicação concreta da norma;

17. Os vícios de que padecem as normas contidas nos artigos 29.º e 31.º do RCPAS importam tanto a desaplicação da norma, como a anulação do ato sindicado;

18. A sujeição a uma contribuição atenta contra as mais sãs regras da boa- fé, nos termos em que ela se mostra vertida no art. 10º do CPA;

19. A A./Recorrente vê-se confrontada com uma notificação de 18.03.2016 e uma deliberação tardias e de todo inesperadas, na medida em que, nunca até então, havia sido alertada para uma sujeição a uma tal contribuição, tendo sido, em vez disso, levada a pensar que não haveria lugar a ela;

20. Assim, quer a deliberação, quer as normas em apreço – que nunca até ao momento tinham sido acionadas em relação à sua pessoa – são violadoras do princípio da proporcionalidade;

21. Invoca a A./Recorrente a violação do sagrado princípio geral de natureza tributária, mas que aqui, mutatis mutandis, se aplica por similitude de razões e identidade de fundamentos, que é o da proibição da dupla tributação a que as normas em causa se prestam e que o ato sindicado aqui ofende;

22. Não pode o munus desenvolvido pela autora ser castigado duas vezes em termos de “tributação”, ao ponto de a massa remuneratória que dele recebe ser alvo de incidência contributiva para efeito de segurança social geral e ao mesmo tempo seja objeto de contribuição para o regime de previdência da CPAS alheio à função que exerce, no que é próximo ao ne bis in idem em direito penal, sem olhar à capacidade contributiva do interessado e à “riqueza efectiva” que lhe advém do exercício de uma só atividade profissional;

23. Invoca-se, ainda e, expressamente a violação do princípio constitucional da liberdade do indivíduo na escolha e no exercício da sua profissão uma vez que uma imposição arbitrária como esta (mesmo que estabelecida na lei) não tem qualquer respaldo no atual texto da Constituição da República Portuguesa;

24. As normas jurídicas dos artigos 29.º e 31.º do RCPAS violam os princípios constitucionalmente consagrados nos referidos artigos 13.º e 266.º, nº 2, da CRP, pelo que são ilegais e inválidas, bem como os atos que as aplicam;

25. Impõe-se a desaplicação das referidas normas, bem como a declaração da sua ilegalidade, com efeitos circunscritos ao caso concreto (artigos 73.º, nºs 2 e 3 do CPTA);

26. Impõe-se declarar inválido o ato administrativo sub impugnação!

27. Impõe-se seja, igualmente, a R. condenada a abster-se da prática de atos administrativos de conteúdo idêntico ao ora em crise e que sempre serão ofensivos do direito da A./Recorrente;

28. Ao decidir como decidiu, violou a sentença sub judicie os artigos 29.º e 31.º do RCPAS, o artigo 10.º do CPA, o artigo 73.º, nºs 2 e 3 do CPTA e os princípios constitucionalmente consagrados nos artigos 13.º e 266.º, nº 2, da CRP!

29. Impõe-se a revogação da sentença a quo em nome da Lei, do Direito e da Justiça, na parte sub recurso!».

1.6. A Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, adiante Recorrida, notificada da admissão do recurso, contra-alegou, formulando as conclusões que infra se reproduzem:
«A) A Autora impugnou as normas constantes dos artigos 29.º e 31.º do RCPAS, aprovado pelo D.L. n.º 119/2015, de 29/06.

B) A questão de fundo no presente recurso e na presente ação é a de saber se a Autora, pelo facto de exercer a atividade de advogada em regime de subordinação e em exclusividade com o Hospital…………, SA, mediante a celebração de um Contrato de Trabalho e estando inscrita, por via desse contrato de trabalho, no regime da Segurança Social, se tem de estar inscrita e contribuir para a Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores.

C) E, por outro lado, saber se as normas impugnadas violam os princípios constitucionais da igualdade, justiça, proporcionalidade e da boa-fé.

D) A Autora reconhece que, para poder trabalhar para o Hospital ………., SA tem de elaborar petições, contestações e recursos nos processos em que o hospital é parte, bem como acompanhamento dos mesmos em tribunal.

E) E, nos termos gerais do Estatuto da Ordem dos Advogados, tem a Autora de estar inscrita na Ordem dos Advogados para desempenhar essas tarefas, inclusive o patrocínio forense.

F) E, estando a Autora inscrita na Ordem dos Advogados, tem de estar obrigatoriamente inscrita na CPAS e contribuir para esta.

G) Pois a CPAS é o único meio de garantir que os advogados têm autonomia técnica para exercer as suas funções.

H) Também já o Tribunal Constitucional se pronunciou sobre o regime específico de segurança social da CPAS no Acórdão n.º 102/2013, de 20 de Fevereiro de 2013, no que respeita ao princípio da igualdade.

I) Conclui o referido Acórdão, que «atenta à especificidade da função exercida e a necessidade de proteção do interesse público, não se afigura que o tratamento diferenciado dos solicitadores face aos demais trabalhadores independentes configure uma violação desrazoável e injustificada no princípio da igualdade (artigo 13.º, n.º 1 da CRP), razão pela qual se conclui pela não inconstitucionalidade da interpretação normativa extraída dos artigos 5.º e 8.º do RCPAS.» (no actual RCPAS art.ºs 29.º e 31.º).

J) Conclusão que se aplica na íntegra ao caso dos autos, uma vez que a situação de Autora, como advogada inscrita na CPAS, é em tudo semelhante à situação do solicitador dos referidos autos.

K) Pelo que é forçoso concluir que a interpretação dada pela CPAS aos artigos 29.º e 31.º do RCPAS não viola quaisquer dos princípios constitucionais enumerados pela Autora, nomeadamente os princípios da igualdade da proporcionalidade, da justiça e da boa fé.

L) Como não violam o princípio da capacidade contributiva ou o princípio de natureza tributária que é proibição da dupla tributação.

M) Pois, como já se salientou, a inscrição na CPAS é o traço distintivo daqueles que exercem a advocacia e a solicitadoria em relação aos demais trabalhadores.

N) Por outro lado, no caso dos advogados e solicitadores, o único regime de proteção social que garante a verdadeira independência e autonomia técnica daqueles profissionais é o da inscrição na CPAS.

O) Pelo que, a haver dupla tributação no caso sub judice, sempre a eliminação dessa dupla tributação deveria incidir sobre a inscrição no outro regime de previdência (segurança social) e nunca no da CPAS.

P) Assim, tendo presente a Jurisprudência do Tribunal Constitucional – Acórdão n.º 102/2013, de 20 de Fevereiro de 2013 – aplicável ao caso “sub judice”, é forçoso concluir que a sentença recorrida, tendo julgado de acordo com as normas e princípios constitucionais em vigor, deve ser confirmada.

Q) E, em consequência, a presente ação deve ser julgada improcedente».

1.7. O Exmo. Magistrado do Ministério Público neste Supremo Tribunal emitiu parecer no sentido de que este Supremo Tribunal Administrativo é incompetente em razão da hierarquia, uma vez que, tendo sido atribuído à acção o valor de € 30.000,01 e não sendo de considerar a mesma de valor indeterminável – por na verdade a pretensão da Autora se traduzir na anulação do acto de indeferimento da sua pretensão de não pagamento das contribuições relativas aos anos de 2004 a 2017, no valor de € 46.460,29 – não estarem verificados os pressupostos previstos no artigo 151.º do CPTA.
1.8. Notificadas as partes para se pronunciarem quanto à questão suscitada pelo Exmo. Procurador-Geral-Adjunto, a Autora defendeu a competência deste Tribunal, por o objecto da acção se traduzir na declaração de ilegalidade das normas por inconstitucionalidade, circunscritas ao caso, e, consequentemente, que se verificam os pressupostos do artigo 151.º do CPTA, contrariamente ao entendimento professado pelo Ministério Público e à recondução do seu pedido à anulação do acto de liquidação das contribuições.
1.9. Por despacho da relatora deste acórdão foi determinado o desentranhamento do documento junto com a referida pronúncia, bem como os requerimentos e documentos que Recorrida e Recorrente foram sucessivamente apresentando no processo, por extravasarem largamente o âmbito da pronúncia definida do despacho que as antecedeu.
2. 2. OBJECTO DO RECURSO

2.1 Como é sabido, sem prejuízo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é o teor das conclusões com que a Recorrente finaliza as suas alegações que determina o âmbito de intervenção do tribunal de recurso [artigo 635.º do Código de Processo Civil (CPC)].

Essa delimitação do objecto do recurso jurisdicional, numa vertente negativa, permite concluir se o recurso abrange tudo o que na sentença foi desfavorável ao Recorrente ou se este, expressa ou tacitamente, se conformou com parte das decisões de mérito proferidas quanto a questões por si suscitadas (artigos 635.º, n.º 3 e 4 do CPC), desta forma impedindo que voltem a ser reapreciadas por este Tribunal de recurso. Numa vertente positiva, a delimitação do objecto do recurso, especialmente nas situações de recurso directo para o Supremo Tribunal Administrativo, como é o caso, constitui ainda o suporte necessário à fixação da sua própria competência, nos termos em que esta surge definida pelos artigos 26.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF) e 280.º e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

2.2. No caso concreto, face ao teor das conclusões e ao demais circunstancialismo processual que ficou registado nos pontos antecedentes, importa salientar dois aspectos conexionados com a delimitação do objecto do recurso nas duas vertentes identificadas.

2.2.1. No que respeita à vertente negativa, sublinha-se que os fundamentos invocados em recurso para pôr em causa a bondade do julgado são exclusivamente o erro de julgamento de direito em que a sentença recorrida incorre por ter decidido não anular o acto impugnado.

Aliás, a Recorrente afirmou várias vezes que o presente recurso se funda «exclusivamente em matéria de Direito!» (cfr. alegações de recuso, particularmente, porque transcrito, § 2, fls. 2 das alegações e conclusão 2 das referidas alegações) e declarou que “Elege e repete (…) que tal ilegalidade se consubstancia na violação dos princípios constitucionais da igualdade, justiça, proporcionalidade e da boa-fé, previstos nos artigos 13.º e 266.º, n.º 2 da CRP!» , que «É de vício de interpretação da lei e, por isso, na aplicação do Direito que padece a sentença em crise”.

Todavia, e não obstante a conformação que a Recorrente neste recurso foi dando ao objecto da presente acção, desde a primeira sentença proferida nos autos a 24 de Março de 2017 - em que o Tribunal Administrativo do Porto se julgou incompetente em razão da matéria – que ficou bem claro que a presente acção só prosseguia por das alegações da Autora ainda ser possível sustentar-se que a sua verdadeira pretensão era a anulação do acto administrativo (em matéria tributária) de indeferimento do seu pedido de que fosse dada sem efeito a sua interpelação para pagamento das contribuições liquidadas pela Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, ao abrigo dos artigos 29.º e 31 do RCPAS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 119/2015, de 29 de Junho, com fundamento em que, no seu caso, atentas as circunstâncias de facto invocadas, esse acto violaria um conjunto de preceitos inconstitucionais.

De resto, nessa sentença, de que a Autora não interpôs recurso jurisdicional, ficou sublinhado, bem, que os artigos 29.º e 31.º do Regulamento da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, por constarem de um Decreto-Lei, não são normas regulamentares emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo, por órgãos administrativos, mas sim normas legais emitidas ao abrigo do exercício do poder político e legislativo, pelo que, por força da alínea a) do n.º 3 do artigo 4.º do ETAF, não podiam ser objecto de impugnação.

Foi, pois, com esta conformação que a acção transitou para o Tribunal Tributário, que, reafirmando o mesmo (cfr. fls. 4 a 7 da sentença recorrida, em especial, § 3 e seguintes de fls. 6 e fls. 7), apreciou de novo a mesma questão e, com o mesmo enquadramento e fundamentos, julgou igualmente improcedente a excepção de incompetência em razão da matéria suscitada pela Ré.

E foi com base nessa mesma definição do objecto da acção que a questão a decidir foi fixada na sentença recorrida nos seguintes termos: «Face ao pedido formulado e aos argumentos explanados, cumpre ao Tribunal decidir se o acto administrativo consubstanciado na deliberação da Ré constante da Acta n.º 106, de 15 de junho de 2016, na parte em que indeferiu o pedido da Autora de que fosse dada sem efeito a interpelação para pagamento de contribuições dos anos de 2004 a fevereiro de 2016, padece de invalidade com fundamento na inconstitucionalidade das normas constantes dos artigos 29.º e 31.º do Regulamento da CPAS, por violadoras do princípio da igualdade para os trabalhadores abrangidos pelo regime da Segurança Social, e dos princípios de justiça e proporcionalidade, da dupla tributação e da liberdade do indivíduo, e, como tal, se devem ser desaplicadas no caso concreto».

Em suma, o que desde cedo ficou definido é que o objecto da acção era a legalidade do acto administrativo substanciado na Deliberação de indeferimento da pretensão da Autora, impondo-se aferir, face aos vícios imputados, se devia ser anulado, desaplicando-se, com efeitos restritos à esfera jurídica da Autora, os artigos 29.º e 31 do dito RCPAS.

Assim, não tendo a Autora, também neste recurso, posto em causa a delimitação do objecto da acção, mas, tão só, o mérito da decisão, e mantendo a Autora que a sua discordância se reconduz à interpretação e aplicação do direito, será exclusivamente por referência a esse quadro material que o presente recurso será apreciado. E não com a amplitude que, pelo menos aparentemente, a Autora lhe pretende dar por via do requerimento de pronúncia quanto à questão da competência hierárquica deste Supremo Tribunal Administrativo.

2.2.2. No que concerne à vertente positiva do objecto do recurso, importa clarificar que o recurso per saltum, aplicável às acções administrativas em matéria tributária, apenas cabe das decisões que sejam passiveis de ser incluídas no n.º 1 do artigo 151.º do CPTA e que não sejam de excluir da competência deste Supremo Tribunal Administrativo por força do regime consagrado no n.º 2 do mesmo preceito e diploma legal.

2.2.3. Tendo presente o enquadramento realizado, a questão que previamente importa decidir é a da competência desta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo para conhecer o mérito do recurso jurisdicional.

Só firmada esta, se imporá, então, aferir se o Tribunal a quo andou mal, como defende a Recorrente, ao julgar que o acto administrativo impugnado se devia manter na ordem jurídica, com fundamento em que os artigos 29.º e 31.º do RCPAS, não afrontando nenhum dos princípios constitucionais por si invocados, não deviam ser desaplicados na situação concreta.

3. Fundamentação

3.1. Fundamentação de facto

Em 1ª instância foram declarados como provados os seguintes factos:
1. A Autora é advogada, inscrita na Ordem dos Advogados, portadora da cédula profissional n.º …………..- cf. cópia da cédula profissional a fls. 18 do suporte físico dos autos.

2. Com data de 1 de novembro de 2003, foi subscrito pelo Hospital …………., S.A., na qualidade de 1º Contratante, e pela Autora, na qualidade de 2º Contratante, o documento designado por "Contrato Individual de Trabalho por tempo indeterminado", de que se destacam as seguintes cláusulas:

Cláusula 1ª

O 2º CONTRATANTE é admitido ao serviço do 1º CONTRATANTE para exercer, sob a sua autoridade e direcção, as funções correspondentes à categoria profissional de JURISTA.

Cláusula 2ª

À categoria profissional de JURISTA e sem prejuízo do disposto no artigo 22º da Lei 49408 de 24 de Novembro de 1969, durante a prestação de trabalho cumpre ao 2º OUTORGANTE, o desempenho das seguintes funções:

Elaboração de petições, contestações e recursos nos processos em que o Hospital seja parte, bem como o acompanhamento dos mesmos em tribunais.

Cláusula 3ª

O 1º CONTRATANTE toma ao seu serviço o 2º CONTRATANTE a partir de 1 de Novembro de 2003.” - cf. documento de fls. 19 a 25 do suporte físico dos autos.

3. Com data de 21 de Setembro de 2016, foi emitido documento pelo Serviço de Finanças do Porto 5, do qual se destaca:

CERTIFICO, em cumprimento do despacho exarado no requerimento que antecede e após consulta aos diversos elementos existentes neste Serviço de Finanças que, relativamente ao requerente acima identificado [A…………], não se encontra inscrito em qualquer actividade empresarial ou profissional, conforme definido no artigo 3º do Código do Imposto s/ o Rendimento de Pessoas Singulares (IRS)– cf. documento a fls. 29 do suporte físico dos autos

4. Em 18 de janeiro de 2015, a Autora, indicando como morada Praça …………… nº…., sala …., 4050 Porto, apresentou junto da Ré requerimento, do qual se destaca:

“(…), vem reiterar pedido já efectuado em Janeiro de 2004, onde solicitou o cancelamento da inscrição da beneficiária ou caso V. Exas. assim não entendessem a suspensão dos efeitos da inscrição, uma vez que, desde Novembro de 2003 se encontra a efectuar descontos para a segurança social como trabalhadora dependente.

Com efeito, durante toda a sua actividade como advogada cumpriu pontualmente o pagamento das contribuições para a Caixa de Previdência até Novembro de 2003, porém, encontrando-se a sua situação laboral alterada, entende que não pode lhe ser imposto, tal como a qualquer outro cidadão português, a obrigação de efectuar o pagamento para mais de um sistema contributivo de segurança social quando a actividade exercida é a mesma e existe apenas uma entidade patronal.

Acresce ainda que, tal como é do conhecimento de V. Ex.as, não lhe é possível cancelar na situação de trabalhadora dependente, o pagamento dessas contribuições pelo que, nunca poderia liquidar em função da remuneração que actualmente aufere as duas contribuições, a não ser que V. Ex.as em função da insuficiência económica a que ficaria sujeita, lhe atribuíssem o subsídio de assistência.

Por último, cumpre referir que o contrato de trabalhadora dependente, a que se encontra vinculada tem como objecto o exercício da advocacia e não o exercício de qualquer outra actividade profissional.

Pelo exposto, solicito a V. Ex.as se dignem dar provimento ao ora solicitado sendo certo que se encontra disponível para fornecer quaisquer elementos ou informações adicionais que julguem necessárias”cf. documento a fls. 32 do Processo Administrativo (PA) apenso aos autos.

5. Com data de 26 de Janeiro de 2005, os serviços da Ré emitiram ofício, dirigido à Ré para a morada Praça …………….. n.º …., sala …, 4050 Porto, com o seguinte teor:

Acusamos recebido o prezado favor e gentileza da carta de V.ª Ex.ª de 18 de Janeiro de 2005, relativamente à qual cabe informar que:

1. Ao abrigo, nos termos e para os efeitos dos ARTIGOS 5.º N.º 1 e 74.º, ambos do RCPAS, a inscrição na Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, decorre de inscrição na Ordem dos Advogados, pelo que, enquanto V.ª Ex.ª mantiver activa a sua inscrição na Ordem dos Advogados, não há quadro regulamentar que permita a suspensão dos pagamentos das contribuições à Caixa.

2. Mais informamos, que atento ao princípio da cumulação de inscrições obrigatórias, expresso no ARTIGO 8.º do RCPAS, a obrigatoriedade de inscrição na Caixa se mantém, nos casos de vinculação simultânea a outro regime de inscrição obrigatória.

Sendo que, os benefícios atribuídos ao abrigo do RCPAS, são acumuláveis com os recebidos de outros regimes de segurança social, pelos quais os beneficiários estejam abrangidos” – cf. documento a fls. 33 e 34 do PA apenso aos autos.

6. Foi produzido documento pelo Centro Hospitalar …….., E.P.E., designado por "Talão de Vencimento", relativo a 2012/Setembro, referente à Autora, do qual se destaca que esta aufere a remuneração base no montante de € 1.579,09, sobre a qual incidem descontos para a Segurança Social, Regime Geral, artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 199/99, no valor de € 201,14 - cf. documento a fls. 36 do suporte físico dos autos.

7. Foi produzido documento pelo Centro Hospitalar ………, E.P.E., designado por "Talão de Vencimento", relativo a 2016/Julho, referente à Autora, do qual se destaca que esta aufere a remuneração base no montante de € 1.579,09, sobre a qual incidem descontos para a Segurança Social, Regime Geral, no valor de € 206,98 - cf. documento a fls. 37 do suporte físico dos autos.

8. Com data de 18 de Março de 2016, foi produzido documento pelos serviços da Ré, sob o assunto "Dívida de Contribuições", dirigido à aqui Autora, do qual se destaca:

No dia 1 de Julho de 2015, entrou em vigor o novo regulamento da CPAS, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 119/2015, de 29 de Junho.

Nos termos do disposto no art.º 81.º, n.º 5 do novo regulamento do CPAS, “a certidão de dívida de contribuições emitida pela Direcção” da CPAS “constitui título executivo”.

Consta dos registos da CPAS que V. Exa. tem, à data de hoje, uma dívida de contribuições no montante total de 46.460,29 €, sendo a quantia de 32.415,60 € relativa a contribuições e 14.044,69 € de juros moratórios (…).” – cf. documento a fls. 36 do PA apenso aos autos.

9. Com data de 31 de Março de 2016, a Autora dirigiu, por carta registada com aviso de recepção, que foi recepcionado em 4 de Abril de 2016, requerimento à Ré, nos termos do qual requer que seja "dada sem efeito a interpelação efectuada, considerando a signatária não enquadrada no regime de contribuições da Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores" - cf. documento de fls. 39 a 41 do PA apenso aos autos.

10. Com data de 18 de Maio de 2016 foi produzido documento pelos serviços da Ré designado por "Pedido de Prescrição de Contribuições - Proposta de Deferimento", do qual se destaca:

BENEF.º N.º ……..

DR.ª A……………..

1. Por carta recepcionada em 04.04.2016, a beneficiária em epígrafe veio invocar a prescrição das contribuições em dívida à CPAS vencidas até Fevereiro de 2011;

2. Nos termos do artigo 1.º, n.º 2 do RCPAS e do n.º 3 do artigo 60.º da Lei n.º 4/2007, que aprovou a Lei de Bases da Segurança Social, a obrigação do pagamento das quotizações e das contribuições prescreve no prazo de cinco anos a contar da data em que aquela obrigação deveria ter sido cumprida.

3. (…)

4. Assim, nos termos explanados e atenta a dívida de contribuições da beneficiária, as contribuições referentes ao período compreendido entre Janeiro de 2004 a Fevereiro de 2011, inclusive, no valor de 17.375,70€, relativas aos anos e meses discriminados no extracto em anexo que faz parte integrante da presente proposta como doc. 2 e respectivos juros de mora, são passíveis de extinção por prescrição de acordo com a solicitação da beneficiária;

5. Pelas razões atrás constantes, proponho:

a) Que seja reconhecida a prescrição das contribuições em dívida relativamente ao período compreendido entre Janeiro de 2004 a Fevereiro de 2011, inclusive, no valor de 17.375,70€;

b) Que, em consequência, seja extinta a dívida das referidas contribuições na conta-corrente da beneficiária, por motivo de prescrição;

c) E que as contribuições respeitantes aos meses e anos atrás referidos não contem como carreira contributiva para formação da pensão, nem para qualquer outro efeito e sejam excluídas do histórico contributivo da beneficiária, corrigindo-se este em conformidade.” – cf. documento a fls. 45 e 46 do PA apenso aos autos.

11. Sobre a proposta referida no ponto anterior recaiu a seguinte decisão da Ré: "Deliberado em conformidade com a presente proposta e nos exactos termos da mesma, como consta da Acta n.º 106/2016, de 15 de 6 de 2016, ficando a fazer parte da Deliberação." - cf. fls. decisão aposta a fls. 46 do PA apenso aos autos.

12. Com data de 15 de junho de 2016 foi produzido documento pelos serviços de Direcção da Ré designado por "Isenção do Pagamento de Contribuições à CPAS - PROPOSTA DE INDEFERIMENTO", do qual se destaca:

“BENEF.º N.º ……………

DR.ª A……………….

1. A beneficiária veio, por carta recepcionada em 04.04.2016, requerer que seja dada sem efeito a interpelação para pagamento de contribuições por considerar que não se encontra enquadrada no regime da CPAS.

2. Como fundamento do seu pedido a requerente alegou factos e argumentos para que ora se remetem na íntegra.

Em face do exposto importa analisar o seguinte:

3. Ao abrigo e nos termos do artigo 29.º n.º 1 do RCPAS são inscritos obrigatoriamente como beneficiários ordinários todos os advogados inscritos na Ordem dos Advogados.

4. Decorrendo do artigo 29.º n.º 2 do mesmo RCPAS que a inscrição na caixa se conta a partir do mês seguinte ao da inscrição no respectivo organismo de representação profissional.

5. Sendo que, nos termos do artigo 31.º do RCPAS mantém-se obrigatória a inscrição na Caixa nos casos de vinculação simultânea a outro regime de inscrição obrigatória ou facultativa, subsistindo as respectivas situações autonomizadas.

6. Relativamente à obrigatoriedade contributiva, dispõe o artigo 79.º n.º 1 do RCPAS, que os beneficiários pagam até ao último dia de cada mês contribuições, sendo que, a partir do dia um do mês seguinte ao do vencimento das mesmas, ao montante destas acrescem juros de mora [artigo 81.º n.º 2 do RCPAS].

7. No âmbito da CPAS, os benefícios concedidos são cumuláveis com os recebidos de outros regimes de segurança social pelos quais os beneficiários estejam também abrangidos (artigo 31.º n.º 2 do RCPAS).

8. Ocorre referir que em 1996, na Revisão do Regime Geral de Segurança Social dos Trabalhadores Independentes, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 240/96, de 14 de Dezembro, que republicou o Decreto-Lei n.º 328/93, manteve-se consagrado o princípio de que “Os advogados e solicitadores que, em função do exercício de actividade profissional, estejam integrados obrigatoriamente no âmbito pessoal da respectiva caixa de previdência, mesmo quando a actividade em causa seja exercida na qualidade de sócios os membros das sociedades referidas na alínea b) do artigo 6.º, são excluídos do regime dos trabalhadores independentes.”

9. Idêntico preceito está vertido no artigo 139.º do código dos regimes contributivos do sistema previdencial de segurança social, aprovado pela Lei n.º 110/2009, de 16 de Setembro.

10. A autonomia específica do regime privado de segurança social dos advogados e solicitadores Portugueses veio a ser novamente reiterada, com consagração e reconhecimento legal, na Lei de Bases da Segurança Social, aprovada pela Lei n.º 17/2000, de 8 de Agosto, no seu artigo 114.º e, posteriormente aprovada pela Lei n.º 32/2002, de 20 de Dezembro.

11. E, de igual modo, a mesma consagração e reconhecimento legal da autonomia específica daquele regime se manteve na estatuição do artigo 106.º da Lei n.º 4/2007, de 16 de Agosto, que aprovou as Bases Gerais da Segurança Social, actualmente em vigor.

12. O artigo 4.º do Estatuto da Ordem dos Advogados estabelece que a previdência social dos advogados é realizada pela Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, nos termos das disposições legais e regulamentares aplicáveis.

13. Do exposto resulta claro que a inscrição na CPAS é uma obrigação legal para todos os que estejam inscritos como advogados na Ordem dos Advogados, independentemente do facto de exercerem, ou não, essa actividade, de o fazerem, ou não, em regime de exclusividade, de estarem, ou não, abrangidos por outro regime de protecção social, ou de pretenderem, ou não, beneficiar dos benefícios atribuíveis pela CPAS.

14. Tal obrigação só cessa nas situações tipificadas nos artigos 32.º e 34.º do RCPAS, concernentes, respectivamente, à suspensão e ao cancelamento da inscrição.

15. Afigura-se importante referir que o Regulamento da CPAS aprovado pela Portaria n.º 487/83, de 27 de Abril, não resultava regime diverso quer quanto à obrigatoriedade de inscrição, quer quanto à correlativa obrigação do pagamento de contribuições dos advogados.

16. Neste enquadramento de facto e de direito não se vislumbra que a inscrição da Beneficiária na CPAS, enquanto advogada inscrita na Ordem dos Advogados, infrinja ou sequer belisque qualquer princípio de direito, designadamente os invocados pela beneficiária.

17. A sua inscrição na Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores resulta pois da estrita aplicação nos normativos legais que impõe a inscrição de advogados nesta Instituição.

18. Nestes termos e com os fundamentos atrás constantes, proponho o indeferimento do pedido” – cf. documento a fls. 43 e 44 do PA apenso aos autos.

13. Sobre a proposta referida no ponto anterior recaiu a seguinte decisão da Ré: "Deliberado em conformidade com a presente proposta e nos exactos termos da mesma, como consta da Acta n.º 106/2016, de 15 de 6 de 2016, ficando a fazer parte da Deliberação" - cf. fls. decisão aposta a fls. 44 do PA apenso aos autos.

14. Com data de 24 de Junho de 2016, foi produzido documento pelos serviços da Ré, sob o assunto "Notificação da deliberação", dirigido à aqui Autora, do qual se destaca:

Informamos V. Exa. do conteúdo da deliberação constantes da Acta n.º 106/2016, de 15/06/2016, nos termos e com os fundamentos das propostas de deliberação de que junto anexamos fotocópia.

Da presente deliberação cabe:

1. Reclamação para a Direcção da CPAS, no prazo de 15 dias úteis a contar da data da presente notificação, nos termos do ARTIGO 191.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA). (…)

2. Impugnação contenciosa para os Tribunais Administrativos nos termos do CPTA, no prazo de 3 meses a contar da data da presente notificação, no caso de actos anuláveis, ou a qualquer tempo, no caso de actos nulos ou inexistentes (ARTIGO 58.º, n.º 1 e n.º 2 alínea b) do CPTA)” – cf. documento a fls. 42 do PA apenso aos autos.

3.2. Fundamentação de direito

3.2.1. A primeira questão que se impõe apreciar é, como ficou dito, a de saber se este Supremo Tribunal Administrativo é ou não competente, em razão da hierarquia para conhecer o mérito do recurso que nos vem apresentado. Questão que, como é sabido, pode ser suscitada por qualquer uma das partes ou pelo Ministério Público (como no caso aconteceu) ou oficiosamente suscitada pelo Tribunal até trânsito em julgado da decisão final, independentemente do despacho de admissão que previamente haja sido proferido (cfr. artigos 16.º do CPPT( «1-A infracção das regras de competência em razão da hierarquia e da matéria determina a incompetência absoluta do tribunal) e 13.ºdo CPTA. ( A incompetência absoluta é de conhecimento oficioso e pode ser arguida pelos interessados ou suscitada pelo Ministério Público ou pelo representante da Fazenda Pública até ao trânsito em julgado da decisão final». )).

Significa, pois, o que vimos dizendo, que é esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, a quem o recurso vem dirigido, que cabe a última palavra quanto à sua própria competência em razão da hierarquia.

3.2.2. Cumpre, pois, decidir. E, fazendo-o, dir-se-á, como, de resto, esta Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal há muito vem sublinhando ( Neste sentido, entre muitos, vide, acórdão de 18 de Novembro de 2015, proferido no processo 1502/14, integralmente disponível em www.dgsi.pt) , que constituindo a acção administrativa um meio processual comum à jurisdição administrativa e tributária, os recursos interpostos no âmbito desse meio processual, como é o caso, estão sujeitos às regras previstas no CPTA, nos termos do estabelecido no artigo 279.º, n.º 2 ( «Os recursos dos actos jurisdicionais sobre meios processuais acessórios comuns à jurisdição administrativa e tributária são regulados pelas normas sobre processo nos tribunais administrativos».), do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) (Sobre esta matéria, cfr. JORGE LOPES DE SOUSA, Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado, Áreas Editora, 6.ª edição, IV volume, anotações 37 e ss. ao art. 279.º, págs. 389 e segs.) .

3.2.3. Neste contexto, atentemos, então, no regime consagrado no artigo 151.º, n.º 1 e 2 do CPTA, que determina o seguinte: «Os recursos interpostos de decisões de mérito proferidas por tribunais administrativos de círculo são da competência do Supremo Tribunal Administrativo quando as partes, nas alegações, suscitem apenas questões de direito e o valor da causa seja superior a 500 000 (euro) ou seja indeterminada, designadamente nos processos de declaração de ilegalidade ou de condenação à emissão de normas.» (n.º 1). E que «O disposto no número anterior não se aplica a processos respeitantes a atos administrativos em matéria de emprego público ou relacionados com formas públicas ou privadas de proteção social» (n.º 2) – negrito de nossa autoria.
3.2.4. Em anotação ao preceito transcrito, a doutrina ( Mário Aroso de Almeida e Carlos Alberto Fernandes Cadilha, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativo, Almedina, 2020, 4ª edição, Tomo II, anotação 2 ao artigo 151.º, página 1165.)
vem enunciando os seguintes requisitos de cujo preenchimento está dependente a admissibilidade do recurso per saltum: «(a) o recurso incida sobre uma decisão de mérito (artigo 151.º, n.º 1); (b) o fundamento do recurso consista na violação de lei substantiva ou processual; (c) o valor da causa, fixado segundo os critérios estabelecidos nos artigos 32.º e seguintes, seja superior a 500.000 (euro) ou seja indeterminável (artigo 151.º, n.º 1); (d) o processo não verse sobre questões de funcionalismo público ou de segurança social (artigo 151.º, n.º 2)».
3.2.5. Tendo, no caso, o valor da acção sido em € 30.000,01 e substanciando-se o objecto da acção em matéria relacionada com segurança social, há que concluir que não se mostram verificados os pressupostos positivos determinantes da competência deste Supremo Tribunal consagrados no n.º 1 do artigo 151.º do CPTA e mostram-se preenchidos os pressupostos excludentes da sua competência à luz do n.º 2 da mesma norma e código citados.
3.2.6. Não se olvida, ao extraímos tal conclusão, que a Autora, em defesa da verificação dos requisitos consagrados no n.º 1 do artigo 151.º do CPTA, veio alegar que a presente acção tem valor indeterminável, sublinhando que o que peticionou foi a declaração de ilegalidade de normas e a sua desaplicação ao caso concreto.
Acontece porém que, como a Autora não ignora, tanto mais que se ofereceu a colaborar na conformação do objecto no articulado de réplica então apresentado e tomou conhecimento da decisão de incompetência em razão da matéria do Tribunal Administrativo que supra curamos de detalhar (e dela não interpôs recurso),a acção não tem por objecto a declaração de ilegalidade de normas com fundamento em inconstitucionalidade mas, nas palavras da Autora «a invalidade do acto administrativo consubstanciado na deliberação constante da Ata n.º 106 de 15.06.2016, na parte que indeferiu o pedido da Autora».
Como se disse já por duas vezes no processo, as normas que a Autora pretendia que fossem declaradas ilegais e desaplicadas, os artigos 29.º e 31.º do RCPAS, por constarem de um Decreto-Lei, não são normas emitidas ao abrigo de disposições de direito administrativo, por órgãos administrativos, mas sim emitidas ao abrigo do exercício do poder político e legislativo. E, consequentemente, como bem se disse, enquanto actos praticados no exercício da função política e legislativa, está vedada a sua impugnação, por força do preceituado no artigo 4.º, n.º 3, al. a) do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF).
Tudo quanto se podia admitir, e para tanto se julgou a jurisdição administrativa e fiscal competente, era configurar que a acção tinha por objecto o acto administrativo e a sindicância da sua validade à luz dos fundamentos legais que a suportam, ou seja, do regime convocado para fundamentar a decisão, conhecendo-se, incidentalmente, da conformidade constitucional dos artigos 29.º e 31º do RCPAS, ou seja, aferir se o acto impugnado era ou não válido por os fundamentos invocados para o fundamentarem, mormente os citados preceitos do RCPAS, violavam a Lei Fundamental.
Daí que, embora a Autora lhe tenha atribuído o valor de € 30.000,01 e o Tribunal de 1ª instância, não obstante a conformação realizada quanto ao objecto, não tenha suscitado a questão do valor da causa, se deva concluir que a presente acção não é de valor indeterminável, uma vez que, para que o fosse, teríamos que estar perante um processo respeitante a bens imateriais e a normas emitidas ou omitidas no exercício da função administrativa, o que, como vimos já, não é o caso.
3.2.7. Donde, ainda que a este Supremo Tribunal Administrativo não caiba o poder de alterar o valor da acção fixado na sentença, fixado em 30.000,01 (e não, como devia, o valor das contribuições alegadamente em dívida realizadas pela primeira interpelação - € 46.460,29 -, ou, eventualmente, o valor que subsistira na ordem jurídica como exigido após expresso reconhecimento de prescrição parcial da dívida antes da própria propositura da presente acção – artigos 32.º e 33.º do CPTA) não tem o dever que interpretar esse valor como correspondendo a valor indeterminável, quer porque a Autora nunca o justificou como tal, quer, como bem diz o Exmo. Procurador, não se encontra fundamento para o qualificar dessa forma, subsistindo, assim, tão só, a imposição de o relevar para aferir «se cabe recurso da sentença proferida em 1ª instância e que tipo de recurso» - artigo 31.º, n.º 1 e 2 do CPTA.
3.2.8. Em conclusão: não estando nós perante acção de valor indeterminável e sendo o valor da causa inferior a € 500.000,00, há que concluir, como começamos por adiantar, que não se mostram preenchidos os pressupostos determinantes da nossa competência e de admissibilidade do recurso per saltum para esta Secção de Contencioso Administrativo previstos no n.º 1 do artigo 151.º do CPTA ou, dito de outra forma, que se verifica circunstância que, desde logo, exclui que este recurso possa assumir-se como uma revista a dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo
3.2.9. Acresce que, como também concluímos, que independentemente do real valor da acção, do que lhe foi fixado ou até da qualidade de valor indeterminável que lhe pudesse ser atribuído, no caso falha outro dos pressupostos para a admissibilidade do recurso per saltum: que a acção não verse sobre questão de protecção social.

3.2.10. Recuperando, de novo, os ensinamentos da doutrina que já convocamos, o regime consagrado no n.º 1 do artigo 151.º do CPTA «não se aplica a processos respeitantes a atos administrativos (…) relacionados com formas públicas ou privadas de protecção social, o que significa que mesmo que se preencham os demais pressupostos previstos no n.º 1, quer quanto ao objecto do recurso (decisão de mérito), o valor da causa (superior a € 500 000 ou indeterminável) e a natureza das questões a dirimir (questões de direito), o recurso não é admitido se versar sobre a prática de atos administrativos em matéria de emprego público ou de protecção social».

Em síntese nossa, nos processos que tenham como objecto material questões de protecção social desencadeados pela prática ou omissão de actos administrativos não é admissível recurso per saltum para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, por essa competência ter ficado expressamente excluída pelo legislador nos termos do n.º 2 do artigo 151.º do CPTA.

3.2.1.1. Ora, considerando que, no caso, o objecto de acção se traduz na apreciação da legalidade de acto administrativo proferido pela Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores pelo que foi determinado que a Autora procedesse ao pagamento de contribuições devidas pela sua qualidade de advogada inscrita na respectiva Ordem dos Advogados, com fundamento em deveres emergentes do RCPAS, deveres e contribuições de protecção social que a Autora não aceita e defende serem ilegais, dúvidas não subsistem que estamos perante processo em que se apreciam questões relativas a previdência social. E, consequentemente, que não é admissível recurso per saltum para este Supremo Tribunal Administrativo.

3.1.12. Impõe-se, consequentemente, observar o disposto no n.º 4 do mesmo artigo 151.º do CPTA, segundo o qual «Se, remetido o processo ao Supremo Tribunal Administrativo, o relator entender que as questões suscitadas ultrapassam o âmbito da revista, determina, mediante decisão definitiva, que o processo baixe ao Tribunal Central Administrativo, para que o recurso aí seja julgado como apelação, com aplicação do disposto no artigo 149.º».
3.1.13. Nem se diga que ao caso não se aplica o disposto no artigo 152.º do CPTA por a distribuição da competência entre o Supremo Tribunal Administrativo e os tribunais centrais administrativos, no que se refere ao contencioso tributário, dever ser a que resulta dos artigos 26.º e 38.º do ETAF, motivo por que sempre competiria à Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo conhecer dos recursos interpostos de decisões dos tribunais tributários com exclusivo fundamento em matéria de direito [cfr. artigo 26.º, alínea b) do ETAF] e à Secção de Contencioso Tributário dos Tribunais Centrais Administrativos conhecer dos recursos de decisões dos Tribunais Tributários, salvo o disposto na referida alínea b) do artigo 26.º [cfr. artigo 38.º, alínea a) do ETAF].
Na verdade, sendo certo que a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos, em regra, se efectua nos termos daqueles preceitos, nada obsta a que outros preceitos, contidos em diploma legal com igual posição hierárquica, ( Apesar de o Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais ter sido aprovado por lei (Lei n.º 13/2002, de 15 de Fevereiro) e o Código de Procedimento e de Processo Tributário o ter sido por decreto-lei (Decreto-Lei n.º 433/99, de 26 de Outubro), entre a lei e o decreto-lei não existe relação de hierarquia. Para maior desenvolvimento, J. BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1983, pág. 166 e segs.) regulem de modo que conduza a resultado diverso noutras situações, como sucede, v.g., no artigo 151.º do CPTA, quando aplicável no contencioso tributário por remissão do n.º 2 do artigo 279.º do CPPT.
Do exposto resulta que o presente recurso jurisdicional deve baixar ao Tribunal Central Administrativo Norte, para aí ser julgado como apelação.
3.2.14. CONCLUSÕES
I - No regime dos recursos jurisdicionais aplicável aos meios processuais comuns à jurisdição administrativa e tributária é aplicável o regime previsto no CPTA como legislação subsidiária, por força do disposto na alínea c) do artigo 2.º do CPPT.

II - O recurso per saltum previsto no art. 151.º do CPTA só é admitido desde que se encontrem preenchidos os requisitos seguintes: (i) o fundamento do recurso consista apenas na violação de lei substantiva ou processual; (ii) o valor da causa, fixado segundo os critérios estabelecidos nos artigos 32.º e seguintes, seja superior a 500,000 (euro) ou seja indeterminável (n.º 1 do artigo 151.º); (iii) incida sobre decisão de mérito; (iv) o processo não verse sobre questões de funcionalismo público ou de segurança social (n.º 2 do artigo 151.º).

III – Se ao processo em que vem interposto o recurso per saltum versa sobre a legalidade do acto administrativo que indeferiu a pretensão da Atora de não pagar contribuições à Caixa de Previdência dos Advogados e Solicitadores, no valor de € 46.460, 29, há que concluir que não se mostra verificado nem o pressupostos determinante da competência do Supremo Tribunal Administrativo relativo ao valor da causa, previsto no n.º 1 do artigo 151.º do CPTA, nem o pressuposto excludente da sua competência relativo ao objecto do processo (acto administrativo relacionado com questões de protecção social), consagrado no n.º 2 do mesmo normativo e Código citados.
IV - A tal não obsta o disposto nos artigos 26.º e 38.º do ETAF, pois, sendo certo que a repartição de competências entre o Supremo Tribunal Administrativo e os Tribunais Centrais Administrativos, em regra, se efectua nos termos daqueles preceitos, nada obsta a que outros preceitos, contidos em diploma legal com igual posição hierárquica, regulem de modo que conduza a resultado diverso (como sucede, v.g., no artigo 151.º do CPTA, quando aplicável no contencioso tributário por remissão do n.º 2 do artigo 279.º do CPPT).

4. DECISÃO
Face ao exposto, acordam os Juízes que integram esta Seção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo declarar este Supremo Tribunal Administrativo incompetente para conhecer do presente recurso e ordenar a baixa dos autos ao competente Tribunal Central Administrativo Norte (Secção do Contencioso Tributário), para que o recurso aí seja julgado como apelação.
Custas pela Recorrente.
Após trânsito, remeta os autos ao Tribunal Central Administrativo Norte.

Lisboa, 9 de Junho de 2021 – Anabela Ferreira Alves e Russo (relatora, que consigna e atesta, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, que têm voto de conformidade com o presente acórdão os Senhores Juízes Conselheiros que integram a presente formação de julgamento – José Gomes Correia e Aníbal Augusto Ruivo FerraZ