Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:062/07
Data do Acordão:02/28/2007
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JORGE LINO
Descritores:EXECUÇÃO FISCAL.
RECLAMAÇÃO CONTENCIOSA.
RECLAMAÇÃO DE ACTO PRATICADO PELO ÓRGÃO DA EXECUÇÃO FISCAL.
PRAZO.
RECURSO JURISDICIONAL.
EFEITO SUSPENSIVO.
Sumário:I - Em processo de execução fiscal não têm aplicação os artigos 36º e 37º, e 146º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (respeitantes à comunicação ou notificação de actos em matéria tributária, e a diversos meios processuais acessórios em processo judicial tributário).
II - O processo de execução fiscal tem natureza judicial, e aos seus actos aplica-se o regime de notificação e de impugnação dos actos judiciais.
III - A reclamação judicial de acto proferido em processo de execução fiscal, ao abrigo do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, deve ser apresentada no prazo de 10 dias após a notificação de tal acto, nos termos do nº 1 do artigo 277º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e do artigo 144º do Código de Processo Civil, sob pena de intempestividade.
IV - Tem efeito suspensivo – de harmonia com os artigos 734°, nº 2, e 740º, nº 1, do Código de Processo Civil, e 286°, nº 2, in fine, do Código de Procedimento e de Processo Tributário – o recurso jurisdicional de decisão da reclamação judicial nos termos do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que deva subir imediatamente e nos próprios autos.
Nº Convencional:JSTA00064043
Nº do Documento:SA220070228062
Data de Entrada:01/23/2007
Recorrente:A...
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL.
Objecto:SENT TAF LISBOA DE 2006/11/28 PER SALTUM.
Decisão:NEGA PROVIMENTO.
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL - REC JURISDICIONAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART36 ART37 ART146 N1 ART276 ART277 N1 ART286 N2.
CPC96 ART144 N1 ART734 N2 ART740 N1.
CONST97 ART268 N1.
LGT98 ART18 ART59 N3 G.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC832/02 DE 2002/06/26.
Referência a Doutrina:JORGE DE SOUSA CÓDIGO DE PROCEDIMENTO E DE PROCESSO TRIBUTÁRIO ANOTADO E COMENTADO 2006 V1 ART12 NOTA6.
CASALTA NABAIS DIREITO FISCAL 2ED PAG355 PAG356 PAG357 PAG358 PAG359.
Aditamento:
Texto Integral: 1.1 “A..., L.DA” vem interpor recurso da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 28-11-2006, que decidiu, por extemporaneidade da presente reclamação judicial de acto do órgão da execução fiscal, abster-se de conhecer do pedido e absolver da instância a Fazenda Pública – cf. fls. 140 e seguintes.
1.2 Em alegação, a recorrente formula as seguintes conclusões – cf. fls. 151 a 156.
1. O Supremo Tribunal Administrativo, na sua secção de contencioso tributário, é competente para apreciar o presente recurso jurisdicional, por força do disposto no artigo 280°, nº 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, uma vez que apenas se discute e pretende discutir matéria de direito.
2. Ao presente recurso jurisdicional deve ser atribuído efeito suspensivo, sob pena de o mesmo perder o seu efeito útil, pelas razões supra referidas.
3. Salvo a existência de qualquer disposição especial — que, no caso, não existe -, os artigos 36°, nºs 1 e 2, e 37°, nºs 1 e 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário aplicam-se à notificação de quaisquer decisões da Administração Fiscal que sejam praticadas no quadro de processos tributários, como é o caso do processo de execução fiscal, ou de procedimentos tributários, sob pena de inconstitucionalidade por ofensa ao disposto no artigo 268.°, nºs 3 e 4, da Constituição da República.
4. A notificação do ofício nº 4.888, de 12 de Abril de 2005, que capeou a notificação do despacho proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Leiria - 2, do dia 4 do mesmo mês e ano, que fixou o valor da garantia exigida no processo de execução fiscal que aqui está em causa, não observou o disposto no artigo 36°, nºs 1 e 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, uma vez que não continha todos os elementos exigidos neste preceito.
5. Os elementos em falta no ofício referido na conclusão anterior foram expressamente solicitados ao Chefe do Serviço de Finanças de Leiria - 2, através de pedido de certidão correspondente, com a invocação do disposto nos artigos 36°, nºs 1 e 2, e 37°, nºs 1 e 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
6. Com a apresentação do pedido referido na conclusão anterior, o prazo para desencadear o meio de defesa adequado para reagir contra o despacho de fixação do valor da garantia exigida ficou interrompido enquanto o referido Chefe do Serviço de Finanças de Leiria - 2 não deu resposta a tal pedido de certidão, como resulta do disposto no artigo 37°, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
7. Idêntico efeito se manteve perante a ausência de resposta do Chefe do Serviço de Finanças de Leiria - 2 e a apresentação, pela ora recorrente, de um pedido de intimação daquele para a passagem da certidão pretendida, por força do disposto no artigo 146.°, nº 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário e artigos 104.°, nº 2, e 106.°, nº 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
8. A certidão pretendida apenas foi emitida em 5 de Agosto de 2005, pelo que apenas nessa data se iniciou a contagem do prazo para a ora recorrente deduzir reclamação judicial do despacho de fixação do valor da garantia exigida, proferido em 4 de Abril do mesmo ano.
9. A conjugação dos artigos 36.°, nºs 1 e 2, 37°, nºs 1 e 2, 146.°, nº 1, 276° e seguintes do referido Código de Procedimento e de Processo Tributário, artigos 104°, nº 2, e 106°, nº 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 144°, nº 2, do Código de Processo Civil, determina que a contagem do prazo para reagir judicialmente contra o despacho de 4 de Abril de 2005, proferido pelo Chefe do Serviço de Finanças de Leiria - 2, apenas se iniciou a partir de 5 de Agosto de 2005, com a notificação da certidão emitida em execução da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria.
10. A conjugação dos mesmos preceitos, associada ao facto de o dia 15 de Agosto de 2005 - décimo dia após a notificação - ter sido feriado, levaram a que o termo do prazo para deduzir a referida reclamação tenha coincidido com o dia 16 de Agosto de 2005, justamente a data em que a recorrente o fez.
11. A sentença proferida pelo Tribunal a quo, ao ter decidido - mal - pela intempestividade da reclamação judicial apresentada, violou o disposto nos artigos conjugados 36.°, nºs 1 e 2, 37°, nºs 1 e 2, 146°, n° 1, 276° e seguintes do referido Código de Procedimento e de Processo Tributário, artigos 104°, nº 2, e 106°, nº 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e 144.°, nº 2, do Código de Processo Civil, devendo, por isso, ser substituída por outra.
Termos em que deve o presente recurso jurisdicional ser julgado procedente, por provado, revogando-se a decisão recorrida, proferida pelo Tribunal a quo, com as legais consequências, designadamente a sua substituição por outra que reconheça a tempestividade da reclamação judicial apresentada, assim se fazendo justiça.
Mais requer, pelas razões descritas, a atribuição de efeito suspensivo ao presente recurso jurisdicional.
1.3. Não houve contra-alegação.
1.4 O Ministério Público neste Tribunal emitiu o seguinte parecer – cf. fls. 179 verso.
O julgado é de confirmar pela sua bondade (e na linha da jurisprudência desta secção que cita), sendo certo, ademais, que o acto do chefe do serviço de finanças estabelecido no nº 2 do probatório da sentença recorrida não é um “acto em matéria tributária”, suposto no artº 37º do CPP Tributário, mas um acto processual.
Termos em que sou de parecer que o recurso não merece provimento.
1.5. Cumpre decidir, em conferência.
A recorrente vem dizer, desde logo, que «deve ser atribuído ao presente recurso jurisdicional efeito suspensivo, nos termos previstos no artigo 286º, nº 2, do referido Código de Procedimento e de Processo Tributário».
É que, diz, «o presente recurso jurisdicional insere-se em anterior reclamação judicial do despacho que concretamente fixou o valor da garantia exigida pelo Serviço de Finanças de Leiria-2 no processo de execução fiscal»; «e a tal reclamação judicial foi atribuído efeito suspensivo, nos termos dos artigos 276° e seguintes do Código de Procedimento e de Processo Tributário, justamente por força dos prejuízos decorrentes da sua retenção»; «ora, ao presente recurso jurisdicional deve igualmente ser atribuído o mesmo efeito suspensivo, sob pena de o mesmo não ter utilidade».
Nos termos do artigo 286º, nº 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, «Os recursos têm efeito meramente devolutivo, salvo se for prestada garantia nos termos do presente Código ou o efeito devolutivo afectar o efeito útil dos recursos».
Como é sabido, o recurso tem efeito meramente devolutivo quando a sua interposição não obsta à execução imediata da decisão recorrida, dele resultando apenas a atribuição, ao tribunal superior, da possibilidade de alterar ou anular a decisão anterior. E efeito suspensivo, que assim se lhe contrapõe, quando o recurso, além daquele efeito, tem, ainda, o de impedir que se dê imediata execução à decisão recorrida.
Por modos que não tem qualquer sentido ordenar a subida imediata e nos próprios autos mas com efeito devolutivo.
Aliás, nos processos urgentes, como é o caso (artigo 278.°, nº 5, do Código de Procedimento e de Processo Tributário), a tramitação urgente da reclamação, com subida imediata e nos próprios autos, consequência igual urgência na tramitação do recurso jurisdicional e propicia o efeito suspensivo do recurso (cfr. Jorge de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário Anotado, 4.ª ed., pág. 1051, nota 8 in fine).
Cf. a este respeito os acórdãos desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 16-8-2006, recurso nº 0689/06, e de 8-11-2006, recurso nº 938-06.
Neste caso, o recurso subiu imediatamente na própria execução fiscal –, já que a reclamação judicial (cuja decisão está agora em crise) é processada nessa mesma execução.
De resto, o recurso já está a ser processado com efeito suspensivo, pois que, como se disse, teve subida imediata e nos próprios autos, estando, pois, já concretizado o efeito suspensivo pretendido pela recorrente.
Por isso, o presente recurso jurisdicional, que subiu imediatamente, e nos próprios autos, deve ter efeito suspensivo – de harmonia com o disposto nos artigos 734.°, nº 2, e 740º, nº 1, do Código de Processo Civil, e 286°, nº 2, in fine, do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Como assim, deve ser fixado ao presente recurso jurisdicional o efeito suspensivo (e não o efeito meramente devolutivo com que o recurso foi admitido na instância).
Posto isto, importa saber se a presente reclamação judicial de decisão do órgão da execução fiscal foi apresentada dentro do prazo legal, ou não, o que implica especialmente saber se a sentença recorrida fez correcta interpretação e aplicação, ou não, do disposto nos artigos 277º, nº 1; 36º, nºs 1 e 2; 37º, nºs 1 e 2; e 146º, nº 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário – o que constitui a principal questão decidenda, em face do teor da sentença recorrida, das conclusões da alegação, bem como da posição do Ministério Público.
2.1 Em matéria de facto, a sentença recorrida assentou o seguinte – cf. fls. 245 a 249.
1. O Processo de execução fiscal nº ..., foi instaurado contra A..., Lda., no Serviço de Finanças de Leiria 2, por dívidas de IRC, Juros Compensatórios e de Mora do ano de 2002 no montante total de € 89.674,66, tudo conf. informações oficiais a fls. 65 e doc. de fls. 66 e 67 dos autos.
2. No âmbito do processo supra referido foi, em 04/04/2005, proferido despacho com o seguinte teor
“Fixo em 119 059,19 (cento e dezanove mil e cinquenta e nove euros e dezanove cêntimos) o valor da garantia a prestar nos termos do art.° 199º nº 1 do CPPT.
Notifique a executada para proceder à prestação da garantia desse valor por uma das formas previstas no citado preceito legal e, no prazo de 15 dias, sob pena de prosseguimento dos autos com penhora em bens que garantam idêntico valor.
(...)”
tudo conforme fls. 92 dos autos que aqui se dá por integralmente reproduzido.
3. A reclamante tomou conhecimento do conteúdo deste despacho por carta emitida pelo SF de Leiria 2 onde foi aposta mecanicamente no canto superior direito a data de 15/04/2005, conf. fls. 96 dos autos.
4. Em 18/04/2005 a agora reclamante solicita junto do Chefe do Serviço de Finanças de Leiria 2, uma certidão contendo todos os elementos considerados para efeitos de cálculo da garantia, conf. doc. de fls. 40 a 42 dos autos.
5. Não tendo obtido resposta intentou acção de intimação para passagem de certidão neste TAF, onde correu os seus termos com o nº ..., decidida em 06/06/2005 em seu favor, tido conforme fls. 44 a 46 dos autos.
6. A certidão a que supra se refere foi emitida em 03/08/2005 por ..., conf. doc. de fls. 59 a 61 dos autos.
7. E foi enviada ao aqui reclamante por carta registada com aviso de recepção em 05/08/2005 (oficio nº 9506), conf. fls. 58 dos autos
8. E a presente reclamação apresentada em 16/08/2005 no Serviço de Finanças de Leiria 2, conforme consta de fls. 4.
2.2. As decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro são susceptíveis de reclamação para o tribunal tributário de l.ª instância – nos termos do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (na redacção da Lei nº 109-B/2001 de 27 de Dezembro).
O nº 1 do artigo 277º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, sobre o “Prazo e apresentação da reclamação”, preceitua de modo muito claro que «A reclamação será apresentada no prazo de 10 dias após a notificação da decisão e indicará expressamente os fundamentos e conclusões.».
De outra banda, e sob a epígrafe “Notificações em geral”, o artigo 36º do Código de Procedimento e de Processo Tributário preceitua que «Os actos em matéria tributária que afectem os direitos e interesses legítimos dos contribuintes só produzem efeitos em relação a estes quando lhes sejam validamente notificados.» (nº 1); e que «As notificações conterão sempre a decisão, os seus fundamentos e meios de defesa e prazo para reagir contra o acto notificado, bem como a indicação da entidade que o praticou e se o fez no uso de delegação ou subdelegação de competências.» (nº 2).
Por sua vez, o artigo 37º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, sob a epígrafe “Comunicação ou notificação insuficiente”, estabelece que «Se a comunicação da decisão em matéria tributária não contiver a fundamentação legalmente exigida, a indicação dos meios de reacção contra o acto notificado ou outros requisitos exigidos pelas leis tributárias, pode o interessado, dentro de 30 dias ou dentro do prazo para reclamação, recurso ou impugnação ou outro meio judicial que desta decisão caiba, se inferior, requerer a notificação dos requisitos que tenham sido omitidos ou a passagem de certidão que os contenha, isenta de qualquer pagamento.» (nº 1); e que «Se o interessado usar da faculdade concedida no número anterior, o prazo para a reclamação, recurso, impugnação ou outro meio judicial conta-se a partir da notificação ou da entrega da certidão que tenha sido requerida.» (nº 2).
Como se vê, as vias previstas, quer no artigo 36º, quer no artigo 37º, acabados de enunciar, dizem respeito à comunicação de actos ou decisões “em matéria tributária”, e visam alcançar a perfeição, a suficiência ou a eficácia da notificação de actos ou decisões “em matéria tributária”, com a finalidade de possibilitar a utilização esclarecida e conveniente do meio judicial próprio em relação a actos ou a decisões “em matéria tributária”.
De acordo com o que consta do site da DGCI (cf. também Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e de Processo Tributário, anotado e comentado, 2006, I vol., nota 6. ao artigo 12º; e Casalta Nabais, Direito Fiscal, 2.ª edição, pp. 355 a 359), são considerados actos “em matéria tributária” mormente os seguintes:
a) As acções preparatórias ou complementares da liquidação dos tributos, incluindo parafiscais, ou de confirmação dos factos tributários declarados pelos sujeitos passivos ou outros obrigados tributários;
b) A liquidação dos tributos, quando efectuada pela administração tributária;
c) A revisão, oficiosa ou por iniciativa dos interessados, dos actos tributários;
d) A emissão, rectificação, revogação, ratificação, reforma ou conversão de quaisquer outros actos administrativos em matéria tributária, incluindo sobre benefícios fiscais;
e) As reclamações e os recursos hierárquicos;
f) A avaliação directa ou indirecta dos rendimentos ou valores patrimoniais;
g) A cobrança das obrigações tributárias, na parte que não tiver natureza judicial;
h) A contestação de carácter técnico relacionada com a classificação pautal, a origem ou o valor das mercadorias objecto de uma declaração aduaneira, sem prejuízo da legislação especial aplicável;
i) Todos os demais actos dirigidos à declaração dos direitos tributários.
Se, na sua fase de cobrança voluntária, a cobrança das obrigações tributárias não tem natureza judicial, é justamente na sua fase coerciva – conforme é entendimento da melhor doutrina e da jurisprudência desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo – que a cobrança das obrigações tributárias marcadamente assume natureza judicial no processo de execução fiscal.
E, como se viu, para a aplicação dos artigos 36º e 37º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, torna-se necessário que os actos ou decisões notificandas sejam de natureza substancialmente administrativa, e não judicial.
De resto, o processo de execução fiscal, como processo judicial que é, permite todos os meios de impugnação próprios dos actos judiciais, garantindo um esclarecido e conveniente exercício e defesa dos direitos do executado, o qual poderá, v.g., acusar obscuridades, arguir insuficiências, irregularidades e nulidades, e sempre com a possibilidade de recurso ao Tribunal através da reclamação prevista no artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Cf., ao que se julga neste sentido, o acórdão desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 26-6-2002, proferido no recurso nº 832/2002, onde se defende, a respeito da «regularidade e validade da citação», que «cumpria arguir a respectiva irregularidade no processo executivo, tanto mais dada a sua natureza judicial».
Por outro lado, sobre “Meios processuais acessórios”, o artigo 146º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, no seu nº 1 (na redacção introduzida pela Lei nº 30-B/2000, de 29 de Dezembro), reza que «Para além do meio previsto no artigo seguinte [Intimação para um comportamento], são admitidos no processo judicial tributário os meios processuais acessórios de intimação para a consulta de documentos e passagem de certidões, de produção antecipada de prova e de execução dos julgados, os quais serão regulados pelo disposto nas normas sobre o processo nos tribunais administrativos.».
Assegura-se, assim – nas palavras também do citado acórdão desta Secção do Supremo Tribunal Administrativo, de 26-6-2002, recurso nº 832/2002 – o direito à informação previsto no artigo 268°, nº 1, da Constituição e concretizado, desde logo, no artigo 59°, nº 3, al. g), da Lei Geral Tributária – cf. ainda o artigo 67.°, nº 1, deste último diploma legal. E, desde logo, à chamada informação procedimental. O contribuinte, entendido nos termos do artigo 18° da mesma lei, isto é como sujeito passivo da relação jurídica tributária, "seja como contribuinte directo, substituto ou responsável", tem, pois, direito a ser informado sobre o andamento dos processos em que seja directamente interessado, bem como o de conhecer as decisões definitivas que sobre eles forem tomadas, tendo acesso aos respectivos processos.
No caso sub judicio – e para a dilucidação da questão decidenda, de saber se a presente reclamação judicial de decisão do órgão da execução fiscal foi apresentada dentro do prazo legal, ou não – da legislação acima anotada, e pelas razões aí expostas, vale para a situação apenas o artigo 277º, nº 1, do Código de Procedimento e de Processo Tributário, pelo que importa verificar se a sentença recorrida deu correcta interpretação e aplicação, ou não, a esse dispositivo legal.
Neste específico ponto a sentença recorrida pronuncia-se como segue.
Tendo o despacho reclamado sido proferido em 04/04/2005 e confirmando a reclamante na petição inicial o seu recebimento, (pontos 2. a 4. do probatório), quando a presente reclamação foi apresentada, em 16/08/2005, já havia há muito expirado o prazo legal de 10 dias a que refere o art.° 277° do CPPT e 144.° do CPC.
Neste sentido e porque se trata de um prazo peremptório, de caducidade e de conhecimento oficioso, cuja invocação a lei não torna dependente da vontade do interessado (artº 496° do Código Processo Civil), o seu decurso faz extinguir o direito de praticar o acto, neste caso, o direito de deduzir reclamação.
Segundo julgamos, a sentença recorrida decidiu com acerto e fundamentadamente.
O despacho em causa, a fixar «o valor da garantia a prestar nos termos do art.° 199º nº 1 do CPPT», foi proferido no presente processo de execução fiscal.
Como assim, e independentemente da arguição perante o órgão da execução de eventuais obscuridades, insuficiências, irregularidades, nulidades, ou ilegalidades, esse despacho haveria de ter sido atacado, e não foi, no prazo peremptório de 10 dias estabelecido no nº 1 do artigo 277º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, pelo meio próprio de reclamação para o tribunal tributário de 1.ª instância ao abrigo do artigo 276º do mesmo Código de Procedimento e de Processo Tributário – sendo certo que, tanto os artigos 36º e 37º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, como o artigo 146º do mesmo Código de Procedimento e de Processo Tributário, estabelecem medidas e meios que não servem para o processo de execução fiscal.
Pelo que, e em resposta ao thema decidendum, estamos neste passo a dizer que a presente reclamação judicial de decisão do órgão da execução fiscal não foi apresentada dentro do prazo legal – razão por que deve ser confirmada a sentença recorrida que decidiu nesta conformidade.
E, então, podemos concluir que em processo de execução fiscal não têm aplicação os artigos 36º e 37º, e 146º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (respeitantes à comunicação ou notificação de actos em matéria tributária, e a diversos meios processuais acessórios em processo judicial tributário).
O processo de execução fiscal tem natureza judicial, e aos seus actos aplica-se o regime de notificação e de impugnação dos actos judiciais.
A reclamação judicial de acto proferido em processo de execução fiscal, ao abrigo do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, deve ser apresentada no prazo de 10 dias após a notificação de tal acto, nos termos do nº 1 do artigo 277º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, e do artigo 144º do Código de Processo Civil, sob pena de intempestividade.
Tem efeito suspensivo – de harmonia com os artigos 734.°, nº 2, e 740º, nº 1, do Código de Processo Civil, e 286°, nº 2, in fine, do Código de Procedimento e de Processo Tributário – o recurso jurisdicional de decisão da reclamação judicial nos termos do artigo 276º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, que deva subir imediatamente e nos próprios autos.
3. Termos em que se acorda negar provimento ao recurso, atribuindo-se-lhe, todavia, efeito suspensivo.
Custas pela recorrente, com procuradoria de 1/6.
Lisboa, 28 de Fevereiro de 2007.- Jorge Lino (relator) – Lúcio BarbosaAntónio Calhau.