Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0442/16.0BEBRG
Data do Acordão:03/22/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:MADEIRA DOS SANTOS
Descritores:APRECIAÇÃO PRELIMINAR
PENSÃO DE SOBREVIVÊNCIA
SEPARAÇÃO JUDICIAL DE PESSOAS E BENS
UNIÃO DE FACTO
Sumário:É de admitir a revista do acórdão revogatório que julgou improcedente a acção dos autos – tendente a obter do ISS (CNP) uma pensão de sobrevivência – pois importa elucidar se a pretensão da recorrente, que se fundara em união de facto, podia ser indeferida com o fundamento de que ela e o falecido, que eram casados entre si, estavam judicialmente separados de pessoas e bens e sem qualquer pensão alimentícia fixada.
Nº Convencional:JSTA000P24364
Nº do Documento:SA1201903220442/16
Data de Entrada:02/21/2019
Recorrente:A..................
Recorrido 1:INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P. (CENTRO NACIONAL DE PENSÕES)
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, no Supremo Tribunal Administrativo:
A…………….., identificada nos autos, interpôs esta revista do acórdão do TCA Norte que, revogando o sentenciado no TAF de Braga – que deu procedência à acção deduzida pela ora recorrente contra o Instituto da Segurança Social, IP (Centro Nacional de Pensões) com vista a suprimir o acto que lhe indeferira o pagamento de uma pensão de sobrevivência e a obter a condenação da entidade de mandada no deferimento do requerido – julgou a mesma acção totalmente improcedente.

A recorrente defende na revista a necessidade de uma melhor aplicação do direito.
Não houve contra-alegação.

Cumpre decidir.
Em princípio, as decisões proferidas em 2.ª instância pelos TCA’s não são susceptíveis de recurso para o STA. Mas, excepcionalmente, tais decisões podem ser objecto de recurso de revista em duas hipóteses: quando estiver em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, assuma uma importância fundamental; ou quando a admissão da revista for claramente necessária para uma melhor aplicação do direito («vide» o art. 150º, n.º 1, do CPTA).
«In casu», a factualidade provada diz-nos que a recorrente requereu ao ISS (CNP) a atribuição de uma pensão de sobrevivência por morte do seu marido, de quem estava judicialmente separada de pessoas e bens e com quem alegadamente vivia em união de facto, mas sem pensão alimentícia fixada. Respondendo a esse requerimento, o ISS sugeriu à recorrente que fundasse o seu pedido na união de facto (Lei n.º 7/2001, de 11/5). E, tendo-o ela feito, o ISS emitiu o acto impugnado – onde indeferiu a pretensão da viúva porque – à luz do art. 11º do DL n.º 322/90, de 18/10 – o cônjuge judicialmente separado de pessoas e bens só tem direito a haver uma pensão do género se o tribunal previamente o reconhecer como credor de alimentos, devidos pelo falecido.
O TAF considerou que a autora tinha direito à pensão de sobrevivência ao abrigo da Lei n.º 7/2001; pois nada juridicamente impediria que a autora vivesse, com o marido, numa união de facto superadora da separação judicial de pessoas e bens.
Ao invés, o TCA entendeu que a subsistência do casamento era impeditiva da união de facto. De modo que o acto de indeferimento se harmonizava com o art. 11º do DL n.º 322/90, justificando-se a improcedência da acção.
Na presente revista, a recorrente pugna pela revogação do aresto, assinalando que foi o próprio ISS quem a induziu a requerer a pensão de sobrevivência com base na união de facto.
E, na verdade, a conduta do ISS não primou pela coerência. Num primeiro momento, sugeriu à recorrente que fundasse o seu pedido na união de facto (ou seja, na Lei n.º 7/2001); e, quando ela o fez, indeferiu-o com base num tipo legal de acto alheio à previsão desse diploma.
Perante essa Lei n.º 7/2001 – afinal, a invocada no requerimento indeferido – o caso dos autos suscitava uma única, e espinhosa, questão: a de saber se dois cônjuges, juridicamente separados de pessoas e bens, podem, ainda assim, unir-se de facto – por forma a que um deles beneficie depois das medidas protectivas ali previstas.
E essa questão era mesmo a única porque, se for concebível uma união de facto entre cônjuges judicialmente separados, a pensão de sobrevivência é, em princípio, devida – tendo em conta o que se dispõe no art. 6º da Lei n.º 7/2001.
Ora, este assunto merece, apesar da sua singularidade, uma elucidação por parte do Supremo. Não só porque as instâncias julgaram em sentidos opostos, mas também devido à dificuldade técnica da «quaestio juris» em presença. Por outro lado, o aresto recorrido revelou pouca atenção à incoerência das respostas que o ISS foi dando às solicitações da aqui recorrente; e este ponto também induz a uma reanálise do assunto.

Nestes termos, acordam em admitir a revista.
Sem custas.

Porto, 22 de Março de 2019. – Madeira dos Santos (relator) – Costa Reis – São Pedro.