Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0458/15
Data do Acordão:02/17/2016
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:TAXA DE RECURSOS HÍDRICOS
RESERVA DE LEI
INCONSTITUCIONALIDADE ORGÂNICA
PRINCÍPIO DA LEGALIDADE TRIBUTÁRIA
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
Sumário:Tendo a taxa de recursos hídricos (TRH) natureza jurídica de taxa, o respectivo regime jurídico não afronta, do ponto de vista orgânico, as normas constitucionais.
Nem, atenta a respectiva incidência objectiva e subjectiva, afronta os princípios da legalidade tributária, da igualdade ou da proporcionalidade.
Nº Convencional:JSTA00069563
Nº do Documento:SA2201602170458
Data de Entrada:04/20/2015
Recorrente:MUNICÍPIO DE POMBAL
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF COIMBRA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - TAXA.
DIR PROC TRIBUT CONT - IMPUGN JUDICIAL.
Legislação Nacional:CONST05 ART8 ART13 ART103 N2 ART165 N1 I ART266 N2.
L 58/05 DE 2005/12/29 ART78 ART79 ART80 ART81 ART102.
DL 130/12 DE 2012/06/22.
DL 245/09 DE 2009/09/22.
DL 97/08 DE 2008/06/11 ART4 - ART6.
DL 306/07 DE 2007/08/27.
DL 226-A/07 DE 2007/05/31.
DL 243/01 DE 2001/09/05.
Legislação Comunitária:DIR CONS E PARLAMENTO 2000/60/CE DE 2000/10/23.
DIR CONS CEE SEXTA DIRECTIVA 77/388/CEE DE 1997/05/17 ART33.
DIR CONS 98/83/CE DE 1998/11/03.
Jurisprudência Nacional:AC TC 349/12 DE 2012/07/05.; AC TC 115/12 DE 2012/03/06.; AC TC 365/03 DE 2003/07/14.; AC TC 1140/96 DE 1996/11/06.
Referência a Doutrina:DIOGO LEITE DE CAMPOS, BENJAMIM DA SIVA RODRIGUES E JORGE LOPES DE SOUSA - LEI GERAL TRIBUTÁRIA ANOTADA E COMENTADA 4ED PAG70.
TEIXEIRA RIBEIRO - LIÇÕES DE FINANÇAS PÚBLICAS COIMBRA 1977 PAG262.
ALBERTO XAVIER - MANUAL DE DIREITO FISCAL VOLI 1981 PAG42.
CASALTA NABAIS - CONTRATOS FISCAIS - COIMBRA 1994 PAG236.
SUZANA TAVARES DA SILVA - AS TAXAS E A COERÊNCIA DO SISTEMA TRIBUTÁRIO CEJUR OUTUBRO 2008 PAG60-61.
SUZANA TAVARES DA SILVA - A TUTELA JURISDICIONAL DOS SUJEITOS PASSIVOS DAS TAXAS COIMBRA 2011 AO-CDC ALMEDINA PAG4-5.
GONÇALO LEITE DE CAMPOS E MIGUEL CLEMENTE - AS TAXAS DE REGULAÇÃO ECONÓMICA NOS SECTORES DAS ÁGUAS E RESÍDUOS IN AS TAXAS DE REGULAÇÃO ECONÓMICA EM PORTUGAL - COORDENAÇÃO DE SÉRGIO VASQUES MARÇO 2008 ALMEDINA PAG119 E SEGS.
CARDOSO DA COSTA IN HOMENAGEM A JOSÉ GUILHERME XAVIER DE BASTO PAG555.
JOANA MENDES IN TRATADO DE DIREITO ADMINISTRATIVO ESPECIAL VOLII - COORDENAÇÃO DE PAULO OTERO E PEDRO GONÇALVES - ALMEDINA PAG122-124.

Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. O Município de Pombal recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, julgou improcedente a impugnação judicial deduzida contra o acto de liquidação da Taxa de Recursos Hídricos do ano de 2008 operada pela Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P., no valor de € 75.615,76.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
I. No caso em apreço, como melhor resulta dos factos dados como provados, é o Município de Pombal que procede à captação, distribuição e fornecimento público de água em toda a área do Concelho de Pombal, fiscalizando e garantindo a qualidade da água e gerindo a rede de abastecimento público, não prestando a ARH qualquer serviço.
II. No caso concreto dos autos, não estão verificados os pressupostos de bilateralidade da taxa não se verificam porquanto não existe qualquer contrapartida resultante da prestação de um serviço pela entidade que liquida a TRH.
III. Face a tal enquadramento, a Taxa de Recursos Hídricos revela-se inquinada de inconstitucionalidade dado que visa compensar custos administrativos - manifestando uma função retributiva, bem como promover objectivos de índole ambiental - revelando uma função extrafiscal.
IV. Pelo exposto, guardado o devido respeito pela Merit.ª Juiz do Tribunal a quo, no caso em apreço, a cobrança do TRH terá de ser considerada inconstitucional, por violação inequívoca do princípio da legalidade tributária, consagrado no nº. 2, do art. 103º, da C.R.P. Igualmente por violação do princípio da igualdade previsto nos art.ºs 13º, e nº. 2 do 266º, da C.R.P. Ainda por violação do princípio da proporcionalidade, consagrado no nº. 2, do art. 266º da C.R.P verificando-se assim um, erro de julgamento de direito da decisão recorrida.
V. No caso concreto do Município de Pombal, não existem dúvidas na inexistência de natureza sinalagmática do pagamento da taxa, logo, o pagamento de qualquer taxa é sempre desproporcional, não carecendo sequer de alegação por imediatamente apreensível pelo cidadão médio.
VI. Com efeito, o Município de Pombal apenas capta e utiliza os recursos hídricos para satisfação de uma necessidade pública das suas populações e no prosseguimento de uma competência que lhe é legalmente cometida, quer pela revogada Lei 169/99, quer pela atual 75/2013.
VII. Logo, não existe qualquer utilização privativa do domínio público hídrico por parte do Município de Pombal, mas sim uma utilização pública de um bem do domínio público hídrico.
VIII. Por todo o exposto, deveria a Merit.º Juiz do Tribunal a quo ter considerada verificada a inconstitucionalidade orgânica e material da taxa cobrada ao Município de Pombal, assim como a violação do princípio da proporcionalidade e da legalidade tributária.
IX. Donde, deveria o Merit.º Juiz do Tribunal a quo ter julgado que os artigos 3.º, 4.º, 5.º e 6.º e 8.º do DL 97/2008 e a sua aplicação ao Município de Pombal no caso concreto são inconstitucionais por violação do artigo 165.º, n.º 1, i) da CRP.
Termina pedindo que seja revogada a decisão recorrida e julgada procedente a impugnação.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«1. O presente recurso vem interposto da sentença de fls. 128 e seguintes do TAF de Coimbra, que julgou improcedente a acção de impugnação judicial proposta contra o acto de liquidação, por parte da “Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P.”, de taxa de recursos hídricos (TRH).
Considera a Recorrente que a sentença recorrida incorreu em erro de julgamento ao apreciar as questões de inconstitucionalidade orgânica e material da taxa, assim como de violação do princípio da proporcionalidade e legalidade tributária.
Para o efeito alega que não se verificam os pressupostos de bilateralidade da taxa, uma vez que não existe qualquer contrapartida resultante da prestação de um serviço por parte da entidade que a liquida e é o Recorrente que procede à captação, distribuição e fornecimento público de água em toda a área do concelho de Pombal, fiscalizando e garantindo a sua qualidade. Motivo pelo qual conclui que “não existe qualquer utilização privativa do domínio público hídrico por parte do município de Pombal, mas sim uma utilização pública de um bem do domínio público hídrico”.
Entende, assim, que a taxa padece do vício de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da legalidade tributária, princípio da igualdade e princípio da proporcionalidade, consagrados nos artigos 103º, nº 2, 13º e nº 2 do artigo 266º, da Constituição da República, já que visa “compensar custos administrativos -manifestando uma função retributiva, bem como promover objectivos de índole ambiental -revelando uma função extrafiscal”.
Mais considera que o Mmo. juiz “a quo” devia ter julgado os artigos 3º a 6º e 8º do Dec.-Lei nº 97/2008, inconstitucionais, por violação do artigo 165º, nº 1, alínea i) da CRP.
E termina pedindo a revogação da sentença e sua substituição por outra que julgue a acção de impugnação judicial procedente.
2. Na sentença recorrida deu-se como provado que por ofício remetido em 03/03/2009, a “Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P.” notificou a Recorrente, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 16º do Dec.-Lei nº 97/2008, de 11 de Junho, para efectuar o pagamento da quantia de € 75.615,76 euros, a título de taxa de recursos hídricos (TRH) relativa ao ano de 2008, a qual foi paga através de cheque.
Mais resulta da sentença recorrida que da notificação em causa consta que “...o valor apurado relativo à Taxa de Recursos Hídricos (TRH) para o ano de 2008 deverá ser pago até ao último dia do mês de Fevereiro de 2009, conforme dispõe o nº 1 do artigo 16º do Decreto-Lei nº 97/2008, de 11 de Junho”, e que a taxa incidiu sobre “utilizações dos recursos hídricos realizadas por um período igual ou superior a 1 ano” e respeitantes a “captação de água” (componente “A” e “U”) e rejeição de águas residuais (componente “E”).
Para se decidir pela improcedência da acção o Mmo. juiz “a quo” considerou que “a taxa em causa foi aprovada pela Assembleia da República e não pelo Governo, ao contrário do argumentado pela impugnante no artigo 15º da sua petição inicial. É a Lei nº 58/2005 que constitui a lei habilitante da visada taxa, definindo a sua base de incidência objectiva e subjectiva, o destino da sua receita e o modo de cobrança, limitando-se o Decreto- Lei nº 97/2008 a regular, entre o mais e em concreto, as bases de incidência, as taxas unitárias aplicáveis, a liquidação, a cobrança e o destino de receitas da TRH, conforme previsto no artigo 102º, nº 2, da Lei nº 58/2005”. E invocando a doutrina dos acórdãos do TCA Sul de 11/04/2013 e 06/06/2013 (proferidos nos processos nºs 08574/12 e 08573/12), concluiu-se na sentença recorrida que não se verifica qualquer inconstitucionalidade orgânica.
E no que respeita ao sinalagma ou bilateralidade que caracteriza o tributo “taxa” invocou o Mmo. juiz “a quo” que «a taxa de recursos hídricos não é mais que a contraprestação pela utilização de um bem de domínio público - a água. Por outro lado, a cobrança de um valor pela utilização deste bem escasso proporciona ao Estado os meios financeiros indispensáveis ao funcionamento de todo um sistema de protecção desse mesmo recurso, objectivo a que o mesmo se encontra obrigado a atingir pela Directiva Água». E como indicador legal da natureza bilateral refere-se na sentença recorrida “a manutenção e recuperação da qualidade e da quantidade dos recursos hídricos resultantes da sua utilização e das demais actividades susceptíveis de lhe causarem um impacte negativo significativo”.
O Mmo. juiz “a quo” afastou igualmente a invocada violação do princípio da proporcionalidade, pois no seu entendimento «o impugnante não alega existir tal desproporção, limitando-se a argumentar que a taxa financia um serviço público, nem convoca factualidade que consubstancie a existência de tal desproporção».
E desse modo concluiu-se na sentença recorrida pela não verificação do vício de inconstitucionalidade material da taxa.
3. A questão que a Recorrente coloca consiste em saber se a sentença padece de erro de julgamento na apreciação que fez das questões que lhe foram colocadas pela Recorrente, tendo em vista a sua pretensão de anulação da taxa que lhe foi liquidada pela “Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P.”, no valor de € 75.615,76 euros, a título de taxa de recursos hídricos (TRH) relativa ao ano de 2008.
E considerando as conclusões do recurso, há que aferir se a referida taxa padece dos vícios de inconstitucionalidade orgânica, por falta de lei habilitante, e de inconstitucionalidade material, por violação dos princípios da legalidade e proporcionalidade.
3.1. A Recorrente tinha invocado junto do tribunal “a quo” que o diploma que prevê a taxa ao abrigo da qual foi emitida a liquidação impugnada padece do vício de inconstitucionalidade orgânica, uma vez que não existe lei prévia habilitante, o que viola o princípio da reserva legal absoluta, e a TRH assume a estrutura típica de uma contribuição especial de financiamento de um serviço público.
Como se deixou exarado na sentença recorrida, o regime da TRH consagrado no Dec.-Lei nº 97/2008, de 11 de Junho, tem como lei habilitante a Lei nº 58/2005, chamada Lei da Água, a qual constitui uma transposição da Directiva nº 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de Outubro. Com efeito, resulta do nº4 do artigo 78º da Lei nº 58/2005 que as «bases de incidência, as taxas unitárias aplicáveis, a liquidação, a cobrança e o destino de receitas da TRH, bem como as correspondentes competências administrativas, as isenções referidas no n.º 3 do artigo 80.º e as matérias versadas no n.º 2 do artigo 79.º e no n.º 2 do artigo 81.º são reguladas por normas a aprovar nos termos do n.º 2 do artigo 102.º», o qual por sua vez dispõe que «O Governo deve aprovar no prazo de três meses após a entrada em vigor da presente lei os decretos-leis complementares da presente lei que regulem a utilização de recursos hídricos e o regime económico e financeiro».
Afigura-se-nos, assim, que não se verifica a invocada inconstitucionalidade orgânica, com base na falta de lei habilitante, como se concluiu na sentença recorrida.
3.2 E quanto à invocada inconstitucionalidade material?
No preâmbulo do Dec.-Lei nº 97/2008, de 11 de Junho, consignou-se que «A estrutura objectiva da taxa de recursos hídricos integra diferentes tipos de utilizações dos recursos hídricos, combinando na sua base de incidência componentes que reflectem a preocupação fundamental de compensar quer os custos que o utilizador provoca à comunidade quer os benefícios que a comunidade lhe proporciona. Tomam -se, por isso, como base de incidência o aproveitamento de águas do domínio público hídrico do Estado; a descarga, directa ou indirecta, de efluentes sobre os recursos hídricos, susceptível de causar impacte significativo; a extracção de materiais inertes do domínio público hídrico; a ocupação de terrenos ou planos de água do domínio público hídrico do Estado; bem como a utilização de águas sujeitas a planeamento público, susceptível de causar nelas impacte significativo».
Invoca o Recorrente que no seu caso é o município de Pombal que não só procede à captação da água como controla a sua qualidade e quantidade, pelo que a “Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P.” não presta qualquer serviço que fundamente a cobrança da taxa.
Sucede que a actividade que o Recorrente desenvolve (distribuição de água para consumo humano e actividade de drenagem e tratamento de águas residuais) obedece a princípios diversos daqueles que se encontram subjacentes à utilização dos recursos hídricos, sendo certo que a regulação dessa actividade mereceu tratamento legislativo (nacional e comunitário) autónomo, nos termos do Dec.-Lei nº 243/2001, de 5 de Setembro (alterado pelo Dec.-Lei nº 306/2007, de 27 de Agosto), que transpôs a Directiva nº 98/83/CE do Conselho, de 3 de Novembro.
Ora, a “Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P.” actua num plano mais global de gestão e monitorização dos recursos hídricos das chamadas bacias hidrográficas e que em termos territoriais abrange a área de diversos municípios, entre os quais o município de Pombal.
Por seu lado, a Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, a que o Estado Português está vinculado, determina no nº1 do artigo 8º que “Os Estados-Membros garantirão a elaboração de programas de monitorização do estado das águas, por forma a permitir uma análise coerente e exaustiva do estado das águas em cada região hidrográfica”. Dessa tarefa foram incumbidas, nos termos da alínea b) do nº1 do artigo 7º da Lei da Água, as administrações das regiões hidrográficas (ARH), a quem compete, através dos seus órgãos e serviços, realizar uma série de acções que vêm discriminadas no nº6 do artigo 8º da mesma Lei. A realização desses serviços implica custos que nos termos da legislação implementada devem ser suportados pelos utilizadores dos recursos hídricos.
Como referem Gonçalo Leite de Campos e Miguel Clemente (in “Taxas de Regulação Económica nos Sectores das Águas e Resíduos” - As Taxas de Regulação Económica em Portugal, Março 2008, Almedina, pág. 11 e seguintes), «…o artigo 78º da lei da Água também decompõe o plano de incidência objectiva da TRH em duas parcelas cumulativas, ambas colocadas sob o domínio do princípio da equivalência. A primeira, consiste na utilização privativa dos bens dominiais e assenta no benefício, como contraprestação específica e individualmente mensurável, que o sujeito passivo da relação jurídica tributária retira dessa utilização (prestando, assim, homenagem ao princípio do utilizador-pagador). Já a segunda, formada pelas “actividades susceptíveis se causarem impacto negativo significativo no estado de qualidade ou quantidade de água”, é norteada pela necessidade de repercutir no poluidor os custos ambientais provocados (obedecendo, portanto, à lógica que subjaz ao princípio do poluidor-pagador)».
E como resulta da alínea b) do nº1 do artigo 82º da Lei da Água (e se reproduz no artigo 5º, nº2, do Dec.-Lei nº 97/2008, de 11 de Junho), sempre que o sujeito passivo da TRH, como é o caso concreto dos autos, não seja o utilizador final dos recursos hídricos, esta deve ser economicamente repercutida nos preços ou tarifas praticados.
Refere José Manuel M. Cardoso Costa (in “Homenagem a José Guilherme Xavier de Basto, p. 555), a propósito da orientação jurisprudencial do Tribunal Constitucional sobre a natureza sinalagmática da taxa (acórdãos do TC nº 115/2002 e 349/2002), que «…os termos de referência a considerar na emissão de um juízo sobre a correspondência «material» (ou a proporcionalidade) entre o montante da taxa e a respectiva contraprestação (independentemente, agora, do grau que tal correspondência deva assumir). Com efeito, nesses acórdãos, deixou o Tribunal esclarecido que para tal efeito - para um confronto, sob o ponto de vista dessa correspondência material, entre o valor (montante) da taxa e o da contraprestação pública que é recebida pela pessoa ou entidade que a paga - não tem de ser relevante apenas o «custo», e o custo «directo» do serviço: - podem (ou devem) sê-lo, também, os respectivos «custos globais» (isto é, os custos gerais de funcionamento da entidade prestadora do serviço, que é legítimo repercutir, parceladamente, sobre os respectivos utilizadores);- mas, sobretudo, pode (ou deve) igualmente sê-lo, ainda, a «utilidade» daquela contraprestação para o respectivo beneficiário, ou seja, acrescentaremos: podem (ou devem) sê-lo ainda outros elementos ou outros aspectos dessa contraprestação susceptíveis de valoração económica e, consequentemente, susceptíveis de servirem de indicador de tal utilidade».
E conclui o mesmo Autor: «Vertendo em termos doutrinais a orientação jurisprudencial exposta, significa ela, em suma, que o Tribunal Constitucional considera que «o princípio” das taxas - enquanto, não apenas fundamento da sua incidência, mas igualmente justificação do seu montante - não tem de ser necessariamente o da «cobertura dos custos» do serviço prestado como sua contrapartida específica, mas pode ser também o chamado «princípio da equivalência», o qual justamente se reporta ao «valor da utilidade» auferida com esse serviço pelo respectivo beneficiário».
Ora, desenvolvendo o Recorrente uma actividade de utilização de recursos hídricos susceptível de causar “impacto negativo significativo no estado de qualidade ou quantidade da água” e considerando a necessidade de repercutir no poluidor os custos ambientais assim provocados, há que concluir que não se verifica a falta de equivalência jurídica subjacente à natureza sinalagmática da taxa. Por outro lado, como resulta do artigo 3º, nº 2, do Dec.-Lei nº 97/2008, de 11 de Junho, «A taxa de recursos hídricos visa compensar o benefício que resulta da utilização privativa do domínio público hídrico, o custo ambiental inerente às actividades susceptíveis de causar um impacte significativo nos recursos hídricos, bem como os custos administrativos inerentes ao planeamento, gestão, fiscalização e garantia da quantidade e qualidade das águas».
Afigura-se-nos, assim, que a taxa de recursos hídricos passa o teste da bilateralidade e da proporcionalidade.
4. Entendemos, assim, que a taxa impugnada não padece dos vícios de inconstitucionalidade que lhe são assacados pelo Recorrente, como de forma fundamentada se concluiu na sentença recorrida, a qual deve ser confirmada e o recurso ser julgado improcedente.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
1. A Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P. enviou para a Câmara Municipal de Pombal ofício com a referência 001/ARH-C_REF/2009, com data de saída de 03.03.2009, no qual se pode ler o seguinte:
«ASSUNTO: Notificação para pagamento de Taxa de Recursos Hídricos.
Serve o presente para informar V. Exa. que o valor apurado relativo à Taxa de Recursos Hídricos (TRH) para o ano de 2008 deverá ser pago até ao último dia do mês de Fevereiro de 2009, conforme dispõe o n.º 1 do artigo 16º do Decreto-Lei n.º 97/2008, de 11 de Junho. No entanto, e pelo facto de este ser o primeiro ano de aplicação do regime económico- financeiro dos recursos hídricos, a data de pagamento será, excepcionalmente, prolongada até ao dia 31 de Março de 2009.
Sempre que o valor apurado para a taxa de recursos hídricos for inferior a 10 euros, fica V. Exª isento do seu pagamento.
Mais se informa que a falta de pagamento atempado determina a aplicação de juros de mora à taxa legal em vigor, de acordo com o disposto no nº5 do artigo 16.º do supra citado diploma legal.»;
Cfr. documento a fls. 6 do Processo Administrativo Tributário em apenso; igualmente presente a fls. 27 dos autos.
2. Anexo ao referido ofício constava nota de liquidação com o seguinte conteúdo:








Cfr. documento a fls. 3/5 do PAT em apenso; igualmente presente a fls. 28/29 dos autos.
3. A Impugnante procedeu ao pagamento do valor constante da nota de liquidação referida no ponto anterior através do cheque n.º 7237168786, com data de 31.03.2009, sacado sobre a Caixa Geral de Depósitos, recebido por correio postal registado pela Entidade Impugnada em 01.04.2009;
Cfr. fls. 7/8 do PAT em apenso.
4. A Impugnante procede à captação, distribuição e fornecimento público de água em toda a área do Concelho de Pombal, fiscalizando e garantindo a qualidade da água e gerindo a rede de abastecimento público;
Acordo.
5. A presente impugnação deu entrada em juízo no dia 29.06.2009.
Cfr. mensagem de correio electrónico a fls. 3 e ss. dos autos.

3.1. Enunciando como questão a decidir a de aferir a legalidade do acto de liquidação impugnado relativo à taxa de recursos hídricos, quer por inconstitucionalidade orgânica do diploma que a criou, quer por inconstitucionalidade material desse tributo (i) por possuir objectivos extrafiscais e (ii) por violar o princípio da proporcionalidade, os princípios da legalidade tributária e da justiça, bem como o artigo 33° da Sexta Directiva do IVA e, ainda, por ocorrer ilegitimidade do sujeito passivo da taxa, a sentença, depois de apreciar (pela ordem que considerou determinar uma mais estável e/ou eficaz tutela dos interesses da impugnante) cada uma daquelas invocadas ilegalidades, veio a julgar improcedente a impugnação.
Para tanto, considerou-se, em síntese, o seguinte:
a) Não procede a invocada violação do art. 33º da Sexta Directiva do IVA
Na tese da impugnante a incidência subjectiva da taxa em causa e a sua repercussão sobre o consumidor final aproxima-a de uma tributação sobre o consumo, em violação do disposto no art. 33º da Sexta Directiva do IVA.
Porém, além de a impugnante não especificar em que é que se consubstancia tal violação, limitando-se a fazer um juízo conclusivo, também não se entende a invocação de legislação comunitária em matéria de IVA quando se discute uma taxa, e não aquele imposto, sendo que a visada Directiva 77/388/CEE do Conselho, de 17/5/1977, não impedia a introdução de impostos ou taxas sobre consumos específicos que não possuíssem as características essenciais do IVA [tendo o TJCE, em acórdão de 7/5/1992 (proc. C-347/90) emanado jurisprudência no sentido de que aquele art. 33º não levanta qualquer obstáculo à manutenção ou à introdução de outros tipos de impostos, direitos e taxas que não possuam as características essenciais do IVA].
Ora, como resulta do disposto no art. 78º da Lei n° 58/2005, de 29/12 e nos arts. 6º a 11º do DL nº 97/2008, de 11/6, sempre faltariam à taxa em questão algumas das características essenciais do IVA.
b) Não se verifica inconstitucionalidade orgânica da Taxa de Recursos Hídricos (TRH)
Esta taxa está prevista no art. 78° da Lei n° 58/2005, de 29/12, havendo ainda que atentar no DL n° 97/2008, de 11/6, que estabelece o regime económico e financeiro dos recursos hídricos previsto naquela Lei, disciplinando a taxa de recursos hídricos, as tarifas dos serviços públicos de águas e os contratos-programa em matéria de gestão dos recursos hídricos (cfr. o art. 1º desse DL).
Esta taxa foi aprovada pela AR e não pelo Governo, ao contrário do alegado pela impugnante, sendo a Lei nº 58/2005 a respectiva Lei habilitante, nela se definindo a base de incidência objectiva e subjectiva, o destino da receita e o modo de cobrança (o DL nº 97/2008 limita-se a regular, entre o mais e em concreto, as bases de incidência, as taxas unitárias aplicáveis, a liquidação, a cobrança e o destino de receitas da TRH, conforme previsto no art. 102°, n° 2 da dita Lei n° 58/2005 (denominada Lei da Água).
Aliás, esta Lei 58/2005, transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva n° 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23/10.
E sendo as Directivas vinculativas para os Estados-Membros seus destinatários, são obrigatórias em todos os seus elementos, não podendo ser transpostas para a ordem jurídica nacional de modo incompleto, selectivo ou parcial, pelo que é a própria Directiva citada (n° 2000/60/CE) que habilita o legislador nacional a criar a Taxa dos Recursos Hídricos (TRH), quando lhe permite o “financiamento de medidas preventivas ou de medidas correctivas específicas para atingir os objectivos da presente directiva” para além da amortização dos custos dos serviços hídricos, conforme resulta do disposto no art. 9° da mesma Directiva.
Tratando-se, portanto de uma taxa, a respectiva criação não está sujeita ao disposto na al. i) do nº 1 do art. 165° da CRP, sendo ainda certo que não existe ainda um “regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas”. E de todo o modo, esta TRH foi criada por lei do Parlamento e resulta sobretudo da Diretiva n° 2000/60/CE.
c) Não se verifica inconstitucionalidade material da TRH
Tendo presente a noção de taxa, é indubitável que a TRH não é mais que a contraprestação pela utilização de um bem de domínio público - a água. Por outro lado, a cobrança de um valor pela utilização deste bem escasso proporciona ao Estado os meios financeiros indispensáveis ao funcionamento de todo um sistema de protecção desse mesmo recurso, objectivo a que o mesmo se encontra obrigado a atingir pela Directiva Água.
E também não é de acolher a argumentação no sentido de que é a própria impugnante que procede à captação, distribuição e fornecimento de água em toda a área do Concelho de Pombal, bem como à gestão e fiscalização dos recursos hídricos, garantindo a quantidade e qualidade da água fornecida aos seus munícipes, pelo que a Entidade Demandada não lhe presta, ou aos seus munícipes, qualquer serviço, inexistindo contraprestação na taxa ora impugnada: é que a impugnante confunde a prestação de um serviço, que ela própria presta e para o qual cobrará, com certeza, um preço, com a utilização de um bem do domínio público. Na verdade, como até resulta do nº 1 do art. 78° da Lei da Água e do nº 2 do art. 3º do DL nº 97/2008, a captação, distribuição e fornecimento de água aos munícipes, bem como a gestão e fiscalização de tais tarefas, de molde a garantir a quantidade e qualidade da água fornecida, consubstancia a prestação de um serviço público, para o qual a impugnante está legitimada a cobrar o respectivo preço aos respectivos consumidores; já a utilização privativa dos recursos hídricos, que por inerência limita ou exclui o aproveitamento por outrem, é a contrapartida principal da taxa em apreço.
Assim, ao contrário do defendido pela impugnante, o tributo em causa possui natureza bilateral, e não unilateral.
E quanto à também alegada violação do princípio da proporcionalidade, além de não ser possível descortinar como pode a TRH violar tal princípio, pela simples circunstância de a sua receita permitir o financiamento de um serviço público, sendo que a alegação da impugnante também está desprovida de qualquer substanciação, também, por outro lado, não se descortina a existência de qualquer “desproporção intolerável” que seja “manifesta” e comprometedora, “de modo inequívoco, [d]a correspectividade pressuposta na relação sinalagmática” – cfr. o ac. nº 1140/96 do TConstitucional.
d) Não se verifica ilegitimidade da impugnante enquanto sujeito passivo da taxa, nem ocorre violação dos princípios da justiça e da legalidade
Com efeito, atentando no disposto nos arts. 4º (incidência objectiva) e 5º (incidência subjectiva) do DL nº 97/2008, de 11/6, a TRH incide sobre a utilização de águas sujeitas a planeamento e gestão públicos susceptível de causar impacte significativo.
Ora, decorrendo do Probatório que é a impugnante quem procede à captação, distribuição e fornecimento público de água em toda a área do concelho de Pombal, gerindo a rede de abastecimento público e considerando que a utilização da água pelos munícipes de todo um concelho é indubitavelmente susceptível de causar impacte significativo, é ela o sujeito passivo da taxa, nos termos do nº 1 do citado art. 5º do DL nº 98/2008, sendo que, ao contrário do alegado pela impugnante, relativamente à base tributável referente às componentes “I” e “O” o respectivo valor é zero (nº 2 do Probatório), ou seja, nada foi liquidado com referência à “extracção de inertes do domínio público hídrico do Estado” (arts. 6º e 9º do DL nº 97/2008) e à “ocupação de terrenos do domínio público hídrico do Estado e à ocupação e criação de planos de água” (arts. 6º e 10º do mesmo diploma).

3.2. Discordando do assim decidido, a recorrente entende, como se viu, que a sentença incorre em erro de julgamento ao apreciar as questões de inconstitucionalidade orgânica e material da taxa, assim como de violação do princípio da proporcionalidade e legalidade tributária.
Reitera que não se verificam os pressupostos de bilateralidade da taxa (dado que não existe qualquer contrapartida resultante da prestação de um serviço por parte da entidade que a liquida) sendo ela – recorrente - que procede à captação, distribuição e fornecimento público de água em toda a área do concelho de Pombal, fiscalizando e garantindo a sua qualidade), não havendo, por isso, “qualquer utilização privativa do domínio público hídrico por parte do município de Pombal, mas sim uma utilização pública de um bem do domínio público hídrico”.
Entende, assim, que a taxa enferma do vício de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da legalidade tributária, da igualdade e da proporcionalidade (nº 2 do art. 103º, art. 13º e nº 2 do art. 266º, todos da CRP), já que visa «compensar custos administrativos -manifestando uma função retributiva, bem como promover objectivos de índole ambiental -revelando uma função extrafiscal».
Além de que a sentença devia, também, ter desaplicado os arts. 3º a 6º e 8º do DL nº 97/2008, por inconstitucionalidade – decorrente de violação da al. i) do nº 1 do art. 165º da CRP.
Estas são, portanto, as questões aqui a decidir.
Vejamo-las.

4.1. Sustenta a recorrente que a inconstitucionalidade orgânica da Taxa de Recursos Hídricos (TRH) decorre da violação do princípio da reserva legal absoluta (al. i) do nº 1 do art. 165° da CRP) pois que este tributo assume a estrutura típica de uma contribuição especial de financiamento de um serviço público e, assim sendo, falta a prévia lei habilitante.
Ora, a TRH foi criada pela designada Lei da Água [Lei nº 58/2005, de 29/12 (Com alterações decorrentes do DL nº 245/2009, de 22/9 e do DL nº 130/2012, de 22/6.)], e resulta, aliás, da Directiva nº 2000/60/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23/10 (a Lei nº 58/2005 transpõe para a ordem jurídica nacional essa Directiva Quadro da Água – cfr. o nº 2 do art. 1º da Lei). Ou seja, como bem se refere na sentença, é de entender que o regime da TRH consagrado no DL nº 97/2008, de 11/6, tem como lei habilitante a referida Lei nº 58/2005 (Lei da Água) e que, de todo o modo, atendendo também ao disposto no art. 8º da CRP e visto que a Directiva vincula o Estado Português, não se vê que ocorra inconstitucionalidade, por violação do princípio da reserva de lei formal.
Aliás, no nº 4 do art. 78º da Lei logo se prescreve que «As bases de incidência, as taxas unitárias aplicáveis, a liquidação, a cobrança e o destino de receitas da TRH, bem como as correspondentes competências administrativas, as isenções referidas no nº 3 do artigo 80º e as matérias versadas no nº 2 do artigo 79º e no nº 2 do artigo 81º, são reguladas por normas a aprovar nos termos do nº 2 do artigo 102º», que no nº 2 do art. 80º se prevê que «O Governo promove a introdução progressiva da taxa, em função das necessidades de financiamento dos planos de gestão e protecção das águas e das instituições responsáveis pelos mesmos, mas considerando igualmente as consequências económicas, sociais e ambientais da sua aplicação» e que, por último, no art. 102º, também se impõe que o Governo aprove, em normativo próprio, as normas complementares necessárias à aplicação dos anexos da Directiva nº 2000/60/CE, bem como os D.Leis complementares que regulem a utilização de recursos hídricos e o respectivo regime económico e financeiro (o supra apontado DL nº 97/2008, de 11/6), pelo que até a alegação de inconstitucionalidade (por falta de Lei Quadro/Regime Geral das Taxas) carecerá de razão legal.
Acresce que, como bem salienta a sentença recorrida, quanto à alegada violação do disposto no art. 33º da Sexta Directiva do IVA, por parte da TRH, em razão da respectiva incidência subjectiva ou da sua repercussão sobre o consumidor final, a recorrente não especifica em que é que se materializa essa violação, além de que a própria jurisprudência do (então) TJCE vai no sentido de que o referido art. 33º não obsta à criação de outros tipos de impostos, direitos e taxas que não possuam as características essenciais do IVA, como, claramente, sucede no caso da TRH.
Improcede, portanto, o recurso no que se reporta à alegação de inconstitucionalidade orgânica da TRH, por violação

4.2. Quanto à invocada inconstitucionalidade material
A este respeito a recorrente argumenta, no essencial, que não se verificam os pressupostos de bilateralidade da taxa, dado não existir qualquer contrapartida que resulte da prestação de um serviço por parte da entidade que liquida a taxa, sendo ela, recorrente, a proceder à captação, distribuição e fornecimento público de água em toda a área do concelho de Pombal, fiscalizando e garantindo a sua qualidade. E sustentando que, por isso, «não existe qualquer utilização privativa do domínio público hídrico por parte do município de Pombal, mas sim uma utilização pública de um bem do domínio público hídrico», conclui que a TRH sofre do vício de inconstitucionalidade, por violação dos princípios da legalidade tributária, da igualdade e da proporcionalidade (nº 2 do art. 103º, art. 13º e nº 2 do art. 266º, da CRP) já que visa «compensar custos administrativos - manifestando uma função retributiva, bem como promover objectivos de índole ambiental - revelando uma função extrafiscal».
Vejamos.

4.2.1. É sabido que a taxa se consubstancia numa prestação pecuniária e impositiva devida a uma entidade que exerça funções públicas, em contrapartida de uma prestação dessa entidade, provocada ou utilizada pelo sujeito passivo; e a prestação da entidade pública há-de consistir (na tipologia consagrada na LGT, na Lei das Finanças Locais e no Regime Geral das Taxas das Autarquias Locais) na prestação de um serviço público, na utilização privativa de bens do domínio público e na remoção de obstáculo jurídico ao comportamento dos particulares. (Cfr. Diogo Leite Campos, Benjamim Silva Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, Lei Geral Tributária, Anotada e comentada, Editora Encontro da escrita, 4ª ed. 2012, pp. 70/71, anotação 4 ao art. 3º.)
Dando por adquiridas as inúmeras reflexões doutrinárias e jurisprudenciais produzidas sobre a matéria atinente à distinção entre imposto e taxa [ou seja, que ambos constituem receitas públicas coactivamente impostas, mas enquanto o imposto «... é uma prestação pecuniária, coactiva e unilateral, sem carácter de sanção, exigida pelo Estado com vista à realização de fins públicos» (Cfr. Teixeira Ribeiro, Lições de Finanças Públicas, Coimbra, 1977, p. 262.) a taxa tem «carácter sinalagmático, não unilateral, o qual por seu turno deriva funcionalmente da natureza do facto constitutivo das obrigações em que se traduzem e que consiste ou na prestação de uma actividade pública ou na utilização de bens do domínio público ou na remoção de um limite jurídico à actividade dos particulares» (Cfr. Alberto Xavier, Manual de Direito Fiscal, Vol. I, Lisboa, 1981, p. 42.) pressupondo, pois, uma contraprestação por parte do ente público que a exige, a verificar-se na respectiva génese, e que deve concretizar-se naquela prestação de serviço público, naquele acesso à utilização de bens do domínio público ou na remoção do obstáculo jurídico à actividade do particular] (Cfr. Casalta Nabais, Contratos Fiscais, Coimbra 1994, 236.) ressalta na definição legal e doutrinal da taxa a individualização de um aspecto estrutural da mesma (a sinalagmaticidade ou bilateralidade) e, em consequência, os respectivos pressupostos da sua cobrança. Relação sinalagmática essa que, como se sublinha no acórdão do Tribunal Constitucional n° 365/03, de 14/7/2003, «há-de ter um carácter substancial ou material, e não meramente formal; isso não implica, porém, que se exija uma equivalência económica rigorosa entre ambos, não sendo incompatível com a natureza sinalagmática da taxa o facto de o seu montante ser superior (e porventura até consideravelmente superior) ao custo do serviço prestado.
O que não pode é ocorrer uma «desproporção intolerável» (Ac. nº 1140/96, in DR II Série, de 10/2/97)”, ou seja, “manifesta” e comprometedora, “de modo inequívoco, [d]a correspectividade pressuposta na relação sinalagmática”, sendo certo que a sua aferição há-de tomar em conta, não apenas o valor da quantia a pagar, mas também a utilidade do serviço prestado.»
Ou seja, embora (i) se venha acentuando que a taxa não pode ter só como pressuposto uma mera prestação administrativa sendo necessário que se dirija à compensação dessa prestação, estabelecendo-se uma relação comutativa entre a prestação e a taxa; (ii) e embora alguns autores entendam que a função compensatória das taxas se refere ao custo da prestação para a entidade pública ou ao benefício que esta acarreta para o devedor, elas também têm uma finalidade arrecadatória de receitas, intimamente associada à função compensatória, ou a outras finalidades, (iii) por outro lado, também se acentua que, apesar de não dever ultrapassar-se um certo patamar quantitativo nem perder o sentido comutativo, a equivalência se reconduz a uma equivalência jurídica (ver art. 4º do RTL) entre as prestações e não a uma equivalência económica; equivalência jurídica que deve, contudo, fundamentar-se numa relação entre o custo do serviço e o valor da prestação e é materialmente determinada segundo o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade. (Cfr. Suzana Tavares da Silva, As Taxas e a Coerência do Sistema Tributário, CEJUR, Outubro de 2008, pp. 60/61.
Idem, A Tutela jurisdicional dos sujeitos passivos das taxas, Conferência – A tutela jurisdicional efectiva dos sujeitos passivos das taxas, Coimbra, 3 de Fevereiro de 2011 – AO-CDC / Almedina, pp. 4/5.)

4.2.2. Entre outras, relevam, no caso vertente, as disposições contidas nos arts. 78º e 79º da Lei nº 58/2005, de 29/12 (Lei da Água) e nos arts. 4º a 6º do DL nº 97/2008 de 11/6, nas quais se estabelece o seguinte:
Lei nº 58/2005
Artigo 78º
Taxa de recursos hídricos
«1 — A taxa de recursos hídricos (TRH) tem como bases de incidência objectiva separadas:
a) A utilização privativa de bens do domínio público hídrico, tendo em atenção o montante do bem público utilizado e o valor económico desse bem;
b) As actividades susceptíveis de causarem um impacte negativo significativo no estado de qualidade ou quantidade de água, internalizando os custos ambientais associados a tal impacte e à respectiva recuperação.
2 — A utilização de obras de regularização de águas superficiais e subterrâneas realizadas pelo Estado constitui também base de incidência objectiva da TRH, proporcionando a amortização do investimento e a cobertura dos respectivos custos de exploração e conservação, devendo ser progressivamente substituída por uma tarifa cobrada pelo correspondente serviço de água.
3 — A TRH corresponde à soma dos valores parcelares aplicáveis a cada uma das bases de incidência objectivas.
4 — As bases de incidência, as taxas unitárias aplicáveis, a liquidação, a cobrança e o destino de receitas da TRH, bem como as correspondentes competências administrativas, as isenções referidas no nº 3 do artigo 80º e as matérias versadas no nº 2 do artigo 79º e no nº 2 do artigo 81º, são reguladas por normas a aprovar nos termos do nº 2 do artigo 102º.»
Artigo 79º
Aplicação da taxa de recursos hídricos
«1 — As receitas obtidas com o produto da taxa de recursos hídricos são aplicadas:
a) No financiamento das actividades que tenham por objectivo melhorar a eficiência do uso da água e a qualidade dos recursos hídricos;
b) No financiamento das acções de melhoria do estado das águas e dos ecossistemas associados;
c) Na cobertura da amortização dos investimentos e dos custos de exploração das infra-estruturas necessárias ao melhor uso da água;
d) Na cobertura dos serviços de administração e gestão dos recursos hídricos, objecto de utilização e protecção.
2 — (...)».
DL nº 97/2008 de 11/6:
Artigo 4º
Incidência objectiva
«A taxa de recursos hídricos incide sobre as seguintes utilizações dos recursos hídricos:
a) A utilização privativa de águas do domínio público hídrico do Estado;
b) A descarga, directa ou indirecta, de efluentes sobre os recursos hídricos, susceptível de causar impacte significativo;
c) A extracção de materiais inertes do domínio público hídrico do Estado;
d) A ocupação de terrenos ou planos de água do domínio público hídrico do Estado;
e) A utilização de águas, qualquer que seja a sua natureza ou regime legal, sujeitas a planeamento e gestão públicos, susceptível de causar impacte significativo.»
Artigo 5º
Incidência subjectiva
«1 — São sujeitos passivos da taxa de recursos hídricos todas as pessoas, singulares ou colectivas, que realizem as utilizações referidas no artigo anterior estando, ou devendo estar, para o efeito munidas dos necessários títulos de utilização.
2 — Quando a taxa não seja devida pelo utilizador final dos recursos hídricos, deve o sujeito passivo repercutir sobre o utilizador final o encargo económico que ela representa, juntamente com os preços ou tarifas que pratique.»
Artigo 6º
Base tributável
«1 — A base tributável da taxa de recursos hídricos é constituída por cinco componentes e expressa pela fórmula seguinte:
Taxa = A + E + I + O + U
2 — A aplicação das componentes da base tributável da taxa de recursos hídricos é cumulativa e a inaplicabilidade de uma qualquer das componentes não prejudica a aplicação das demais.
3 — Quando o sujeito passivo realize utilizações que se integrem na mesma componente e às quais sejam aplicáveis valores de base diferentes, os títulos de utilização devem proceder à sua segregação, na falta da qual se aplicará ao conjunto das utilizações que integrem a mesma componente o valor de base mais elevado.
4 — Não podem ser reconhecidas isenções de taxa de recursos hídricos, em qualquer das componentes que a integram, além das que se encontram expressamente previstas no presente decreto-lei.»

4.2.3. A sentença recorrida caracterizou como taxa o tributo em questão (taxa de recursos hídricos - TRH).
E afigura-se-nos que o fez correctamente, pois que, do que decorre dos normativos transcritos, naquele se surpreendem as características (acima enunciadas) que a doutrina e a jurisprudência exigem à qualificação de um tributo na categoria das taxas, nomeadamente a bilateralidade contestada pela recorrente.
E apesar de a recorrente invocar que é o município de Pombal que procede à captação da água e controla a sua qualidade e quantidade, pelo que a “Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P.” não presta qualquer serviço que fundamente a cobrança da taxa, também é certo que, como bem aponta o MP, a actividade que ela desenvolve (distribuição de água para consumo humano e actividade de drenagem e tratamento de águas residuais) se encontra autonomamente regulada pelo DL nº 306/2007, de 27/8 (que revogando o DL 243/2001, de 5/9, logo explicita no seu Preâmbulo «a necessidade de adaptar melhor a legislação nacional relativa à qualidade da água para consumo humano à Directiva nº 98/83/CE, do Conselho, de 3 de Novembro»), obedecendo a princípios diversos daqueles que se encontram subjacentes à utilização dos recursos hídricos.
Na verdade, as Administrações das Regiões Hidrográficas — a quem a lei (no seguimento do determinado no nº 1 do art. 8º da Directiva 2000/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, (Onde se determina que «Os Estados-Membros garantirão a elaboração de programas de monitorização do estado das águas, por forma a permitir uma análise coerente e exaustiva do estado das águas em cada região hidrográfica».) atribui a gestão das águas, incluindo o respectivo planeamento, licenciamento e fiscalização (cfr a al. b) do nº 1 do art. 7º da Lei 58/2005), nomeadamente, na respectiva área territorial de cada uma das ARH (as atribuições e competências previstas nos nºs. 5 e 6 do art. 9º do mesmo diploma) —, actuam num plano mais global de gestão e monitorização dos recursos hídricos das bacias hidrográficas, sendo que, relativamente à Administração da Região Hidrográfica do Centro, I.P., a respectiva área territorial abrange também a de outros municípios, para além do município de Pombal.
E para a prossecução e realização de tais serviços a lei também contempla receitas próprias das ARH (entre as quais a Taxa de Recursos Hídricos), especificadas no nº 9 daquele referido art. 9º da Lei da Água, a serem suportados pelos utilizadores dos recursos hídricos, de acordo com o princípio da promoção da utilização sustentável desses recursos hídricos (cfr. o art. 77º da Lei e os arts. 2º e 3º do DL nº 97/2008 de 11/6).
Tanto que, como resulta do nº 1 do art. 78º da mesma Lei e do art. 4º do dito DL, a TRH tem bases de incidência objectiva separadas: a utilização privativa de bens de domínio público hídrico, bem como, por outro lado, as actividades susceptíveis de causar um impacte negativo significativo no estado das águas. Aliás, logo no Preâmbulo do DL 97/2008 se consigna que a estrutura objectiva da taxa «integra diferentes tipos de utilizações dos recursos hídricos, combinando na sua base de incidência componentes que reflectem a preocupação fundamental de compensar quer os custos que o utilizador provoca à comunidade quer os benefícios que a comunidade lhe proporciona.
Tomam-se, por isso, como base de incidência o aproveitamento de águas do domínio público hídrico do Estado; a descarga, directa ou indirecta, de efluentes sobre os recursos hídricos, susceptível de causar impacte significativo; a extracção de materiais inertes do domínio público hídrico; a ocupação de terrenos ou planos de água do domínio público hídrico do Estado; bem como a utilização de águas sujeitas a planeamento público, susceptível de causar nelas impacte significativo.» Ou seja, como referem Gonçalo Leite de Campos e Miguel Clemente, («As Taxas de Regulação Económica nos Sectores das Águas e Resíduos», in «As Taxas de Regulação Económica em Portugal» - Coordenação de Sérgio Vasques, Março 2008, Almedina, pp. 119 e ss.) «…o artigo 78º da lei da Água também decompõe o plano de incidência objectiva da TRH em duas parcelas cumulativas, ambas colocadas sob o domínio do princípio da equivalência. A primeira, consiste na utilização privativa dos bens dominiais e assenta no benefício, como contraprestação específica e individualmente mensurável, que o sujeito passivo da relação jurídica tributária retira dessa utilização (prestando, assim, homenagem ao princípio do utilizador-pagador). Já a segunda, formada pelas “actividades susceptíveis se causarem impacto negativo significativo no estado de qualidade ou quantidade de água”, é norteada pela necessidade de repercutir no poluidor os custos ambientais provocados (obedecendo, portanto, à lógica que subjaz ao princípio do poluidor-pagador)».
Daí que a base subjectiva da TRH seja «preenchida por aplicação do citado princípio da necessidade de título de utilização, ou seja, em substância, pelas entidades que, por um lado, utilizem o domínio público hídrico e que, por outro, pela sua dimensão e potenciais efeitos, sejam susceptíveis de provocar um impacto negativo significativo sobre os recursos hídricos. Tais utilizações – susceptíveis de causar impacto negativo relevante no estado das águas – encontram-se, naturalmente, enumeradas na Lei da Água, correspondendo, em suma, às que são sujeitas à emissão de título de utilização do domínio público hídrico». (Cfr. sobre os títulos de utilização do domínio público hídrico, o DL nº 226-A/2007, de 31/5.)
E de todo o modo, também resulta da al. b) do nº 1 do art. 82º da Lei da Água (bem como do nº 2 do art. 5º do DL nº 97/2008, de 11/6) que sempre que o sujeito passivo da TRH, como é o caso concreto dos autos, não seja o utilizador final dos recursos hídricos, esta deve ser economicamente repercutida nos preços ou tarifas praticados. Sendo, ainda, de realçar que, como acima se referiu (a propósito do teor do ac. nº 365/03, de 14/7/2003, do T. Constitucional), em termos de bilateralidade não será exigível uma equivalência económica rigorosa entre a prestação e a taxa e que, por outro lado, como citando Cardoso da Costa (In «Homenagem a José Guilherme Xavier de Basto», p. 555.) sublinha o MP, a jurisprudência constitucional (cfr., v. g. os acs. nº 115/2002 e nº 349/2002) também vem considerando que «…os termos de referência a considerar na emissão de um juízo sobre a correspondência «material» (ou a proporcionalidade) entre o montante da taxa e a respectiva contraprestação (independentemente, agora, do grau que tal correspondência deva assumir). Com efeito, nesses acórdãos, deixou o Tribunal esclarecido que para tal efeito - para um confronto, sob o ponto de vista dessa correspondência material, entre o valor (montante) da taxa e o da contraprestação pública que é recebida pela pessoa ou entidade que a paga - não tem de ser relevante apenas o «custo», e o custo «directo» do serviço: - podem (ou devem) sê-lo, também, os respectivos «custos globais» (isto é, os custos gerais de funcionamento da entidade prestadora do serviço, que é legítimo repercutir, parceladamente, sobre os respectivos utilizadores);- mas, sobretudo, pode (ou deve) igualmente sê-lo, ainda, a «utilidade» daquela contraprestação para o respectivo beneficiário, ou seja, acrescentaremos: podem (ou devem) sê-lo ainda outros elementos ou outros aspectos dessa contraprestação susceptíveis de valoração económica e, consequentemente, susceptíveis de servirem de indicador de tal utilidade». Ou seja, «o Tribunal Constitucional considera que “o princípio” das taxas - enquanto, não apenas fundamento da sua incidência, mas igualmente justificação do seu montante - não tem de ser necessariamente o da «cobertura dos custos» do serviço prestado como sua contrapartida específica, mas pode ser também o chamado «princípio da equivalência», o qual justamente se reporta ao «valor da utilidade» auferida com esse serviço pelo respectivo beneficiário».
Daí que, no entendimento de Joana Mendes, (In Tratado de Direito Administrativo Especial, Volume II, coordenação de Paulo Otero e Pedro Gonçalves, Almedina, pp. 122 a 124.) seja possível defender «a bondade constitucional da taxa de recursos hídricos», apesar das dúvidas que eventualmente possam suscitar-se relativamente à natureza da TRH (taxa ou contribuição especial de carácter unilateral) em face do teor do nº 2 do art. 3º, da al. e) do art. 4º e do nº 1 do art. 11º, todos do DL nº 97/2008 e da inerente dificuldade em determinar a possível divisibilidade dos custos administrativos ali mencionados, para poderem ser imputáveis aos sujeitos passivos da TRH.
E na verdade afigura-se-nos ser essa a interpretação que resulta dos normativos em causa. É que, como aquela autora sublinha, não obstante a TRH vise, também, compensar os “custos administrativos inerentes ao planeamento, gestão, fiscalização e garantia da quantidade e qualidade das águas” (nº 2 do art. 3º) e não obstante a respectiva base de incidência objectiva reporte, nomeadamente quanto à componente “U”, à “utilização de águas, qualquer que seja a sua natureza ou regime legal, sujeitas a planeamento e gestão públicos, susceptível de causar impacte significativo [al. e) do art. 4º e nº 1 do art. 11º] pelo que esta, «na parte referente à componente “U” seria devida pelos serviços de planeamento e de gestão de que o utilizador beneficia e que constituem externalidades positivas da actividade de protecção da água», com a consequente caracterização desta componente como contribuição financeira a favor de entidades públicas, o que é certo é que a natureza de taxa se revela na medida em que a TRH «é devida pela utilização privativa do domínio público e pelo custo ambiental inerente às actividades susceptíveis de causarem impactes negativos significativos, e na medida em que estes são mensuráveis e imputáveis a um utilizador, existe uma contraprestação específica “resultante de uma relação concreta (...) entre o contribuinte e um bem (...) público” sendo possível assegurar o princípio da equivalência entre o valor pago e o custo que os utilizadores provocam à comunidade ou na medida do benefício que esta lhes proporciona, nos termos do artigo 2º, nº 2, do Decreto-Lei nº 97/2008».
Acresce que, no caso, a base tributável referente às componentes “I” e “O”, (As componentes da TRH, especificados nos arts. 6º e sgts. do DL 97/2008, integram (a) o aproveitamento da água, (e) as descargas de efluentes emitidas, (i) os inertes extraídos do domínio público hídrico, (o) a área ocupada de domínio público hídrico e (u) a utilização privativa de águas sujeitas a planeamento e gestão públicos.) possui o valor de zero (cfr. nº 2 do Probatório); ou seja, nada foi liquidado com referência às ditas componentes “I” e “O”.
Daí que, em discordância com o alegado pela recorrente (no sentido de que não existe qualquer contrapartida resultante da prestação de um serviço pela entidade que liquida a taxa), não se conclua que a TRH evidencia mera função retributiva (por alegadamente visar exclusivamente compensar custos administrativos), ou evidencia mera função extrafiscal (por alegadamente apenas promover objectivos de índole ambiental). E considerando que, naquela medida, a recorrente (que procede à captação, distribuição e fornecimento público de água em toda a área do concelho de Pombal, gerindo a rede de abastecimento público (cfr. nº 4 do Probatório) desenvolve uma actividade de utilização de recursos hídricos susceptível de causar “impacto negativo significativo no estado de qualidade ou quantidade da água” (e como diz a sentença, a utilização da água pelos munícipes de todo um concelho é indubitavelmente susceptível de causar impacte significativo), é ela o sujeito passivo da taxa (nº 1 do art. 5º do DL nº 98/2008).
E considerando, igualmente, a necessidade de repercutir no poluidor aqueles referenciados custos assim provocados, também se conclui que não se verifica a alegada falta de equivalência jurídica subjacente à natureza sinalagmática da taxa, nem, por consequência, ocorre violação dos princípios constitucionais da legalidade tributária, da igualdade e da proporcionalidade.
Improcedem, portanto, as Conclusões do recurso.

DECISÃO
Nestes termos, acorda-se em, negando provimento ao recurso, confirmar a sentença recorrida.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 17 de Fevereiro de 2016. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco Rothes – Aragão Seia.