Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0738/16.0BEPRT
Data do Acordão:09/27/2019
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SÃO PEDRO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
CONTRATO DE ARRENDAMENTO
Sumário:Não se justifica admitir revista de acórdão que, através de um discurso fundamentado e juridicamente plausível, confirma decisão da primeira instância relativamente a questões que apenas relevam no âmbito do processo em causa.
Nº Convencional:JSTA000P24934
Nº do Documento:SA1201909270738/16
Data de Entrada:06/21/2019
Recorrente:CÂMARA MUNICIPAL DA MAIA
Recorrido 1:A.........
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar – art. 150º, 1, do CPTA.

Acordam no Supremo Tribunal Administrativo (art. 150º, 1 do CPTA)

1. Relatório

1.1. O MUNICÍPIO DA MAIA recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, nos termos do art. 150º, 1, do CPTA, do acórdão do TCA Norte, proferido em 1 de Março de 2019, que manteve a sentença proferida pelo TAF do Porto a qual, por seu turno julgou improcedente a acção administrativa por si instaurada contra A……………… pedindo a resolução de um contrato de arrendamento e promessa de compra e venda no âmbito do regulamento municipal para atribuição de habitações a custos controlados.

1.2. Fundamenta a admissão da revista por entender que estão em causa questões de importância fundamental.

1.3. A recorrida pugna pela não admissão da revista.

2. Matéria de facto

Os factos dados como provados são os constantes do acórdão recorrido para onde se remete.

3. Matéria de Direito

3.1. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, excepcionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito». Como decorre do próprio texto legal e a jurisprudência deste STA, tem repetidamente sublinhado trata-se de um recurso excepcional, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, considerando-o como uma «válvula de segurança do sistema», que só deve ter lugar, naqueles precisos termos.

3.2. O Município da Maia intentou a presente acção formulando o seguinte pedindo que fosse decretado o despejo da ré, condenando-a condenando-se a entregar o locado, livre e devoluto de pessoas e bens e a reconhecer resolvido o Contrato Promessa de aquisição de fracção, face ao seu declarado incumprimento, com perda de todas as quantias que pagou a esse título a favor do Autor. Fundamentou a sua pretensão na circunstância da ré, desde 2002 não habitar o imóvel e o disposto no art. 7º, n.º 2, al. c) do Regulamento Municipal para Atribuição de Habitações a Custos Controlados em Empreendimentos a Tal Fim Destinados, segundo o qual: “A clausula de reversão funcionará, entre outras razões a explicitar nos respectivos contratos, sempre que: (…) c) O locador mantiver o fogo desabitado por um período superior a seis meses sem que apresente justificação aceite pela Câmara Municipal”.

3.3. A sentença proferida na 1ª instância julgou a acção improcedente, por duas razões essenciais: (i) por ter entendido que a autora consentiu – ainda que esse consentimento não fosse expresso – na ausência da ré, por ser do seu conhecimento que a mesma residia no estrangeiro, tanto mais que em 8 de Julho de 2011, pelo Administrador Executivo da “Espaço Municipal” foi exarado o seguinte: “Face à situação apresentada peço que dentro de um ano a situação seja reavaliada”. Como mais nada foi comunicado à ré no sentido de entregar o fogo habitacional, entendeu a sentença que a Câmara Municipal aceitou a sua justificação pela não ocupação da habitação (emigração). (ii) a segunda razão assentou na circunstância do contrato de arrendamento e promessa de compra e venda, não conter qualquer cláusula de reversão, e portanto, não ser o invocado art. 7º, 2, c), aplicável ao caso da ora recorrida.

3.4. O TCA, no essencial, confirmou a sentença recorrida, ou seja, considerou que tinha havido aceitação a justificação da ré para não residir no local e que o art.7º, 2, c) do citado Regulamento – que analisou criticamente considerando-o, além do mais, ininteligível – não era aplicável ao presente caso, por não constar do contrato respectivo qualquer cláusula de reversão.

3.5. O Município recorrente entende que não pode inferir-se dos factos provados que tenha considerado justificado o não uso do fogo e que o art.7º, 2, c) é efetivamente aplicável a este caso.

3.6. Julgamos que se não justifica admitir o recurso excepcional de revista. Na verdade, a primeira razão invocada para justificar a improcedência da acção – aceitação da justificação da não ocupação do fogo – que se traduzia no facto da ré ter emigrado para a Inglaterra, o que era do conhecimento do Administrador Executivo dos serviços que geriam o Espaço Municipal – emerge de uma situação concreta que apenas diz respeito a este caso. Os serviços camarários entenderam que a “face à situação apresentada” dentro de um ano a “situação fosse reavaliada”. Entenderam as instâncias que este tipo de actuação traduzia a aceitação da justificação dada pela ré. Entendimento que, a nosso ver, não pode considerar-se arbitrário ou manifestamente desadequado. Portanto, quanto a este aspecto, não se justifica a sua reapreciação por este STA, quer pela plausibilidade do entendimento seguido, quer ainda pela circunstância da questão se restringir ao presente caso e suas especiais vicissitudes.

Ora, a aceitação da plausibilidade jurídica do entendimento, segundo o qual a Câmara Municipal considerou justificada a ausência da ré do arrendado, prejudica o conhecimento – neste processo – a outra questão, ou seja, saber se o art.7º, 2, c) do Regulamento é aplicável, por não constar de cláusula expressa no respetivo contrato. Pois ainda que o fosse, não implicaria a “reversão”, face à justificação do não uso.

Daí que, a problemática relevante neste recurso se limite a uma questão de interpretação do comportamento dos serviços da Câmara Municipal, sem repercussões fora deste processo, retirando assim às questões suscitadas a importância jurídica e social que poderiam justificar um recurso excepcional de revista. Por outro lado, o entendimento das instâncias para além de concordante mostra-se fundamentado através de um discurso juridicamente plausível, sem evidenciar erros manifestos, pelo que também não há razão para admitir o recurso com vista a uma melhor interpretação e aplicação do Direito.

4. Decisão

Face ao exposto, não se admite a revista.

Custas pelo recorrente.

Porto, 27 de Setembro de 2019. – São Pedro (relator) - Costa Reis – Madeira dos Santos.