Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0434/13
Data do Acordão:04/17/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:LINO RIBEIRO
Descritores:RECLAMAÇÃO DE ÓRGÃO DE EXECUÇÃO FISCAL
SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO
Sumário:A reclamação prevista nos artigos 276º e ss do CPPT não se inclui entre os casos de suspensão da prescrição abrangidos pelas designações genéricas de meios processuais incluídas no nº 4 do art. 49º da LGT.
Nº Convencional:JSTA00068214
Nº do Documento:SA2201304170434
Data de Entrada:03/15/2013
Recorrente:A......, SA
Recorrido 1:FAZENDA PÚBLICA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF PORTO
Decisão:PROVIDO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT - EXEC FISCAL.
Legislação Nacional:CPPTRIB99 ART276.
LGT ART49 N4.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC052/10 DE 2010/02/10; AC STA PROC01054/10 DE 2011/02/09; AC STA PROC0117/11 DE 2011/06/08.; AC STA PROC0711/11 DE 2011/11/02.; AC STA PROC0450/13 DE 2013/04/03.
Referência a Doutrina:DIOGO LEITE DE CAMPOS E OUTROS - LGT ANOTADA E COMENTADA 4ED NOTA2 PAG408.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

1.1. A……… S.A, com os sinais dos autos, interpõe recurso da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, que negou provimento à reclamação da decisão do Chefe do Serviço de Finanças do Porto, no processo de execução fiscal n.º 3603200101004069, indeferindo o pedido de prescrição das dívidas exequendas.
Nas respectivas alegações, conclui o seguinte:
1. A reclamação do acto do órgão de execução fiscal não integra uma das causas de suspensão da prescrição previstas no n.º 3 do artigo 49° da LGT, com a redacção originária à data dos factos, sendo certo que as causas de suspensão da prescrição estão taxativamente previstas;
2. Sendo que a reclamação aí mencionada deve ser interpretada como significando “reclamação graciosa”, por conjugação com a norma constante do artigo 169° n.º 1 do CPPT, onde se estabelece a suspensão da execução fiscal em consequência da apresentação de reclamação graciosa, desde que constituída ou prestada garantia ou efectuada penhora que garanta a totalidade da dívida exequenda e do acrescido;
3. Dado que a reclamação do acto do órgão de execução fiscal é tramitada no processo de execução fiscal, o processo de execução fiscal não esteve parado e portanto não teve a virtualidade de suspender a prescrição;
4. Na reclamação do acto do órgão de execução fiscal em apreço não foi invocado qualquer fundamento de inexigibilidade da dívida exequenda;
5. Apenas se estava a discutir a alocação errada efectuada pela Administração Tributária do valor da compensação n.º 2007 00000007213 aos processos de execução fiscal com ns.° 3387200001030183 e 3387200401015966;
6. Não se discutiu assim, no âmbito da reclamação do acto do órgão de execução fiscal a exigibilidade da dívida exequenda, não se preenchendo assim o pressuposto estabelecido no n.º 1 do artigo 169° do CPPT, por forma a suspender o processo executivo;
7. Mas apenas se discutindo a compensação e qual o processo executivo a que a mesma deveria ser imputada;
8. Ao contrário do alegado na sentença recorrida pelo Tribunal a quo, de que o processo de execução fiscal esteve parado mais de um ano por facto imputável ao sujeito passivo, o tempo que decorreu entre a apresentação da reclamação do ato do órgão de execução fiscal (Processo n.° 1410/07.8 BEPRT) e a sua conclusão decorreu da insistência da Administração Tributária e do Tribunal a quo em não seguirem as conclusões do Tribunal ad quem que deram razão à A………;
9. Deste modo, podemos concluir que a douta sentença recorrida incorre em erro de julgamento, pois o Tribunal a quo, na interpretação e aplicação do artigo 49°, n.º 3, da LGT, ao considerar que a reclamação do acto do órgão de execução fiscal consubstancia causa de suspensão do prazo de prescrição.
10. Consequentemente, deve o presente recurso ser julgado procedente e revogada a douta sentença do Tribunal a quo, e, em consequência, o pedido subjacente à reclamação do acto do órgão de execução fiscal interposta pela Recorrente deve ser julgado procedente, com todas as consequências legais,

1.2. Não houve contra-alegações.
1.3 O Ministério Público emitiu parecer no sentido de se averiguar se a execução esteve efectivamente parada em consequência da reclamação.

3. A sentença deu por assentes os seguintes factos:

1. No Serviço de Finanças (SF) do Porto, em 09.11.2002, foi instaurada a execução fiscal n.° 3387200201507478, contra a reclamante (fls. 429 e ss. do PEF em anexo);
2. Para cobrança do IVA devido pelos períodos de Setembro, Outubro e Novembro do ano de 2001, no montante de €2.627,73;
3. A reclamante foi citada em 20.03.2003 (fls. 433);
4. Em 17.05.2007 a reclamante apresentou reclamação do acto do órgão de execução fiscal (fls. 671 e ss. do PEF em anexo);
5. Que correu termos neste Tribunal sob o n.º 1410/07.8;
6. Que foi admitida por despacho judicial de 21.06.2007 (fls. 677 e ss. do PEF em anexo);
7. Cuja decisão transitou em julgado em 18.07.2011 «fls. 1020 e ss. do PEF em anexo);
8. Em 16.08.2011 a reclamante requereu ao OEF a declaração de prescrição da dívida exequenda (fls. 1117 e ss. do PEF em anexo);
9. Por despacho do OEF, de 14.02.2012, foi indeferida a requerida declaração de prescrição (fls. 1135 e ss. do PEF em anexo);
10. Desta decisão a reclamante deduziu a presente reclamação.


3. A única questão que suscita a apreciação deste Tribunal consiste em saber se a reclamação prevista no artigo 276º do CPPT constitui uma das causas suspensivas do prazo de prescrição previstas nº 4 do 49º da LGT.
A sentença recorrida considerou que aquela reclamação suspende sempre o prazo de prescrição, independentemente do seu fundamento, pois se a Administração Tributária está impedida de prosseguir com a cobrança da dívida «é natural que não lhe possa ser assacada a inércia e não lhe possa ser oposta a prescrição da dívida exactamente por não ter actuado».
Contra esse entendimento, diz o recorrente que a “reclamação” prevista no nº 4 do artigo 49º corresponde à “reclamação graciosa” prevista no artigo 169º do CPPT, sendo certo que na reclamação que efectuou em 17/5/07 do acto praticado pelo órgão de execução fiscal não se discutiu a inexigibilidade da dívida.
Ora, esta mesma questão foi apreciada recentemente, no acórdão deste STA proferido no recurso nº 450/13, datado de 3 de Abril, em que as partes são as mesmas e as conclusões idênticas.
Por isso, sendo o colectivo constituído por dois dos adjuntos que aprovaram o referido acórdão e concordando-se basicamente com os fundamentos arvorados naquela jurisprudência, é caso para se decidir sumariamente o recurso, tal como se exige no nº 3 do art. 8º do CCv e se permite nos arts. 94º nº 3 do CPTA e 713º nº 5 do CPC, tendo um vista a interpretação e aplicação uniforme do direito.
Assim sendo, explicita-se no referido acórdão n.º 450/13 o seguinte:
Constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal (cfr. entre muitos outros, os nossos Acórdãos de 10 de Fevereiro de 2010, rec. n.º 52/10, de 9 de Fevereiro de 2011, rec. n.º 1054/10, de 8 de Junho de 2011, rec. n.º 117/11 e de 2 de Novembro de 2011, rec. n.º 711/11) que para o cômputo, em concreto, da prescrição das dívidas exequendas, há que atender às causas de interrupção ou suspensão da prescrição previstas na lei vigente à data da respectiva ocorrência, ex vi do disposto no n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil.
Ora, ao tempo em que foi deduzida a reclamação de acto do órgão de execução cujo efeito suspensivo se controverte no presente recurso dispunha já o n.º 4 do artigo 49.º da LGT que: «O prazo de prescrição legal suspende-se em virtude do pagamento em prestações legalmente autorizadas, ou enquanto não houver decisão definitiva ou passada em julgado, que puser termo ao processo, nos casos de reclamação, impugnação, recurso ou oposição, quando determinem a suspensão da cobrança da dívida».
Entendeu o tribunal “a quo” que a reclamação de actos apresentada pela reclamante em 17/05/2007, tendo a natureza de um recurso, configura uma causa de suspensão da execução a ser tida em consideração uma vez que determinou a suspensão do processo executivo em apreço.
Ora, não obstante a lei tributária assim a designar na alínea d) do artigo 101.º e no artigo 97.º, n.º 1, alínea n) do CPPT, não nos parece inequívoca tal inclusão para efeitos de suspensão da prescrição, em face das hesitações e incertezas reflectidas na variação terminológica que o legislador utiliza para designar este meio de defesa dos lesados perante decisões do órgão da execução fiscal praticados no processo de execução fiscal (cfr. o Acórdão deste STA de 20 de Janeiro de 2011, rec. n.º 1077/09) e atento o especial vigor do princípio da legalidade tributária constitucionalmente exigido em matéria de garantias dos contribuintes (cfr. o n.º 2 do artigo 103.º da Constituição da República).
Entendemos, ao invés - como julgado no Acórdão deste Supremo Tribunal de 2 de Março de 2011, proferido no recurso n.º 0125/11 e subscrito pela Relatora como 2.ª adjunta - , que « (…) a reclamação prevista nos arts. 276º e sgts. do CPPT, não está contemplada como facto com eficácia suspensiva na previsão da disposição normativa aplicável (actual nº 4 e, anteriormente, o nº 3, ambos do art. 49° da LGT), pois que a expressão «reclamação» ali mencionada deve ser interpretada como significando reclamação graciosa, por conjugação com a norma constante do art. 169° nº 1 CPPT, onde se estabelece a suspensão da execução fiscal em consequência da apresentação de reclamação graciosa, desde que constituída ou prestada garantia ou efectuada penhora que garanta a totalidade da quantia exequenda e do acrescido.». Pelo que, »(…) na falta de preceito que tal disponha, não pode entender-se que a reclamação prevista nos arts. 276º e segts. do CPPT suspenda a execução, pois que, por um lado não se encadeia com a prestação de garantia e, por outro lado, é processada nos próprios autos de execução fiscal, sendo que também o recurso dela interposto sobe nos próprios autos, (imediatamente, aliás, quando se invocar prejuízo irreparável ou quando a retenção lhe fizer perder a respectiva utilidade - cfr. por todos, o ac. de 20/1/2010, rec. nº 01258/09).
Não se desconhece a posição qualificada de JORGE LOPES DE SOUSA, que a recorrente revela também conhecer, que inclui entre os casos de suspensão da prescrição todos os que sejam abrangidos pelas designações genéricas de meios processuais incluídas no n° 4 do art. 49° da LGT, aí se incluindo «a reclamação de actos praticados pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária [prevista nos arts. 276° a 278° do CPPT, denominada também como «recurso» no art. 101°, alínea d), da LGT e no art. 97°, n° 1, alínea n), do CPPT], desde que seja invocado um fundamento de inexigibilidade (pois só nestes casos se suspenderá a execução, à face do n° 1 do art. 169° do CPPT)» (cfr. Sobre a Prescrição da Obrigação Tributária, Notas Práticas, 2ª ed., 2010, pags. 54/55). Como não se desconhece a anotação discordante de DIOGO LEITE DE CAMPOS/BENJAMIM SILVA RODRIGUES e JORGE LOPES DE SOUSA (Lei Geral Tributária: Anotada e Comentada, 4.ª ed., 2012, nota 2 de p. 408) ao Acórdão a cujo entendimento aderimos e que parece ter inspirado o decidido.
Não obstante, ainda que fosse de reconhecer que a reclamação fundamentada na inexigibilidade da dívida exequenda teria efeito suspensivo da prescrição, tal entendimento não confirmaria a bondade do decidido no que se refere à reclamação a que se referem as alíneas e) a i) do probatório fixado e cujo efeito suspensivo se controverte, porquanto esta reagiu contra uma compensação de créditos alegadamente ilegal (e que como tal veio a ser julgada), não tendo, pois, por fundamento a inexigibilidade da dívida exequenda.
Ora, considerando que a reclamação a que se referem as alíneas e) a i) do probatório fixado não tem efeito suspensivo do prazo de prescrição, impõe-se concluir que, ao contrário do decidido, está prescrita a dívida exequenda a que se refere o despacho reclamado, não podendo a reclamação que está na origem dos presentes autos - mesmo que se lhe reconhecesse efeito suspensivo por estar em causa a inexigibilidade da dívida exequenda em virtude da prescrição – suspender um prazo que entretanto se extinguira já.
Pelo exposto, forçoso é concluir que o recurso merece provimento, sendo de revogar a sentença recorrida e julgar procedente a reclamação”.

4. Pelo exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida, julgando procedente a reclamação deduzida por estar prescrita a dívida objecto do despacho reclamado.
Custas pela Fazenda Pública, apenas em 1.ª instância pois não contra-alegou neste supremo Tribunal.
Lisboa, 17 de Abril de 2013. – Lino Ribeiro (relator) – Dulce Neto - Isabel Marques da Silva.