Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01000/17.7BALSB
Data do Acordão:02/04/2021
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:SUZANA TAVARES DA SILVA
Descritores:DISCRICIONARIEDADE
AVALIAÇÃO
CONCURSO DE RECRUTAMENTO
Sumário:I - Havendo necessidade legalmente fundamentada de substituição de um elemento de um júri de um concurso, há lugar ao aproveitamento dos actos já praticados nesse procedimento concursal sempre que seja possível salvaguardar a congruência e uniformidade do juízo avaliativo nas diligências que envolvem o princípio da imediaticidade da avaliação (maxime, nas entrevistas).
II - Na avaliação curricular, sobretudo nos aspectos que envolvem a discricionariedade de avaliação do júri, o controlo externo que caracteriza o escrutínio judicial dessas decisões impõe que a fundamentação apresentada seja aceite, sempre que adequada e proporcional.
Nº Convencional:JSTA000P27145
Nº do Documento:SA12021020401000/17
Data de Entrada:09/13/2017
Recorrente:A............
Recorrido 1:B............ E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: I - Relatório
1. A………… intentou neste Supremo Tribunal contra o Tribunal Constitucional, acção administrativa especial, pedindo a anulação: i) da decisão final do procedimento concursal aberto e tramitado pelo R. para recrutamento do cargo de direcção intermédia de 1° grau (Director de Serviços) para o seu Departamento Administrativo e Financeiro, incluindo quer a proposta pelo júri do procedimento concursal quer o despacho homologatório, incluindo quer a proposta pelo júri do procedimento concursal quer o despacho homologatório proferido pelo Exmo. Senhor Presidente do Tribunal Constitucional, em 12 de Junho de 2017, e ii) também de um outro despacho do Exmo. Senhor Presidente do Tribunal Constitucional, proferido no mesmo dia 12 de Junho de 2017, que determina a cessação do regime de substituição nesse cargo, em que a A. se encontrava desde 21 de Setembro de 2015.

2. O demandado Tribunal Constitucional apresentou contestação na qual impugna, fundamentalmente, as ilegalidades imputadas pela autora aos actos impugnados

3. Na P. I. foi indicada como contra-interessada B…………, que também apresentou contestação, na qual impugnou as ilegalidades relativas à decisão final proferida no âmbito do procedimento concursal aqui em apreço e pugnou pelo indeferimento liminar do pedido de notificação da Direcção de Serviços de Recursos Humanos do Departamento Geral de Administração do Ministério dos Negócios Estrangeiros e do Secretariado Executivo da CPLP para "virem aos autos esclarecer qual a base legal da alegada equiparação das funções exercidas pela Contra­ Interessada na CPLP a Director de Serviços da Administração Pública portuguesa".

4. No despacho saneador foram considerados como verificados todos os indispensáveis pressupostos processuais, e, ainda, que os autos já continham todos os elementos que se mostravam necessários ao conhecimento do objecto da acção e desconsiderou-se a pronúncia oferecida pela Autora, a título de réplica, por se considerar que “do articulado de contestação oferecido pelo réu, Tribunal Constitucional, não resultou arguida matéria de excepção quer dilatória, quer peremptória, mas, tão-só, a impugnação motivada dos factos alegados pela Autora, para concluir pela não verificação dos pressupostos determinantes da procedência dos pedidos formulados”.

5. Notificados do despacho saneador, nenhuma das partes se pronunciou.

6. Colhidos que foram os vistos legais, importa apreciar e decidir a acção administrativa.

II. DE FACTO

Resultam provados nos autos os seguintes factos pertinentes:

1. Em 3 de Junho de 2016, foi publicado na 2.ª série do Diário da República, o Aviso n.º 7100/2016, respeitante à abertura do procedimento concursal de selecção com vista ao recrutamento do cargo de direcção intermédia de 1.º grau, para o Departamento Administrativo e Financeiro, previsto no artigo 13.º-A do Decreto-Lei n.º 545/99, de 14 de Dezembro, artigo aditado àquele diploma legal pelo Decreto-Lei n.º 197/2015, de 16 de Setembro.

2. Em 12 de Outubro de 2015, foi publicado na 2.ª série do Diário da República, o Despacho n.º 11420/2015 que designou a licenciada A………… para exercer, em regime de substituição, o cargo de Director de Serviços do Departamento Administrativo e Financeiro do Tribunal Constitucional.

3. A abertura do procedimento concursal foi publicada na Bolsa de Emprego Público sob o Código de oferta OE201606/0073, do qual constam as regras de formalização das candidaturas, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido [doc. junto a pág. 109 do processo físico].

4. O júri do concurso foi inicialmente integrado pelo Professor Doutor …………, Presidente do Tribunal Constitucional, pelo Professor Doutor …………, Professor do ISEG e pela Licenciada …………, Secretária-Geral do Tribunal Constitucional e na primeira reunião fixaram os métodos de selecção avaliação curricular e entrevista pública, bem como os critérios e factores de ponderação dentro de cada item [Acta n.º 1, doc. junto a págs. 161e ss. do processo físico].

5. No dia 7 de Julho de 2016, o júri reuniu e deliberou sobre a admissão e exclusão das candidaturas, sobre a avaliação curricular dos candidatos admitidos e sobre a marcação das entrevistas, nos termos que constam da acta n.º 2, cujo conteúdo, incluindo os anexos (fichas de avaliação curricular individuais) aqui se dá por integralmente reproduzido [Acta n.º 2, doc. junto a págs. 211 e ss. do processo físico].

6. No dia 15 de Julho de 2016, o júri reuniu e deliberou sobre a marcação de uma nova data para a realização da entrevista a um dos candidatos, por solicitação do mesmo, bem como sobre a avaliação das entrevistas, nos termos que constam da acta n.º 3, cujo conteúdo, incluindo os anexos (fichas de avaliação das entrevistas) aqui se dá por integralmente reproduzido [Acta n.º 3, doc. junto a págs. 229 e ss. do processo físico].

7. Em 23 de Fevereiro de 2017, na sequência do despacho do Presidente do Tribunal Constitucional de 23 de Fevereiro de 2017, foi aberto um inquérito, nos termos do artigo 229.º, n.º 1 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, à Secretaria-Geral e serviços de apoio administrativo e financeiro, a fim de averiguar as circunstâncias que estiveram na origem da instauração pela AT de um processo de contra-ordenação tributária e de execução fiscal contra o Tribunal Constitucional [doc. junto a págs. 300 do processo físico].

8. Por despacho do Presidente do Tribunal Constitucional, Prof. Doutor …………, de 16 de Março de 2017, determinou-se a constituição de um novo júri para o concurso, integrado pelo Prof. Doutor …………, Vice-Presidente do Tribunal Constitucional, pelo Professor Doutor …………, Professor do ISEG e pela Mestre …………, Chefe do Gabinete do Presidente do Tribunal Constitucional, bem como o aproveitamento dos actos já praticados naquele procedimento, com excepção das entrevistas [doc. junto a págs. 251 e 252 do processo físico].

9. A nova composição do júri foi publicada na Bolsa de Emprego Público [doc. junto a pág. 293 do processo físico].

10. Em 23 de Maio de 2017, o novo júri reuniu, ratificou os actos anteriores, atribuiu as classificações e ordenou os candidatos, tendo ainda decidido que haveria lugar a audiência prévia, conforme consta da acta n.º 4, cujo conteúdo integral aqui se dá por integralmente reproduzido [Acta n.º 4, doc. junto a págs. 262 e ss. do processo físico].

11. Em 12 de Junho de 2017, o júri respondeu às objecções da proposta de ordenação final suscitadas pela aqui A. em sede de audiência prévia, tendo mantido a proposta de designação da candidata B………… por ser a classificada em primeiro lugar, nos termos dos fundamentos que constam da acta dessa reunião e que aqui se dão por integralmente reproduzidos [Acta n.º 5, doc. junto a págs. 88e ss. do processo físico].

12. Em 12 de Junho de 2017, o Presidente do Tribunal Constitucional homologou a proposta de designação do júri [Doc. n.º 1, junto a fls. 87 do processo físico].

13. Por despacho de 20 de Junho de 2017, o Presidente do Tribunal Constitucional determinou a cessação do regime de substituição no cargo de Directora de Serviços do Departamento Administrativo e Financeiro da A. [doc. junto a págs. 95 do processo físico].

14. Em 13 de Setembro de 2017, a A. intentou no Supremo Tribunal Administrativo a presente acção administrativa especial.

15. Por despacho de 12 de Outubro de 2017, decidiu o Presidente do Tribunal Constitucional que deveria ser aplicada à aqui A. a sanção disciplinar de multa e mandou remeter o processo ao novo titular do poder disciplinar sobre a A. [doc. junto a págs. 312 do processo físico].

III. De Direito

1. A autora imputa as seguintes ilegalidades ao acto final do procedimento concursal aberto pelo Demandado Tribunal Constitucional para o recrutamento para o cargo de director de serviços para o Departamento Administrativo e financeiro: i) vício procedimental por indevida não exclusão da oponente ao concurso e aqui contra-interessada; ii) ilegalidade de todos os actos praticados pelo “novo júri” do concurso por violação do disposto no artigo 21.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro; iii) vício por erro na avaliação curricular da contra-interessada; iv) vício por erro na avaliação curricular da A..

Vejamos se assiste razão à impugnante a respeito de cada um destes fundamentos.

1.1. Do vício decorrente da indevida não exclusão da aqui contra-interessada do procedimento concursal

1.1.1. Sustenta a A. que o júri violou as regras do procedimento concursal – que no seu entender são as previstas no Capítulo II da Secção I da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro, diploma que aprova o estatuto do pessoal dirigente dos serviços e organismos da administração central, regional e local do Estado – ao admitir a candidatura da contra-interessada (decisão constante da Acta n.º 2, ponto 5 da matéria de facto assente), uma vez que esta não teria entregue com o requerimento de formalização da sua candidatura a declaração exigida na alínea d) das regras estipuladas no edital da Oferta de Emprego publicada na Bolsa de Emprego Pública [declaração autenticada emitida pelo serviço de origem comprovativa de que o candidato se encontra a exercer funções públicas, com indicação da modalidade de relação jurídica de emprego público, da categoria e antiguidade da mesma, da antiguidade na carreira e na função pública, das funções ou actividades exercidas, bem como a duração das mesmas].

Sustenta ainda que terá havido desigualdade de tratamento, uma vez que a Secretária-Geral do Tribunal Constitucional, por email de 30 de Junho de 2016, havia convidado a contra-interessada a suprir aquela “ilegalidade” da candidatura (informação que consta do teor da Acta n.º 2, ponto 5 da matéria de facto assente), não tendo sio proporcionado igual tratamento a outra concorrente (C…………), que foi excluída do procedimento.

1.1.2. Quanto a este ponto, tem razão o Demandado quando alega que ao procedimento de recrutamento em causa não se aplica, por determinação legal, o regime jurídico da Lei n.º 2/2004.

Com efeito, o Departamento Administrativo e Financeiro, criado pela alteração legislativa introduzida no artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 545/99, de 14 de Dezembro, com a aprovação do Decreto-Lei n.º 197/2015, de 16 de Setembro, constitui um serviço de apoio ao Tribunal Constitucional e, nessa medida e por efeito do disposto no artigo 1.º, n.º 5, alínea a) da Lei n.º 2/2004, encontra-se excluído do âmbito de aplicação deste diploma. Ao processo de recrutamento aqui em apreço, aplicar-se-ia, por determinação legal, com as devidas adaptações, ex vi do disposto no artigo 1.º n.º 3 da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, o regime jurídico previsto neste diploma; como, de resto, também resulta do disposto no artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 545/99, cuja redacção, talvez por lapso do legislador, não foi modificada pelo Decreto-Lei n.º 197/2015, e onde se pode ler que: “Os lugares do quadro de pessoal da Divisão Administrativa e Financeira, do Núcleo de Apoio Documental e Informação Jurídica, do Centro de Informática e do pessoal operário e auxiliar são providos de acordo com o regime geral da função pública, aplicando-se este regime aos respectivos titulares em tudo quanto neste diploma não se ache especificamente regulamentado”.

Porém, neste caso, o Presidente do Tribunal Constitucional optou por abrir concurso ao abrigo do regime jurídico da Lei n.º 2/2004, podendo ler-se no aviso n.º 7100/2016 (ponto 1 da matéria de facto assente) que “[C]onsiderando o previsto no artigo 23.º do Decreto-Lei n.º 545/99, de 14 de dezembro, na redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 197/2015, de 16 de setembro, do qual decorre a aplicação ao Tribunal Constitucional, com as devidas adaptações, da Lei n.º 2/2004, de 15 de janeiro, na sua redação atual, faz-se público que, por meu despacho de 11 de março, se encontra aberto, pelo prazo de dez dias úteis, a contar do dia da publicitação na bolsa de emprego público (BEP), procedimento concursal de seleção com vista ao recrutamento do cargo de direção intermédia de 1.º grau, para o Departamento Administrativo e Financeiro, previsto no artigo 13.º-A.º do referido Decreto-Lei n.º 545/99, de 14 de dezembro.

Assim, como tem sido entendimento da jurisprudência pretérita deste Supremo Tribunal Administrativo, ao estabelecer os parâmetros do concurso (incluído o regime jurídico ao qual o mesmo se subordina), a entidade responsável pelo mesmo auto-vincula-se ao seu cumprimento (v., por todos, acórdão de 29 de Maio de 2002, proc. 044744), pelo que o procedimento concursal aqui em apreço deve ajuizar-se com base no disposto na Lei n.º 2/2004.

1.1.3. Certo é que a aplicação do regime jurídico da Lei n.º 2/2004 não altera, neste caso, o sentido da decisão quanto ao cumprimento ou não, pelo júri, das regras procedimentais. Com efeito, compulsado o documento oferecido pela A. a fls. 125 verso do processo físico, verifica-se que a contra-interessada juntou com o requerimento de candidatura a declaração autenticada exigida na alínea d) dos requisitos de formalização da candidatura publicados no edital e que o convite formulado pelos serviços do TC para complementar a informação se limitavam ao comprovativo do exercício de funções dirigentes mencionadas pela candidata no seu CV. Uma possibilidade [a de esclarecimento de elementos constantes do CV], que estava expressamente prevista no edital [v. ponto 3 da matéria de facto assente] e que foi utilizada não apenas a respeito da contra-interessada, mas também de outro oponente ao concurso, como resulta do teor do ponto 12 da Acta n.º 2 [ponto 5 da matéria de facto assente].

Improcede, por isso, o alegado vício decorrente da não observação pelo júri das regras do edital do concurso.

1.1.4. Já no que respeita à alegada desigualdade de tratamento entre a contra-interessada e a concorrente C…………, cabe concluir que a mesma não existe, atento o facto de os fundamentos que levaram à exclusão desta segunda candidata não serem, como alega a A. na sua P.I., apenas a falta de apresentação de um documento exigido pelo edital (em especial, a declaração autenticada exigida na alínea d) dos requisitos de formalização da candidatura); falta que pudesse ser suprida mediante “convite” do Demandado, antes incluindo, também, a não apresentação da candidatura por nenhuma das vias exigidas, não possuir os requisitos mencionados no n.º 1 do artigo 20.º do pessoal dirigente e não possuir nenhuma das licenciaturas exigidas.

Improcede, por isso, também este segundo fundamento para a não observação pelo júri das regras do edital do concurso, dando-se por não verificado in totum o primeiro fundamento de ilegalidade do acto final do procedimento.

1.2. Do vício decorrente da substituição indevida dos membros do júri que determinaria a ilegalidade de todos os actos praticados pelo “novo júri” do concurso por violação do disposto no artigo 21.º da Lei n.º 2/2004, de 15 de Janeiro

1.2.1. Sustenta a A. que a substituição dos membros do júri durante o procedimento concursal não foi publicitada na Bolsa de Emprego Público, o que constitui violação do disposto no artigo 21.º, n.º 1 da Lei n.º 2/2004, e, nessa medida, conduz à ilegalidade dos actos praticados pelo “novo júri”.

1.2.2. Porém, e independentemente de existir ou não a exigência legal de publicação dessa alteração ou da suficiência ou não, para o efeito, da notificação desse facto a todos os oponentes ao concurso, a verdade é que é falso o alegado pela A., como resulta do documento junto a págs 293 do processo físico (ponto 9 da matéria de facto assente), pois a mencionada alteração do júri, devidamente fundamentada pelo despacho do Presidente do Tribunal Constitucional de 16 de Março de 2017 (ponto 8 da matéria de facto assente), foi publicitada na Bolsa de Emprego Público.

Mais se acrescenta que, atentando nos fundamentos daquela substituição – modificação na composição do Tribunal Constitucional –, bem como nas diligências adoptadas para assegurar a legalidade do aproveitamento dos actos já praticados, nenhuma censura pode ser dirigida à tramitação procedimental adoptada e às decisões que sobre a mesma recaíram, improcedendo também este fundamento de ilegalidade do acto final do procedimento apresentado pela A.

1.3. Do vício decorrente do erro na avaliação curricular da contra-interessada

1.3.1. Sustenta a A. que o júri errou na avaliação do currículo da contra-interessada ao considerar que a mesma havia exercido cargos dirigentes, uma qualificação que considera infundada, pelo que deveria ter-lhe sido atribuída a classificação de 12 e não de 18 valores na avaliação da “Experiência Profissional Específica”.

Na tese da A., as funções que a candidata B………… desempenhou como Coordenadora da Direcção Administrativa e Financeira do Secretariado Executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP) não podia ser equiparável ao exercício de funções de Directora de Serviços na Administração Pública portuguesa, o mesmo sendo válido para o exercício das funções de Conselheira Técnica Principal no Ministério dos Negócios Estrangeiros.

1.3.2. Ora, como explica o Tribunal Constitucional na sua contestação, na avaliação do CV da aqui contra-interessada não se estabeleceu nenhuma “equiparação legal” entre as funções que a mesma exercera na CPLP e na Representação de Portugal junto da União Europeia (REPER), nem essa equiparação legal foi “certificada” na Declaração emitida pela Direcção de Serviços de Recursos Humanos do Departamento Geral de Administração do Ministério dos Negócios Estrangeiros, que consta de fls. 128 verso do processo físico. Do referido documento consta apenas que a contra-interessada havia exercido funções naquelas estruturas administrativas internacionais em regime de equiparação material a Director de Serviços. É isso que resulta do seguinte trecho do documento a que vimos fazendo referência: “[…] a Técnica Superior B…………, desempenhou funções como Coordenadora da Direcção Administrativa e Financeira do Secretariado Executivo da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), em Lisboa, sendo equiparada para todos os efeitos legais a Directora de Serviços, no período de ……… a ………, em regime de Acordo de Cedência de Interesse Público entre o Ministério dos Negócios Estrangeiros e a CPLP […]”.

Quer isto dizer que foi com base numa equiparação material de funções, descrita no CV e atestada pela entidade empregadora, e não por equiparação legal, no sentido de legalmente prevista, que o Tribunal Constitucional considerou que a contra-interessada tinha experiência profissional específica “com desempenho de cargo dirigente intermédio de 1.º grau na área do concurso, ou equiparado, por período superior a 24 meses (18 valores)” [fls. 220 do processo físico].

Uma interpretação e qualificação das funções exercidas pela contra-interessada naquele organismo internacional que, pelo conteúdo descrito no CV [o qual se tinha à data da avaliação, por verdadeiro, e que veio depois a ser certificado em 12 de Outubro de 2017, por declaração da Directora Geral da CPLP, conforme documento junto a fls. 298 do processo físico], se afigura razoável (dentro da margem de livre apreciação do júri) que fosse reconduzido ao descrito no n.º 1 do artigo 8.º da Lei n.º 2/2004, onde são elencadas as competências dos titulares dos cargos de direcção intermédia de 1.º grau. Não se identifica, por isso, a alegada violação do princípio do inquisitório na instrução do procedimento concursal.

Ilustre-se, de resto, a asserção de adequação e razoabilidade do juízo formulado pelo júri com a referência às actividades desenvolvidas pela contra-interessada na elaboração da proposta de orçamento do secretariado executivo da CPLP, na elaboração de pareceres que permitiam antecipar necessidades em termos de bens necessários ao funcionamento daquele Secretariado Executivo ou na produção de indicadores de auxílio à gestão, e com a exigência legal de experiência na definição de objectivos de actuação da unidade orgânica em que exerce direcção.

Improcede, por isso, o alegado erro na avaliação do CV da contra-interessada.

1.4. Do vício decorrente do erro na avaliação curricular da A.

Alega a A., por último, que o júri errou na avaliação do seu currículo ao não considerar todos os cargos de direcção intermédia de 1.º grau exercidos por esta, a saber: i) como Directora de Serviços Administrativos e Financeiros no Instituto do Desporto de Portugal, entre ……… e ………; ii) Como Directora do de Recursos e Sistemas de Informação do Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação Relações Internacionais do Ministério das Finanças, entre ……… e ………; e iii) Como Directora de serviços no Departamento Administrativo e Financeiro do Tribunal Constitucional, em regime de substituição, entre ……… e ……….

Está aqui em causa a desconsideração pelo júri, para efeitos de avaliação da “Experiência Profissional Específica”, do exercício de funções como Directora de Recursos e Sistemas de Informação do Gabinete de Planeamento, Estratégia, Avaliação e Relações Internacionais do Ministério das Finanças. Uma não consideração para efeitos de ponderação neste item que o júri fundamentou, na resposta à reclamação apresentada pela aqui A. em sede de audiência prévia, com a circunstância de ter considerado apenas a sua experiência como directora de serviços na área administrativa e financeira, ou seja, o período de ……… a ……… de exercício de funções em regime de substituição enquanto Directora de Serviços no Tribunal Constitucional (nove meses) e o período de ……… a ……… como Directora de Serviços Administrativos e Financeiros do Instituto do Desporto de Portugal (um ano e dois meses). Não perfazendo a soma daqueles dois períodos o mínimo de dois anos no exercício das funções, a classificação a atribuir foi de 17 valores.

Ora, a limitação da contabilização do período de exercício de funções como directora de serviços na área administrativa e financeira não se afigura desadequado nem irrazoável, em face dos critérios estabelecidos (ponderação da experiência profissional específica) e dos fundamentos apresentados, pelo que, a decisão não merece a censura que a A, lhe pretende atribuir.

E tal basta para se concluir que não procede também este vício apontado pela A. ao acto final do concurso.

Em suma, nenhum dos fundamentos alegados pela A. permite concluir que exista ilegalidade do acto de homologação do resultado a que chegou o júri do concurso para recrutamento do cargo de direcção intermédia de 1° grau (Director de Serviços) para o Departamento Administrativo e Financeiro do aqui demandado Tribunal Constitucional.

1.5. Por último, a A. pediu também a anulação do despacho do Exmo. Senhor Presidente do Tribunal Constitucional, proferido no dia 20 de Junho de 2017 [o acto em causa foi praticado no dia 20 de Junho e não 12, como por lapso se indica na P. I. – v. ponto 13 da matéria de facto assente], que determinou a cessação do exercício de funções pela A., em regime de substituição, que a mesma vinha exercendo desde 21 de Setembro de 2015.

Como bem assinala o Demando na sua contestação, este acto é um acto autónomo e não consequente do acto de homologação do concurso, acrescendo que também não enferma de nenhuma ilegalidade que lhe tenha sido apontada.

Improcede, por isso, também este segundo pedido.

IV. Decisão

Nos termos do exposto, decidimos julgar improcedente a acção, e, em conformidade, absolver o demandado dos pedidos.
Custas pela autora

A relatora consigna e atesta que, nos termos do disposto no artigo 15.º-A do Decreto-Lei n.º 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo artigo 3.º do Decreto-Lei n.º 20/2020, de 1 de Maio, tem voto de conformidade com o presente acórdão dos Senhores Juízes Conselheiros Maria do Céu Neves e José Francisco Fonseca da Paz.

Suzana Tavares da Silva