Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0119/15
Data do Acordão:03/15/2017
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:DULCE NETO
Descritores:IMPOSTO DE SELO
REGIME TRANSITÓRIO
Sumário:I - Estando em causa liquidação de Imposto de Selo prevista na Verba 28 da TGIS relativa ao ano de 2012 há que observar as regras transitórias do nº 1 do art.º 6º da Lei 55-A/2012 e não as do n.º 2, ainda que a Administração Tributária efectue a liquidação já no ano de 2013.
II - Do regime transitório constante do art.º 6.º da Lei n.º 55-A/2012 decorre que para o ano de 2012 e para efeitos de Imposto de Selo, os proprietários de prédios urbanos com afectação habitacional e um VPT superior a € 1.000.000,00, o único facto tributário situa-se em 31/10/2012.
III - Carece de fundamento legal a liquidação efectuada em 2013, por referência ao ano de 2012, cumulativa com anterior liquidação do mesmo imposto e relativa ao mesmo prédio e ao mesmo ano, efectuada em 2012 ao abrigo do disposto no n.º 1 do art.º 6º da Lei n.º 55-A/2012.
Nº Convencional:JSTA000P21592
Nº do Documento:SA2201703150119
Data de Entrada:02/02/2015
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A............ S.A.
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

1. A FAZENDA PÚBLICA recorre da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé que julgou procedente a impugnação judicial que a sociedade A…………………, S.A., deduziu contra as liquidações de imposto de selo referentes ao ano de 2012, relativas a 16 unidades independentes que compõem o prédio urbano inscrito na matriz predial da freguesia e concelho de ………….. sob o ex-artigo 8891 e actual 5963, no valor total de € 3.394,28.

1.1. Terminou a alegação de recurso com as seguintes conclusões:

A. Com o aditamento à Tabela Geral do Imposto do Selo, introduzido pelo artigo 4º da Lei nº 55-A/2012, de 29.10, o IS passou a incidir também sobre a propriedade, usufruto ou direito de superfície de prédios urbanos cujo VPT constante da matriz, nos termos do CIMI, seja igual ou superior a € 1.000.000,00 (vide verba nº 28 da TGIS);

B. As liquidações em causa foram efectuadas pela AT em 21.03.2013 e reportam-se ao ano de 2012;

C. Nas Liquidações foi aplicada a taxa de 1% ao valor patrimonial tributário (VPT) que, no global, ascendia e € 1.018.300,56, à data de 31.12.2012.

D. Este VPT resultou da avaliação trienal;

E. Entendeu a Mmª Juíza do Tribunal ad quo que, referindo-se a liquidação ao ano de 2012, foi a mesma efectuada ao abrigo do art.º 6º, nº 1, alínea a), daquele diploma legal.

F. Esta norma determina que o facto tributário ocorre no dia 31.10.2012,

G. E que a base tributária corresponde ao VPT que resulta das regras previstas no Código do IMI, por referência ao ano de 2011 (alínea c) do mesmo normativo legal);

H. Assim, perante a redação desta norma, e incidindo este imposto sobre a propriedade de prédios urbanos cujo VPT seja igual ou superior a € 1.000.000,00, concluiu a Mmª Juíza que o prédio urbano em causa cai fora da norma de incidência.

I. Pois, à data do facto tributário, o VPT do prédio urbano era de apenas € 981.494,52.

J. Entendemos que a douta sentença incorre em erro na determinação da norma aplicável, o que inquinou o sentido da decisão.

K. Na verdade, as liquidações foram efectuadas ao abrigo da disposição transitória contida no artigo 6º, nº 2 daquele diploma legal, segundo a qual: “Em 2013, a liquidação do imposto do selo previsto na verba n° 28 da respetiva Tabela Geral deve incidir sobre o mesmo valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de imposto municipal sobre imóveis a efetuar nesse ano.”.

L. Este normativo trata das liquidações do imposto do selo a efectuar no ano de 2013, as quais devem incidir sobre o valor patrimonial tributário utilizado para efeitos de liquidação de IMI, ou seja, o valor patrimonial tributário reportado a 31.12. (art.º 113º, nº 1 in fine, do Código do IMI;

M. Como ficou provado, o VPT do imóvel em causa, em 31.12.2012, era superior a € 1.000.000,00 (ascendia a €1.018.300,56).

N. Logo, a AT efectuou as liquidações colocadas em crise, na estrita aplicação deste dispositivo legal, não padecendo as mesmas das ilegalidades que lhe são imputadas na douta sentença.

Pelo exposto, deve ser dado provimento ao presente recurso e consequentemente revogada a douta sentença recorrida, mantendo-se as liquidações impugnadas, assim se fazendo JUSTIÇA.


1.2. A sociedade Recorrida apresentou contra-alegações para sustentar a manutenção do julgado.

1.3. O Exmº Magistrado do Ministério Público emitiu douto parecer no sentido de que devia ser negado provimento ao recurso e mantida a sentença recorrida, por não assistir razão à Recorrente.

1.4. Colhidos os vistos dos Exmºs Conselheiros Adjuntos, cumpre apreciar e decidir em conferência.

2. Na sentença recorrida consta como provada a seguinte matéria de facto:

A. A Impugnante é proprietária do prédio em propriedade total, sito em ………,…….. da freguesia e concelho de ………., identificado como Bloco …..actual Lote ……., inscrito na matriz sob o artigo 5963 antigo 8893 (cfr. fls. 30 a 40 dos autos);

B. Desde 2009, até à avaliação trienal, realizada em 31/12/2012, ao prédio identificado na alínea anterior, foram atribuídos os seguintes VPT’s parciais, correspondente ao VPT total de € 981.494,52;






C. Em 20/03/20 13 foi feita avaliação geral, o que originou o VPT:





D. Com referência ao ano de 2012 foram efectuadas, em 21/03/2013, as seguintes liquidações de Imposto de Selo relativas às zonas susceptíveis de utilização independente do prédio identificado em A), com data limite de pagamento em Julho de 2013:

i. 2013 00287235 no montante de € 204,19 (duzentos e quatro euros e dezanove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………. Ex-8891-1;
ii. 2013 000287259, no montante de € 204,19 (duzentos e quatro euros e dezanove cêntimos - artigo urbano da freguesia e concelho de ……….. Ex-8891-2;
iii. 2013 000287262, no montante de € 209,49 (duzentos e nove euros e quarenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………. Ex-8091-3;
iv. 2013 000287265, no montante de € 209,49 (duzentos e nove euros e quarenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………. Ex-8891-4;
v. 2013 000287260, no montante de € 214,79 (duzentos e catorze euros e setenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………. Ex-6891-5;
vi. 2013 000287271, no montante de € 214,79 (duzentos e catorze euros e setenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………… Ex-8891-6;
vii. 2013 000287274, no montante de €220,10 (duzentos e vinte euros e dez cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………. Ex-8691-7;
viii. 2013 000287277, no montante de 220,10 (duzentos e vinte euros e dez cêntimos) - artigo urbano da freguesia e concelho de ………. Ex-8891-8;
ix. 2013 000287280, no montante de € 204,19 (duzentos e quatro euros e dezanove cêntimos) — artigo urbano da freguesia do concelho de ………… Ex-8891-9;
x. 2013 000237238, no montante de € 204,19 (duzentos e quatro euros e dezanove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………… Ex-8891-10;
xi. 2013 000287241 no montante de € 209,49 (duzentos e nove euros e quarenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………. Ex-8891-11;
xii. 2013 000287244, no montante de € 209,49 (duzentos e nove euros e quarenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ………… Ex-8891-12;
xiii. 2013 000287247, no montante de € 214.79 (duzentos e catorze euros e setenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de …………. Ex-8891-13;
xiv. 2013 000287250, no montante de € 214,19 (duzentos e catorze euros e setenta e nove cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ……….. Ex-8891-14;
xv. 2013 000287253, no montante de € 220,10 (duzentos e vinte euros e dez cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ……… Ex-8891-15;
xvi. 2013 000287256, no montante de € 220,10 (duzentos e vinte euros e dez cêntimos) — artigo urbano da freguesia e concelho de ……… Ex-8891-16;

E. Em 29/11/2013 a Impugnante procedeu ao pagamento das liquidações que antecedem (cfr. fls. 44 a 59 dos autos);

3. A questão colocada neste recurso é a de saber se a sentença incorreu em erro de julgamento, em matéria de direito, ao anular as liquidações sindicadas, no entendimento de que a determinação do valor patrimonial tributário do prédio para efeitos de incidência do Imposto do Selo previsto na verba 28.1 da respectiva Tabela Geral e relativo a 2012 teria de ser determinado de acordo com o disposto no nº 1 do artigo 6º da Lei 55-A/2012, e não com o disposto no nº 2 do mesmo artigo, como alegado pela Recorrente.

Tal questão é idêntica à decidida nesta Secção do Supremo Tribunal Administrativo nos acórdãos proferidos em 29/10/2014 no proc. nº 0529/14, em 29/11/2014, no proc. nº 899/14, em 29/10/2014, no proc. nº 0865/14, em 8/10/2014, nos proc. nsº 0805/14 e 0806/14, em 14/01/2015, no proc. nº 01084/14,e em 5/02/2015, no proc. nº 0993/14, nos quais, com fundamentação que merece a nossa inteira adesão, se concluiu no sentido da correcção do julgado, porquanto estando em causa liquidação de Imposto de Selo prevista na verba 28 da TGIS relativa ao ano de 2012 haverá que observar as regras transitórias do nº 1 do artigo 6º da Lei 55-A/2012, e não as do nº 2, ainda que a AT efectue a liquidação já no ano de 2013, carecendo de fundamento legal a liquidação efectuada em 2013, por referência ao ano de 2012, cumulativa com anterior liquidação do mesmo imposto e relativa ao mesmo prédio e ao mesmo ano efectuada em 2012 ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 6º da Lei nº 55-A/2012.

Deste modo, e atentando na regra constante nº 3 do artigo 8º do Código Civil – que impõe ao julgador o dever de considerar todos os casos que mereçam tratamento análogo, a fim de obter uma interpretação e aplicação uniformes do direito – e não se vendo que a Recorrente invoque em juízo novas razões que infirmem a fundamentação em que assentou essa decisão ou que levem a inflectir ou a divergir do entendimento aí afirmado, impõe-se remeter para essa fundamentação, que assim se acolhe e subscreve na íntegra.

Razão por que nos limitaremos a reproduzir o que sobre a questão ficou dito no aludido acórdão proferido no proc. nº 0865/14, e que traduz jurisprudência que se pode considerar já consolidada.

«(…) estando em causa liquidação de Imposto do Selo relativa a 2012, ainda que efectuada em 2013, há que observar o regime transitório constante do n.º 1 do artigo 6.º daquela Lei n.º 55-A/2012, e não o constante do n.º 2 do artigo 6.º, este último aplicável às liquidações relativas ao ano de 2013, confundindo a recorrente na sua alegação o ano de referência do imposto (no caso concreto 2012) com ano em que foi praticado o acto de liquidação do imposto (no caso concreto 2013), e parecendo pretender, no caso dos autos, ser lícito à Administração, relativamente ao mesmo ano de referência, liquidar Imposto do Selo em 2012, ao abrigo do regime transitório do n.º 1 do artigo 6.º, e outra vez em 2013, ao abrigo do n.º 2 do artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012.

Ora, por mais agudas que sejam as necessidades de receitas fiscais, que estão na génese do aditamento à Tabela Geral do Imposto do Selo da Verba 28.1 em Outubro de 2012, não parece lícito concluir ter sido intenção do legislador que, relativamente ao mesmo ano de referência – 2012 –, pudesse haver cumulativamente duas liquidações de Imposto do Selo da verba 28.1 da Tabela Geral (preenchidos que fossem os respectivos pressupostos de incidência): uma a efectuar ainda em 2012, a que seria aplicável o disposto no artigo 6.º n.º 1 da Lei n.º 55-A/2012, e outra a efectuar em 2013, a que seriam aplicáveis as regras gerais (ao abrigo do n.º 2 do artigo 6.º da mesma Lei).

Tratar-se-ia, inequivocamente, de uma situação em tudo anómala em face dos princípios que enformam o sistema fiscal, de constitucionalidade pelo menos duvidosa e que não parece, de todo, ter sido a querida pelo legislador. Ao invés, como propugnado pela Exma. Procuradora da República junto do TAF de Loulé no seu parecer em 1.ª instância (cfr. fls. 51 a 53 dos autos) parece-nos também que, do regime transitório constante do n.º 1 do artigo 6.º da Lei n.º 55-A/2012, decorre com clareza que para o ano de 2012 e para efeitos de Imposto de Selo, os proprietários de prédios urbanos com afectação habitacional e um VPT superior a €1.000.000,00, o único facto tributário situa-se em 31/10/2012, a única liquidação pela AT deve ser feita até ao final de Novembro de 2012, a única taxa a aplicar no caso de prédios avaliados nos termos do CIMI é de 0,5% e o imposto deverá ser pago numa única prestação até 20/12/2012.

E assim sendo, como nos parece que é, as liquidações sindicadas carecem de fundamento legal, pois que, como bem decidido, já tendo sido liquidado e pago imposto relativamente a 2012, é ilegal a liquidação referente ao mesmo prédio e tendo por referência o mesmo ano de 2012, efectuada em Março de 2013.

Pelo exposto se conclui que o recurso não merece provimento, sendo de confirmar a sentença recorrida, que bem julgou.» (fim de citação).

É esta, pois, a jurisprudência que aqui, mais uma vez, se acolhe e reitera, tendo em conta que a recorrente não aduz argumentação susceptível de a infirmar.

4. Termos em que acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 15 de Março de 2017. – Dulce Neto (relatora) – Isabel Marques da Silva – Pedro Delgado.