Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:03262/19.6BEPRT-S1
Data do Acordão:01/13/2022
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:CARLOS CARVALHO
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REPRESENTAÇÃO
ESTADO
INCONSTITUCIONALIDADE
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Não é de admitir a revista em que o Ministério Público [MP] questiona o indeferimento, por ambas as instâncias, da sua arguição de nulidade por falta de citação do réu Estado, porquanto o recorrente apenas invoca questões de inconstitucionalidade e estas não são o objeto próprio deste tipo de recursos.
Nº Convencional:JSTA000P28826
Nº do Documento:SA12022011303262/19
Data de Entrada:12/20/2021
Recorrente:ESTADO PORTUGUÊS
Recorrido 1:MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E OUTROS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em apreciação preliminar, na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1. MINISTÉRIO PÚBLICO [doravante MP], invocando o disposto no art. 150.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA], peticiona a admissão do recurso de revista por si interposto do acórdão de 08.10.2021 do Tribunal Central Administrativo Norte [doravante TCA/N] [cfr. fls. 325/365 dos autos de recurso instruídos e com subida em separado - paginação «SITAF» tal como as ulteriores referências à mesma, salvo expressa indicação em contrário], que negou provimento ao recurso de apelação pelo mesmo deduzido e que manteve a decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [doravante TAF/PRT - cfr. fls. 201/214] na ação administrativa instaurada pelo SINDICATO INDEPENDENTE DE PROFESSORES E EDUCADORES contra Estado Português [ep] e MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO [ME] [doravante RR.] que havia indeferido o requerimento apresentado pelo MP onde se arguiu a nulidade da falta de citação do R. ESTADO PORTUGUÊS com a consequente anulação de todo o processado posterior à petição inicial e a determinação da citação do mesmo no MP junto do TAF/PRT, não atendendo, assim, à invocação de inconstitucionalidade material das normas constantes do segmento final do n.º 1 do art. 11.º e do n.º 4 do art. 25.º ambos do CPTA, na redação da Lei n.º 118/2019, de 17.09, mercê da violação dos mesmos dos n.ºs 1 e 2 do art. 219.º da Constituição da República Portuguesa [CRP].

2. Motiva a necessidade de admissão do recurso de revista [cfr. fls. 370/388] na relevância jurídica fundamental da questão objeto de dissídio [citação/representação judiciária do Estado Português enquanto demandado nos meios processuais previstos no contencioso administrativo] e, bem assim, para uma «melhor aplicação do direito», invocando, mormente, a incorreta aplicação dos arts. 11.º e 25.º, n.º 4, do CPTA, 51.º do ETAF, 03.º do Estatuto do Ministério Público [EMP - aprovado pela Lei n.º 68/2019, de 27.08], 24.º, 187.º, 188.º, n.º 1, al. a), do Código de Processo Civil [CPC/2013] ex vi do art. 01.º do CPTA, bem como uma interpretação normativa inconstitucional ao não haver sido recusada a aplicação dos arts. 11.º, n.º 1, e 25.º, n.º 4, do CPTA dado que violadora do comando inserto no art. 219.º, n.ºs 1 e 2, da CRP.

3. Não foram produzidas contra-alegações em sede de recurso de revista [cfr. fls. 389 e segs.].

Apreciando:

4. Dispõe-se no n.º 1 do art. 150.º do CPTA que «[d]as decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».

5. Do referido preceito extrai-se, assim, que as decisões proferidas pelos TCA’s no uso dos poderes conferidos pelo art. 149.º do CPTA, conhecendo em segundo grau de jurisdição, não são, em regra, suscetíveis de recurso ordinário, dado a sua admissibilidade apenas poder ter lugar quando: i) esteja em causa apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, revista de importância fundamental; ou, ii) o recurso revelar ser claramente necessário para uma melhor aplicação do direito.

6. O TCA/N manteve o decidido pelo TAF/PRT, no sentido de recusar a verificação da invocada inconstitucionalidade e, por isso, entender que o R. Estado Português foi e mostra-se regularmente citado nos autos de acordo com a lei aplicável.

7. O MP, aqui ora recorrente, insurge-se na presente revista contra este juízo, reafirmando, no essencial, a ocorrência da alegada inconstitucionalidade e da consequente falta de citação do referido R., assinalando a relevância e a repetibilidade da questão.

8. Compulsados os autos importa, destarte, apreciar, «preliminar» e «sumariamente», se se verificam os pressupostos de admissibilidade referidos no n.º 1 do citado art. 150.º do CPTA quanto ao recurso de revista.

9. E entrando nessa análise refira-se, desde logo, que não se mostra persuasiva a motivação/argumentação expendida pelo MP, aqui recorrente, não se descortinando a relevância jurídica fundamental, nem o juízo firmado revela a necessidade de melhor aplicação do direito.

10. Com efeito, em face de recursos de revista onde se discutia questão similar à dos autos sub specie esta Formação já teve oportunidade de decidir que «(…) não se justifica admitir a revista. Esta centra-se exclusivamente em inconstitucionalidades. Ora, e como temos repetidamente dito, os “themata” de inconstitucionalidade não são objeto próprio dos recursos de revista, já que podem ser separadamente colocados ao Tribunal Constitucional» [cfr., entre outros, os Acs. de 24.09.2020 - Proc. n.º 0902/19.0BEPNF-S1, de 11.12.2020 - Proc. n.º 092/20.6BELSB-S1, de 11.03.2021 - Proc. n.º 1240/19.4BEPNF-S1, de 25.03.2021 - Proc. n.º 0213/20.9BEALM-S1, de 13.05.2021 - Proc. n.º 0216/20.3BEALM-S1, de 27.05.2021 - Procs. n.ºs 0895/20.1BEPRT-S1, 01031/19.2BEAVR-S1 e 0271/20.6BEVIS, de 09.06.2021 - Procs. n.ºs 0732/19.0BECBR-S1, 0462/20.0BECBR-S1 e 0714/19.1BECBR-S1, de 23.09.2021 - Proc. n.º 0714/19.1BECBR-S1, de 07.10.2021 - Proc. n.º 0780/20.7BEPRT-S1, e de 18.11.2021 - Proc. n.º 0434/20.4BEPRT-S1].

11. Ainda que a questão suscitada em litígio verse ou tenha vocação para se repetir no futuro, pois respeita a questão replicável no quadro do contencioso administrativo, entendemos não se justificar a intervenção deste Supremo Tribunal, porquanto o problema jurídico que, em essência, se mostra suscitado [recusa de aplicação das normas legais em referência mercê da sua inconstitucionalidade] diz respeito a questão sobre a qual a sua intervenção não pode assegurar as finalidades inerentes à razão de ser do recurso excecional de revista, isto é, de, em termos finais, decidir litígios e/ou orientar e definir interpretações para futuras decisões de casos semelhantes no âmbito daquilo que constituem as matérias da sua competência especializada, tanto mais que em sede do controlo da constitucionalidade das normas e das interpretações normativas feitas a última palavra caberá ou mostra-se acometida ao Tribunal Constitucional [TC].

12. Para além disso, afigura-se-nos que para se lograr aceder ao TC e obter tutela em sede do controlo de questão de conformidade constitucional de normas não resulta como exigida, ou sequer como imposta, a necessidade de emissão de uma pronúncia sobre a questão por parte deste Supremo Tribunal no quadro do recurso de revista excecional tal como se mostra delimitado e gizado no art. 150.º do CPTA, tanto mais que um tal entendimento redundaria ou implicaria que, uma vez suscitada uma questão de constitucionalidade, houvesse lugar à necessária e imediata admissão do recurso de revista, ao arrepio daquilo que constituem as finalidades e âmbito do mesmo e dos critérios definidos.

13. Reiterando-se aqui o entendimento supra enunciado, o qual, aliás, faz aplicação à situação de posicionamento sucessivamente afirmado por esta Formação de Admissão quanto ao âmbito das questões objeto do recurso de revista quando, no essencial, este se cinge a questões de constitucionalidade [cfr., entre outros, os Acs. do STA/Formação de Admissão Preliminar de 09.09.2015 - Proc. n.º 0881/15, de 03.12.2015 - 01544/15, de 08.03.2017 - Proc. n.º 0185/17, de 05.04.2017 - Proc. n.º 0352/17, de 11.01.2018 - Proc. n.º 01419/17, de 10.05.2019 - Proc. n.º 0445/15.1BEBRG, e nos mais recentes, os Acs. de 04.02.2021 - Procs. n.ºs 0549/13.5BEAVR, 0822/09.7BECBR e 02605/14.3BESNT, de 18.02.2021 - Procs. n.ºs 01382/20.3BELSB, 0804/17.5BEPRT, de 11.03.2021 - Proc. n.º 1240/19.4BEPNF-S1, de 22.04.2021 - Proc. n.º 1182/08.9BESNT, 13.05.2021 - Proc. n.º 02045/19.8BEPRT e 01703/17.6BELSB-R1, de 24.06.2021 - Proc. n.º 01703/17.6BELSB-S1, de 13.07.2021 - Procs. n.ºs 020024/16.5BCLSB e 0387/14.8BEALM, de 07.10.2021 - Proc. n.º 0288/21.3BEBRG, de 18.11.2021 - Proc. n.º 0434/20.4BEPRT-S1, de 25.11.2021 - Procs. n.ºs 434/20.4BEPRT-S1, 0579/20.0BEALM e 02244/18.0BEPRT, de 09.12.2021 - Procs. n.ºs 425/11.6BESNT e 842/21.3BELSB, de 16.12.2021 - Proc. n.º 0282/11.2BECBR], impõe-se, então, concluir no sentido de que não se justifica admitir a presente revista, valendo in casu a regra da excecionalidade supra enunciada.

DECISÃO
Nestes termos e de harmonia com o disposto no art. 150.º do CPTA, acordam os juízes da formação de apreciação preliminar da Secção de Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal em não admitir a revista.
Sem custas dada a isenção subjetiva do recorrente MP [art. 04.º, n.º 1, al. a), do Regulamento das Custas Processuais (RCP)].
D.N..
Lisboa, 13 de janeiro de 2022. – Carlos Carvalho (relator) – Teresa de Sousa – José Veloso.