Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo | |
Processo: | 01038/09 |
Data do Acordão: | 03/17/2010 |
Tribunal: | 2 SECÇÃO |
Relator: | ANTÓNIO CALHAU |
Descritores: | DÍVIDA PRESCRIÇÃO SUCESSÃO DE LEIS NO TEMPO CITAÇÃO |
Sumário: | I - Para determinar se o prazo de prescrição aplicável é o do CPT ou o da LGT, há que atentar ao que estabelece o artigo 297.º, n.º 1 do CC, de acordo com o qual a regra é a aplicação do novo prazo aos prazos que já estiverem em curso, salvo se segundo a lei antiga falte menos tempo para o prazo se completar, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei. II - Os efeitos interruptivos ou suspensivos dos prazos de prescrição produzidos por certos factos jurídicos são regulados pela lei vigente na data em que se verificam (artigo 12.º, n.º 1 do CC). III - A citação efectuada em 9/3/2007 carece de eficácia interruptiva porque se verificou após o decurso do prazo normal de prescrição iniciado em 1/1/1999 e termo final em 1/1/2007. |
Nº Convencional: | JSTA000P11600 |
Nº do Documento: | SA22010031701038 |
Recorrente: | A... |
Recorrido 1: | FAZENDA PÚBLICA |
Votação: | UNANIMIDADE |
Aditamento: | |
Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I – A…, residente no Porto, não se conformando com a sentença da Mma. Juíza do TAF do Porto que julgou improcedente a oposição por si deduzida ao processo de execução fiscal n.º 1821200101019260, instaurado no Serviço de Finanças de Matosinhos 1 contra a sociedade B…, por dívidas de IRC e IVA de 1996 e 1997, e que contra si reverteu, dela vem interpor recurso para este Tribunal, formulando as seguintes conclusões: 1. Conforme consta da sentença do tribunal a quo, dos elementos existentes dos autos que não foram impugnados, apurou-se a seguinte matéria de facto (fls. 2 do Relatório): - em 15.05.2001 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 1821200101019260 contra “B...,” para cobrança de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 1996 (al.a)); - em 05.12.2001, foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 1821200101067540 contra “B...,” para cobrança de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) dos anos de 1996 e 1997 (al. b)); - o oponente foi citado na execução em 09.03.2007 (al. e)); - o aqui oponente foi citado na execução em 19.03.2007 (al. g)). 2. Relativamente ao Direito (fls. 3 ss do Relatório) e com relevância para o presente recurso, considerou a Meritíssima Juiz a quo: - de acordo com o ínsito no CPT o prazo prescricional começou a correr no início de 1997 para as dívidas de 1996 e no início de 1998 para as dívidas de 1997 (1.º §, pág. 06); - mas, com a entrada em vigor da LGT o prazo passou a ser de 8 anos … ambos os prazos terminariam em 2007 (2.º §, pág. 06); - em 19.03.2007, com a citação do ora oponente deu-se a primeira interrupção para efeitos de prescrição, nos termos do art.º 49.º, n.º 1, da LGT (último §, pág. 06); - assim, nos autos de execução a que se reportam esta oposição, o responsável subsidiário foi citado na execução em 19/03/2007, logo dentro dos oito anos a contar do início da prescrição – 01.01.1999. É, pois, de considerar o prazo prescricional interrompido, desde aquela data; - destarte, o prazo de prescrição da dívida exequenda ainda não correu (3.º e 4.º §, pág. 07); 3. Faz, a Meritíssima Juiz a quo, referência ao douto Ac. do STA de 27.08.2008, que considerou, caso o responsável subsidiário seja citado posteriormente ao 5.º ano, mas anteriormente ao fim do 8.º ano a contar do início do prazo de prescrição, os efeitos da interrupção que derivam da sua própria citação produzem-se em relação a ele (2.º §, pág. 07). Ora: 4. O art.º 48.º da LGT estatui que as dívidas tributárias prescrevem, salvo o disposto em lei especial, no prazo de oito anos, contados, nos impostos periódicos, a partir do termo do ano em que se verificou o facto tributário e, nos impostos de obrigação continuada, a partir da data em que o facto tributário ocorreu. 5. E o art.º 34.º do CPT estatuía que (n.º 1) a obrigação tributária prescreve no prazo de 10 anos, salvo se outro mais curto estiver fixado na lei, e (n.º 2) o prazo de prescrição conta-se desde o início do ano seguinte àquele em que tiver ocorrido o facto tributário, salvo regime especial. 6. Sendo que o art.º 5.º do Dec.-Lei n.º 398/98, de 17.12, que aprovou a LGT, estatui que ao novo prazo de prescrição (de 08 anos consagrado na LGT, parêntesis nosso) aplica-se o disposto no art.º 297.º do Código Civil. 7. Esta disposição, por seu turno, estatui que se a lei estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar. 8. Exemplificam Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, Coimbra Editora, Limitada, 1987, em anotação ao art.º 297.º, que, sendo o prazo, por exemplo, de cinco anos e passar a ser de dois, contam-se dois anos a partir da nova lei; se, porém, o prazo de cinco anos terminar antes do novo prazo de dois, por já terem decorrido mais de três anos quando a nova lei entrar em vigor, é então aplicável o antigo prazo. 9. Como ficou provado (als. a) e b) “Dos Factos” – pág. 2 do Relatório), os factos tributários reportam-se a IRC de 1996 e IVA de 1996 e 1997. 10. E, nos termos do art.º 48.º da LGT, a regra de início da contagem do prazo é o termo do ano em que se verificou o facto tributário. 11. Como, na vigência do CPT, o prazo da prescrição se contava a partir da ocorrência do facto tributário – início do ano seguinte àquele em que ocorreu o facto gerador do imposto (Alfredo José de Sousa e José da Silva Paixão, Código de Processo Tributário Comentado e Anotado, 2.ª Edição, Almedina Coimbra, anotação 5 ao art.º 34.º, pág. 98). 12. Assim, e contando os 10 anos a partir do início do ano seguinte em que ocorreu o facto gerador do imposto temos que, relativamente ao IRC (1996) e grande parte do IVA (1996): 1997 – 1 ano; 1998 – 2 anos; 1999 – 3 anos; 2000 – 4 anos; 2001 – 5 anos; 2002 – 6 anos; 2003 – 7 anos; 2004 – 8 anos; 2005 – 9 anos; 2006 – 10 anos. 13. Pelo que, pela aplicação do regime antigo e conforme é perfilhado por toda a doutrina, as dívidas de IRC e IVA do ano de 1996 prescreveram em 31 de Dezembro de 2006 ou, pelo menos, em 01 de Janeiro de 2007. 14. E pelo que, tendo o Recorrente apenas sido citado em 19/03/2007 e conforme facto dado como assente pela Meritíssima Juiz a quo, essas dívidas já prescreveram. 15. O Recorrente goza do benefício do apoio judiciário, conforme seguramente consta dos autos. 16. O apoio judiciário mantém-se na fase de recurso. 17. Motivo pelo qual não é paga a correspondente taxa de justiça. Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada, considerando-se prescritas as dívidas de IRC de 1996 e IVA de 1996/1997 ou, pelo menos, as dívidas de IRC e IVA de 1996, como o impõem o Direito e a Justiça! Não foram apresentadas contra-alegações. O Exmo. Magistrado do MP junto deste Tribunal emite parecer no sentido de que o recurso merece provimento, devendo a sentença impugnada ser revogada e substituída por acórdão que, declarando a prescrição das dívidas tributárias exequendas, julgue procedente a oposição à execução fiscal. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir. II – Mostra-se fixada a seguinte matéria de facto: a) Em 15.05.2001 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 1821200101019260 contra “B…”, para cobrança de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do ano de 1996; b) Em 05.12.2001 foi instaurado o processo de execução fiscal n.º 1821200101067540 contra “B…”, para cobrança de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) dos anos de 1996 e 1997; c) O processo referido na alínea a) foi eleito processo principal; d) Por inexistência de bens penhoráveis conhecidos à executada originária foi revertida a execução contra o agora oponente, A…; e) O oponente foi citado na execução em 09.03.2007; f) O processo executivo referido na alínea a) esteve sem qualquer movimento processual desde 13.03.2003 até 16.11.2006; g) O aqui oponente foi citado na execução em 19.03.2007; h) Em 10.04.2007 foi deduzida a presente oposição; III – Vem o presente recurso interposto da sentença da Mma. Juíza do TAF do Porto que julgou improcedente a oposição deduzida pelo ora recorrente contra a execução fiscal, instaurada no Serviço de Finanças de Matosinhos 1 contra a sociedade B..., por dívidas de IRC e IVA de 1996 e 1997, e que contra si reverteu. Para tanto, considerou a Mma. Juíza a quo que o prazo de prescrição das dívidas exequendas ainda não ocorrera. Vejamos. A única questão que vem suscitada é a prescrição das dívidas exequendas que se reportam, no caso em apreço, a IRC de 1996 e IVA de 1997. Dispunha o artigo 34.º do CPT, então em vigor, que o prazo de prescrição de tais dívidas era de 10 anos, contando-se desde o início do ano seguinte àquele em que tinha ocorrido o facto tributário. Tal prazo, com a entrada em vigor da LGT em 1/1/1999, passou, porém, a ser de oito anos. De acordo com o n.º 1 do artigo 297.º do CC, a lei que estabelecer, para qualquer efeito, um prazo mais curto do que o fixado na lei anterior é também aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da data de entrada em vigor da nova lei, a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar. Assim, tendo o prazo, neste caso, começado a correr no início de 1997 para as dívidas de 1996 e no início de 1998 para as dívidas de 1997, constata-se que, face à inexistência de causas de interrupção ou de suspensão da prescrição na vigência do CPT, à data de entrada em vigor da LGT, não faltava menos tempo do que o previsto nesta lei para o prazo se completar, pelo que, como bem se refere na decisão recorrida, será de aplicar às dívidas em apreço o prazo prescricional ínsito na LGT, contando-se o mesmo a partir da data de entrada em vigor desta lei, ou seja, 1 de Janeiro de 1999. E, correndo o prazo ininterruptamente desde aí (a paragem do processo executivo entre 13/3/2003 e 16/11/2006 é irrelevante no domínio da LGT), é evidente que a citação do oponente em 9/3/2007 e 19/3/2007 (alíneas e) e g) do probatório) ocorreu já para além do prazo prescricional se ter completado. Daí que as dívidas exequendas, ao contrário do que se concluiu na sentença recorrida, se mostram, pois, prescritas. A decisão recorrida não pode, por isso, manter-se. IV – Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do STA em conceder provimento ao recurso, revogando-se a sentença recorrida, e, em consequência, declarando prescritas as dívidas exequendas, julgar procedente a oposição e extinta a execução fiscal. Custas pela Fazenda Pública, apenas na 1.ª instância, fixando-se a procuradoria em 1/6. Lisboa, 17 de Março de 2010. - António Calhau (relator) - Miranda de Pacheco – Pimenta do Vale. |