Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:095/15
Data do Acordão:03/12/2015
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:VITOR GOMES
Descritores:RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL
SUSPENSÃO DA INSTÂNCIA
DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:Tem relevância jurídica a questão de saber se a deserção do recurso com fundamento em a instância ter estado suspensa por mais de um ano com fundamento na falta de um pressuposto relativo a um dos recorrentes abrange o recurso de outro interessado, que interpôs recurso autónomo, por ter consequências processuais relevantes e poder repetir-se num número indeterminados de casos.
Nº Convencional:JSTA000P18716
Nº do Documento:SA120150312095
Data de Entrada:01/29/2015
Recorrente:A................., SA
Recorrido 1:B................ E OUTRO
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Formação de Apreciação Preliminar

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo

1. O TAF de Almada, por sentença de 13/10/2011, declarou a nulidade do despacho que deferiu o pedido de licenciamento apresentado por C…………. Ldª, titulado pelo alvará n.º 75/05 da Câmara Municipal do Barreiro. Dessa decisão interpuseram recurso, separadamente, o Município do Barreiro e a contra-interessada A……………, SA que sucedeu à requerente do licenciamento.
Subindo os recursos ao TCA Sul, o relator proferiu despacho, em 5/7/2012, a suspender a instância, com fundamento na absoluta incapacidade do mandatário do Município para exercer o mandato. Por despacho de 26/9/2013, foram julgados desertos os recursos interpostos, com fundamento em que a instância esteve suspensa por mais de um ano e as partes nada tinham requerido ( art.ºs 284.º, n.º3 e 291.º, n.º3, na versão anterior e, na versão actual, artºs 276.º, n.º3 e 281.º, n.º 3, do CPC).

2. A A………….. reclamou deste despacho para a conferência no segmento que lhe respeita, sustentando que o seu recurso não deveria ser julgado deserto, porque é independente e autónomo relativamente ao recurso do Município, nenhuma negligência lhe podendo ser assacada por não ter removido uma causa de suspensão que só a esse outro recorrente respeita.
Por acórdão de 25/09/2014, o TCA Sul indeferiu a reclamação para a conferência com os seguintes fundamentos:
1.º - A inércia das partes em remover a causa de suspensão produz o efeito definido no art.º 291.º, n.º3, do CPC de 1961, ou seja a deserção dos recursos interpostos, mesmo do recurso autónomo da parte à qual não respeita a causa de suspensão;
2.º- Mesmo que assim se não entendesse, nunca cumpriria conhecer do objecto do recurso interposto pela reclamante, antes devendo ser proferida decisão no sentido da não admissão desse recurso, uma vez que a decisão do TAF de Almada estava sujeita a reclamação para a conferência nesse tribunal, nos termos do art.º 27.º, n.º, 2, do CPTA, visto que foi proferida pelo relator em acção administrativa especial de valor superior à alçada.

3. Deste acórdão recorreu a A…………., ao abrigo do art.º 150.º do CPTA, pedindo revista excepcional. Sustenta, em síntese, que atenta a causa que originou a suspensão da instância - a impossibilidade absoluta de exercício do mandato por parte do advogado que patrocina outro recorrente - não tinha o ónus de promover a notificação prevista no n.º 3 do art.º 283.º do CPC pelo que não pode o seu recurso ser julgado deserto.

4. As decisões proferidas pelos tribunais centrais administrativos em segundo grau de jurisdição não são, em regra, susceptíveis de recurso ordinário. Apenas consentem recurso nos termos do n.º 1 do art.º 150.º do CPTA, preceito que dispõe que das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal Central Administrativo pode haver, a título excepcional, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo “quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.

5. No presente recurso pretende-se a apreciação da questão de saber se a deserção do recurso com fundamento em a instância ter estado suspensa por mais de um ano com fundamento na falta de um pressuposto relativo a um dos recorrentes abrange o recurso de outro interessado que interpôs recurso autónomo. Questão de consequências processuais relevantes, que bem pode repetir-se num número indeterminado de casos.
É certo que o acórdão recorrido se apoia em jurisprudência deste Supremo Tribunal, designadamente, no acórdão de 8/7/2010, Proc. nº 443/10. Todavia há diferenças assinaláveis entre a situação agora em apreciação e aquela que foi objecto desse outro recurso. Nesse, pelo menos directamente, estavam em apreciação as consequências tributárias da inércia das partes perante a suspensão da instância por facto referente a uma das partes, mas em fase de 1ª instância. No presente processo, a suspensão da instância ocorreu já em fase de recurso e a consequência foi a extinção deste por deserção, relativamente a todos os recorrentes. Pode razoavelmente colocar-se em dúvida que a solução para situações com estas diferenças deva ser a mesma, pelo que se justifica a admissão da revista excepcional com fundamento na relevância jurídica da questão.

6. A tanto não obsta, nesta fase, a circunstância de, segundo a fundamentação expressa do acórdão recorrido, ainda que viesse a ser revogado o segmento decisório que levou ao não conhecimento do recurso da A………….. por deserção da instância, continuar a justificar-se o não conhecimento dele com outro fundamento. Incumbirá à formação de julgamento apreciar se os termos em que as alegações se referem a essa outra questão se projectam na decisão final e prejudicam ou dispensam o conhecimento do decidido quanto à questão da deserção da instância.

7. Decisão
Pelo exposto, decide-se admitir a revista.
Lisboa, 12 de Março de 2015. - Vítor Gomes(relator) - Alberto Augusto Oliveira- São Pedro.