Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:01595/13
Data do Acordão:11/12/2014
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CT
Relator:ASCENSÃO LOPES
Descritores:RECURSO POR OPOSIÇÃO DE JULGADOS
PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
Sumário:I – No recurso por oposição de julgados, a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não relevando, para a existência de oposição, conclusão implícita ou mera consideração colateral que possa retirar-se da decisão.
II – Se não se verifica, no recurso por oposição de julgados, identidade substancial das situações fácticas em confronto, nem divergência de soluções quanto à mesma questão de direito, deve o mesmo ser julgado findo, por falta de um dos pressupostos desse recurso de oposição de julgados, nos termos do disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.
Nº Convencional:JSTA000P18211
Nº do Documento:SAP2014111201595
Data de Entrada:10/16/2013
Recorrente:A... LDA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, no Pleno da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1 – RELATÓRIO

A sociedade A……………………, Lda, melhor identificada nos autos, veio recorrer do Acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul (Secção de Contencioso Tributário) de 12 de Março de 2013, (cfr. fls. 541-597), por oposição com o Acórdão proferido em 23 de Fevereiro de 2006 – Processo nº 0105/01 do Tribunal Central Administrativo Norte.

Admitido o recurso por despacho do relator a fls. 625, foram apresentadas alegações tendentes a demonstrar a oposição entre os citados acórdãos (cfr. fls.629-632 verso).

Por despacho de fls.656-660 foi determinado o prosseguimento do recurso, tendo sido ordenado a notificação das partes para apresentarem alegações, nos termos do artigo 282.º nº 3 do CPPT, aplicável por força do disposto no nº5 do artigo 284.º do CPPT.

A recorrente apresentou a fls.665-677 alegação tendente a demonstrar alegada oposição de julgados, formulando as seguintes conclusões:
«1 — De acordo com os critérios doutrinal e jurisprudencialmente fixados, existe contradição de julgados quando (i) há identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, o que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica; (ii) não houve alteração substancial na regulamentação jurídica; (iii) se perfilhe, nos dois arestos, solução oposta; (iv) a oposição decorra de decisões expressas e não implícitas.
II - Ambos os acórdãos partem do mesmo pressuposto que consiste na desconsideração dos custos apresentados pelo contribuinte em sede de IRC e em ambos os processos apreciou-se se, nestes casos, se impõe ou não à Administração Fiscal o recurso a métodos indirectos de forma a apurar os custos que existiram e que geraram os proveitos objecto de tributação.
III - No acórdão recorrido foi decidido que não se impõe à Administração Tributária o recurso a métodos indirectos enquanto que no acórdão fundamento decidiu-se em sentido contrário, concluindo-se que se impõe “essa avaliação, nomeadamente por os custos, em virtude de a contabilidade não ser credível, não poderem ser apurados por outros meios”.
IV - Estão em causa duas decisões expressas e opostas que recaem sobre uma questão apreciada à luz da mesma regulamentação jurídica, que não sofreu até à prolação do acórdão recorrido alteração substancial, pelo que se pugna de imediato pela verificação dos três últimos critérios supra explicitados.
V - Resta apreciar a existência de uma identidade da questão de direito, o que pressupõe igual identidade na matéria de facto, entendida não como uma total identidade dos factos, sob pena de uma quase impossibilidade de verificação deste critério, mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.
VI - Nos presentes autos, provou-se que no exercício de 2002 a ora recorrente emitiu as facturas constantes de fls. 102 a 194 dos autos (als. B) a P) dos factos provados) e provou-se ainda que as facturas emitidas pelos subempreiteiros à recorrida são as constantes de fls. 242 a 250, no valor global, sem IVA, de € 274.641,60 e que esse valor foi totalmente desconsiderado pela Administração Fiscal enquanto custo e acrescido ao resultado tributável do exercício de 2002 (cfr. al. U) dos factos provados, bem como a al. W), em especial, as páginas 24, 29 e 30 do douto acórdão recorrido).
VII - Analisados os serviços descritos nas facturas emitidas pela recorrente, verifica-se que estão em causa essencialmente serviços de beneficiação florestal, de vedação, de limpeza e de manutenção de zonas verdes, cuja execução depende essencialmente de mão-de-obra, resultando ainda dessa análise a grande dimensão dos trabalhos executados, perfeitamente demonstrada pelo volume de facturação.
VIII - De acordo com a Administração Fiscal, a recorrente não teve, no exercício de 2002, qualquer custo com subempreiteiros, o que é totalmente irrealista quando se atende ao volume de trabalhos prestados e facturados e à natureza dos mesmos, o que resulta evidente da matéria de facto dada por provada.
IX - Existindo uma identidade fáctica entre os dois processos, como se crê existir, e tendo a mesma questão de direito, ou seja, a imposição ou não do recurso a métodos indirectos para determinação dos custos fiscalmente desconsiderados, sido decidida em sentido oposto, entende-se estar verificado o último requisito para que se conclua pela oposição de julgados.
X - Resulta da matéria de facto dada por provada nos presentes autos — cfr. alíneas B) a P) e JJ) - que a ora recorrente, no âmbito da sua actividade, prestou serviços com um volume de facturação na ordem dos € 500.000,00 (quinhentos mil euros), cuja execução depende quase única e exclusivamente de mão-de-obra.
XI - A recorrente para executar esses trabalhos teve necessariamente de recorrer a subempreiteiros, cujos custos se encontram documentados pelas facturas de fls. 242 a 250 dos autos, no valor global de € 274.641,60, totalmente desconsiderados pela Fazenda Pública enquanto tal, que optou pela mera operação aritmética de fazer acrescer esse valor ao resultado tributável do lucro de 2002.
XII - Tendo a Administração Fiscal acesso ao volume de facturação da recorrente e ao seu quadro de pessoal, constituído em 2002 por cerca de 15 trabalhadores, necessariamente teria de concluir que a sociedade não dispunha de capacidade para executar, pelos seus próprios meios, os serviços adjudicados e que teve de recorrer à ajuda de terceiros, o que implica a assunção de custos.
XXII - Mesmo que se opte por desconsiderar as facturas apresentadas, e impondo a Constituição da República Portuguesa que as sociedades sejam tributadas pelo seu lucro real (artigo 104°, n.º da C.R.P.), a Administração Fiscal não poderia deixar, por a isso estar obrigada, de recorrer a métodos indirectos para a determinação dos custos suportados pela recorrente, mas não o fez.
XXV - De acordo com o disposto na al. b) do n.º 1 do artigo 87° da LGT, em caso de impossibilidade de comprovação e quantificação directa e exacta dos elementos indispensáveis à correcta determinação da matéria tributável de qualquer imposto, não só poderá, como deverá (em respeito pela mencionada regra constitucional), a Administração Tributária recorrer a métodos de avaliação indirecta.
XV - O recurso aos métodos indiciários não é uma mera faculdade da Administração Fiscal, mas sim uma obrigação nos casos discriminados na lei, sob pena de, ao não ser aceite qualquer custo, serem inflacionados os resultados para além do verosímil, atingindo valores que nada têm a ver com a realidade.
XVI - O acórdão recorrido ao ter decidido que não se impunha a aplicação de métodos indirectos para a determinação dos custos suportados pela ora recorrente, não anulando o acto de liquidação impugnado, violou os princípios da legalidade, da justiça e da tributação pelo lucro real e as normas dos artigos 103º e 104º, n.º 2 da C.R.P. e dos artigos 5º, n.º 2, 87.º e 90° da LGT.
XVII - Deverá prevalecer, assim, o entendimento sufragado no douto acórdão fundamento, anulando-se a liquidação impugnada e fixando-se jurisprudência no seguinte sentido: No exercício de uma actividade em que a subcontratação de mão-de-obra assume valor significativo, a serem desconsiderados pela Administração Fiscal os custos declarados pelo contribuinte, deverá ser utilizada a avaliação indirecta para apuramento dos custos que no caso concreto tiveram de existir, sob pena de violação do princípio constitucional da tributação pelo lucro real.
Nestes termos e nos mais de Direito, que V. Exas. doutamente suprirão, deverá o recurso ser julgado procedente, fixando-se jurisprudência de acordo com o entendimento sufragado no acórdão fundamento e anulando-se a liquidação impugnada, pois só assim se fará a COSTUMADA JUSTIÇA!»

Contra alegou a representante da Fazenda Pública, concluindo que:
«a) A invocação da oposição de acórdãos depende da verificação dos seguintes pressupostos cumulativos:
- que exista contradição entre acórdão do TCA e outro acórdão anterior, do mesmo TCA ou do STA ou entre acórdãos do STA;
- que essa contradição recaia sobre a mesma questão fundamental de direito;
- que se tenha verificado o trânsito em julgado do acórdão impugnado e do acórdão fundamento;
- que não exista, no sentido da orientação perfilhada no acórdão impugnado, jurisprudência mais recentemente consolidada no STA.
b) No presente recurso com fundamento em oposição de acórdãos, entendemos que não existe real contradição entre as doutrinas adoptadas por cada uma das decisões — o que existe sim, são duas situações fácticas distintas, porquanto:
c) No acórdão fundamento, os custos desconsiderados pela Administração Fiscal foram levados à base instrutória e fundamento da decisão, contrariamente ao que sucedeu no acórdão recorrido.
d) No acórdão fundamento foi proferido com base em um contexto factual específico que o próprio acórdão reflecte na factualidade mencionada no probatório.
e) Constitui, portanto, a ausência de custos o real fundamento da decisão proferida no acórdão fundamento, o que não ocorre no acórdão recorrido, no qual não resulta do probatório qual o valor dos custos subsistentes após as correcções técnicas efectuadas por desconsideração das facturas falsas;
f) Isto é, a questão sobre os custos constantes na contabilidade após a correcção aritmética é omissa no probatório.
g) Não foi, portanto, ponderado, no acórdão recorrido, a questão dos custos subsistentes após a correcção e, consequentemente, e essencialmente, não se pronunciou sobre se os montantes permitiam a obtenção dos proveitos declarados, neste sentido vide Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 17/10/2012, proferido no processo n.º 0287/12.
h) Os Acórdãos recorrido e fundamento, decidiram, pois, a mesma questão - legalidade do recurso a correcções técnicas para desconsideração de custos titulados por facturas falsas - de forma distinta, não por força de divergência de entendimentos jurídicos, mas, antes, pela verificação de distintos quadros factuais provados. É porque tal questão é essencial para aferir dos valores que a impugnante pode deduzir para efeitos de custos nos termos do artigo 23.º do CIRC (com a redacção em vigor à data dos factos);
i) É nossa opinião que, do julgamento feito no acórdão recorrido e no acórdão fundamento que não existe entre eles divergência e incompatibilidade que justifiquem e sirvam de fundamento ao presente recurso por oposição de acórdãos.
j) Este acórdão foi utilizado noutra situação como acórdão fundamento, para o recurso com fundamento em oposição de acórdãos, onde a matéria de facto do acórdão recorrido era em tudo idêntica à acórdão ora recorrido, e apesar de ter sido admitido o recurso pelo tribunal a quo, o STA considerou não estarem preenchidos os pressupostos da oposição de acórdãos, neste sentido vide acórdão STA, de 17/10/2012, no processo n. 0287/12.
k) O acórdão fundamento e recorrido decidiram em confronto por força de diferentes factos provados e não por divergência de entendimento jurídico, pelo que também queda aqui um dos pressupostos do recurso de oposição de julgados.
l) Sem prescindir, entendemos que a decisão que se mostra mais adequada neste caso é a acolhida pelo Douto Acórdão recorrido, para cuja fundamentação se remete integralmente, porquanto:
m) A Fazenda Pública vem aderir na íntegra à posição assumida no Acórdão recorrido, defendendo que o mesmo não merece censura, efectivamente através da factualidade constante do probatório verifica-se que no mesmo é feita, a nosso ver, uma correta aplicação do direito aos factos, designadamente no tocante à repartição do ónus da prova nos casos em que, como o presente, está em causa a legalidade de ato tributário de liquidação de imposto, originado por correcção meramente aritmética, resultante de acção inspectiva no decurso da qual são apurados indícios fortes, sérios, objetivos da existência de recurso à facturação falsa com o intuito de redução da carga fiscal, nomeadamente em sede de IRC, através do qual são desconsiderados os custos, nos termos do artigo 23.º do CIRC; bem como, defendemos ser correto o enquadramento legal da consequência de não-aceitação dos custos documentados pelas facturas que se consideraram falsas.
n) Nos casos de “facturação falsa”, à Administração Fiscal compete reunir e demonstrar factos que apreciados com recurso às regras da experiência, permitam concluir que as facturas analisadas não correspondem a operações reais, efectivas, isto é, demonstrar os pressupostos da sua atuação, ónus da prova que, no caso subjudice, foi cumprido.
o) Tendo a Administração Fiscal demonstrado tais factos caberia à recorrente demonstrar que efectivamente os subcontratos tiveram lugar nos precisos termos constantes das faturas, em que obras, e porque montantes, em suma fazer a correspondência das faturas (consideradas falsas pela Administração Fiscal) com a realidade.
p) A recorrente não logrou fazer tal prova.
q) Torna-se evidente que tais custos (documentados por faturas falsas) não poderiam reflectir-se negativamente na determinação da matéria tributável (de acordo com o disposto no n° 1 do art. 17° do CIRC, porque neles a recorrente não incorreu, o lucro tributável das pessoas colectivas e outras entidades mencionadas na al. a) do n° 1 do artigo 30 do CIRC;
r) Razão pela qual, em conformidade com os artigos 17.º e 23.º do CIRC, os custos a que respeitam as facturas falsas só poderiam ser desconsiderados na determinação do lucro tributável referente ao exercício de 2002. Mediante as duas testemunhas arroladas não fica demonstrada a (suposta) cedência de mão de obra, nem em consequência, em que obras, nem que valores foram pagos, e se estão corretos os valores constantes das faturas;
s) Como se diz no douto Acórdão recorrido: “Neste cenário, aos serviços da AT não restava outra alternativa legal que aquela que produziram de, sendo imposta, pelo artigo 23.º n.º 1 do CIRC, a não consideração dos custos reputados factos, efectuar a correcção consubstanciada na dedução do valor total, apurado por mera soma aritmética, desses encargos, tal como resultou das importâncias tituladas pelas facturas inquinadas de falsidade”
t) No caso concreto, a recorrente contabilizou custos documentados por facturas que não correspondem operações reais, pelo que, as prestações de serviços a que tais facturas se reportam não poderiam ser consideradas para a determinação do lucro tributável.
u) Neste pressuposto, será suficiente à AT, no procedimento de determinação da matéria colectável, lançar mão de correcções técnicas através da desconsideração de tais custos, apurando-se, pois, de forma directa, que é a legalmente preferida a dita matéria.
v) E sendo assim, seria manifestamente ilegal o recurso a métodos indirectos para efectivar tal determinação, atento o carácter subsidiário destes últimos que resulta claramente, da norma dos artigos 81° e 87°, n° 1 da LGT.
w) Não está no poder discricionário da Administração Fiscal a opção por um ou outro método, a lei determina claramente em que situações poderão ser aplicados os métodos indirectos na determinação da matéria coletável, de acordo com os artigos 81.º e 87.° da LGT.
Na situação vertente, não era legalmente admissível que se aplicasse os métodos indirectos para determinação da matéria tributável.»

O EMMP pronunciou-se emitindo o seguinte parecer:
«Recorrente: A……………….., Lda
Objecto do recurso: acórdão do TCA Sul - SCT proferido em 12.03.2013, em oposição com acórdão TCA Norte - SCT proferido em 23.02.2006 (processo n° 105/01)
FUNDAMENTAÇÃO
1.São requisitos legais cumulativos do conhecimento do recurso por oposição de acórdãos:
- identidade da questão fundamental de direito
- ausência de alteração substancial da regulamentação jurídica
- identidade de situações fácticas
- antagonismo de soluções jurídicas
(art.284° CPPT; art.27° n°1 al. b) ETAF vigente; art.152° n°1 al. a) CPTA)
A alteração substancial da regulamentação jurídica relevante para afastar a existência de oposição de julgados verifica-se «sempre que as eventuais modificações legislativas possam servir de base a diferentes argumentos que possam ser valorados para determinação da solução jurídica» (acórdãos STA Pleno secção de Contencioso Tributário 19.06.96 processo n° 19532; 18.05.2005 processo n°276/05)
A oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais (Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume IV p.475809; acórdão STJ 26.04.1995 processo n°87 156)
A oposição e soluções jurídicas exige ainda pronúncia expressa sobre a questão, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta (acórdãos STA Pleno SCT 6.05.2009 processo n° 617/08, 26.09.2007 processo n° 452/07; acórdãos STA SCT 28.01.2009 processo n° 981/07); 22.10.2008 processo n°224/08).
2. Aplicando estas considerações ao caso concreto:
Questão fundamental de direito: legalidade da aplicação de métodos indirectos para a determinação da matéria tributável, no caso de desconsideração pela administração tributária de custos constantes de facturas consideradas falsas.
A esta questão os acórdãos em confronto respondem de forma consonante, no sentido da ilegalidade do recurso aos métodos indirectos da imperatividade de correcções técnicas, em consequência da desconsideração de custos fundadamente considerados inexistentes (cf. designadamente, sumário do acórdão fundamento n°2 fls.647)
A divergência de sentido das decisões inscritas nos acórdãos conflituantes não radica em antagónicas interpretações de normas jurídicas aplicadas na solução da questão fundamental de direito; antes em diferentes situações fácticas subjacentes, plasmadas nos respectivos probatórios e correctamente enunciadas nas contra-alegações da recorrida (conclusões b)/i) e k), fls.695/696), determinantes da manutenção da liquidação adicional de IRC (acórdão recorrido) e da anulação da liquidação adicional de IRC (acórdão fundamento)
3. A decisão do relator no tribunal recorrido que reconheceu a oposição de acórdãos (fls. 656/660) não impede que o pleno da secção decida em sentido contrário no julgamento do conflito de jurisprudência qual pressupõe oposição de soluções jurídicas (Jorge Lopes de Sousa Código de Procedimento e de Processo Tributário anotado e comentado 6ª edição 2011 Volume IV p.482)
CONCLUSÃO
O recurso deve ser julgado findo.»

2 – FUNDAMENTAÇÃO
Com interesse para a decisão foram dados como provados os seguintes factos:
A) com base no Auto de Noticia de fls 364 a 366, dos autos, que se dá por reproduzido para todos os efeitos legais, foi instaurado inquérito em 21-11-2006, a que foi atribuído o n°177/06.IDIFUN, por factos que se subsumem ao crime de fraude fiscal;
B) No Exercício de 2002 a A………………, Lda emitiu as seguintes facturas à Direcção regional de Florestas (fls 102 a 114, dos autos):



C) Com data de 17-10-2002 foi enviado fax da B……………. da Madeira, para adjudicação à impugnante de dois meses de prestação de serviços de desmarcação e limpeza geral dos esp verdes entre a Ribeira Brava e Machico Sul, conforme proposta da; 16-09-2002 e subsequente negociação de 09-10-2002, no valor €10.000,00 (fls 115, dos autos);
D) No Exercício de 2002 a A………………, Ldª emitiu as seguintes facturas à B……………… (fls 116 a 124, dos autos):



E) No Exercício de 2002 a A………… emitiu as seguintes facturas à Câmara Municipal de Porto Moniz (fls. 125 a 129, dos autos):


F) No Exercício de 2002 a A………………, Lda emitiu as seguintes facturas à Câmara Municipal de Santa Cruz (fls. 130 a 139, dos autos):



G) No Exercício de 2002 a A…………….., Ldª emitiu as seguintes facturas à Junta de Freguesia de Santo António da Serra (fls 139 e 140, dos autos):



H) No Exercício de 2002 a A………………., Ldª emitiu seguintes facturas à Junta de Freguesia de São Martinho (fls 141 a 152, dos autos):


I) No Exercício de 2002 a A………………, Ldª emitiu as seguintes facturas à Direcção Regional da PSP (fls. 153 a 163, dos autos):


J) No Exercício de 2002 a A…………….., Ldª emitiu as seguintes facturas à Direcção Regional dos Assuntos Culturais (fls 164 a 168, dos autos):



K) No Exercício de 2002 a A………………, Ldª emitiu a seguinte facturas à Direcção Regional da Agricultura DSATCA (fls 170 a 180, dos autos):



L) No Exercício de 2002 a A………………, Ldª emitiu a seguinte facturas à C………………. SA (fls. 170 a 180, dos autos):






M) No Exercício de 2002 a A………………, Ldª emitiu as seguintes facturas à D………….. (fls. 181 a 191, dos autos):




O) No Exercício de 2002 a A……………., Ldª emitiu a seguinte facturas à E……………, Ldª (fls 193, dos autos):



P) No Exercício de 2002 a A………………, Ldª emitiu a seguinte factura à ………… (fls. 194, dos autos):



Q) Em cumprimento da Ordem de Serviço n° 01200700019, de 2007-01-18, com despacho de 2008-01-08, código PNAIT 211,19, com extensão ao exercício 2002, foi realizada inspecção tributária à impugnante A…………….., Ldª (Relatório de Inspecção, junto ao PA).
R) A impugnante é sujeito passivo de IRC, enquadrada no regime geral de apuramento do lucro tributável desde 01/01/2001 e IVA, enquadrada no regime normal de periodicidade mensal e exerce a actividade de serviços relacionados com a agricultura com o CAE 001610 (relatório de inspecção junto ao PA);
S) Foi elaborado o Projecto de Relatório de Inspecção do qual a impugnante foi notificada por carta, com o registo datado de 07/11/2008, para exercer o direito de audição no prazo de 10 dias, nos termos do disposto no art° 60° da LGT e 60° do RCPIT (fls. 41/42, dos autos);
T) Em 17/11/2008 a impugnante exerceu o direito de audição (Relatório de Inspecção);
W) Em 20-11-2008 foi elaborado o relatório de inspecção tributária, que com interesse para os autos se reproduz, quase na sua integra (Processo Administrativo apenso):
1.3 - DESCRIÇÃO SUCINTA DAS CONCLUSÕES DA ACÇÃO DE INSPECÇÃO
O sujeito passivo (SP) contabilizou, no exercício de 2002, facturas emitidas em nome de entidades não declarantes, que não estão na forma legal e respeitam a custos com fortes indícios de respeitarem a operações simuladas, tendo infringido os nºs 2 e 3 do artigo 19.° do Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado (CIVA) e o artigo 23.° do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC), o que é punível pelo artigo 103.º do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT) Fraude fiscal.
Foram apuradas as seguintes correcções, relativas ao exercício de 2002:




II - 2. Motivo, âmbito e incidência temporal
Acção inspectiva decorrente de um processo de cruzamento de informação no âmbito do sector da construção civil, em que se detectaram contribuintes não declarantes, com volumes consideráveis de serviços prestados a diversas entidades, inclusive ao SP em análise.
(...)
III - DESCRIÇÃO DOS FACTOS E FUNDAMENTOS DAS CORRECÇÕES MERAMENTE ARITMÉTICAS A MATERIA TRIBUTÁVEL
III - 1. IRC
O contribuinte encontra-se enquadrado no regime geral de apuramento do lucro tributável, no exercício de 2002.
De acordo com o valor declarado no anexo P da declaração anual do contribuinte objecto de inspecção, as empresas F……………….., Lda. e G…………….., Lda. - entidades não declarantes - foram, no exercício de 2002, dois dos seus maiores fornecedores, o que se confirmou mediante as facturas respectivas, recolhidas junto do SP.
Verificou-se que aquelas facturas, referentes a supostos subcontratos, não estão emitidas na forma legal, não referindo a quantidade e denominação usual dos serviços prestados, nem dispondo de quaisquer anexos com os respectivos autos de medição ou orçamentos, o que inviabiliza o controlo ulterior da efectiva realização dos serviços.
Acresce que o contribuinte não detém documentos comprovativos dos pagamentos das facturas em causa àqueles prestadores de serviços, uma vez que os mesmos se têm vindo a contabilizar por contrapartida da conta 11. “Caixa”, isto é, em numerário. Segundo os registos contabilísticos, os pagamentos são efectuados também a pronto, no momento da emissão da factura (docs. de 1 a 6).
No exercício em análise, contudo, constatou-se a existência de contas bancárias, em que se verifica terem sido descontados diversos cheques emitidos a favor de terceiros. Relativamente a estes movimentos não há documentos suporte, nem cópias dos cheques em questão, alegando o contribuinte que estes desapareceram de um cofre que foi assaltado. No entanto, a consulta aos extractos bancários permite identificar o pagamento frequente, por cheque, de valores inferiores aos relativos às facturas em nome de G………………., Lda. e F…………….., Lda., pagas a pronto e em numerário.
Da análise às facturas relativas à subcontratação a G…………….., Lda. e a F……………., Lda., verifica-se a concentração destes custos essencialmente no final do ano (doc. 7). Detectou-se, por exemplo, a contabilização de um custo com a subcontratação a F…………….., Lda., relativo a trabalhos de mondas e construção de vedação no Paul da Serra, em factura datada de 2002-12-12 (doc. 8). No entanto, o SP facturou a clientes os trabalhos desta natureza, realizados no Paul da Serra, em Maio, Agosto e Novembro do mesmo ano (docs. de 9 a 15), antes de conhecer os custos inerentes, pois para além de não ter sido emitida ainda a factura pela entidade subcontratada, nem sequer existia qualquer orçamento.
Importa ainda referir que as assinaturas que constam das facturas emitidas em nome de F……………., Lda. são diferentes, parecendo haver uma tentativa de cópia das mesmas; o mesmo se passa com as facturas em nome de G……………, Lda., A título de exemplo juntam-se os docs. de 16 a 20 e os docs. de 24, respectivamente em nome de F…………….. Lda. e G……………….., Lda.
Acresce que, por consulta à base de dados da DGCI, se verificou que F………………., Lda. e G……………….., Lda. têm por actividade a “Construção de Edifícios”. Ora, os serviços facturados ao SP por estas entidades têm natureza distinta, incluindo serviços de limpeza e o fornecimento e espalhamento de terra, plantas e árvores.
Tendo-se requerido ao SP para identificar as pessoas com quem foram contratados os serviços facturados em nome das entidades subcontratadas em causa, o mesmo identificou H………………. como representante de G………………, Lda., I………………. como representante de F…………………, Lda. e J…………….., enquanto contabilista das duas sociedades em questão e com conhecimento directo dos serviços prestados e inclusive dos respectivos pagamentos (docs. 25 e 26).
F…………………, Lda. e G……………….., Lda. foram notificadas quer na sua sede quer no domicílio fiscal dos respectivos sócios para prestar declarações nesta Direcção Regional dos Assuntos Fiscais, no âmbito de diversos processos em análise no sector da construção civil, não tendo contudo comparecido qualquer destas entidades, cujas respectivas notificações foram devolvidas por “averiguações sem resultado”.
J……………….. foi ouvido em auto de declarações, em 2008-09-10 (doc. 27), afirmando não ser contabilista daquelas entidades subcontratadas mas apenas conhecido das mesmas e desconhecer os pagamentos a elas efectuados por A……………….., Lda., apesar de ser amigo pessoal de K…………………., gerente do SP. Referiu que os sócios gerentes de G………………., Lda. e F…………….., Lda., H……………….. e I……………… respectivamente, o contactavam diversas vezes para passar facturas em nome daquelas entidades, pois apesar de saberem escrever, tinham uma letra de difícil percepção. No momento não dispunha do contacto das mesmas, mas comprometeu-se a informar estes serviços de inspecção tributária, no prazo de cinco dias, do n.º de telefone de H……………….. - o único que era do seu conhecimento - o que não fez até hoje.
Por consulta à base de dados, disponível nesta Direcção Regional dos Assuntos Fiscais, verificou-se que I…………………. não é o sócio de F………………, Lda.
No que respeita aos serviços prestados ao SP por aquelas entidades, J………………. afirmou conhecer a natureza de vários trabalhos, tratando-se de limpeza de levadas e caminhos.
Acrescentou ter identificado, por diversas vezes, funcionários de G…………….., Lda. e F……………….., Lda. a prestar serviços ao SP. Ora, junto do Centro de Segurança Social da Madeira, apurámos que estas entidades não têm qualquer trabalhador dependente inscrito, desde o seu início de actividade.
J………………. admitiu ainda que as entidades subcontratadas em questão não se tratam de empresas idóneas, atendendo a diversos documentos em seu nome que estiveram em sua posse e que considera não serem válidos.
Importa referir que, no âmbito da análise a este mesmo SP, para os anos de 2003 a 2006, J………………. foi indicado, por uma outra entidade subcontratada e não declarante, como receptor de livros de facturas assinadas e em branco, pelo que prometia em troca recompensas monetárias.
G………………., Lda. não procedeu ao envio das declarações periódicas de IVA, nem das declarações anuais e declarações de rendimento modelo 22 relativas a 2002. Esta empresa, de resto, foi cessada oficiosamente para efeitos de IVA a 2001-12-31.
No que respeita a F…………………, Lda., esta entidade também não enviou as declarações periódicas de IVA, declarações anuais e declarações de rendimento modelo 22 referentes ao exercício de 2002.
Apurou-se ainda, através do Instituto da Construção e do Imobiliário - instituição competente na emissão de alvarás de construção - que estas duas empresas subcontratadas, com a actividade de construção de edifícios, não dispõem de alvará de construção (docs. 28 e 29). Atendendo a um conjunto de facturas disponíveis nesta Direcção Regional dos Assuntos Fiscais, emitidas em nome de G……………….., Lda., verificou-se que esta entidade tem facturas impressas em várias tipografias (“Tipografia L…………., Lda. e “M……………….., Lda.), bem como facturas processadas por computador, o mesmo acontece com F………………, Lda., com facturas impressas pela “Tipografia L………………., Lda. e pela tipografia N…………………, Lda. Desta forma, há fortes indícios de utilização indevida destes documentos por diversos agentes económicos, em operações de negócio simulado.
Junto das respectivas tipografias obtiveram-se requisições de facturas em nome de F…………………, Lda. (docs. de 30 a 33) e G…………………, Lda. (docs. de 34 a 38). Detectaram-se diferentes assinaturas nas mesmas e ainda divergentes daquelas que constam das respectivas facturas. Em nenhuma das assinaturas constantes das requisições se identificou a da sócia gerente O………………..
Junto da “Tipografia L………….” apuramos que uma das pessoas que requisitava facturas em nome de F………………, Lda. era o Sr. I……………. - cujo nome é perceptível na requisição de 2003-11-07.
Deslocámo-nos, em 2008-10-24, ao domicílio fiscal de I………………, NIF ………….., ao ……………. Conjunto 1-habitacional …………., casa F, ………., ………. Funchal. I………………….. é “………….” e encontrámo-lo no local de onde partem os carrinhos do Monte, tendo-se recusado a prestar qualquer declaração sem a presença do seu advogado, referindo apenas que “está em causa muito dinheiro” e que “P……………… - de que desconhecemos a ligação à empresa F………………., Lda. - está por dentro de todo o negócio”.
Importa ainda referir que se detectou a requisição à “Tipografia L…………..”, de guias de transporte em nome de F……………….., Lda. (doc. 39), o que indicia a intenção de emissão de documentos em seu nome relativos a transmissão de bens.
A guia de transporte, enquanto documento de transporte, deve acompanhar os bens em circulação por motivo de transmissão ou incorporação em serviços prestados. Ora, se por um lado, a entidade em questão não tem por actividade a transmissão de bens, por outro lado, de acordo com a informação disponível na base de dados da DGCI, não é adquirente de bens que possam ser incorporados em qualquer obra.
Acresce que F………………., Lda. bem como a respectiva sócia não são proprietárias de veículos que permitam o transporte de mercadorias, dos próprios ou de terceiros (does. 40 e 41).
No exercício de 2002, de acordo com a informação fornecida por clientes, F…………………, Lda. prestou serviços num montante total de € 1.667.197,00. Quanto a aquisições, não há qualquer valor declarado por terceiros.
No que respeita a G………………., Lda., também sem qualquer aquisição declarada por terceiros, emitiu facturação relativa a serviços prestados no valor total de € 7.561.956,00. A “Tipografia L…………” não localizou as requisições das facturas em nome desta entidade, de 2002, mas apenas de anos posteriores, não tendo sido possível identificar qualquer dos requisitantes, uma vez que as respectivas assinaturas são ilegíveis. Relativamente a estas facturas, detectou-se a requisição junto de Q…………….., Lda. - que subcontratou a tipografia “M…………….” - de facturas com os n.º de 701 a 800, em 2005-03-02 (docs. 36 e 37); facturas com numeração idêntica, da 701 à 850, foram também requisitadas à “Tipografia L………………, em 2006-01-13 (doc. 38), desrespeitando assim a numeração sequencial exigida por lei.
Pelo exposto, conclui-se que o contribuinte deduziu custos indevidamente, não tendo comprovado tratarem-se de custos indispensáveis à realização dos proveitos nos termos do artigo 23.º do CIRC.
Neste contexto, o montante apurado no quadro que se segue, contabilizado como custo do exercício, a título de subcontratos, no montante de € 274 641,60, deverá ser acrescido ao resultado tributável do exercício de 2002.



(a) Factura impressa pela tipografia N…………………, Lda.
(h) Facturas impressas pela “Tipografia L………………….., Ldª
III - 2. IVA
Trata-se de um sujeito passivo que, através da consulta ao sistema informático disponível nesta Direcção Regional dos Assuntos Fiscais, se encontra enquadrado no regime normal, de periodicidade mensal, no exercício de 2002.
O SP deduziu IVA no montante total de € 35 516,41, inerente a facturas que não conferem o direito à dedução, nos termos dos n.º 2 e 3 do artigo 19.° do CIVA e alínea b), 11.0 5 do artigo 35.° do mesmo diploma legal, pelo que se procederá correspondentes correcções em cada período, conforme quadro que consta do ponto 1
IX - DIREITO DE AUDIÇÃO - FUNDAMENTAÇÃO
O SP foi notificado por carta registada, com registo de saída em 2008-11-07, nos termos do artigo 60.° da Lei Geral Tributária (LGT) e artigo 60.º do Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária (RCPIT), para exercer o direito de audição, no prazo de 10 dias.
IX.1 - FACTOS DEFENDIDOS E FUNDAMENTADOS PELO SUJEITO PASSIVO
O SP exerceu o seu direito de audição, invocando o seguinte:
1. Caducidade do direito de liquidação;
2. Inexistência no ordenamento jurídico da figura de “projecto de correcções do relatório de inspecção”, que finde num só documento, o que deviam ser dois: o projecto de decisão e o relatório da inspecção tributária;
3. Inviabilização do exercício do direito de audição acerca do relatório da inspecção, uma vez que este não foi apresentado;
4. Erro na quantificação da matéria tributável. As correcções referem-se a custos suportados com entidades emitentes de facturas e recibos relativos a serviços prestados pelas próprias, sem os quais não seria possível executar os trabalhos facturados a clientes;
5. Não competia ao SP averiguar quanto à natureza, declarante ou não, das entidades subcontratadas;
6. O lucro tributável é acrescido por um valor que, de acordo com o projecto, não existe;
7. Inexistência de implicações a nível do IVA, uma vez que não há lugar a correcção do lucro para efeitos de IRC.
IX. 2- ANÁLISE DOS FACTOS INVOCADOS PELO SUJEITO PASSIVO E RESPECTIVO ENQUADRAMENTO LEGAL
1. Na sequência do processo de inquérito instaurado no ano de 2006 ao SP, o prazo de caducidade do direito à liquidação foi alargado até ao arquivamento ou em julgado da respectiva sentença, acrescido de um ano, nos termos dos n°s 1 e 5 do artigo 45.° da LGT.
2. O “projecto de correcções do relatório de inspecção” trata-se do projecto da decisão da administração tributária, previsto no n.º 5 do artigo 60.º da LGT e no n.º 1 do artigo 60.° do RCPIT.
3. A audição prévia da entidade inspeccionada realiza-se uma vez concluída a inspecção, mediante notificação ao SP do projecto de conclusões do relatório, o relatório definitivo é apenas elaborado após o exercício do direito de audição, ou no fim do decurso do prazo concedido para o efeito, nos termos do artigo 60.º do RCPIT. Observa-se assim o princípio da participação, nos termos da alínea e), n.º 1 e n.º 5 do artigo 60.º da LGT. De resto, não se compreende como pode o contribuinte opor-se à totalidade do que vem referido no projecto de conclusões do relatório e alegar a inobservância do dever de audição.
4. A correcção à matéria tributável resulta de se ter detectado a contabilização de um conjunto de documentos relativos a custos com alegados subcontratos, que indiciam a celebração de negócios simulados, seja quanto à natureza ou por interposição, omissão ou substituição de pessoas. Estes custos não foram comprovados pelo SP como necessários à obtenção dos ganhos, havendo fortes indícios de que as entidades responsáveis pela execução dos trabalhos não foram aquelas em nome de quem foram emitidos os respectivos documentos.
Admite-se que os proveitos, que não são postos em causa no Relatório, tenham implicado custos, de natureza diversa dos declarados. Compete ao contribuinte comprovar a sua existência, sob pena de os mesmos não poderem ser considerados para efeitos de apuramento do resultado tributável.
5. As correcções não decorrem da natureza, declarante ou não, das entidades em causa, mas resultam de um conjunto de fundamentos que impossibilitam que as empresas em questão tenham realizado os trabalhos a que respeitam as facturas em seu nome, contabilizadas pelo SP.
6. O resultado tributável declarado - prejuízo fiscal de - € 130 984,58 – é corrigido pelo valor do custo registado na contabilidade, relativo às facturas de subcontratos em causa, anulando-se desta forma o seu impacto no apuramento daquele resultado para efeitos de IRC.
7. A natureza das operações em questão, com fortes indícios de consubstanciar negócio simulado, implica a correcção para efeitos de IVA nos termos do n.º 3 do artigo 19.º do CIVA. Acresce que as facturas em causa não estão na forma legal, pelo que o IVA respectivo não confere direito à dedução, nos termos do n.º 2 do artigo 19.º e alínea b), n.º 5 do artigo 35º, ambos do CIVA.
Em conformidade com o exposto, o Relatório foi elaborado de acordo com o Projecto, não se tendo procedido a qualquer alteração ao mesmo.
U) Dão-se por inteiramente reproduzidas as facturas subjacentes às correcções efectuadas no Relatório de Inspecção Tributária que, com interesse para a decisão da causa se reproduzem em parte (fls 242 a 250)







V) Dou por inteiramente reproduzido o Auto de Declarações, que faz parte integrante do Relatório de Inspecção, de J………………., na qualidade de conhecido das sociedades G……………… e F…………….. onde ficou consignado, designadamente que (fls. 253, dos autos):
Os sócios gerentes de G………………, Lda e F……………….., H……………. e I…………….., respectivamente, contactavam-no por diversas vezes para passar facturas em nome daquelas entidades … No que respeita aos serviços prestados por estas entidades à A………………., Ldª afirma conhecer a natureza de vários trabalhos, tratando-se de limpeza de levadas e caminhos. - No que respeita à natureza das entidades G…………….. e F……………. admite não se tratarem de empresas idóneas, atendendo a diversos documentos em nome entidades que estiveram na sua posse e que considera não serem válidos ou correctos. Preenchia diversas facturas em nome da G…………… e F……………., uma vez que H………………. e I………………, apesar de saberem escrever tinham uma letra de difícil percepção.
X) Dá-se por inteiramente reproduzidos os documentos de fls 256 a 264, que constituem requisições de facturas, e fazem parte integrante do relatório de inspecção;
Y) Sobre o Relatório de Inspecção Tributária incidiu o seguinte parecer do Técnico Economista Assessor, datado de 21-11-2008 (Relatório de Inspecção):
O sujeito passivo deverá ser notificado, conforme art° 77° da LGT e art° 62° do RCPIT, do resultado da acção inspectiva com correcções.
Z) Sobre o relatório de Inspecção e parecer incidiu o seguinte despacho do Chefe de Divisão, datado de 26-11-2008 (Relatório de Inspecção):
Concordo com o relatório. Notifique-se o sujeito passivo nos termos do art° 77° da LGT e art° 62° do RCPIT, do resultado da acção inspectiva com correcções.
AA) Em 03-12-2008 a impugnante foi notificada do Relatório de Inspecção Tributária, por carta registada com aviso de recepção, conforme oficio n° 11265, datado de 28-11-2008 (fls. 44 a 46, dos autos);
BB) Dá-se por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais o oficio n° 11265, datado de 28-11-2008, onde consta uma assinatura ilegível e um carimbo com (fls. 44, dos autos):
Por delegação - Despacho de 13.04.07, do Director Regional dos Assuntos Fiscais, II Série, n° 171 de 17.10.07
CC) Em resultado da inspecção foram efectuadas as liquidações adicionais de IRC n° 2008 8310039232 no valor de €42.567,53, juros nºs 2008 00001980746 e 2008 00001980747, nos valores, respectivamente €5.275,91 e €0,62 (fls. 35/36, dos autos);
DD) Em 12-01-2009 a impugnante apresentou pedido de revisão da matéria tributável ao abrigo do disposto no art° 91º da LGT (fls 318 a 325, dos autos);
EE) Em 19-01-2009 a impugnante enviou requerimento a informar que tendo apresentado o pedido de revisão da matéria tributável a liquidação de IRC devia ser suspensa (fls. 282, dos autos);
FF) A impugnante foi notificada do projecto de despacho de indeferimento que recaiu sobre o requerimento referido no ponto anterior (informação oficial);
GG) Por oficio n° 1922, datado de 02-03-2009 a impugnante foi notificada do despacho de indeferimento que recaiu sobre o pedido de Revisão da Matéria Tributável (fls. 269 a 280, dos autos);
HH) Por oficio n° 1921, datado de 02-03-2009 foi enviada resposta sobre o pedido de suspensão (fls. 281 e 282, dos autos);
II) A impugnante apresentou recurso hierárquico do indeferimento referido no ponto anterior (informação oficial);
JJ) Dá-se por inteiramente reproduzido o documento de fls. 63/64, dos autos que constitui a enumeração dos serviços prestados pela impugnante à Direcção regional de Floresta durante o ano de 2002 (inquirição da testemunha R……………….);
KK) Em 03-02-2009 deu entrada a presente impugnação (carimbo aposto no rosto de fls. 1, dos autos);
A convicção do Tribunal fundou-se no teor dos documentos juntos em cada ponto dos factos provados e na inquirição das testemunhas. Da inquirição das testemunhas, salienta-se, o seguinte:
R………………., eng° técnico agrário e Director na Direcção Regional de Florestas da região Autónoma da Madeira que disse que a A………………. entrou em diversos procedimentos de contratação e tem fornecido materiais de natureza florestal e feito diversos trabalhos de limpeza, monda, montagem de redes de vedação, limpeza de árvores, beneficiação florestal. Alguns trabalhos são de comparticipação comunitária e são trabalhos que exigem um número razoável de trabalhadores principalmente os trabalhos de plantação e veredas e em que os equipamentos mecânicos são pontuais. Acompanhamos o desenrolar dos trabalhos.
S……………….. disse que a A……………….. é propriedade dos seus pais e que prestou algum apoio na empresa que é uma empresa familiar. A Direcção regional de Florestas era um seu cliente, mas tínhamos ainda a C…………….., Câmaras, ... a empresa em 2002 não devia ter mais de 15 trabalhadores, para prestar os seus serviços nas mais diversas áreas; é uma empresa virada para a prestação de serviços com base na mão de obra. Nessa altura os prazos eram curtos e com o boom da construção para cumprirmos houve necessidade de recorrer a outras empresas. A mão de obra era unicamente homens predominantemente emigrantes: brasileiros, africanos, países de leste. As facturas foram recebidas na contabilidade e não me apercebi que houvesse anomalias. Eram feitas contas semanais.

B) No acórdão fundamento:
a) Em 01/04/1990, o impugnante declarou como início de actividade a “Construção de edifícios”, por si desenvolvida;
b) O impugnante trabalhou por conta própria na actividade de construção civil até 1997;
c) O irmão do impugnante, ……… .., encontrava-se colectado em nome individual;
d) A 17/12/1998, o impugnante apresentou uma declaração de cessação de actividade reportada a 31/03/1996;
e) A 22/10/1999, o impugnante apresentou nova declaração de cessação de actividade reportada a 31/03/1997, na qual mencionou o seguinte: «Já foi apresentada uma declaração de cessação dando como terminada a actividade em 30/03/96, quando na realidade cessou um ano depois»;
f) A escrita do impugnante foi alvo de uma inspecção tributária ocorrida de 21/09/1999 a 19/07/2000, a qual culminou com a elaboração de um relatório, junto aos autos e que aqui se dá como por integralmente por reproduzido;
g) Em 10/11/2000, foi emitida a liquidação 5343545826, relativa ao IRS de 1995, no valor de € 117.605,02, com data limite de pagamento a 03/01/2001;
h) Em 24/11/2000, foi emitida a liquidação 5333565702, relativa ao IRS de 1996, no valor de € 127.234,43, com data limite de pagamento a 17/01/2001;
i) Em 10/11/2000, foi emitida a liquidação 5343548319, relativa ao IRS de 1997, no valor de € 11.460,77, com data limite de pagamento a 03/01/2001.
Ao abrigo do disposto no art.º 712.º nº 1, alínea a) do CPC e por relevarem se encontrarem provados nos autos e relevarem para a decisão, aditam-se ao probatório os seguintes factos:
j) De acordo com o ponto 2 - Organização e Análise Contabilístico-fiscal, do citado relatório da inspecção tributária, os proveitos e custos do impugnante nos anos de 1995, 1996 e 1997, foram os seguintes:

QUADRO l
DescriçãoAno de 1995Ano de 1996Ano de 1997
Proveitos
Serviços prestados39 809 797$0047 859 676$007 394 490$00
Custos
Subcontratados38 452 220$0047 142 525$006 650 000$00
Outros custos138 534$0085 720 $00-$-
Total dos custos38 590 754$0047 228 245$006 650 000$00
Resultado liquido1 219 244$00631 431$00744 490$00

1) Por força da desconsideração dos custos referidos no quadro anterior e relativos a subcontratados, foi corrigido o lucro tributável para 39.671.464$00, 47.751.431$00 e 7.394.490$00, respectivamente em relação aos anos de 1995, 1996 e 1997 (v. Quadro 17 de fls. 40).
m) Em consequência do referido na alínea anterior, e para os proveitos aí indicados, temos como custos, respectivamente, 138.534$00, 85.720$00 e zero escudos (anos de 1995, 1996 e 1997).

3 – DO DIREITO
O presente recurso vem interposto do acórdão proferido na Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul de 12 de Março de 2013, (cfr. fls. 541-597), por oposição com o Acórdão proferido em 23 de Fevereiro de 2006 – Processo nº 0105/01-Braga do Tribunal Central Administrativo Norte.
Por despacho proferido em 16/07/2013 (vide fls. 656/660) o Sr. Juiz relator julgou verificada a oposição, por entender que existe a apontada contradição entre ambos os arestos, no tocante à mesma questão fundamental de direito: saber se a AT, no caso da desconsideração dos custos, pode e deve aplicar os métodos indirectos na determinação da matéria tributável.
Mas porque tal decisão do relator não faz, nesse âmbito, caso julgado, nem impede ou desobriga o Tribunal de recurso de a apreciar - cfr. art. 685º-C, nº 5 do CPC – podendo, se for caso disso, ser julgado findo o respectivo recurso; (Cfr. o ac. deste STA, de 7/5/2003, proc. nº 1149/02) - cfr. também neste sentido Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário: Anotado e Comentado, volume II, 5ª ed., Lisboa, Áreas Editora, 2007, p. 814 (nota 15 ao art. 284º), importa, então, averiguar se a alegada oposição de acórdãos se verifica.

Sendo ao caso aplicável o regime legal resultante do ETAF de 2002, nos termos dos arts. 2º, nº 1, e 4º, nº 2, da Lei nº 13/2002, de 19/2, na redacção da Lei nº 107-D/2003, de 31/12, a admissibilidade do recurso por oposição de acórdãos, tendo em conta o regime previsto nos artigos 27º, al. b) do ETAF e 152º do CPTA, depende, como se deixou expresso no ac. de 26/9/2007, do Pleno da Secção do Contencioso Tributário deste STA, no processo nº 0452/07, da satisfação dos seguintes requisitos:
«– existir contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão invocado como fundamento sobre a mesma questão fundamental de direito;
– a decisão impugnada não estar em sintonia com a jurisprudência mais recentemente consolidada do Supremo Tribunal Administrativo.
Como já entendeu o Pleno da Secção do Contencioso Administrativo deste Supremo Tribunal Administrativo (() Acórdão de 29-3-2006, recurso nº 1065/05), relativamente à caracterização da questão fundamental sobre a qual deve existir contradição de julgados, devem adoptar-se os critérios já firmados no domínio do ETAF de 1984 e da LPTA, para detectar a existência de uma contradição:
– identidade da questão de direito sobre que recaíram os acórdãos em confronto, que supõe estar-se perante uma situação de facto substancialmente idêntica;
– que não tenha havido alteração substancial na regulamentação jurídica;
– que se tenha perfilhado, nos dois arestos, solução oposta;
– a oposição deverá decorrer de decisões expressas e não apenas implícitas (() Neste sentido, podem ver-se os seguintes acórdãos da SCA:
– de 29-3-2006, recurso n.º 1065/05;
– de 17-1-2007, recurso n.º 48/06;
– de 6-3-2007, recurso n.º 762/05;
– de 29-3-2007, recurso n.º 1233/06.
No mesmo sentido, pode ver-se MÁRIO AROSO DE ALMEIDA e CARLOS CADILHA, Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, 2ª edição, páginas 765-766.)».
Por um lado, portanto, a oposição deverá decorrer de decisões expressas, não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta e, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, entendida esta não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais.

Neste contexto, importa, então, apreciar se se verifica, ou não, a suscitada oposição, no que respeita à questão em apreciação, que, segundo o recorrente, consiste em saber se a Administração, no caso da desconsideração dos custos por as facturas não corresponderem a transacções reais, pode e deve aplicar os métodos indirectos na determinação da matéria tributável.
Vejamos, pois.

Enunciando como questões a decidir as de saber se a sentença errou o julgamento ao considerar que as facturas em causa nos autos não correspondem a reais transacções e se a consequência de tal julgamento é a não aceitação dos custos documentados por essas facturas, o acórdão recorrido veio a concluir, em síntese quanto à desconsideração, como custo, das facturas questionadas:
“(…) Importa avançar para o outro elemento que se prende com a prova da veracidade das transacções em causa, sendo que inequívoco que cabe ao contribuinte evidenciar tal realidade.
Com este pano de fundo, surge então a afirmação produzida na decisão recorrida no sentido de que “ponderada a prova produzida, conclui-se que a Administração Fiscal não podia desconsiderar os custos que as facturas em causa suportam a menos que outra actividade instrutória junto das obras públicas/privadas identificadas nos contratos públicos/privados e que deram origem à emissão por parte da impugnante de facturas suas e a sua aceitação de facturas de subempreiteiros, o que infelizmente não se preocupou em verificar, lhe permitissem concluir com um mínimo de segurança que subjacente às facturas não correspondiam efectivas prestações de serviços.

Consequentemente, não se tendo demonstrado que as operações comerciais referidas nas facturas em causa eram fictícias, é justo a dedução dos custos em que incorreu a impugnante e a impugnação tem de proceder.”
Como está bom de ver, depois de se afirmar que cabe ao contribuinte a prova da veracidade das transacções em causa, não pode acompanhar-se a ideia de que não se demonstrou que as operações comerciais referidas nas facturas em causa eram fictícias, dado que, tal significa inverter os dados da questão, na medida em que aquilo que se impõe é a prova pela Recorrida da materialidade que suporta as tais transacções.
Por outro lado, resulta evidente que o raciocínio vertido na decisão recorrida não tem suporte bastante para se manter, na medida em que se desvia do essencial da questão que agora cumpre apreciar.
Efectivamente, na sentença recorrida considerou-se que as prestações de serviço assumidas pela Recorrida são indiscutíveis, mormente em função da natureza das entidades com quem estabeleceu tais prestações, sendo que esse elemento é também garantia de que tais prestações foram efectivamente realizadas.
Efectivamente, na sentença recorrida considerou-se que as prestações de serviço assumidas pela Recorrida são indiscutíveis, mormente em função da natureza das entidades com quem estabeleceu tais prestações, sendo que esse elemento é também garantia de que tais prestações foram efectivamente realizadas.
Assim sendo, e como a Recorrida não tinha condições para, pelos seus próprios meios, assegurar todas as obras que lhe foram adjudicadas, teve necessariamente que recorrer à subcontratação, o que conduz à afirmação da realidade reclamada pela então impugnante, até porque as deficiências formais das facturas e os pagamentos em dinheiro não impressionam em função do controlo exercido pelas entidades que adjudicaram os trabalhos à ora Recorrida.
Ora, esta lógica como que intuitiva de decisão não encontra apoio bastante no probatório dos autos, nem procede ao devido enquadramento da matéria que efectivamente interessa aos autos.
Efectivamente, não obstante a posição assumida pela impugnante, reclamando a efectiva realização de todas as transacções referenciadas nas facturas postas em crise pela AT, constata-se que nenhuma dessa relevante factualidade foi demonstrada pela produção das provas, maxime, a testemunhal produzida no âmbito deste processo de impugnação judicial”.
E, mais adiante: “Assim sendo, e na medida em que a ora Recorrida não fez prova da veracidade das transacções em causa, aqui, tal como foi assumido pela AT, só podemos apontar e aceitar o procedimento de desconsiderar os custos correspondentes aos montantes inscritos nas facturas reputadas “falsas”, na medida em que os mesmos, pura e simplesmente, não foram suportados, pagos, pela impugnante, na medida em que só desta forma, se concretiza e respeita, nomeadamente, a exigência legal de só se poderem considerar custos ou perdas “os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora ..“ - cfr. art. 23° n° 1 do CIRC, o que significa que a sentença recorrida não pode manter-se, impondo-se a sua revogação”.

E, quanto à consequência da não aceitação dos custos documentados pelas facturas desconsideradas (pois que a recorrente sustenta que não se aceitando os custos titulados pelas facturas a AT teria que recorrer aos métodos indirectos para determinação da matéria tributável).
Relativamente a esta questão, o acórdão recorrido, aderiu à jurisprudência constante do ac. do TCAN, de 12/01/2006, no proc. nº 444/04 que citou em parte para concluir pela correcção da actuação da AT consistente na não utilização de métodos indiciários e pela necessidade de revogar a decisão de 1ª instância recorrida julgando improcedente a impugnação
Por sua vez, no acórdão fundamento (proferido na Secção de Contencioso Tributário do TCAN, em 23/2/2006, no proc. nº 00105/01 – Braga) vinha especificada a matéria de facto seguinte (no que aqui releva):
«f) A escrita do impugnante foi alvo de uma inspecção tributária ocorrida de 21/09/1999 a 19/07/2000, a qual culminou com a elaboração de um relatório, junto aos autos e que aqui se dá como por integralmente por reproduzido;
g) Em 10/11/2000, foi emitida a liquidação 5343545826, relativa ao IRS de 1995, no valor de € 117.605,02, com data limite de pagamento a 03/01/2001;
h) Em 24/11/2000, foi emitida a liquidação 5333565702, relativa ao IRS de 1996, no valor de € 127.234,43, com data limite de pagamento a 17/01/2001;
i) Em 10/11/2000, foi emitida a liquidação 5343548319, relativa ao IRS de 1997, no valor de € 11.460,77, com data limite de pagamento a 03/01/2001.»
Todavia, por entender que se encontravam «provados nos autos e relevarem para a decisão» o mesmo acórdão aditou ao Probatório, ao abrigo do disposto na al. a) do nº 1 do art. 712º do CPC, os seguintes factos:
«j) De acordo com o ponto 2 - Organização e Análise Contabilístico-fiscal, do citado relatório da inspecção tributária, os proveitos e custos do impugnante nos anos de 1995, 1996 e 1997, foram os seguintes:

QUADRO 1

DescriçãoAno de 1995Ano de 1996Ano de 1997
Proveitos
Serviços prestados39.809.797$0047.859.676$007.394.490$00
Custos
Subcontratados38.452.220$0047.142.525$006.650.000$00
Outros custos138.534$0085.720$00-$-
Total dos custos38.590.754$0047.228.245$006.650.000$00
Resultado líquido1.219.244$00631.431$00744.490$00

l) Por força da desconsideração dos custos referidos no quadro anterior e relativos a subcontratados, foi corrigido o lucro tributável para 39.671.464$00, 47.751.431$00 e 7.394.490$00, respectivamente em relação aos anos de 1995, 1996 e 1997 (v. Quadro 17 de fls. 40).
m) Em consequência do referido na alínea anterior, e para os proveitos aí indicados, temos como custos, respectivamente, 138.534$00, 85.720$00 e zero escudos (anos de 1995, 1996 e 1997).»
E face à matéria de facto, assim especificada, no acórdão decidiu-se, em síntese, que:
- O recurso a métodos indirectos para fixação da matéria tributável em sede de IRS depende da verificação dos pressupostos legais, não podendo a AT a eles recorrer, sob pena de ilegalidade, quando não ocorram esses pressupostos.
- Deste modo, se a AT desconsiderar determinados custos constantes de facturas por as considerar falsas apenas está obrigada a efectuar correcções técnicas, não sendo obrigada a presumir a existência de custos na actividade e muito menos a recorrer a métodos indirectos para os apurar, por ser de presumir que eles existam.
- Todavia, se num caso como o dos autos, em que por ter desconsiderado quase todos os custos em sede de correcções técnicas, o contribuinte fica apenas com proveitos, sendo certo que é impossível no sector da construção civil (ou em qualquer outra actividade económica) a existência de proveitos sem custos ou com a proporção proveitos/custos considerada pela AT, impõe-se considerar que a escrita não permite a quantificação exacta ou aproximada da realidade, recorrendo-se ao apuramento da matéria tributável através de métodos indirectos.
- Ou seja, embora no acórdão se afirme, como princípio, que as facturas falsas determinam correcções meramente aritméticas, considera que haverá casos e que deve admitir-se a aplicação de métodos indirectos, como seja o ali questionado, em que os proveitos, mercê da desconsideração dos custos, ficam praticamente desacompanhados de custos, que se sabe que tiveram de existir.

Ora, do exposto, parece claro que, como bem se salienta nas contra-alegações da recorrida, existem diferenças fundamentais nas situações factuais subjacentes aos acórdãos em confronto.
Com efeito, a solução jurídica aceite no acórdão fundamento assenta num contexto factual específico, que o próprio acórdão faz reflectir na factualidade que aditou ao Probatório que fora fixado na sentença [ou seja, nas aditadas als. j) a m)].
Na verdade, diz-se no acórdão:
«… se examinarmos os factos acima dados como provados nas alíneas l) e m), desde logo concluiremos que o impugnante, no exercício de uma actividade em que a subcontratação de mão de obra assume valor significativo, ficou sem custos dessa mesma mão de obra.
E, uma vez que a escrita do contribuinte não permite apurar tais custos, sendo certo que a Administração Tributária recolheu indícios sérios e credíveis de que as facturas que titulavam tais custos eram falsas, temos de considerar que, abrangendo o apuramento da matéria tributável proveitos e custos, tem de ser encontrado um meio de apurar custos que, no caso concreto existiram e geraram os proveitos acima referidos e declarados pelo contribuinte.
Ora, essa forma de determinação tem de ser a avaliação indirecta.»

Sendo a total ou quase total ausência de custos o verdadeiro fundamento da decisão vertida no acórdão fundamento, é óbvio que essa situação tinha que estar replicada no acórdão recorrido para existir uma verdadeira oposição de julgados.
Ora, como o tribunal recorrido reconhece, não se mostra assente no probatório qual o valor dos custos subsistentes (subcontratos e pessoal próprio) após as correcções técnicas efectuadas por força da desconsideração das facturas falsas. E essa falta condiciona inteiramente a opção jurídica realizada no julgado em recurso, uma vez que o acórdão recorrido não ponderou a questão do valor dos custos subsistentes após as correcções e não decidiu, em consequência, sobre se tal montante permitia a obtenção dos proveitos declarados e respectivas consequências. Com efeito, no acórdão recorrido exarou-se (…) Desde logo, tal como aponta a Recorrente, recaindo ónus da prova sobre a impugnante, a esta competia demonstrar que a materialidade das operações económicas subjacentes às faturas, a saber: - que as prestações de serviços se haviam efetivado com as sociedades emitentes “F………………., Lda.” e “G……………..”, e não com qualquer outra entidade prestadora de serviços; - quais as quantidades precisas das prestações de serviços, local, natureza, preços praticados nas prestações de serviços que estariam em causa em cada uma das faturas.
Pois bem, lendo e relendo a matéria de facto apurada nos autos, não existe qualquer matéria que permita, sequer, apontar algum elemento capaz de contribuir para eventualmente viabilizar a pretensão da Recorrida.
O probatório é constituído pela indicação das facturas emitidas pela Recorrida com referência aos trabalhos realizados no âmbito das prestações que lhe foram adjudicadas, pela caracterização do enquadramento fiscal da Recorrida, o procedimento que culminou com o relatório de inspecção, as facturas postas em crise no âmbito desse relatório e ainda outros elementos.
Pois bem, as facturas que são questionadas não conseguem, só por si, comprovar a realidade que se pretende demonstrar, impondo-se evidenciar o processo a montante, ou seja, aquilo que foi contratado entre as partes as condições fixadas, com referência aos serviços a prestar e ao preço pagar por forma a tomar clara a leitura das facturas correspondentes.
Aliás, o probatório nada diz sobre os termos em que a ora Recorrida desenvolvia a sua actividade, do mesmo modo que não constam do mesmo elementos que possam ser utilizados para justificar o recurso subempreiteiros, sendo um deserto total no que concerne àquilo que interessa à prova da veracidade das transacções colocadas em crise pela AT (…).

Enquanto que no acórdão fundamento se adoptou a solução jurídica ali afirmada por considerar que «… se examinarmos os factos acima dados como provados nas alíneas l) e m), desde logo concluiremos que o impugnante, no exercício de uma actividade em que a subcontratação de mão de obra assume valor significativo, ficou sem custos dessa mesma mão de obra»,
Os arestos em confronto decidiram, pois, a mesma questão - legalidade do recurso a correcções técnicas para desconsideração de custos titulados por facturas falsas - de forma distinta, não por força de divergência de entendimentos jurídicos, mas, antes, por força de diferentes quadros factuais provados: além do mais, no acórdão fundamento a respectiva fundamentação jurídica acentua que «… tem de ser encontrado um meio de apurar custos que, no caso concreto existiram e geraram os proveitos acima referidos e declarados pelo contribuinte», enquanto que no acórdão recorrido tal fundamentação jurídica acentua que «… Assim sendo, e na medida em que a ora Recorrida não fez prova da veracidade das transacções em causa, aqui, tal como foi assumido pela AT, só podemos apontar e aceitar o procedimento de desconsiderar os custos correspondentes aos montantes inscritos nas facturas reputadas “falsas”, na medida em que os mesmos, pura e simplesmente, não foram suportados, pagos, pela impugnante, na medida em que só desta forma, se concretiza e respeita, nomeadamente, a exigência legal de só se poderem considerar custos ou perdas “os que comprovadamente forem indispensáveis para a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a imposto ou para a manutenção da fonte produtora ..” - cfr. art. 23° n° 1 do CIRC, o que significa que a sentença recorrida não pode manter-se, impondo-se a sua revogação.

Ou seja, independentemente de quaisquer outras vicissitudes, resulta claro da análise do julgamento feito no acórdão recorrido e no acórdão fundamento que não existe entre eles divergência e incompatibilidade que justifiquem e sirvam de fundamento ao presente recurso por oposição de acórdãos.
E porque, por um lado, apenas é relevante para fundamentar o recurso por oposição de julgados, a oposição entre soluções expressas, sendo que a oposição deverá existir relativamente às decisões propriamente ditas e não em relação aos seus fundamentos (não bastando a pronúncia implícita ou a mera consideração colateral, tecida no âmbito da apreciação de questão distinta) - cfr. Jorge de Sousa e Simas Santos, Recursos Jurisdicionais em Contencioso Fiscal, p. 424, acs. do Plenário deste STA, de 15/11/2006, rec. nº 387/05, bem como os acs. do Pleno desta Secção do STA, de 15/9/2010, recs. nºs. 344/2009 e 881/2009 - e, porque, por outro lado, a oposição de soluções jurídicas pressupõe identidade substancial das situações fácticas, embora esta deva ser entendida não como uma total identidade dos factos mas apenas como a sua subsunção às mesmas normas legais, concluímos que, no caso presente e no contexto factual e jurídico acima referenciado, a diversidade de soluções a que o Tribunal chegou nos dois casos em confronto não determina qualquer oposição de julgados, na medida em que não se verificam nem a alegada identidade substancial das situações fácticas em confronto nem divergência de soluções quanto à mesma questão de direito.
E, assim sendo, por falta dos pressupostos do recurso de oposição de julgados, este deve ser considerado findo, atento o disposto no nº 5 do art. 284º do CPPT.

4- DECISÃO
Termos em que, face ao exposto, acordam os Juízes do Pleno da Secção de Contencioso Tributário do STA em julgar findo o recurso.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 12 de Novembro de 2014. – José da Ascensão Nunes Lopes (relator) – Pedro Manuel Dias Delgado – Dulce Manuel da Conceição Neto – Joaquim Casimiro Gonçalves – Isabel Cristina Mota Marques da Silva – Francisco António Pedrosa de Areal Rothes – Ana Paula da Fonseca Lobo – Jorge Miguel Barroso de Aragão Seia – José Maria da Fonseca Carvalho.