Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01204/09
Data do Acordão:02/10/2010
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:VALENTE TORRÃO
Descritores:CONTRA-ORDENAÇÃO FISCAL
IVA
COIMA
FALTA DE ENTREGA DE IMPOSTO
Sumário:I - Relativamente à "falta de entrega da prestação tributária", a que se refere o artigo 114.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias, tem a jurisprudência uniforme do STA entendido que não abrange os casos de não recebimento do imposto pelo sujeito passivo.
II - No caso dos autos, estando em causa a entrega de declaração de IVA desacompanhada de meio de pagamento, relativa ao 1º trimestre de 2001, teria de aplicar-se o direito vigente nessa data, a saber, o artº 95º do mesmo Código que estabelecia que “falta de entrega ou a entrega fora dos prazos estabelecidos de todo ou parte do imposto devido será punida ...”
III - Porém, o facto de esta norma ter sido expressamente revogada pela alínea c) do artigo 2.º da Lei nº 5/2001, de 5 de Junho, implica a descriminalização do facto aí tipificado (na medida em que não subsumível na contra-ordenação homónima prevista no RJIFNA e no RGIT), mesmo que temporalmente praticado no domínio de aplicação da lei antiga, "ex vi" do artigo 29.º n.º 4 (parte final) da Constituição da República (e artigo 2.º, n.º 2 do Código Penal, este aplicável por remissão do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 433/82, "ex vi" do artigo 3.º, alínea b) do RGIT.
Nº Convencional:JSTA00066278
Nº do Documento:SA22010021001204
Data de Entrada:12/07/2009
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF VISEU PER SALTUM.
Decisão:PROVIDO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - CONTRA ORDENAÇÃO.
Legislação Nacional:CIVA84 ART19 ART25 ART26 ART35 ART36 N1 ART40 N1 ART95.
RJIFNA90 ART29 N2 N3 N9.
RGIT01 ART3 B ART24 ART105 ART114 N1 N2.
L 15/2001 DE 2001/06/05 ART2 C.
CONST97 ART29 N4.
CP95 ART2 N2.
DL 433/82 DE 1982/10/27 ART32.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC483/08 DE 2008/09/18.; AC STA PROC279/08 DE 2008/05/28.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
1. A..., SA, melhor identificada nos autos, veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Viseu, que negou provimento ao recurso por si interposto da decisão do Director de Finanças de Aveiro, que a condenou no pagamento de uma coima no montante de 17.494,00 euros por falta de entrega de prestação tributária de IVA, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui:
1ª) No caso sub judice está em causa o facto de a Recorrente, na liquidação (autoliquidação) de IVA referente ao primeiro trimestre de 2001, ter entregue a respectiva declaração sem meio de pagamento.
2ª) Atendendo ao seu regime (normal) e enquadramento (trimestral) em termos de IVA, a Recorrente, na data a que se reportam os factos, estava obrigada a enviar aos Serviços do IVA a respectiva declaração periódica, por forma a que a mesma desse entrada nesses mesmos Serviços até ao dia 15 do segundo mês seguinte ao trimestre a que respeitam as operações, acompanhada do respectivo meio de pagamento do imposto que nessa declaração tivesse sido apurado a favor do Estado.
3ª) Ora, contrariamente ao que parece suposto na sentença recorrida, com a entrega da declaração periódica de IVA desacompanhada do meio de pagamento do imposto aí apurado pelo sujeito passivo a favor do Estado, não ficam preenchidos todos os elementos constitutivos do tipo de contra-ordenação legalmente previsto e punido.
4ª) O tipo legal de contra-ordenação que prevê e pune a falta de entrega da prestação tributária que, "tendo sido recebida", haja obrigação de liquidar, encontrava-se previsto, à data dos factos, no artº. 29º-3 do RJIFNA (actual artº. 114º-3 do RGIT), e não nas normas do "ARTº. 23º E/OU 24º E/OU Nº. 9 DO ARTº. 29º do RJIFNA", como se refere no "AUTO DE NOTÍCIA", ou do artigo 29º-2-9 do RJIFNA, como se refere na "Decisão de Aplicação da Coima".
5ª) Para que possa considerar-se preenchido o tipo legal de contra-ordenação previsto e punido na norma do artº. 29º-3 do RJIFNA, não basta que o sujeito passivo não tenha entregue o IVA, quer essa não entrega resulte de dolo (situação p. e p. no artº 29º-1 do RJIFNA) ou de negligência (situação p. e p. no artº 29º-2 do RJIFNA).
6ª) É necessário que, para além disso, o IVA liquidado pelo sujeito passivo nas suas transmissões de bens e prestações de serviços tenha sido por ele efectivamente recebido.
7ª) O recebimento da prestação tributária constitui, pois, um dos elementos que compõem o Tatbestand da referida norma, um dos elementos do tipo de ilícito contra-ordenacional p. e p. no artº. 29º-3 do RJIFNA.
8ª) À semelhança do que já tinha acontecido no "AUTO DE NOTÍCIA" e na "Decisão de Aplicação da Coima" proferida pelo Exmo. Sr. Chefe do Serviço de Finanças de ..., na Sentença recorrida não é feita a mais pequena referência a factos que permitam considerar preenchido esse elemento constitutivo do tipo legal de contra-ordenação que vem imputado à Recorrente.
9ª) A prolação da douta Sentença recorrida só poderá, eventualmente, resultar de ter sido presumido o recebimento do IVA, isto é, de se ter interpretado a norma do artº. 29º do RJIFNA no sentido de que, para se verificarem os factos descritos na respectiva previsão, bastaria que a declaração periódica fosse apresentada sem meio de pagamento da importância correspondente ao imposto apurado nessa mesma declaração periódica a favor do sujeito activo.
10ª) Sucede que o efectivo recebimento da importância correspondente a esse IVA jamais se pode presumir.
11ª) Com efeito, a dúvida relativa aos elementos de facto - quer sejam pressupostos do preenchimento do tipo de ilícito (seja criminal seja contra-ordenacional), quer sejam factos demonstrativos da existência de uma causa de exclusão de ilicitude ou da culpa - não pode deixar de ser resolvida, ex vi da aplicação do princípio in dubio pro reo, no sentido da absolvição do arguido.
12ª) Os factos dados como provados na Sentença Recorrida não são, pois, suficientes para integrar os pressupostos de facto descritos nas normas em que se encontre previsto qualquer ilícito contra-ordenacional, seja nas normas referidas no "AUTO DE NOTÍCIA" e na "Decisão de Aplicação da Coima", seja em quaisquer outras.
13ª) Por conseguinte, consubstanciando o recebimento da prestação tributária um dos elementos constitutivos do tipo legal de contra-ordenação previsto no artº. 29º do RJIFNA, e não tendo sido feita qualquer menção, quer no "AUTO DE NOTÍCIA" quer na "Decisão de Aplicação da Coima", à circunstância de a Recorrente ter recebido o valor correspondente ao IVA que não enviou com a respectiva declaração periódica, a Sentença recorrida não poderia ter deixado de concluir que, no caso sub judice, não se verificava a referida contra-ordenação.
14ª) Termos em que deverá a Sentença recorrida ser revogada e substituída por outra que julgue procedente o recurso interposto da "Decisão de Aplicação da Coima" proferida pelo Exmo. Senhor Chefe do Serviço de Finanças de ... em 28/05/02.
Sem conceder,
15ª) Contrariamente ao referido na Sentença recorrida, a forma como no "AUTO DE NOTÍCIA" são indicadas as disposições legais que prevêem a contra-ordenação e cominam a respectiva sanção, tal o seu grau de indecisão e de indeterminabilidade, não pode ser considerada como adequada ao preenchimento da previsão da norma do artº. 185º-2/f do CPT (norma vigente à data dos factos e que actualmente corresponde ao artigo 579-2/f do RGIT).
16ª) Do mesmo modo que não poderia considerar-se preenchida a previsão dessa mesma norma se um auto de notícia se limitasse a referir que a alegada infracção nele mencionada se encontrava p. e p. nas normas dos artigos primeiro e seguintes, v.g., do RJIFNA, também não pode considerar-se que preenche o requisito previsto naquela norma do artº. 57º-2/f do CPT (ou na correspondente norma do artº. 185º-2/f do CPT) um auto de notícia em que, através da menção conjunta ("E/OU") de conjunções coordenativas copulativas ("E") e de conjunções coordenativas disjuntivas ("OU"), se procura cobrir todo o espaço onde possa cair a alegada infracção, sem que o arguido consiga saber quais as concretas normas que o autuante considerou terem sido ofendidas.
17ª) Em contrário não se diga, conforme consta da Sentença recorrida, que a referida menção conjunta às normas do "ARTº. 23º E/OU 24º E/OU Nº 9 DO ARTº. 29º do RJIFNA" é de fácil elucidação.
18ª) É que, salvo o devido respeito por melhor opinião, perceber se uma determinada norma respeita a "ilícitos criminais" ou a "responsabilidade contra-ordenacional não está ao alcance de um destinatário normal.
19ª) O elevado grau de indeterminabilidade, de obscuridade, de insuficiência e de indecisão das referências que no "AUTO DE NOTÍCIA" são feitas às aí designadas "normas punitivas" (as quais nem sequer coincidem com as que constam da Decisão Recorrida), equivale à falta de indicação das disposições legais que prevêem a contra-ordenação e cominam a respectiva sanção, na medida em que não permitem esclarecer quais são as concretas disposições legais que motivam o acto.
20ª) Pelo facto de não dar cumprimento a esse requisito essencial (ou seja, a menção das concretas disposições legais que prevêem a contra-ordenação e cominam a respectiva sanção - cfr. artºs. 185º-2/f do CPT e 57º-2/f do RGIT), o "AUTO DE NOTÍCIA" enferma de nulidade.
21ª) Essa nulidade do "AUTO DE NOTÍCIA" inquina a própria decisão que aplicou a coima, pelo que todo o processo de contra-ordenação se encontra enfermo da nulidade insuprível prevista nos artºs. 195º-1/b do CPT e 63º-1/b do RGIT.
22ª) Nestes termos, deve a Sentença recorrida deve ser revogada e substituída por outra que, julgando procedente o recurso interposto da "Decisão de Aplicação da Coima", declare nulo o processo de contra-ordenação instaurado contra a Recorrente, com as legais consequências.
23ª) Ao ter negado provimento ao recurso interposto pela Recorrente, a Sentença recorrida violou o disposto no artigo 29º-3 do RJIFNA (actual artº. 114º-3 do RGIT) e no artigo 185º-2/f do CPT (norma vigente à data dos factos e que actualmente corresponde ao artigo 57º-2/f do RGIT), normas essas que deveriam ter sido interpretadas e aplicadas com o sentido supra descrito.
Nestes termos e nos mais de direito, e sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deverá a Sentença recorrida ser revogada com fundamento na não verificação dos elementos constitutivos da infracção imputada à Recorrente, e, em consequência, deverá essa mesma Sentença ser substituída por outra que julgue procedente o recurso interposto da "Decisão de Aplicação da Coima" que foi proferida pelo Exmo. Senhor Chefe do Serviço de Finanças de ... em 28/05/02.
Quando assim não se entenda, deverá a Sentença recorrida deve ser revogada com fundamento na nulidade do processo de contra-ordenação instaurado contra a Recorrente, e, em consequência, ser substituída por outra que julgue procedente o acima referido recurso, tudo com verificação das legais consequências.
2. O MºPº emitiu o parecer que consta de fls. 71/72, no qual defende a procedência do recurso, louvando-se em jurisprudência deste tribunal e Secção.
3. Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
4. Com interesse para a decisão foram dados como provados em 1ª instância os seguintes factos:
A) A recorrente, respeitante ao período de 0103T, enviou ao SAIVA, em 10.05.01, a declaração periódica, sem o correspondente meio de pagamento do imposto autoliquidado pela importância de Esc. 17.535.428$00 (87.466,35 euros) – cfr. auto de fls. 2.
B) Em consequência, veio ela a ser condenada na coima de 17.494,00 euros, por decisão datada de 28.05.2002 e para cuja fixação se teve em conta, designadamente, que o arguido não apresentou defesa, requereu o pagamento voluntário da coima; carácter acidental da actuação; situação económica má e a sua conduta meramente negligente (cfr. fls. 9 e 7).
C) Porque a recorrente requereu o pagamento voluntário da coima, na decisão que lha aplicou foi notificado “de que deveria proceder ao seu pagamento, no prazo de quinze dias, contados da data de notificação, com redução a 75%, ou seja 13.120,50 euros (cfr. doc.s de fls. 6 e 10).
D) A recorrente não procedeu ao requerido pagamento antes apresentou o recurso que deu origem aos presentes autos (v. fls. 11, 12 e segs.)
5. As questões suscitadas nas conclusões da recorrente são as seguintes:
a) Saber se a autoliquidação de IVA, com a entrega da respectiva declaração periódica desacompanhada de meio de pagamento, constitui infracção de natureza contra-ordenacional quando o IVA liquidado não tenha sido recebido pelo sujeito passivo.
b) Nulidade do auto de notícia por falta de menção concreta das disposições legais que prevêem e punem a contra-ordenação e respectiva sanção.
Comecemos por conhecer da 1ª questão.
Conforme resulta do probatório, a recorrente, relativamente ao período de 0103T, enviou ao SAIVA, em 10.05.01, a declaração periódica de IVA, sem o correspondente meio de pagamento do imposto autoliquidado pela importância de Esc. 17.535.428$00. Em consequência, veio ela a ser condenada na coima de 17.494,00 euros, por decisão datada de 28.05.2002, ao abrigo do disposto nos artºs 40º, nº 1 e 26º do CIVA e 29º, nºs 2 e 9 do RJIFNA (v. fls. 9 dos autos).
Invoca a recorrente que os factos que lhe são imputados, todavia, se enquadrariam no nº 3 do mesmo artigo e não no nº 2.
Ora, aquelas normas estabelecem o seguinte:
1- A não entrega, total ou parcial, pelo período até 90 dias, ou por período superior, desde que os factos não constituam crime, ao credor tributário, da prestação tributária deduzida nos termos da lei é punível com coima variável entre o valor da prestação em falta e o dobro da mesma, com o limite mínimo de 20.000$00 e o limite máximo de 300.000$00.
2- Se a conduta prevista no número anterior for imputável a título de negligência, e ainda que o período da não entrega ultrapasse os 90 dias, será aplicável coima variável entre metade e o total do valor do imposto em falta, com o limite mínimo de 10.000$00 e o limite máximo de 150.000$00.
3- Para os efeitos do disposto nos números anteriores considera-se também prestação tributária a que foi deduzida por conta daquela, bem como aquela que, tendo sido recebida, haja obrigação legal de liquidar nos casos em que a lei o preveja.”
Este Tribunal pronunciou-se já várias vezes sobre casos idênticos, havendo por isso jurisprudência firmada sobre esta questão, relativamente ao artº 114º, nº 1 do RGIT.
Assim, no Acórdão deste Tribunal e Secção, de 18.09.2008 -Recurso nº 483/08, ficou escrito o seguinte:
“Ora, como se referiu no acórdão deste STA de 28/5/2008, proferido no recurso n.º 279/08, com a utilização da expressão «prestação tributária deduzida» pretendeu-se aludir a todas as situações em que é apurada uma prestação tributária pelo sujeito passivo através de uma subtracção de uma quantia global e essa quantia deduzida tem de ser entregue à administração tributária (é o que sucede, por exemplo, nas situações de retenção na fonte previstas nos artigos 71.º e 98.º do CIRS).
No caso do IVA, no respectivo Código não se refere qualquer situação em que o sujeito passivo tenha de entregar imposto que tenha deduzido, apenas se falando de dedução de imposto relativamente ao imposto que o sujeito passivo tem a receber, nos termos dos artigos 19.º a 25.º do CIVA.
O que há, na verdade, é a obrigação de os sujeitos passivos procederem à sua liquidação e adicionarem o valor do imposto liquidado ao valor das mercadorias ou prestações de serviços, incluindo-o na factura ou documento equivalente, para efeitos da sua exigência aos adquirentes das mercadorias ou utilizadores dos serviços (artigos 35.º e 36.º, n.º 1 do CIVA).
O imposto que deve ser entregue não é, contudo, o imposto que foi liquidado, mas sim o eventual saldo positivo a favor da administração tributária que se registe após confrontação do volume global do imposto liquidado com o que foi pago pelo sujeito passivo aos seus fornecedores ou prestadores de serviços (artigos 19.º a 25.º do CIVA).
É certo que pode haver situações em que o sujeito passivo recebeu de terceiros IVA que liquidou e não procedeu à sua entrega à administração tributária, havendo obrigação dessa entrega por se comprovar que há um saldo positivo a favor desta no confronto da globalidade do imposto liquidado com o imposto pago pelo sujeito passivo em determinado período.
Só que tais situações não se enquadram nos números 1 e 2 do preceito em análise mas sim na parte final do seu n.º 3 que refere prestação tributária «que tendo sido recebida, haja obrigação legal de liquidar nos casos em que a lei o preveja».
E, como aí resulta claramente do texto da lei, apenas é sancionado como contra-ordenação o comportamento de quem tem obrigação de liquidar na sequência de recebimento da quantia do imposto.
Aliás, como se salienta no aresto citado, “A conduta de quem não entrega IVA liquidado nas facturas mas não recebido dos adquirentes das mercadorias ou utilizadores de serviços estava expressamente punida no artº. 95.º do CIVA, em que se previa como transgressão «a falta de entrega ou a entrega fora dos prazos estabelecidos de todo ou parte do imposto devido».
Porém, este artº. 95.º, inserido no Capítulo VIII do CIVA, está expressamente revogado pela alínea c) do art. 2.º da Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho.
Por outro lado, as referências à «prestação tributária que nos termos da lei deduziu» e à «prestação tributária deduzida nos termos da lei», que se utilizam no artº. 114.º do RGIT, têm um evidente alcance restritivo em relação à expressão «imposto devido», que era utilizada no referido artº. 95.º do CIVA, pois as primeiras apenas abrangem situações em que o sujeito passivo procede à dedução do imposto, subtraindo-a de uma quantia global.”
No caso dos autos, contudo, inexiste qualquer prova do recebimento do imposto, sendo que a arguida alega que o IVA não entregue não foi por si recebido.
E, assim sendo, não tendo havido recebimento do imposto anterior à entrega à administração tributária da declaração periódica referida no ponto B) do probatório, está afastada a possibilidade de punição da arguida por não verificação dos pressupostos legais previstos nos n.ºs 1 e 2 do artigo 114.º do RGIT”.
Ora, apesar de à data dos factos ainda se encontrar em vigor o artº 95º do CIVA, o facto de esta norma ter sido expressamente revogada pela alínea c) do artigo 2.º da Lei nº 5/2001, de 5 de Junho, implica a descriminalização do facto aí tipificado (na medida em que não subsumível na contra-ordenação homónima prevista no RJIFNA e no RGIT), mesmo que temporalmente praticado no domínio de aplicação da lei antiga, "ex vi" do artigo 29.º n.º 4 (parte final) da Constituição da República (e artigo 2.º, n.º 2 do Código Penal, este aplicável por remissão do artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 433/82, "ex vi" do artigo 3.º, alínea b) do RGIT.
Assim, aplicando a citada jurisprudência ao caso dos autos - válida quer em face do artigo 105.º do RGIT, quer do artigo 24.º do RJIFNA, em razão da similitude de redacção entre os dois preceitos - , há-de concluir-se que o recurso merece provimento, não podendo manter-se a decisão recorrida.
IV – Nestes termos, acorda-se em conceder provimento ao recurso jurisdicional, revogando-se a sentença recorrida e, na procedência do recurso judicial, anular a decisão administrativa de aplicação da coima.
Sem custas.
Lisboa, 10 de Fevereiro de 2010. – Valente Torrão (relator) – Miranda de Pacheco – Pimenta do Vale.