Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0594/13
Data do Acordão:03/26/2014
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:CASIMIRO GONÇALVES
Descritores:MAIS VALIAS
IRS
PERMUTA DE BENS PRESENTES POR BENS FUTUROS
Sumário:I – No contrato de permuta de bens presentes por bens futuros, a transmissão do direito de propriedade das coisas permutadas tem como causa o próprio contrato mas, se nada for convencionado pelas partes, os efeitos ocorrem em momento diferente: quanto aos bens presentes, no momento da celebração do contrato e quanto aos bens futuros, no momento em que se tornam presentes (n°s. 1 e 2 do art. 408° do CCivil).
II – Também relativamente ao adquirente de bens futuros o aumento do poder aquisitivo (que é o que releva para efeitos da tributação em IRS) apenas se materializa no momento da celebração do contrato que lhe permita dispor do direito sobre aqueles bens (que então já não serão futuros) ou, então, se ocorrer tradição ou posse dos mesmos (al. a) do n° 3 do art. 10º do CIRS) antes da celebração daquele contrato, no momento em que tais bens lhe sejam entregues: é um destes momentos – o da escritura ou o da tradição dos bens futuros – conforme o que primeiro se verificar, o momento relevante a considerar para efeitos de tributação.
Nº Convencional:JSTA00068632
Nº do Documento:SA2201403260594
Data de Entrada:04/16/2013
Recorrente:FAZENDA PÚBLICA
Recorrido 1:A...
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PENAFIEL
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR FISC - MAIS VALIAS
Legislação Nacional:CIRS01 ART1 ART9 N1 A ART10 N1 N3 A ART44 N3.
CCIV66 ART939 ART408 N1 N2.
LGT98 ART38.
Jurisprudência Nacional:AC TCA SUL PROC1088/03 DE 2004/05/11; AC STA PROC0536/12 DE 2012/11/28
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

RELATÓRIO
1.1. A Fazenda Pública recorre da sentença que, proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A…………….. contra a liquidação de IRS do ano de 2003.

1.2. Termina as alegações formulando as conclusões seguintes:
A. Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a impugnação deduzida contra a liquidação adicional de IRS relativa ao ano de 2003, por haver concluído que os ganhos sujeitos a tributação em IRS, nos termos do art. 10º, n° 1 al. a) e n° 3 do Código do IRS, consideram-se obtidos na data da celebração do contrato de permuta de bens presentes por bens futuros,
B. ao invés da posição que está na génese da liquidação impugnada, de que a tributação para efeitos de determinação das mais-valias sujeitas a IRS, nos termos do art. 10°, n° 1, al. a) e n° 3, 1ª parte e al. a) do Código do IRS, ocorre na data da escritura da determinação da prestação do contrato de permuta, uma vez que a transmissão dos bens futuros apenas se poderá considerar verificada através da celebração da escritura pública pela qual a posse daqueles seja cedida, momento este a que deverá reportar-se o facto tributário, pois é este o momento em que o titular de rendimentos adquire efetivamente o aumento do poder aquisitivo tributado em IRS.
C. Ressalvado o devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se com o doutamente decidido, considerando existir erro de julgamento de direito, por errónea interpretação do direito aplicável ao caso em concreto.
Assim,
D. A questão controvertida nos presentes autos refere-se então ao momento da exigibilidade do imposto num contrato de permuta de bens presentes por bens futuros, nos termos do art. 10°, n° 3 do CIRS — se a data da outorga do contrato permuta, no caso em 2000, ou se a data da transmissão dos bens futuros verificada através da celebração da escritura pública pela qual a posse daqueles seja cedida, quando os mesmos se tornam presentes, no caso, na data da escritura de determinação da prestação do contrato de permuta outorgada em 2003. Ora,
E. Na determinação do sentido das normas fiscais e na qualificação dos factos a que as mesmas se aplicam, e como nos diz o n° 1 do art. 11° da LGT, devem ser observadas as regras e os princípios gerais de interpretação e aplicação das leis, pelo que, as normas já citadas do Código de IRS a aplicar ao caso em concreto carecem de ser interpretadas à luz do regime global de IRS e dos princípios essenciais em que assenta este imposto.
F. De igual modo, e como determina o n° 2 do mesmo preceito, sempre que, nas normas fiscais, se empreguem termos próprios de outros ramos de direito, devem os mesmos ser interpretados no mesmo sentido daquele que aí têm.
G. No caso em concreto, dúvidas não subsistem que estamos em presença de um contrato de permuta — contrato pelo qual uma pessoa transmite a propriedade de um bem ou outro direito contra a propriedade de outro bem dado em troca — de um bem presente (a parcela de terreno para construção) por um bem futuro (as fracções a construir).
H. Este contrato não se encontra especialmente previsto no nosso Código Civil. Dispõe contudo o art. 939° do Código Civil que as normas de compra e venda são aplicáveis aos outros contratos onerosos, entre os quais, ao contrato de permuta.
I. Os negócios reais (isto é, os que visam a constituição ou transferência de direitos reais) que versem sobre coisas futuras só produzem o seu efeito típico quando as coisas que constituírem o respetivo objeto surjam ou venham a encontrar-se na titularidade do disponente (cfr. n° 2 do art. 408° e n° 1 do art. 880° do CC) ((3) neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, in Código Civil Anotado, Coimbra Editora, 4ª Edição, Vol. I, p. 204.).
J. A lei prevê assim diversos desvios ao princípio do consentimento ou do consensualismo fixado na primeira parte do n° do art. 408° do CC. O primeiro desvio tem a ver com o facto de o direito real não existir eventualmente ao tempo do negócio transmissivo ou constitutivo, o que acontece quando a coisa sobre a qual ele deva incidir, for futura.
K. Deste modo, no caso de permuta de fracções ainda não construídas, o direito de propriedade sobre estas só é adquirido quando a obra estiver concluída.
L. Em sede de IRS, o que se encontra em causa é o rendimento acréscimo constituído pelos ganhos ocasionais ou fortuitos e consequente aumento do poder aquisitivo do seu titular. Assim, para efeitos de determinação da matéria tributável do contribuinte na sequência da celebração de um contrato do tipo e com as características daquele que está aqui em causa, terá de atender-se ao rendimento que este efetivamente recebeu no ano em causa e que foi colocado à sua disposição.
M. Conforme refere André Salgado de Matos, citado por Paula Rosado Pereira ((4) in Estudos sobre IRS: Rendimentos de Capitais e Mais-valias, pág. 88, Almedina, 2005), “a tributação das mais-valias surge na medida em que a alienação de um determinado bem por um valor superior àquele por que foi adquirido tem por resultado um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito alienante, em relação ao qual o principio da capacidade contributiva reclama a existência de normas de incidência objectiva”.
N. Deve, por isso, a tributação reportar-se ao momento em que na realidade o titular dos rendimentos adquira efetivamente o aumento do poder aquisitivo resultante do negócio que origina.
O. A tributação das mais-valias ocorre apenas no momento da sua realização, existindo assim afastamento das mais-valias que embora verificadas se conservam latentes ou potenciais. De outro modo, poder-se-iam criar insuperáveis dificuldades de liquidez nos contribuintes, que se veriam onerados com prestações tributárias imputáveis a ganhos ainda não realizados.
P. Ora, o adquirente dos bens futuros apenas adquire o aumento do poder aquisitivo tributado em IRS no momento da celebração do contrato civil que lhe permita dispor do seu direito sobre tais bens, ou no momento em que os bens lhe sejam entregues, verificando-se assim a tradição ou posse dos mesmos prevista na alínea a) do n° 3 do art. 10° do CIRS.
Q. É a esta transferência que subjaz a perspetiva económica do enriquecimento do património do sujeito passivo e que, deverá estar no caso em concreto, ligada à transferência jurídica da propriedade.
R. Não restam dúvidas que, no ano de 2000, aquando da celebração do contrato de bens presentes por futuros, apenas ocorreu a transferência do terreno para o construtor, não tendo ocorrido, nessa data, qualquer acréscimo patrimonial na esfera jurídica do impugnante, na medida em que a contraprestação acordada pela entrega do terreno só lhe seria adstrita uma vez concluída a edificação.
S. Deste modo, não é a prática do ato jurídico em si que determina a tributação de rendimentos, mas a efetiva entrada desses rendimentos no património do sujeito passivo em cada ano civil, daí a salvaguarda constante das alíneas a) e b) do n° 3 do art. 10º do CIRS.
T. É um destes momentos, aquando da efetiva entrada desses rendimentos no património do sujeito passivo — o da escritura ou o da tradição dos bens futuros — conforme o que primeiro se verificar, o momento relevante a considerar para efeitos de tributação, momento esse a que se reporta o facto tributário.
U. Assim, os ganhos obtidos com esta permuta foram efetivamente auferidos no ano de 2003, por via da escritura de determinação da prestação mediante a qual os bens futuros se tornaram presentes (cfr. arts. 408°, 409° e 1317º do Código Civil), razão pela qual é a este momento que se deverá reportar o facto tributário e a exigibilidade do imposto, nos termos do disposto no art. 10º, n° 1, al. a) e n° 3, 1ª parte e al. a) do Código do IRS.
V. Em face do exposto, ao decidir como decidiu, a douta sentença incorreu em erro de julgamento, consubstanciado na errada interpretação e aplicação das normas legais citadas.
Termos em que, deve ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional e, em consequência, ser revogada a douta sentença recorrida, com as legais consequências.

1.3. Não foram apresentadas contra-alegações.

1.4. O MP emite Parecer nos termos seguintes:
«1. A F.P. interpôs recurso da sentença proferida que julgou procedente a impugnação que tinha sido apresentada por A…………….. com vários fundamentos.
2. Emitindo parecer quanto à questão da interpretação a efectuar sobre o previsto no art. 10° n° 1 al. a) e 3, 1ª parte al. a) do C. do IRS e quanto à tributação de mais valias em causa:
Apesar de não ser conhecida jurisprudência sobre a questão para além do acórdão do T.C.A. Sul que tem sido citado nos autos, não se pode deixar de constatar que neste se admitiu ainda a tributação com base no valor que semelhantemente foi dada a fracções em nova liquidação de sisa, e tendo sido considerada a tributação pela alienação do prédio rústico destinado a construção, conforme consta da escritura de venda, apesar de tal requisito constar apenas de anterior legislação, conforme pontos VIII e IX do respectivo sumário já reproduzido em anterior parecer emitido na 1ª instância (fls. 73).
No entanto, no acórdão do acórdão do S.T.J. [pretender-se-ia dizer STA] de 28-11-12, proferido no proc. 0536/12, acessível em www.dgsi.pt, em que tal tributação foi afastada por posterior não concretização dos bens, refere-se ainda o seguinte: “I – De acordo com o disposto nos arts. 10°, n° 1, alínea a) do CIRS, constituíam mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos comerciais … resultassem de: a) alienação onerosa de direitos reais sobre imóveis. II – O n° 3, alínea a) do mesmo artigo prescrevia ainda que nos casos de troca se presumia que o ganho era obtido logo que verificada a tradição dos bens ou direitos objeto do contrato, acrescentando o art. 42°, n° 3 do mesmo diploma que no caso de troca por bens futuros, os valores referidos na alínea a) do seu n° 1 (valores de realização), se reportavam à data da celebração do contrato.”
Também a doutrina que mais detalhadamente se pronunciou sobre a interpretação das referidas normas, em relação com as constantes nos arts. 41º e ss. do mesmo Código, a tributação de mais-valias está subordinada ao princípio da realização, sendo a regra geral a de fazer coincidir tal com a própria alienação de bens — assim, Xavier de Basto (IRS, Incidência real e Determinação dos Rendimentos Líquidos) pág. 55 e ss.) e Paula Rosado Pereira em Estudos sobre IRS: Rendimentos de Capitais e Mais-Valias, p. 88).
É assim de admitir que, tendo ocorrido em 2000 a permuta de bem presente por bens futuros mas estes apenas se concretizado em 2003 é nesta data que o imposto se torna exigível não obstando a tal o previsto no art. 44° (anterior 42°) n° 3 do mesmo código, em termos dos valores apurados quanto às ditas fracções serem de reportar à data da celebração do contrato.
3. Concluindo, parece que o recurso interposto pela F.P. é de proceder, sendo de revogar o decidido e julgar a impugnação improcedente por a tributação em causa respeitar as referidas normas tidas ao caso por aplicáveis.»

1.5. Corridos os vistos legais, cabe decidir.

FUNDAMENTOS
2.1. Na sentença recorrida julgaram-se provados os factos seguintes:
1.º - Por escritura pública de permuta lavrada de fls.141 a 142 verso do livro n° 108-A no Cartório Notarial de Peso da Régua, em 26 de Maio de 2000, o ora impugnante declarou dar à sociedade B…………….., Lda., representada por C……………….., uma parcela de terreno para construção, com a área de 4.749 m2, sita no ……………., Peso da Régua, descrita na conservatória do registo predial do Peso da Régua ainda como prédio rústico sob o n° 00784/150597, omissa na matriz, mas tendo sido apresentada competente declaração para sua inscrição no Serviço de Finanças Peso da Régua.
2.º - Pela referida escritura, a representada de C……………… declarou dar a A……………. quatro fracções autónomas, que iriam fazer parte integrante do edifício em regime de propriedade horizontal, a construir na parcela de terreno identificada.
3.º - À permuta foi dado o valor de 150.000.000$00 (cento e cinquenta milhões de escudos).
4.º - Em 04.04.2003 foi outorgada a escritura de determinação da prestação acordada — cf. teor de fls.56 do Processo Administrativo apenso aos autos.
5.º - Em 05.04.2004, o ora impugnante apresentou a declaração de rendimentos do ano de 2003 com os anexos A, E, F, e H, não declarando os elementos referentes à permuta.
6.º - O ora impugnante foi notificado através do ofício n° 63353 de 30.07.2007 da Divisão de Liquidação dos Impostos Sobre o Rendimento e Sobre a Despesa, do projecto de decisão para efeitos do exercício do direito de audição.
7.º - Em 16.08.2007 apresentou declaração de substituição.
8.º - A AF considerou que a declaração apresentada enfermava de omissão de rendimentos e continha irregularidades que assumiam especial relevância para a correcta liquidação do imposto.
9.º - Em 02.11.2007, o ora impugnante foi notificado da liquidação n° 20075004551092.
10.º - Em 03.01.2008 o ora impugnante apresentou reclamação graciosa.
11.º - Foi notificado do projecto de indeferimento pelo oficio n° 49558 de 08.07.2008 da Divisão de Justiça Administrativa e Contenciosa da Direcção de Finanças do Porto.
12.º - Em 15.07.2008 exerceu o seu direito de audição.
13.º - Em 22.07.2008 foi o ora impugnante notificado na pessoa do seu mandatário da decisão de indeferimento da reclamação pelo oficio n° 51857 da Divisão de Justiça Administrativa e Contenciosa da Direcção de Finanças do Porto.
14.º - Em 29.07.2008 apresentou na Direcção de Finanças do Porto o presente recurso.
15.º - Por despacho de 12.02.2009, foi indeferido o recurso hierárquico.
2.2. A sentença recorrida julgou procedente a impugnação, por considerar que o n° 3 do art. 10º do CIRS deve ser interpretado não como determinando, no ano da prática do acto, a tributação de rendimentos não efectivamente auferidos, nem postos à disposição do titular nesse ano, mas sim como uma presunção de que os rendimentos que constituem mais-valias são auferidos no momento da prática do acto. Ou seja tendo o impugnante outorgado o contrato de permuta (de bens presentes por bens futuros) em 26/5/2000, a liquidação do IRS resultante dessa mais valia tem que ser feita reportando a essa data da escritura de permuta, apesar de só em 4/4/2003 ter sido outorgado a escritura de determinação da prestação acordada na referida permuta.
Por sua vez, a Fazenda Pública considera que o momento a ter em conta é o da data da determinação da permuta (4/4/2003) e não a data da celebração da escritura de permuta.

2.3. Como resulta dos próprios autos e da factualidade provada, o impugnante/recorrido permutou com sociedade B……………., Lda., em 26/5/2000, uma parcela de terreno para construção, por quatro fracções de um prédio aí a construir pela segunda outorgante e já com projecto foi aprovado pela CM de Peso da Régua.
No contrato as partes atribuíram à parcela de terreno o valor de 76.000.000$00 (379.076,40 Euros) e atribuíram às quatro fracções a construir também o mesmo valor de 76.000.000$00, declarando, portanto, que os bens permutados somavam o valor de 152.000.000$00 (no n° 3 do Probatório, ocorre, manifestamente, um erro material quando se diz que à permuta foi dado o valor de 150.000.000$00; na verdade, o valor, como da própria escritura consta, foi de 152.000.000$00).
E em 4/4/2003, foi outorgada a escritura de determinação da prestação acordada na referida permuta.
Entretanto tendo a referida parcela de terreno para construção sido desanexada do respectivo artigo rústico veio, por isso, a ser inscrita na respectiva matriz urbana (art. 2037), com o valor patrimonial definitivo (resultante da respectiva avaliação) de 101.005,26 Euros.
Em consequência, os Serviços da AT, considerando para essa parcela de terreno o valor de aquisição de 101.005,26 Euros e o valor de realização de 379.076,40 Euros (que corresponde ao valor total atribuído às quatro fracções), procederam à alteração dos elementos declarados, em sede de IRS, relativamente ao agregado familiar do impugnante/recorrido e reportando ao ano de 2003, e apuraram, no âmbito da respectiva categoria G (mais-valias), o rendimento de 135.000,36 Euros correspondente ao ganho obtido com a permuta do mencionado terreno para construção (e que originou a liquidação de IRS ora impugnada).
Mas a recorrida sustenta que o facto tributário sujeito a IRS ocorreu aquando da celebração do contrato de permuta, em 26/5/2000, ao passo que a Fazenda Pública considera que o momento a ter em conta é o da data da determinação dessa permuta, que ocorreu em 4/4/2003 e que, por isso, é legal a liquidação operada por reporte ao rendimento do ano de 2003.
Vejamos, pois.

3.1. Os incrementos patrimoniais integram a categoria G de rendimentos para efeitos de IRS (art. 1º do CIRS), neles se integrando as mais-valias (al. a) do n° 1 do art. 9° do CIRS), constituídas, além do mais, pelos ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário (al. a) do n° 1 do art. 10º do mesmo CIRS).
Na verdade, o CIRS adopta uma concepção de rendimento-acréscimo segundo a qual a base de incidência deste tributo abrange todo o aumento do poder aquisitivo do contribuinte, incluindo nela as mais-valias (acréscimos patrimoniais que, embora não provenham de uma actividade produtiva, têm significado económico e são passíveis de controlo pela AT, nestas se incluindo as mais-valias prediais) e, de um modo geral, as receitas irregulares e ganhos fortuitos, que também devem ser considerados manifestações de capacidade contributiva.(José Guilherme Xavier de Basto, IRS: Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, p. 379.)
Assim, no que ora releva, no art. 10º do CIRS dispõe-se o seguinte:
«1 - Constituem mais-valias os ganhos obtidos que, não sendo considerados rendimentos empresariais e profissionais, de capitais ou prediais, resultem de:
a) Alienação onerosa de direitos reais sobre bens imóveis e afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário;
(…)
3 - Os ganhos consideram-se obtidos no momento da prática dos actos previstos no n° 1, sem prejuízo do disposto nas alíneas seguintes:
a) Nos casos de promessa de compra e venda ou de troca, presume-se que o ganho é obtido logo que verificada a tradição ou posse dos bens ou direitos objecto do contrato;
(...)
4 - O ganho sujeito a IRS é constituído:
a) Pela diferença entre o valor de realização e o valor de aquisição, líquidos da parte qualificada como rendimento de capitais, sendo caso disso, nos casos previstos nas alíneas a), b) e c) do n° 1;
(...)».
Ou seja, embora do transcrito n° 3 resulte que, em regra, para efeitos de tributação em IRS, o ganho sujeito a mais-valias se considera efectivamente obtido no momento da prática dos actos referidos, logo nas alíneas a) e b) desse mesmo n° 3 se especificam as excepções a esta regra: no caso de a tradição do imóvel ocorrer antes da data da assinatura do contrato de compra e venda ou de troca, presume-se que o ganho é obtido logo nessa data em que ocorre a tradição; e no caso de afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida pelo seu proprietário, o ganho só se considera obtido no momento da ulterior alienação onerosa dos bens em causa ou da ocorrência de outro facto que determine o apuramento de resultados em condições análogas.
Assim é que, em caso de promessa de compra e venda ou de troca, dada a maior amplitude do conceito de transmissão para efeitos fiscais (por comparação com o conceito de transmissão em termos de direito privado) e caracterização daquele por reporte, também, a aspectos económicos e substanciais em detrimento do aspecto da titularidade jurídica dos bens, o preceito legal considera obtida a mais-valia desde que se verifique a existência do referido contrato promessa de compra e venda ou de troca e a entrega física do bem objecto do contrato, mesmo que não tenha ocorrido uma alteração da titularidade jurídica do bem, sendo que neste caso, como nos casos de afectação de quaisquer bens do património particular do sujeito passivo à sua actividade empresarial e profissional, o ganho só se considera obtido no momento da ulterior alienação onerosa dos bens em causa ou da ocorrência de outro facto que determine o apuramento de resultados em condições análogas, remetendo-se «a exigibilidade do imposto para o momento de uma posterior alienação onerosa do bem ou da verificação de outro facto de efeito equivalente, uma vez que (...) o Código do IRS optou pela tributação das mais-valias apenas no momento da realização, não sendo tributáveis as mais-valias meramente potenciais ou latentes.»(Paula Rosado Pereira, ESTUDOS SOBRE IRS: RENDIMENTOS DE CAPITAIS E MAIS-VALIAS, Almedina, Fevereiro, 2005, pp. 96 a 98.)
Na verdade em termos de tributação das mais-valias, impõe-se o princípio da realização pelo que, em sede de IRS, a incidência supõe a realização da mais-valia, não sendo «o simples aumento do valor dos activos em que se materializam que constitui o facto gerador. Este é, sim, a respectiva alienação onerosa, ou operação equiparada. Em todas as alíneas do n° 1 do artigo 10º se exige a alienação onerosa do activo, ou então, equipara-se certas operações a transmissão onerosa».(Ob. cit., p. 397.)
Já em relação às mais-valias a que se refere a 2ª parte da alínea a) (as resultantes da afectação de quaisquer bens do património particular a actividade empresarial e profissional exercida em nome individual pelo seu proprietário) diz Xavier de Basto que aqui se equipara a «realização» um fenómeno patrimonial que não é de alienação de bens, implicando transferência de propriedade (pois que os bens continuam na propriedade do sujeito passivo, apenas tendo mudado a sua destinação. Há pois uma realização ficcionada. O facto gerador do imposto não é um acto de alienação ou disposição de activos patrimoniais, mas a sua simples afectação à actividade empresarial ou profissional exercida pelo proprietário.
«A afectação origina incidência, mas não torna o imposto exigível, já que a exigibilidade do imposto é diferida para o momento da ulterior transmissão desses bens, suspendendo-se tributação entretanto. O imposto só vai afinal tornar-se exigível quando a mais valia dos bens afectos for efectivamente realizada. O princípio da realização como que renasce das cinzas ... É o que resulta da alínea b) do n° 3 do artigo 10º ...».(José Guilherme Xavier de Basto, ob. cit., p. 399 e 400.)
Ora, tal como nestes casos, também relativamente ao adquirente de bens futuros o aumento do poder aquisitivo (que é o que releva para efeitos da tributação em IRS) apenas se materializa no momento da celebração do contrato que lhe permita dispor do direito sobre aqueles bens (que então já não serão futuros) ou, então, se ocorrer tradição ou posse dos mesmos (al. a) do dito n° 3 do art. 10° do CIRS) antes da celebração daquele contrato, no momento em que tais bens lhe sejam entregues: é um destes momentos — o da escritura ou o da tradição dos bens futuros — conforme o que primeiro se verificar, o momento relevante a considerar para efeitos de tributação.
3.2. No caso trata-se de um contrato de permuta.
Este contrato de permuta é hoje um contrato atípico, inominado, já que não tem regulamentação específica na lei civil, devendo a sua regulação de referência buscar-se no contrato de compra e venda, por força do disposto no art. 939° do CCivil.
Mas, além disso, trata-se de permuta por bens futuros.
E na definição legal, tanto será permuta a troca imediata da propriedade e da posse material de bens imóveis entre ambas as partes e nos dois sentidos, como a situação em que a prestação de uma das partes envolve um bem futuro, ou seja, um bem que ainda está em construção ou que o permutante ainda vai adquirir a terceiro.
Na verdade no art. 211° do CCivil definem-se as coisas futuras como sendo «... as que não estão em poder do disponente, ou a que este não tem direito, ao tempo da declaração negocial». Ora, sabido que os bens futuros podem ser absolutamente futuros (os que não existem na ordem jurídica, que estão em projecto ou em fase de construção, mas ainda não são bens com identidade própria) ou relativamente futuros (os que já existem e são reais mas não estão ainda no património do disponente) importa distinguir entre o momento da celebração do contrato e o momento em que nas leis tributárias (CIRS, CIRC, CIMT, CIMI, entre outras) se considera consumada essa mesma permuta.
Até porque no contrato de permuta de bens presentes por bens futuros, a transmissão do direito de propriedade das coisas permutadas tem como causa o próprio contrato mas, nada sendo estipulado pelas partes, os efeitos ocorrem em momento diferente: quanto aos bens presentes, no momento da celebração do contrato e quanto aos bens futuros, no momento em que se tornam presentes (n°s. 1 e 2 do art. 408° do CCivil).
Como salienta Fernandes Pires (embora reportando não ao IRS, mas apenas ao IMT) «Em condições normais as permutas ocorrem de forma instantânea, produzindo-se as transmissões em simultâneo com a celebração do contrato. Essa consumação ocorrerá por mero efeito da celebração do contrato, seguindo-se a regra geral, constante do n° 1 do artigo 408° do Código Civil, segundo a qual os efeitos reais dos contratos se produzem imediatamente, com a sua celebração.
Mas é o próprio artigo 408° do Código Civil que no seu n° 2 abre a excepção para a transferência da propriedade dos bens futuros, estabelecendo que a transmissão da propriedade só se produz quando os bens se tornarem presentes no património do transmitente.
Aplicando esta regra da Lei civil às permutas de bens presentes por bens futuros, teríamos que ter em conta que a transmissão da propriedade destes últimos só ocorre quando eles se tornarem presentes no património do permutante que no contrato fica com a obrigação de os entregar. (...)
Em respeito a este princípio o Código do IMT estabelece que a consumação da permuta de bens presentes por bens futuros não ocorre necessariamente, de forma imediata, na data da celebração do contrato. (...)
Daqui resulta que nestes casos a permuta não se consuma num só momento mas em dois momentos distintos, sendo um facto tributário composto por outros dois que se produzem em momentos diferentes no tempo. Assim, quando é celebrado o contrato e se transmite a propriedade de um dos bens, ocorre uma transmissão e quando se transfere a propriedade do bem futuro, ocorre a segunda transmissão. Com esta segunda transmissão consuma-se em simultâneo e de forma automática a permuta..»(José Maria Fernandes Pires, Lições de Impostos sobre o Património e do Selo, Almedina, 2010, pp. 334/349.)
Aliás, para efeitos de incidência de IMT, na parte final do n° 3 do art. 5° do CIMT também se ressalvam os casos em que a transmissão dos bens futuros venha a ocorrer em data anterior àquela em que eles se tornam presentes, ou seja, os casos em que a transmissão para efeitos do IMT ocorre antes de se verificar a sua transmissão nos termos do Código Civil [por exemplo os imóveis urbanos ainda não construídos, mas já com projecto de construção aprovado, os quais, por força da excepção constante do n° 3 do art. 14° do CIMT, são considerados, para efeitos de permuta e desse imposto, como bens presentes (Também João Ricardo Catarino, Aspectos Relevantes do Novo Regime de Avaliação da Propriedade Urbana para Fins Fiscais, in Fisco n° 119-121, p. 95, considera que «em bom rigor, não é materialmente possível a posse ou tradição de bens futuros sobre os quais se concebem meros direitos de crédito, os quais, quando integrados no objecto de uma relação jurídica configuram como um direito à prestação de um bem futuro».)].
Em conclusão, para efeitos de tributação em IRS, em caso de contrato de permuta e ainda que se trate de permuta por bens futuros, o aumento do poder aquisitivo do adquirente dos bens futuros apenas se materializa no momento da celebração do contrato que lhe permita dispor do direito sobre aqueles bens (que então já não serão futuros) ou, então, se ocorrer tradição ou posse dos mesmos (al. a) do dito n° 3 do art. 10º do CIRS) antes da celebração daquele contrato, no momento em que tais bens lhe sejam entregues: é um destes momentos — o da escritura ou o da tradição dos bens futuros — conforme o que primeiro se verificar, o momento relevante a considerar para efeitos de tributação.
E porque a tributação das mais-valias «surge na medida em que a alienação de um determinado bem por um valor superior àquele por que foi adquirido tem por resultado um acréscimo patrimonial na esfera do sujeito alienante, em relação ao qual o principio da capacidade contributiva reclama a existência de normas de incidência objectiva»(André Salgado Matos - Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, Anotado, 1999, Nota 1 ao art. 10º, p. 163.) deverá a tributação reportar-se ao momento em que na realidade o titular dos rendimentos adquira efectivamente o aumento do poder aquisitivo resultante do negócio que o origina.

3.3. Diz a sentença, referenciando o acórdão proferido no TCA Sul em 11/5/2004, no proc. n° 1088/03, que a mais valia obtida consistiu no direito adquirido na escritura de permuta, tanto mais que, que, para efeito de determinação da matéria tributável do contribuinte, terá de atender-se ao rendimento que efectivamente recebeu no ano em causa, sendo que o valor de realização, ou de alienação, de todas as mais valias sujeitas a IRS no caso de troca, será o valor atribuído no contrato aos bens ou direitos recebidos, e, tratando-se de troca por bens futuros, o valor reporta-se à data da celebração do contrato — cf. art. 44º, n°1, al. a) e n° 3 do CIRS, sendo que também o n° 3 do art. 10º do CIRS deve ser interpretado não como determinando, no ano da prática do acto, a tributação de rendimentos não efectivamente auferidos, nem postos à disposição do titular nesse ano, mas sim como uma presunção de que os rendimentos que constituem mais-valias são auferidos no momento da prática do acto.
Ora, não pode deixar de se referir que o dito acórdão, além de considerar (i) que o n° 3 do art° 10º do CIRS deverá ser interpretado não como determinando, no ano da prática do acto, a tributação de rendimentos não efectivamente auferidos, nem postos à disposição do titular nesse ano, mas sim como uma presunção de que os rendimentos que constituem mais-valias são auferidos no momento da prática do acto, também considera (ii) que, tratando-se de bens futuros, o valor se reporta à data da celebração do contrato (o que não quer dizer que também se esteja a afirmar que a esse momento se deva reportar a exigibilidade do imposto). Isto é, a questão ali em causa respeitava ao quantum do valor de realização a considerar e não à data em que devem ser imputados os ganhos sujeitos a IRS.
Acresce, como aponta o MP, que em tal aresto também se admitiu ainda a tributação com base no valor que semelhantemente foi dado a fracções em nova liquidação de sisa, e tendo sido considerada a tributação pela alienação do prédio rústico destinado a construção, conforme consta da escritura de venda, apesar de tal requisito constar apenas de anterior legislação.
De todo o modo, e independentemente do decidido nesse acórdão, não é de aceitar, pelas razões que já supra se deixaram expostas, o entendimento vertido na sentença recorrida e igualmente sustentado pelo recorrido.
Na verdade, como supra se acentuou, a opção legislativa, em sede de IRS, de tributação das mais-valias apenas no momento da realização, não sendo tributáveis as mais-valias meramente potenciais ou latentes, mais não concretiza do que a subordinação ao princípio da realização, sendo a regra geral a de fazer coincidir a realização (e, consequentemente, o momento da tributação) com a própria alienação de bens.
Há, pois, num certo tipo de situações, onde a presente também se pode incluir, uma distinção entre o momento da sujeição (que corresponde ao da celebração da permuta) e o momento da exigibilidade do imposto (que só ocorre com a posterior alienação onerosa do bem ou com facto equivalente).
E como acima se deixou dito, relativamente ao adquirente de bens futuros, o aumento do poder aquisitivo (que é o que releva para efeitos da tributação em IRS) apenas se materializa no momento da celebração do contrato que lhe permita dispor do direito sobre aqueles bens (que então já não serão futuros) ou, então, se ocorrer tradição ou posse dos mesmos (al. a) do dito n° 3 do art. 10º do CIRS) antes da celebração daquele contrato, no momento em que tais bens lhe sejam entregues: é um destes momentos — o da escritura ou o da tradição dos bens futuros — conforme o que primeiro se verificar, o momento relevante a considerar para efeitos de tributação.
E a tanto não obsta o disposto no n° 3 do art. 44° do CIRS, pois que ali apenas se estabelece qual é o valor de realização a considerar, nada se estabelecendo no que respeita à data da tributação em IRS.
Não é a prática do acto jurídico em si (escritura de permuta) que determina a tributação dos rendimentos, mas, antes, a efectiva entrada desses rendimentos no património do sujeito passivo em cada ano civil (e que no caso ocorreu apenas em 4/4/2003) quando foi outorgada escritura pública de determinação da prestação do contrato de permuta.
Neste sentido parece apontar, também, o acórdão desta Secção do STA, de 28/11/2012, proc. n° 0536/12, quando afirma que «na prática no nosso sistema fiscal só há lugar a tributação quando a mais valia é realizada, ou seja quando o activo é transaccionado», tendo-se ali admitido, aliás, o afastamento da tributação em sede de IRS, face a posterior não concretização dos bens e a consequente inexistência de efeito económico do contrato de permuta e ao disposto no n° 1 do art. 38° da LGT).
Em suma, no caso, tendo a permuta de bem presente por bens futuros ocorrido em 26/5/2000, e tendo a concretização desses bens futuros ocorrido em 4/4/2003, é nesta data que o imposto se torna exigível, a tal não obstando o disposto no n° 3 do art. 44° (anterior art. 42°) do CIRS, ao estabelecer que os valores apurados relativamente aos bens futuros (no caso as ditas fracções autónomas que vieram a ser construídas no terreno permutado) devem reportar-se à data da celebração do contrato.
A sentença recorrida, que julgou procedente a impugnação judicial por ter considerado que a liquidação impugnada sofre de vício de violação de lei (violação do disposto no n° 3 do art. 10° do CIRS) enferma, portanto, do erro de julgamento que a recorrente Fazenda Pública lhe imputa, carecendo de ser revogada.

DECISÃO
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Tributário deste Supremo Tribunal Administrativo, em dando provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a presente impugnação judicial.
Custas pelo recorrente, mas apenas em 1ª instância, dado que não contra-alegou no recurso.
Lisboa, 26 de Março de 2014. – Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco RothesIsabel Marques da Silva.


Segue acórdão de 18 de Junho de 2014:

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:

I. A Fazenda Pública, notificada do acórdão proferido nos autos em 23/3/2014 (fls. 120 a 130), vem requerer, invocando o disposto no art. 616º do CPC, a respectiva reforma quanto a custas.
Alegou, em síntese:
- A reforma da sentença ou acórdão "tem como desiderato suprir lapsos ou erros manifestos nele contidos", podendo ocorrer nas situações de "manifesto lapso do juiz".
- O acórdão em análise decidiu dar "provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e julgar improcedente a presente impugnação judicial" (v. fls 10 do acórdão), determinando, a final, "Custas pelo recorrente, mas apenas em 1ª instância, dado que não contra-alegou no recurso".
- Tal segmento do douto acórdão enferma de lapso manifesto, pelo que deve ser reformado:
. o recurso, sobre o qual versou o acórdão aqui em questão, foi interposto pela Fazenda Pública da sentença proferida pelo TAF de Penafiel, a qual julgou procedente a impugnação judicial deduzida por A………… contra a liquidação de IRS do ano de 2003;
. no ponto 1.3. do Relatório do acórdão consta que "Não foram apresentadas contra-alegações";
. e, a final, veio a ser revogada a sentença recorrida, dando-se provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública.
- Do exposto resulta claramente que o acórdão incorre em erro manifesto, no segmento, supra transcrito, em que se determinou "Custas pelo recorrente, mas apenas em 1ª instância, dado que não contra-alegou no recurso", sendo que, da leitura de todo o segmento em causa resulta claro que se pretendia referir à recorrida, uma vez que foi esta quem "não contra-alegou no recurso", devendo pois ser reformado na parte em que decidiu ser a recorrente (Fazenda Pública) responsável pelas custas.

II. O recorrido, notificado do pedido de reforma, nada disse.

III. Com dispensa de vistos dos Exmos. Conselheiros Adjuntos, dada a simplicidade da questão a apreciar, dir-se-á, decidindo, que tem razão a requerente.
Na verdade, como do texto do acórdão claramente se constata, foi a Fazenda Pública quem interpôs o presente recurso, o qual veio a ser provido (tendo sido revogada a sentença recorrida e tendo sido julgada improcedente a impugnação judicial, deduzida pelo impugnante/recorrido A…………, contra a liquidação adicional de IRS do ano de 2003).
E, naturalmente, foi o recorrido que não contra-alegou no recurso, e não a recorrente.
Ocorre, portanto, como alega a requerente, lapso manifesto neste segmento do acórdão em que se condenou em custas (apenas na 1ª instância) a recorrente Fazenda Pública em vez do recorrido, o que determina a respectiva reforma da decisão, nessa parte, visto o disposto no nº 1 do art. 616º do novo CPC (correspondente à anterior al. b) do nº 1 do art. 669º), procedendo, assim, a pretensão da recorrente.
Acresce que sempre estaríamos em face de erro de escrita devido a lapso manifesto (erro evidenciado no texto do próprio acórdão), o qual, nos termos do disposto no art. 614º do novo CPC (correspondente ao anterior art. 667º) desde logo também determinaria a simples correcção do acórdão, nessa medida.

IV. Face ao exposto, decide-se reformar o acórdão quanto a custas, consignando-se que onde se escreveu «Custas pela recorrente, mas apenas em 1ª instância, dado que não contra alegou no recurso» deve ler-se «Custas pelo recorrido, mas apenas em 1ª instância, dado que não contra alegou no recurso».
Sem custas.
Lisboa, 18 de Junho de 2014. - Casimiro Gonçalves (relator) – Francisco RothesIsabel Marques da Silva.