Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03/12
Data do Acordão:03/14/2012
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:FERNANDA MAÇÃS
Descritores:LOCAÇÃO DE IMÓVEIS
SUBLOCAÇÃO
IMPOSTO DE SELO
IVA
Sumário:I - Da conjugação do disposto no nº 1 do art. 1º do Código do Imposto do Selo com o também disposto na Verba 2 da Tabela Geral do Imposto do Selo, resulta que o acto/operação jurídica de locação/sublocação (arrendamento/subarrendamento) está sujeito a esse imposto e que, sendo o próprio negócio (operação) que está sujeito estamos perante imposto devido pela operação (embora o contrato escrito possa, também, ficar sujeito, nos termos da Verba 8 - selo do documento - caso não seja tributada a respectiva operação);
II - Tal imposto não é devido no caso de aquele acto/operação de locação estar sujeito a IVA.
Nº Convencional:JSTA00067472
Nº do Documento:SA22012031403
Data de Entrada:01/05/2012
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...., S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO PER SALTUM
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR FISC - SELO
Legislação Nacional:CPC96 ART684 N3 ART685-A N1
LGT98 ART43 N1
CCIV66 ART1022 ART1023
CIS03 ART1 N1 N2 ART3 N1 N3 B ART22
CIVA08 ART4 N1 ART9 N30 ART12 N4 N6 ART29 N9
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC790/10 DE 2011/02/24
Referência a Doutrina:SALDANHA SANCHES MANUAL DE DIREITO FISCAL 3ED PAG435
SALDANHA SANCHES E OUTRO A INCIDÊNCIA DE SELO SOBRE O TRESPASSE IN FISCALIDADE N32 PAG5 PAG9
SOARES MARTINEZ DIREITO FISCAL 1995 PAG596
CASALTA NABAIS DIREITO FISCAL 2000 PAG411
Aditamento:
Texto Integral: I. Relatório
1. A……, SA, com a identificação constante dos autos, impugnou judicialmente, no TAF do Porto, o despacho de 6/11/2003 proferido pela Directora da Direcção de Serviços dos Impostos do Selo e das Transmissões do Património, que lhe indeferiu o pedido de restituição de imposto de selo no valor de € 5.918,24.
A Mmª. Juíza do TAF do Porto julgou a impugnação procedente, anulando-a e reconhecendo-lhe o direito a juros indemnizatórios contabilizados a partir de um ano após o pedido de revisão efectuado por aquela.
2. Não se conformando com aquela sentença, a Fazenda Pública interpôs recurso para o TCA Norte, formulando nas alegações as seguintes conclusões:
“I. A douta sentença sob recurso julgou procedente a impugnação deduzida contra o despacho de indeferimento do pedido de restituição do imposto do selo liquidado aquando da celebração de cinco contratos de sublocação.
II. Motivou a douta decisão sob recurso ter existido sobreposição de impostos pelo facto de a impugnante, nas sublocações em causa, ter renunciado à isenção do Imposto sobre o Valor Acrescentado, prevista no n° 30 do artigo 9º do respectivo Código.
III. Ao decidir como decidiu, a douta sentença fez errada aplicação do direito aos factos controvertidos.
IV. Entende a Fazenda Pública que estando em causa tributações sobre realidades distintas, a alegada dupla tributação não existe, uma vez que o Imposto do Selo recai sobre os contratos de subarrendamento dos imóveis e o IVA incide sobre as prestações de serviços derivadas desses contratos.
V. Com efeito, a situação sujeita a tributação em sede do Imposto de Selo não é a que é onerada com IVA.
VI. Aliás, no arrendamento e subarrendamento quem suporta o encargo no Imposto do Selo, de acordo com o estipulado n.° 1 conjugado com a alínea b) do n.° 3 ambos do artigo 3º do Código é o locador ou sublocador, entidade tributada relativamente aos rendimentos auferidos em resultado dos respectivos contratos em Imposto sobre o Rendimento.
VII. O n°2 do artigo 1.° do Código do Imposto do Selo só poderá ser invocado nos casos de efectiva sobreposição de tributação, que o legislador quis evitar.
VIII. Logo, no caso sub judice, o que era indispensável identificar eram as realidades submetidas à tributação em sede de cada um dos impostos em referência.
IX. Entende a Fazenda Pública que, contrariamente ao doutamente decidido, não poderá ser dada como verificada a alegada dupla tributação.
X. Em síntese de conclusões, a douta decisão não considerou que o IVA e o Imposto do Selo no caso sub judice tributam realidades diferentes.
XI. Tendo decidido como decidiu, incorreu a douta sentença em erro de julgamento em matéria de direito, violando as disposições legais supra citadas.”
3. Não foram apresentadas contra-alegações.
4. Por Acórdão de fls. 79 e segs. o TCA Norte julgou-se incompetente em razão da hierarquia para conhecer do presente recurso, declarando competente o STA e ordenando a remessa dos autos a este Tribunal, face ao requerimento da recorrente no mesmo sentido.
5. O Magistrado do Ministério Público, junto deste Tribunal, pronunciou-se no sentido de o recurso não merecer provimento, uma vez que sendo a realidade em causa – o acto/negócio jurídico do subarrendamento – tributado em sede de IVA, não poderia o mesmo ser sujeito a Imposto de Selo, sob pena de se estar perante uma dupla tributação (cfr. Acórdão deste STA nº. 790/10, de 24/02/2011 que apreciou questão idêntica).
6. Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentos
1. De facto
A sentença recorrida deu como provados os seguintes factos:
“1 - Em 18.04.2002 a ora impugnante apresentou um pedido de restituição de imposto de selo no valor de € 5.918,24, nos termos constantes de fls. 9 a 10 e que aqui se dão por reproduzidas.
2 - O imposto de selo referido em 1), respeita à celebração de vários contratos de locação celebrados pela impugnante na qualidade de locadora, cfr. fls. 31 e seguintes do PA e que aqui se dão por reproduzidas.
3 - O imposto de selo foi liquidado pela ora impugnante na data da celebração do contrato de locação e entregue nos Cofres do Estado em 28.02.2001.
4 - A ora impugnante, na operação de locação, renunciou à isenção de IVA em 15.01.2001, conforme documentos juntos ao PA e que aqui se dão por reproduzidas.
6 - O pedido de restituição do imposto de selo referido em 1), foi objecto de indeferimento, com os seguintes fundamentos “por carecer de suporte legal, em virtude de nos arrendamentos o imposto do selo recair sobre o contrato, embora a matéria colectável seja a renda de um mês.
(...) Nesta conformidade, atendendo a que sobre o contrato em questão não incide IVA, não se verifica a duplicação invocada pela interessada, pois esta só existiria caso houvesse imposto de selo sobre as rendas, pois sobre elas é que também incide IVA”.
7 - Este despacho foi notificado à ora impugnante por carta datada de 02.06.2005, cfr. fls. 12 e 13 destes autos e que aqui se dão por reproduzidas.”
2. De Direito
2.1. Questão a apreciar e decidir
Resulta da matéria de facto dada como provada que a impugnante ora recorrente apresentou pedido de restituição de imposto de selo, que havia liquidado na data da celebração de vários contratos de locação celebrados na qualidade de locadora, que foi indeferido.
Inconformada interpôs a impugnante recurso para o Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou a impugnação procedente, com fundamento, em síntese, no seguinte:
·O art. 1º nº 2 do Código do Imposto de Selo, dispõe que “não estão sujeitas a imposto as operações abrangidas pela incidência do imposto sobre o valor acrescentado e dele não isentas”.
·Ora, nos termos dos art.ºs 1º e 3º do CIVA, a locação está sujeita a IVA, e por via da regra estaria isenta do mesmo imposto, nos termos do art. 9º, nº 30, do CIVA.
·A excepção vem feita para o caso do locador ter renunciado à isenção do IVA, em conformidade com os nºs 4 e 6 do artº 12º do CIVA.
·O imposto de selo incide sobre os contratos previstos na Tabela Geral de Imposto de Selo e o IVA incide, para além de outros, sobre as prestações de serviços, entendendo-se como tais, as operações efectuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens, artº 1º e 4º do CIVA.
·Ora, de acordo com o disposto no artº 9º, nº 30 e artº 12º nº 4 do CIVA, a “locação” de bens imóveis está isenta de imposto, podendo os respectivos sujeitos que procedam à locação renunciar à isenção, como foi o caso dos presentes autos.
·Assim sendo, e atento ao acima descrito, e porque a impugnante havia renunciado à isenção do IVA com a consequente liquidação do mesmo, conclui-se que a operação em discussão nos presentes autos, não se encontra sujeita a imposto de selo previsto na verba 2 da Tabela Geral, por força do disposto no nº 2 do art. 1º do CIS.”
Acrescentou-se ainda que tendo a impugnante também formulado pedido de juros indemnizatórios, estes são devidos, nos termos do disposto no nº 1 do art. 43º da LGT.
Contra este entendimento se insurge a Fazenda Pública invocando que não ocorre a alegada dupla tributação porque estão em causa tributações sobre realidades distintas, uma vez que o Imposto do Selo recai sobre os contratos de arrendamento dos imóveis e o IVA incide sobre as prestações de serviço derivadas desses contratos.
Em face das conclusões da FP, e considerando que são elas que delimitam o objecto do recurso, nos termos do disposto nos arts. 684º, nº3, e 685º-A/1 do CPC, a questão a decidir prende-se com a legalidade da liquidação de Imposto de Selo, que tem por objecto contratos de locação, importando averiguar se se verifica dupla tributação por tal operação estar abrangida pela incidência de IVA.
A questão já foi decidida por Este Supremo Tribunal, no Acórdão, de 24/2/2011, proc. nº 0790/10, pelo que não havendo razões para divergir da jurisprudência aí vazada, nos limitaremos a sintetizar os argumentos aí esgrimidos para fundamentar aquele Acórdão e que são perfeitamente transponíveis para o caso sub judice.
Vejamos.
O Imposto do Selo, que começou por ser um imposto de larga abrangência, hoje tem uma natureza apenas residual: “assume a sua vocação de tributar aquilo que não pode ser tributado de outra forma” (Cfr. SALDANHA SANCHES, Manual de Direito Fiscal, 3ª ed., Coimbra Editora, Coimbra, 2007, p. 435. Sobre o Imposto do Selo, cfr., ainda, SALDANHA SANCHES/ M. ANSELMO TORRES, “A incidência de selo sobre o trespasse”, Fiscalidade, nº 32, Out/Dez, 2007, pp. 5 ss.; SOARES MARTÍNEZ, Direito Fiscal, Almedina, Coimbra, 1995, pp.596 ss.; e CASALTA NABAIS, Direito Fiscal, Almedina, Coimbra, 2000, pp. 411 ss. ), e é hoje regulado por dois códigos interdependentes: o Código do Imposto do Selo e a Tabela Geral do Imposto do Selo, a qual contém as respectivas taxas e concretiza, por ordem alfabética, os factos tributários.
Em termos de incidência objectiva, os nºs 1 e 2 do art. 1º do CISelo dispõem:
“1 - O imposto do selo incide sobre todos os actos, contratos, documentos, títulos, livros, papéis, e outros factos previstos na Tabela Geral, incluindo as transmissões gratuitas de bens.
2 - Não são sujeitas a imposto as operações sujeitas a imposto sobre o valor acrescentado e dele não isentas.”
E de acordo com o disposto no nº 1 do art. 9º e na Verba 2 da Tabela, bem como no nº 1 do art. 22º do CISelo, nos casos relativos a arrendamento e subarrendamento, a taxa de imposto é de 10% - sobre a renda ou seu aumento convencional, correspondentes a um mês ou, tratando-se de arrendamentos por períodos inferiores a um mês, sem possibilidade de renovação ou prorrogação, sobre o valor da renda ou do aumento estipulado para o período da sua duração.
Por sua vez, a al. a) do nº 1 do art. 1º do CIVA, dispõe que estão sujeitas a esse imposto “As transmissões de bens e as prestações de serviços efectuadas no território nacional, a título oneroso, por um sujeito passivo agindo como tal” considerando-se prestações de serviços as operações efectuadas a título oneroso que não constituem transmissões, aquisições intracomunitárias ou importações de bens (nº 1 do art. 4º do CIVA).
Mas, nos termos do disposto no nº 30 do art. 9º do CIVA, a locação de bens imóveis está isenta de IVA, embora o respectivo sujeito passivo possa renunciar a esta isenção, nos termos do disposto nos nºs. 4 e 6 do art. 12º do mesmo Código, nos quais se estatui o seguinte:
“4 - Os sujeitos passivos que procedam à locação de prédios urbanos ou fracções autónomas destes a outros sujeitos passivos, que os utilizem, total ou predominantemente, em actividades que conferem direito à dedução, podem renunciar à isenção prevista no n° 30 do artigo 9°.
(…)
6 - Os termos e as condições para a renúncia à isenção prevista nos nºs. 4 e 5 são estabelecidos em legislação especial.”
Como vimos, o nº 2 do art. 1º do Código do Imposto do Selo, estabelece um critério geral de delimitação negativa do imposto, excluindo da incidência todas as operações sujeitas a IVA e dele não isentas, com o objectivo de evitar que uma dada transmissão de bens ou prestações de serviços, ainda que constitua um facto ou acto previsto na Tabela Geral, possa ser tributada em sede de imposto do selo quando já o é em sede de IVA. Como referem SALDANHA SANCHES/M. ANSELMO TORRES( Cfr. ob. cit., p. 9.), “Tal exclusão do campo de incidência impede, assim, que o imposto do selo possa vir a ser repercutido no preço dos bens e serviços sujeitos a IVA, agravando a base de incidência deste último imposto e gerando um efeito de dupla tributação. O imposto do selo assume, por isso, um carácter residual face ao IVA, apenas incidindo sobre factos ou actos que, além de previstos na Tabela Geral, não estão sujeitos a IVA ou que, estando sujeitos, dele se encontrem isentos.”
Por outro lado, apesar de o arrendamento de prédios rústicos e urbanos estar abrangido pelas regras de incidência de IVA, já que em sede deste imposto se tributam as prestações de serviços efectuadas em território nacional a título oneroso, constituindo o arrendamento de imóvel um serviço prestado, também é certo que o nº 29 do art. 9° do CIVA excepciona das regras de incidência a locação e que no nº 4 do art. 12° do mesmo compêndio se admite a renúncia a tal isenção quando ambos os intervenientes na operação sejam sujeitos passivos de imposto (o que sucede, por exemplo, quando os imóveis passam a estar afectos a uma utilização comercial, industrial ou profissional).
Aplicando o exposto ao caso em análise, verifica-se que a liquidação impugnada se reporta, como resulta da factualidade provada, ao imposto do selo respeitante à celebração por parte da recorrida a vários contratos de locação celebrados na qualidade de locadora e por ela liquidado na data da celebração dos referidos contratos. Resulta, além do mais, que a impugnante ora recorrida renunciou à isenção do IVA (cfr. nº 4 do Probatório), nos termos do disposto nos nºs 4 e 6 do art. 12º do CIVA.
Ora, aceitando-se que o conceito de locação constante do CISelo e da TGIS se reconduz ao definido no CCcivil (Segundo o art. 1022º do Código Civil a locação define-se como «o contrato pelo qual uma das partes se obriga a proporcionar à outra o gozo temporário de uma coisa, mediante retribuição», dizendo-se arrendamento quando versa sobre coisa imóvel ou aluguer quando incide sobre coisa móvel (art. 1023º do mesmo Código).) e, considerando que, a TGSI prevê a tributação de várias realidades distintas, conclui-se, tal como ficou consignado no Acórdão nº 790/2010, que, para efeitos do imposto do selo e no que respeita à locação/arrendamento, “é o próprio negócio (operação) que está sujeito ao imposto, pela verba 2 da Tabela, independentemente de o respectivo contrato revestir ou não a forma escrita. E que se trata, portanto, de imposto devido pela operação (embora o contrato escrito possa, também, ficar sujeito a Imposto de Selo, nos termos da Verba 8 -selo do documento - caso não seja tributada a respectiva operação). É esta, com efeito, a conclusão que resulta da interpretação do tipo tributário previsto no nº 1 do art. 1º do CISelo e na Verba 2 da TGIS, em consonância com a natureza dos factos e realidades ali inscritas e com as regras supra referidas”.
Estando em causa o imposto devido pelo acto jurídico substanciado na própria locação (selo da operação), estamos perante tributação que é excluída por aplicação do disposto no nº 2 daquele mesmo art. 1º do CISelo, uma vez que é, também, a locação (considerada como prestação de serviços para efeitos de IVA) que é tributada em sede deste imposto.
Em sentido oposto, vem a recorrente sustentar, porém, que estão em causa tributações sobre realidades distintas e que não existe a alegada dupla tributação, uma vez que o Imposto do Selo recai sobre os contratos de locação e o IVA incide sobre as prestações de serviços derivadas desses contratos, sendo que no arrendamento e subarrendamento quem suporta o encargo no imposto do selo é o locador ou sublocador [nº 1, conjugado com a al. b) do nº 3, ambos do art. 3º do CISelo] entidade tributada relativamente aos rendimentos auferidos em resultado dos respectivos contratos em Imposto sobre o Rendimento, pelo que, no caso, o que era indispensável identificar eram as realidades submetidas à tributação em sede de cada um dos impostos em referência.
Não assiste, porém, à recorrente, qualquer razão.
Com efeito, como ficou consignado no Acórdão que estamos a seguir, “Deste entendimento parece resultar a ideia de que, reconduzindo-se (na locação) a prestação de serviços sujeita a IVA à própria cedência do uso do locado e constituindo as rendas a respectiva contraprestação (sendo o imposto liquidado, não no momento da celebração do acto jurídico - locação - mas aquando da efectiva prestação dos serviços e da contraprestação/renda respectiva - cfr. nº 3 do art. 7º do CIVA) então, porque o facto tributário é a locação, mas não desligada das rendas recebidas pelo locador [estas é que constituirão na verdade a contraprestação da cedência do uso, inerente à locação, ou seja, embora o IVA isente a “locação de bens imóveis”, a verdade é que também releva quanto às contraprestações - as rendas - sobre as quais assim também "incide" (hoc sensu) o imposto] sempre estaríamos perante factos tributários diversos (para efeitos de incidência de IVA e para efeitos de incidência de Imposto de Selo).
É, contudo, de salientar que, por um lado, em sede de IVA, as rendas, enquanto contraprestações obtidas pela prestação de serviços contratada, constituem o valor tributável sobre que incide a taxa de IVA aplicável (cfr. art. 16º do CIVA e sendo que é àquela, e não a estas, que se aplica a isenção prevista no citado nº 30 do art. 9º do mesmo código), constituindo a locação a realidade jurídica que é incidente de imposto e sendo que, nesse âmbito e para tal efeito, pouco releva o facto de ser o locador a suportar o encargo do imposto de selo, pois que o mesmo poderá ser tomado em conta aquando da celebração da respectiva operação e que, por outro lado, como refere Cardoso da Costa, (Curso de Direito Fiscal, 2ª ed. Actualizada, Almedina, 1972, pag. 242.) nas normas relativas à matéria colectável «há que distinguir, consoante se trate de normas que a definem, que definem o valor sobre que recai o imposto (p. ex.: de que valor se trata; que verbas entram na sua composição; se é um valor real efectivo, ou presumido, ou um valor normal), ou de normas que se limitam a estabelecer o processo da sua determinação (p. ex: relevo dado à declaração do contribuinte e às averiguações oficiosas da Administração; trâmites do processo de lançamento): no primeiro caso, estamos perante normas relativas à incidência real, ou seja, a um elemento essencial dos impostos; já isso não sucede na segunda hipótese, onde se nos deparam normas disciplinadoras tão-só do processo administrativo de lançamento.»
Nesta base, a norma do art. 16º do CIVA, relativa embora ao “valor tributável”, pode configurar-se como uma verdadeira norma de incidência, pois que define o “valor de que se trata”, harmonizando-se assim perfeitamente com o disposto nos seus artigos 4º e 7º. E, portanto, a sujeição, ao IVA, da “locação”, concretiza-se na prestação do gozo do imóvel e na contraprestação, a renda (mensal).
E o mesmo se verifica, «mutatis mutandis», quanto ao imposto de selo - cfr. arts. 9º, nº 1 e 22º nº 1 do CISelo e verba 2 da Tabela: também estas constituem verdadeiras normas de incidência.
Mas, assim sendo, então os dois tributos incidem, no caso, sobre a mesma realidade fáctica: a prestação do gozo ou uso do imóvel e a correspondente contraprestação.
Daí que, mesmo em termos da perspectiva sustentada pela recorrente, conjugando a norma de incidência objectiva (art. 1º do CISelo) com a norma que concretiza o facto tributário respectivo (Verba 2 da TGIS), tem de concluir-se que, no caso (locação/sublocação), porque está em causa o imposto devido pelo acto jurídico substanciado no próprio subarrendamento (selo da operação), estamos perante tributação que é excluída por aplicação do disposto no nº 2 daquele mesmo art. 1º do CISelo, uma vez que é, também, a locação (considerada como prestação de serviços para efeitos de IVA) que é tributada em sede deste imposto. E, assim, o imposto de selo não é, no caso, devido já que o acto/operação de sublocação está sujeito a IVA (ainda que se possa entender que a base de incidência é distinta e ainda que o imposto não seja liquidado no momento da celebração do acto jurídico, mas somente no momento da prestação dos serviços - art. 7º do CIVA) e dado que a recorrida renunciou à correspondente isenção”.
Em face do exposto, a sentença que nessa base decidiu pela procedência do pedido de restituição de imposto e pela procedência do também formulado pedido de juros indemnizatórios, por serem devidos nos termos do disposto no nº 1 do art. 43º da LGT, não merece qualquer censura. Deve, pois, confirmar-se a sentença recorrida, julgando improcedente o presente recurso jurisdicional.
III- DECISÃO
Nestes termos acorda-se em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida.
Custas pela recorrente e procuradoria em 1/8.
Lisboa, 14 de Março de 2012. - Fernanda Maçãs (relatora) - Casimiro Gonçalves - Lino Ribeiro.