Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0759/14.8BEALM
Data do Acordão:02/05/2020
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:JOSÉ GOMES CORREIA
Descritores:IRS
CONTABILIDADE ORGANIZADA
REGIME SIMPLIFICADO DE TRIBUTAÇÃO
OPÇÃO
Sumário:I - O regime geral de tributação (art. 28º do CIRS) é o da contabilidade e o regime da tributação pelo regime simplificado sempre será supletivo, desde que não haja opção ou condições obrigatórias de enquadramento no regime da contabilidade.
II - O regime simplificado de tributação (artigo 28.º do Código do IRS) constitui um regime não vinculativo, válido somente para quem não tenha optado pelo regime de contabilidade organizada.
III - A inclusão automática ou por obrigação legal no regime geral encontra-se sujeita à regra de validade por três anos (exercícios) estabelecida ao tempo no artº 28º nº 5 do CIRS.
Nº Convencional:JSTA000P25530
Nº do Documento:SA2202002050759/14
Data de Entrada:10/31/2019
Recorrente:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Recorrido 1:A............ E OUTROS
Votação:MAIORIA COM 1 VOT VENC
Aditamento:
Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo

I – Relatório

Vem interposto recurso jurisdicional pela Autoridade Tributária e Aduaneira, visando a revogação da sentença de 29-01-2019, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Almada, que julgou procedente a impugnação intentada por A………… e B…………, sinalizados nos autos, tendo sido decidido anular a liquidação de IRS referente ao ano de 2012, na parte em que efectuou a determinação da matéria colectável da categoria B através do regime simplificado, assim como ficou decidido anular a decisão da Directora de Serviços do IRS que indeferira o recurso hierárquico apresentado.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Autoridade Tributária e Aduaneira as seguintes conclusões:

I. Decidiu o Tribunal “a quo” pela procedência da presente Impugnação por concluir que os Impugnantes teriam, no ano de 2012, de ser tributados, em sede de IRS, no regime da contabilidade organizada e não no regime simplificado de tributação, atento o disposto no art.º 28.º do CIRS, decisão com a qual, com o devido respeito, não se concorda;
II. Entende a Autoridade Tributária, contra o decidido, que o n.º 5 do art.º 28.º do CIRS, ao referir que «(…) o período de permanência em qualquer dos regimes é de três anos, prorrogável por iguais períodos, exceto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do número anterior, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido.», tem aplicação necessária para os casos em que exista opção por esse regime de determinação.
III. Na redação do art.º 28.º do CIRS anteriormente à alteração introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29/12, apenas estava previsto período mínimo de permanência de três anos no regime simplificado, tendo os sujeitos passivos que apresentar declaração de alterações “até ao fim do mês de março do ano em que pretendem utilizar a contabilidade organizada como forma de determinação do rendimento” - não consta que o sujeito passivo A………… tenha optado pelo regime de tributação pela contabilidade organizada, tendo sempre ali ficado enquadrado por vinculação legal – e foi precisamente para esclarecer as dúvidas que então surgiram com a alteração legislativa ocorrida para o ano de 2007 e seguintes, que veio o Exm.º Sr. Diretor Geral da então Direção Geral dos Impostos emitir a Circular n.º 05/2007, de 13.03.2007. E ainda que as orientações genéricas visem a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços, não deixou aquela de ser do conhecimento dos vários interessados – pode ali ler-se: “1. Aos sujeitos passivos que estejam obrigatoriamente abrangidos pelo regime de apuramento dos rendimentos empresariais e profissionais com base na contabilidade por não preencherem os requisitos previstos no nº 2 artigo 28º do Código do IRS não se aplica o período mínimo de permanência previsto no nº 5 do mesmo artigo, uma vez que o seu enquadramento não resulta de uma opção.”
IV. A alteração trazida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29.12, veio no sentido de desonerar o contribuinte da obrigação de opção anual caso pretendesse ficar no regime da contabilidade (necessariamente por ali não estar por obrigação legal), passando qualquer um dos regimes a ter um prazo de três anos prorrogável, o que até é reconhecido pela Douta Sentença, recorrendo a José Guilherme Xavier de Basto: «fechou-se assim uma fonte de dificuldades para os contribuintes que decidem optar pelo regime de contabilidade organizada. Sabem agora que a opção é válida por três anos, prorrogáveis por iguais períodos e que se pretenderem a alteração do seu regime (no caso, obviamente de preencherem para tanto as condições) é que são obrigados a comunica-lo através de declarações de alterações.»
V. E caso tivesse existido opção por este regime da contabilidade, já após a entrada em vigor da redação dada ao art.º 28.º pela Lei 53-A/2006, de 29.12, a mesma seria válida por três anos, prorrogáveis – mas não existiu. Não tinha, assim, a Impugnante de vir fazer opção pelo regime simplificado pois apenas estava no regime da contabilidade por imposição legal, atentos os limites legalmente impostos, verificados anualmente, e não por qualquer opção;
VI. O n.º 6 do art.º 28.º do CIRS, apenas prevê a passagem do regime simplificado para o regime da contabilidade e não o inverso, isto é, da contabilidade para o simplificado no período dos três anos, como afirma a Douta Sentença, precisamente porque, pelo n.º 2, caso não exista opção, e não seja atingido o volume de rendimentos, sempre o sujeito passivo estará enquadrado no regime simplificado;
VII. Seria redundante tal previsão - estando o sujeito passivo no regime da contabilidade organizada por obrigação e não tendo atingido volume de negócios que o obrigue a aí permanecer, então fica abrangido pelo regime simplificado. Não há que fixar qualquer caducidade do regime da contabilidade organizada. É a concretização lógica (atento o n.º 2 do artigo) - quando o que está em causa é o enquadramento pelo volume de negócios e não por qualquer opção – do facto de não ser atingido o montante necessário para ali permanecer;
VIII. Não tendo optado e caso no ano anterior (ou nos dois anos anteriores) não tenha obtido os rendimentos legalmente previstos para o efeito, está enquadrado no regime simplificado, e não em outro. A obrigação legal do enquadramento por volume de rendimentos vale para um exercício, não para três, ao contrário do aqui decidido;
IX. Todo o dispositivo legal tem uma sequência lógica e sistemática, subvertida pelo agora decidido. Começa por indicar quais os regimes de determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, indicando que não sendo ultrapassado determinado montante anual ficam os sujeitos passivos obrigatoriamente abrangidos pelo regime simplificado. De seguida, é estipulado que, ainda que estando no regime simplificado, podem os sujeitos passivos fazer opção pela contabilidade, necessariamente em determinados momentos temporais; caso exista a opção, então o período mínimo de permanência em qualquer dos regimes é de três anos, prorrogável por iguais períodos, a não ser que, no final de cada um destes períodos de três anos, o sujeito passivo venha optar pelo outro;
X. No entanto, caso esteja abrangido pelo regime simplificado – não existindo opção pela contabilidade lá estará – cessa a aplicação do regime simplificado, caso sejam ultrapassados determinados rendimentos, fazendo-se então a tributação pela contabilidade organizada a partir do período de tributação seguinte;
XI. Resulta do normativo que apenas se pode estar no regime da contabilidade de duas maneiras: porque se optou, ou por a ele se estar obrigado, atento o volume de rendimentos – efetivo ou estimado (no ano de início). Obviamente, não se optando, nem se atingindo os rendimentos necessários está-se no regime simplificado – é o que resulta do disposto nos n.ºs 1, 2, 3 e 4 do artigo;
XII. O facto de não estar plasmado na lei qualquer cessação do regime da contabilidade tal como está previsto para o regime simplificado (no caso por quantitativo de rendimentos), na vigência do período de três anos, não permite concluir que os três anos de permanência têm aplicação no caso de enquadramento no regime da contabilidade por obrigação legal. Isto porque o mesmo raciocínio vale para afirmar o contrário: que não está previsto qualquer motivo de cessação na vigência de três anos da contabilidade organizada precisamente porque a obrigação legal de lá estar vale apenas para um ano, não havendo que legislar expressamente quanto à sua cessação, que decorre naturalmente da aplicação do regime;
XIII. Bem andou a Douta Sentença ao afirmar que «uma vez efectuada a opção pelo regime de contabilidade organizada, o Impugnante A………… só teria de regressar ao regime simplificado de tributação, por sua iniciativa e desde que reunisse os requisitos legais para tal, não necessitado de, anualmente, renovar tal opção de manutenção no regime.» -.» - ou seja, coloca, e bem, o enfoque na opção realizada;
XIV. Já não se concorda, no entanto, que venha afirmar que a mesma permanência pelo período de três anos se verifica nas situações em que o sujeito passivo caiu no regime da contabilidade por imperativo legal, ainda que não manifestando qualquer intenção nesse sentido;
XV. Ao decidir, como decidiu, pela ilegalidade da liquidação Impugnada, incorreu o Tribunal “a quo” em erro de julgamento de direito, por violação do disposto no art.º 28.º do CIRS.
Nestes termos e nos mais de Direito aplicável, requer-se a V.ªs Ex.ªs se dignem julgar PROCEDENTE o presente recurso, por totalmente provado e em consequência ser a douta sentença ora recorrida, revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue totalmente improcedente a presente Impugnação, tudo com as devidas e legais consequências.

Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Supremo Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, por, em substância, a decisão recorrida ter feito uma correcta análise e interpretação dos factos e correcta se mostra a sua subsunção jurídica, mostrando-se ancorada em pertinente jurisprudência e doutrina que a propósito cita, não sendo passível de quaisquer censuras até porque a solução nela ditada está na linha da jurisprudência deste STA, designadamente a consagrada nos Acórdãos de 04.11.2015, proc. nº 0877/15 e de 03.07.2019, no processo nº 01277/14.0BEALM.
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Os autos vêm à conferência corridos os vistos legais.

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2. FUNDAMENTAÇÃO:

2.1. - Dos Factos:

Na decisão recorrida foi fixado o seguinte probatório reputado relevante para a decisão:

1. O Impugnante A………… esteve colectado pela actividade de comércio a retalho de têxteis em estabelecimento especializado – facto admitido por acordo;
2. O Impugnante A………… ficou, na sua actividade, sucessivamente enquadrado no regime de contabilidade organizada, desde o ano de 2001, por obrigação legal – facto admitido por acordo;
3. No exercício de 2011, o Impugnante A………… ficou enquadrado, para efeitos de tributação em IRS, no regime de contabilidade organizada – cfr. fls. 6 a 9 do processo administrativo apenso aos autos;
4. O volume de negócios respeitante ao total das vendas e prestações de serviços resultante da actividade do Impugnante A………… no ano de 2011 foi de € 148.881,83 – facto admitido por acordo;
5. No primeiro trimestre de 2012, o Impugnante A………… não declarou à Administração Fiscal pretender ser tributado pelo regime de contabilidade organizada – facto admitido por acordo;
6. No dia 23 de Maio de 2013, os Impugnantes submeteram, por transmissão electrónica de dados, a declaração de rendimentos do ano de 2012, na qual constava o Anexo “C”, relativo aos rendimentos da “categoria B – Contabilidade Organizada” – cfr. informação a fls. 48 do processo administrativo apenso aos autos;
7. A Administração Fiscal não aceitou a declaração de rendimentos referida no ponto anterior, com base na contabilidade organizada, por entender que o Impugnante A………… estava enquadrado no regime simplificado de tributação (Erro C70 – incompatibilidade entre o anexo entregue e opção em cadastro) – cfr. fls. 66 do processo administrativo apenso aos autos;
8. Em 20 de Junho de 2013, os Impugnantes apresentaram nova declaração de rendimentos para o ano de 2012, na qual a matéria tributável da categoria B do Impugnante A………… era apurada através do regime simplificado de tributação – cfr. fls. 18 a 20, bem como informação a fls. 48 do processo administrativo apenso aos autos;
9. Em resultado da declaração referida no ponto anterior foi emitida, com data de 22 de Julho de 2013 e em nome dos Impugnantes, a liquidação de IRS n.º 2013 5005206408, no montante a pagar de € 5.247,62 – cfr. fls. 69 do processo administrativo apenso aos autos;
10. Os Impugnantes deduziram Reclamação Graciosa contra a liquidação de IRS referida no ponto anterior – cfr. fls. 60 a 65 do processo administrativo apenso aos autos;
11. Por despacho proferido em 21 de Outubro de 2013, o Chefe de Divisão de Justiça Tributária da Direcção de Finanças de Setúbal indeferiu a reclamação graciosa apresentada, com fundamento em que o Impugnante A………… não optou, em 2012, pelo regime de contabilidade organizada – cfr. despacho de fls. 78 e informação de fls. 72 a 74 do processo administrativo apenso aos autos;
12. Da decisão de indeferimento da reclamação graciosa referida supra, os Impugnantes interpuseram recurso hierárquico, o qual mereceu decisão de indeferimento, em 31 de Março de 2014, da Directora de Serviços do IRS, com fundamento no regime simplificado ser o regime regra, acrescentando que os sujeitos passivos abrangidos pelo regime de contabilidade teriam de validar todos os anos o seu volume de negócios em face dos requisitos previstos no n.º 2 do artigo 28.º do CIRS, de molde a optarem ou não, pelo regime de contabilidade, no caso do referido volume de negócios se reduzir novamente a valores inferiores ao fixado na norma atrás citada, o que não foi feito – cfr. despacho e informação de fls. 47 a 54 dos autos.
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2.2.- Motivação de Direito

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, nos termos dos artigos 5º, 608º nº 2, 635º nºs 4 e 5 e 639º do CPC.
No caso, em face dos termos em que foram enunciadas as conclusões de recurso pela recorrente, a questão que cumpre decidir subsume-se a saber se a decisão vertida na sentença a qual julgou procedente a impugnação, padece de erro de julgamento por ao caso ser aplicável o regime simplificado e não o regime de contabilidade organizada, violando, desse modo, o disposto no artigo 28.º do CIRS.
Vejamos.
Patenteia o probatório que à data dos factos (2012) o sujeito passivo se mantinha no regime da contabilidade organizada que valia pelo período de 3 anos renováveis por iguais períodos, desde que não houvesse comunicação de alteração a esse regime por parte daquele, face ao disposto no nºs 5 e 6 do artigo 28º do CIRS.
Mas será que, como propugna a EPGA, é aplicável ao caso a jurisprudência reiterada no Ac. deste STA-SCT de 03.07.2019, Processo nº 01277/14.0BEALM (Relatora: Srª Juíza Conselheira Isabel Marques da Silva), versando um caso com contornos similares ao tratado nestes autos e que, por razões de economia, celeridade e uniformidade nos limitaríamos a seguir para, a final, julgar improcedente o recurso e confirmar a decisão recorrida?
Atentemos, pois, no discurso jurídico do referido douto aresto:
“(…) Como é jurisprudência reiterada deste Supremo Tribunal Administrativo, do disposto no n.º 1 do artigo 28.º do Código do IRS resulta (salvo no caso da imputação prevista no artigo 20.º do mesmo Código) que a determinação dos rendimentos empresariais e profissionais se faz com base na aplicação das regras do regime simplificado ou com base nas regras do regime de contabilidade organizada, ficando abrangidos pelo regime simplificado em cada ano os sujeitos passivos que não tenham ultrapassado, no período de tributação imediatamente anterior, qualquer dos limites indicados no n.º 2 daquela disposição legal e não tenham optado pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade (assim vide, a título de exemplo, os Acórdãos deste STA proferidos a 27 de Janeiro de 2010 no Processo n.º 0906/09 e a 4 de Novembro de 2015 no Processo n.º 0877/15).
Assim é porque, como bem resulta das palavras de Rui Duarte Morais, “Sobre o IRS”, 2006, Almedina, p. 73, “a regra do nosso sistema fiscal é o lucro ser apurado com base na contabilidade”, caso em que “a matéria colectável de imposto corresponderá então ao resultado contabilístico dessa actividade (art. 29.º, n.º 1), depois de “corrigido” segundo as prescrições da lei fiscal”. Paralelamente, o regime simplificado constitui um regime não vinculativo, válido somente para quem não tenha optado pelo regime de contabilidade organizada. Como ensina SALDANHA SANCHES, Fiscalidade (Julho/Outubro de 2001), o regime simplificado tem sempre como pressuposto uma opção do contribuinte que renuncia ao seu direito subjectivo de ser tributado com base na contabilidade, sendo uma das situações em que a lei atribui relevância à sua vontade e em que ele pode optar pelo regime que considera mais favorável.
Ora, de acordo com o probatório fixado na sentença recorrida (…) os Recorridos optaram expressamente pela respectiva tributação, em sede de IRS, ao abrigo do regime geral da contabilidade organizada. E considerando esta opção manifestada de forma expressa, não havia como oficiosamente obrigar os Recorridos a serem tributados pelo regime simplificado nos anos de 2011 e 2012 (ao contrário do que sufraga a Recorrente).
Com efeito, e conforme resulta do Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo proferido a 27 de Janeiro de 2010 no âmbito do Processo n.º 0906/09, tendo o sujeito passivo optado “pelo regime de contabilidade organizada, não havia como aplicar-lhe o regime simplificado, pois que o preceito não previa a caducidade dessa opção nem fixava qualquer período mínimo de permanência no regime geral (ao contrário do que sucede hoje, na versão que foi conferida ao artigo 28.º n.º 5 do CIRS pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro)”, independentemente de essa opção ter sido exercida na Declaração de Início de Actividade ou numa Declaração de Alterações, pois que esta última declaração substitui, no que toca a este aspecto e para todos os legais efeitos, a Declaração de Início de Actividade, ao abrigo do disposto no n.º 5 do artigo 112.º do Código do IRS.
Neste mesmo sentido vai o Acórdão deste STA proferido a 17 de Março de 2010 no Processo n.º 056/10, onde se consigna que, “tendo o sujeito passivo tributado pelo regime simplificado apresentado em 7 Setembro de 2001 a sua opção pelo regime de contabilidade organizada - Declaração de Alterações -, por aplicação do disposto no nº 4 do artº 31º do CIRS, passou a ser tributado por esse regime nos anos seguintes, independentemente do volume de vendas e do período de permanência no anterior regime de tributação simplificado”.
Apenas assim não seria no caso de os Recorridos se encontrarem sujeitos ao regime simplificado (por falta de opção pelo regime geral e inclusão automática no regime simplificado), caso em que, como se escreveu no já referido Acórdão deste Supremo Tribunal Administrativo proferido a 27 de Janeiro de 2010 no âmbito do Processo n.º 0906/09, a norma legal lhe exigia “que entregasse, no caso de pretender ser tributado pelo regime geral num determinado ano, a declaração de alterações até ao fim do mês de Março desse ano. Se ele já se encontrava inserido no regime geral, por opção feita na declaração de início de actividade nos termos da alínea a) do nº 4, não tinha de renovar anualmente essa opção nos termos da alínea b) do nº 4” (nosso sublinhado).
Portanto, perante o comportamento declarativo adoptado pelos Recorridos em 2006, impõe-se considerar como válida e relevante essa opção pelo regime geral de contabilidade relativamente ao ano de 2006 e relativamente aos exercícios seguintes, incluindo os anos de 2011 e de 2012 que se encontram em causa nos presentes autos. O que não sofre qualquer alteração por força do enquadramento legal dos recorridos no período compreendido entre 2007 e 2010 nem por força da alteração legislativa introduzida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro (ao contrário do que a Recorrente pretende fazer crer).
Com efeito, tendo os Recorridos exercido a sua opção pela tributação ao abrigo do regime geral de contabilidade organizada em 2006, revela-se inócuo apurar se reiteraram expressamente a vontade de continuarem a ser tributados ao abrigo desse regime nos anos que se encontram em análise ou se nele foram incluídos automática e implicitamente por força da opção geral anteriormente exercida. E revela-se também inócuo perceber se no período decorrido entre 2007 e 2010 foram obrigatoriamente enquadrados no regime geral de contabilidade organizada porque, como já se referiu, a opção exercida em 2006 manteve-se válida nos anos sob análise independentemente de o valor dos rendimentos obtidos pelos Recorridos os situar, em cada ano, no regime de contabilidade organizada por opção ou por obrigação.
Por outro lado, a entrada em vigor da Lei 53-A/2006, de 29 de Dezembro não tem qualquer impacto no caso dos autos na medida em que, ainda que se considere que tal Lei é de aplicação imediata na situação sub judice (por força do disposto no n.º 3 do artigo 12.º da Lei Geral Tributária, que prevê que “as normas sobre procedimento e processo são de aplicação imediata, sem prejuízo das garantias, direitos e interesses legítimos anteriormente constituídos dos contribuintes”), os anos em análise continuariam incluídos pela nova redacção conferida por aquela Lei ao n.º 5 do artigo 28.º do Código do IRS, que passou a estabelecer que “o período mínimo de permanência em qualquer dos regimes a que se refere o n.º 1 é de três anos, prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do número anterior, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido”. Como resulta claramente do texto legal, na ausência de comunicação de alterações por parte do Sujeito Passivo, o período mínimo de permanência no regime de contabilidade organizada foi automaticamente prorrogado por 3 períodos de 3 anos, abrangendo necessariamente os anos de 2011 e de 2012.
Este tem sido, aliás, o entendimento deste STA e que não vemos razões para alterar, por tudo quanto aduzimos anteriormente. Assim, veja-se o Acórdão do STA proferido a 4 de Novembro de 2015 no Processo n.º 0877/15, onde se escreveu que “no caso, o recorrido impugnante marido estava, por opção, a ser tributado, no triénio 2006/2008, de acordo com a contabilidade organizada e não tendo optado pela alteração desse regime no momento em que o poderia ter feito, tal regime mantém-se, pois que, como se viu e bem refere a sentença recorrida, nos termos do n° 5 do art. 28º do CIRS, o período mínimo de permanência em qualquer dos regimes a que se refere o n° 1 é de três anos, prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da al. b) do nº 4, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido”. O que os Recorridos não fizeram no caso sub judice, motivo pelo qual não podia a Administração Tributária ter-se substituído aos Recorridos nessa opção.”
Vejamos, no entanto, se a sentença em crise nos presentes autos é passível da censura que lhe é dirigida pela recorrente quando expende que, no caso dos autos “(…) temos que desde 2001 (e até 2011) o Impugnante A............ se encontrava abrangendo pelo regime de contabilidade organizada para efeitos de determinação dos rendimentos da categoria B de IRS (cfr. pontos 2 e 3 do probatório), e que após 2007, o período mínimo de permanência era, nos preditos termos do n.º 5 do artigo 28.º do Código de IRS, de 3 anos, à míngua de alteração de regime. Assim, uma vez efectuada a opção pelo regime de contabilidade organizada, o Impugnante A………… só teria de regressar ao regime simplificado de tributação, por sua iniciativa e desde que reunisse os requisitos legais para tal, não necessitado de, anualmente, renovar tal opção de manutenção no regime.
Nem sendo motivo para o seu enquadramento no regime simplificado de tributação em 2012, o facto de em 2011 (ano imediatamente anterior) ter um volume de vendas inferior a € 150.000,00, pois não há qualquer requisito específico quanto ao valor dos rendimentos auferidos para que os sujeitos passivos possam optar pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade, não tendo de optar, pelo regime de contabilidade, no caso do referido volume de negócios se reduzir novamente a valores inferiores ao fixado na norma atrás citada todos os anos – cfr. o acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 11 de Maio de 2016, tirado no processo n.º 01536/15, disponível em www.dgsi.pt. Não tendo o Impugnante A………… pretendido alterar o regime de tributação dos rendimentos auferidos pelo regime de contabilidade organizada, a liquidação efectuada (e motivada por comunicação da Administração Fiscal, que não aceitou a declaração apresentada pelos Impugnantes ao abrigo de tal regime – cfr. pontos 6 e 7 do probatório -, padece do erro de violação de lei, por erro nos pressupostos de direito.
Assim como as decisões da reclamação graciosa e do recurso hierárquico que se louvam no mesmo entendimento. Por tudo o exposto, importa declarar procedente a presente Impugnação, e, em consequência, anular a liquidação de IRS impugnada, na parte em que efectuou a determinação da matéria colectável da categoria B do Impugnante A………… através do regime simplificado de tributação.”
Vejamos.
À data, o art. 28º do CIRS dispunha o seguinte [com as alterações introduzidas pela Lei nº 30-G/2000, de 29/12, do DL 198/2001, de 3/7 (que renumerou os arts. do CIRS), da Lei nº 109-B/2001, de 27/12, da Lei nº 32-B/2002, de 30/12, do DL nº 211/2005, de 7/12, e da Lei nº 53-A/2006, de 29/12]:
“Artigo 28.º - Formas de determinação dos rendimentos empresariais e profissionais
1 - A determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, salvo no caso da imputação prevista no artigo 20.º, faz-se:
a) Com base na aplicação das regras decorrentes do regime simplificado;
b) Com base na contabilidade.
2 - Ficam abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tenham ultrapassado no período de tributação imediatamente anterior um montante anual ilíquido de rendimentos desta categoria de (euro) 150 000. (Redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04)
3 - Os sujeitos passivos abrangidos pelo regime simplificado podem optar pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade. (Redacção do DL 211/2005-07/12)
4 - A opção a que se refere o número anterior deve ser formulada pelos sujeitos passivos: (Redacção da Lei 53-A/2006-29/12)
a) Na declaração de início de actividade;
b) Até ao fim do mês de Março do ano em que pretendem alterar a forma de determinação do rendimento, mediante a apresentação de declaração de alterações. (Redacção da Lei 53-A/2006-29/12)
5 - O período mínimo de permanência em qualquer dos regimes a que se refere o n.º 1 é de três anos, prorrogável por iguais períodos, excepto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do número anterior, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido. (Redacção da Lei 53-A/2006-29/12)
6 - A aplicação do regime simplificado cessa apenas quando o montante a que se refere o n.º 2 seja ultrapassado em dois períodos de tributação consecutivos ou, quando o seja num único exercício, em montante superior a 25%, caso em que a tributação pelo regime de contabilidade organizada se faz a partir do período de tributação seguinte ao da verificação de qualquer desses factos. (Redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04)
7 - Os valores de base necessários para o apuramento do rendimento tributável são passíveis de correcção pela Direcção-Geral dos Impostos nos termos do artigo 39.º, aplicando-se o disposto no número anterior quando se verifiquem os pressupostos ali referidos.
8 - Se os rendimentos auferidos resultarem de serviços prestados a uma única entidade, excepto tratando-se de prestações de serviços efectuadas por um sócio a uma sociedade abrangida pelo regime de transparência fiscal, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 6.º do Código do IRC, o sujeito passivo pode optar pela tributação de acordo com as regras estabelecidas para a categoria A, mantendo-se essa opção por um período de três anos. (Redacção da Lei n.º 64-A/2008, de 31 de Dezembro)
9 - Sempre que da aplicação dos indicadores de base técnico-científica a que se refere o n.º 1 do artigo 31.º se determine um rendimento tributável superior ao que resulta dos coeficientes estabelecidos no n.º 2 do mesmo artigo, pode o sujeito passivo, no exercício da entrada em vigor daqueles indicadores, optar, no prazo e nos termos previstos na alínea b) do n.º 4, pelo regime de contabilidade organizada, ainda que não tenha decorrido o período mínimo de permanência no regime simplificado. (Redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04)
10 - No exercício de início de actividade, o enquadramento no regime simplificado faz-se, verificados os demais pressupostos, em conformidade com o valor anual de rendimentos estimado, constante da declaração de início de actividade, caso não seja exercida a opção a que se refere o n.º 3. (Redacção dada pela Lei n.º 3-B/2010-28/04)
11 - Se, tendo havido cessação de actividade, esta for reiniciada antes de 1 de Janeiro do ano seguinte àquele em que se tiverem completado 12 meses, contados da data da cessação, o regime de determinação dos rendimentos empresariais e profissionais a aplicar é o que vigorava à data da cessação. (Aditado pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro)
12 - O referido no número anterior não prejudica a possibilidade de a DGCI autorizar a alteração de regime, a requerimento dos sujeitos passivos, quando se verifique ter havido modificação substancial das condições do exercício da actividade. (Aditado pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro)
13 - Exceptuam-se do disposto no n.º 11 as situações em que o reinício de actividade venha a ocorrer depois de terminado o período mínimo de permanência. (Redacção dada pela Lei n.º 53-A/2006 de 29/12)”.
Do disposto neste art. 28º do CIRS, resulta que a determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, salvo no caso de imputação prevista no art. 20º do mesmo código, se faz com base na aplicação das regras do regime simplificado ou com base nas regras do regime de contabilidade organizada (nº 1), ficando abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tenham ultrapassado, no período de tributação imediatamente anterior, qualquer dos limites indicados no nº 2 e não tenham optado pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade. Sendo que esta opção tanto pode ser formalizada e exercida logo na declaração de início de actividade, como pode ser formalizada e exercida em declaração de alterações a apresentar até ao fim do mês de Março do ano em que se pretenda alterar a forma de determinação dos rendimentos (nºs. 3 e 4).
De todo o modo, embora no nº 6 se preveja, em termos de mudança de regime de tributação, a cessação do regime simplificado, já no que se refere à cessação do enquadramento no regime de contabilidade organizada e consequente saída de tal regime de tributação, para efeito de transição para o regime simplificado, nada se diz: o enquadramento do sujeito passivo no regime simplificado de tributação obedece apenas às regras que constam do transcrito nº 2 do art. 28º, sendo que o período mínimo de permanência em qualquer dos ditos regimes, é de três anos, prorrogável por iguais períodos, salvo se o sujeito passivo comunicar a sua alteração (nºs. 4 e 5).
De outro modo, também não pode olvidar-se que o regime geral de tributação é o da contabilidade (o regime de tributação pelo regime simplificado sempre será supletivo, desde que não haja opção ou condições obrigatórias de enquadramento no regime da contabilidade). Significa que a única excepção que faz cessar o período mínimo de 3 anos é a que se encontra prevista no nº 6 do art. 28º relativamente à cessação do regime simplificado e à passagem obrigatória do contribuinte para o regime da contabilidade, que poderá ocorrer em qualquer momento do ciclo de três anos, quando verificados os respectivos pressupostos; o mesmo não sucedendo, porém, no caso contrário, pois que não há norma idêntica para a cessação da vigência da tributação pelo regime da contabilidade durante o ciclo mínimo de três anos que se encontre a decorrer.
Nesse sentido se pronunciou o Acórdão do STA de 12-09-2018, no recurso nº01094/17, publicado em www.dgsi.pt.
Como salienta a recorrente, o n.º 5 do art.º 28.º do CIRS, ao estabelecer «(…) o período de permanência em qualquer dos regimes é de três anos, prorrogável por iguais períodos, exceto se o sujeito passivo comunicar, nos termos da alínea b) do número anterior, a alteração do regime pelo qual se encontra abrangido», inculca que tal norma tem aplicação necessária para os casos em que exista opção por esse regime de determinação.
Ora, da factualidade apurada não resulta que o impugnante haja exercido a opção pelo regime de contabilidade organizada, mas já resulta que sempre ali ficou enquadrado por vinculação legal.
A recorrente enfatiza que, foi precisamente para esclarecer as dúvidas que então surgiram com a alteração legislativa ocorrida para o ano de 2007 e seguintes, que veio o Exm.º Sr. Diretor Geral da então Direção Geral dos Impostos emitir a Circular n.º 05/2007, de 13.03.2007. E ainda que as orientações genéricas visem a uniformização da interpretação e aplicação das normas tributárias pelos serviços, não deixou aquela de ser do conhecimento dos vários interessados – pode ali ler-se: “1. Aos sujeitos passivos que estejam obrigatoriamente abrangidos pelo regime de apuramento dos rendimentos empresariais e profissionais com base na contabilidade por não preencherem os requisitos previstos no nº 2 artigo 28º do Código do IRS não se aplica o período mínimo de permanência previsto no nº 5 do mesmo artigo, uma vez que o seu enquadramento não resulta de uma opção.”
Por esse prisma, seriamos forçados a concordar com a recorrente no sentido de que a alteração trazida pela Lei n.º 53-A/2006, de 29.12, veio no sentido de desonerar o contribuinte da obrigação de opção anual caso pretendesse ficar no regime da contabilidade (necessariamente por ali não estar por obrigação legal), passando qualquer um dos regimes a ter um prazo de três anos prorrogável, o que até é reconhecido pela Douta Sentença, recorrendo a José Guilherme Xavier de Basto: «fechou-se assim uma fonte de dificuldades para os contribuintes que decidem optar pelo regime de contabilidade organizada. Sabem agora que a opção é válida por três anos, prorrogáveis por iguais períodos e que se pretenderem a alteração do seu regime (no caso, obviamente de preencherem para tanto as condições) é que são obrigados a comunica-lo através de declarações de alterações.» E caso tivesse existido opção por este regime da contabilidade, já após a entrada em vigor da redação dada ao art.º 28.º pela Lei 53-A/2006, de 29.12, a mesma seria válida por três anos, prorrogáveis – mas não existiu. Não tinha, assim, a Impugnante de vir fazer opção pelo regime simplificado pois apenas estava no regime da contabilidade por imposição legal, atentos os limites legalmente impostos, verificados anualmente, e não por qualquer opção.
Ora, tal como se reconhece na sentença, uma vez efectuada a opção pelo regime de contabilidade organizada, o impugnante A………… só teria de regressar ao regime simplificado de tributação, por sua iniciativa e desde que reunisse os requisitos legais para tal, não necessitado de, anualmente, renovar tal opção de manutenção no regime, o que vale por dizer que a opção realizada é determinante.
E já assim não será nas situações – como a presente - em que o sujeito passivo caiu no regime da contabilidade por imperativo legal, ainda que não manifestando qualquer intenção nesse sentido?
Parece ser essa a doutrina que também brota dos acórdãos deste STA acima citados, especialmente do que ficou transcrito.
Pontifica, ainda, a respeito o Acórdão do TCAS de 01.10.2014, tirado no recurso nº 07622/14, disponível no sítio www.dgsi.pt, relatado pelo 1º adjunto desta formação, ainda que sobre matéria de IRC mas que é transponível para o caso, segundo o qual “… da exegese da norma pode concluir-se que, verificando-se uma expressa opção pelo regime geral do sujeito passivo, esta mantém-se válida por um período de três exercícios, susceptível de renovação e só a inclusão automática no regime geral é que não se encontra sujeita àquela regra de validade por três exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.”
Voltando ao caso dos autos, acentua-se, mais uma vez, que o impugnante e ora recorrido não efectuou a opção pelo regime geral na declaração de início de actividade (em 2001 - cfr.nºs.1, 2 e 3 da matéria de facto provada), tendo ficado sucessivamente enquadrado no regime de contabilidade organizada desde então, por obrigação legal.
Sucede que no exercício de 2011, o Impugnante A………… ficou enquadrado, para efeitos de tributação em IRS, no regime de contabilidade organizada mas o volume de negócios respeitante ao total das vendas e prestações de serviços resultante da actividade do impugnante nesse ano de 2011 foi de €148.881,83, sendo que no primeiro trimestre de 2012, o Impugnante A………… não declarou à Administração Fiscal pretender ser tributado pelo regime de contabilidade organizada (cfr. pontos 1 a 5 do probatório).
Será, por isso e em definitivo, que incorreu o Tribunal “a quo” em erro de julgamento de direito, por violação do disposto no art.º 28.º do CIRS o que vale por dizer que colhem plenamente os fundamentos recursórios sob análise e que a sentença recorrida deve ser removida da ordem jurídica?
No fundo, a questão decidenda entronca nesta formulação simples: pode o contribuinte ser obrigatoriamente incluído no regime simplificado, que não é a regra, por iniciativa da administração, quando é certo que dos autos flui com segurança que no ano em que vem liquidado o imposto ainda não havia terminado o período de 3 anos que se havia iniciado em 2010? É que, iniciando-se a actividade em 2001, perfez 3 anos em 2004, mais 3 em 2007 e mais 3 em 2010 e faria mais 3 em 2013!
A nosso ver e percorrido todo o trilho discursivo que antecede, haverá que solver a questão por adesão à fundamentação vertida no Acórdão do STA-SCT, de 12 de Setembro de 2018, pesquisável em www.dgsi.pt. numa situação em que também não houve opção facto que, não foi considerado determinante para “obrigar” o contribuinte a “cair” no regime simplificado de tributação.
Nesse douto aresto se expende que:
“4.2. Do disposto neste art. 28º do CIRS, resulta que a determinação dos rendimentos empresariais e profissionais, salvo no caso de imputação prevista no art. 20º do mesmo código, se faz com base na aplicação das regras do regime simplificado ou com base nas regras do regime de contabilidade organizada (nº 1), ficando abrangidos pelo regime simplificado os sujeitos passivos que, no exercício da sua actividade, não tenham ultrapassado, no período de tributação imediatamente anterior, qualquer dos limites indicados no nº 2 e não tenham optado pela determinação dos rendimentos com base na contabilidade. Sendo que esta opção tanto pode ser formalizada e exercida logo na declaração de início de actividade, como pode ser formalizada e exercida em declaração de alterações a apresentar até ao fim do mês de Março do ano em que se pretenda alterar a forma de determinação dos rendimentos (nºs. 3 e 4).
De todo o modo, embora no nº 6 se preveja, em termos de mudança de regime de tributação, a cessação do regime simplificado, já no que se refere à cessação do enquadramento no regime de contabilidade organizada e consequente saída de tal regime de tributação, para efeito de transição para o regime simplificado, nada se diz: o enquadramento do sujeito passivo no regime simplificado de tributação obedece apenas às regras que constam do transcrito nº 2 do art. 28º, sendo que o período mínimo de permanência em qualquer dos ditos regimes, é de três anos, prorrogável por iguais períodos, salvo se o sujeito passivo comunicar a sua alteração (nºs. 4 e 5).
Aliás, também não pode esquecer-se que o regime geral de tributação é o da contabilidade (o regime de tributação pelo regime simplificado sempre será supletivo, desde que não haja opção ou condições obrigatórias de enquadramento no regime da contabilidade). Ou seja, como bem sublinha o MP, a única excepção que faz cessar o período mínimo de 3 anos é a que se encontra prevista no nº 6 do art. 28º relativamente à cessação do regime simplificado e à passagem obrigatória do contribuinte para o regime da contabilidade, que poderá ocorrer em qualquer momento do ciclo de três anos, quando verificados os respectivos pressupostos; o mesmo não sucedendo, porém, no caso contrário, pois que não há norma idêntica para a cessação da vigência da tributação pelo regime da contabilidade durante o ciclo mínimo de três anos que se encontre a decorrer.
No caso, vem provado que desde 01/01/2008 que o impugnante estava enquadrado no regime simplificado e que, a partir de 01/01/2010, passou a ser tributado pelo regime de contabilidade organizada, com fundamento na circunstância de ter ultrapassado, no ano de 2009, o valor que permitia a inclusão naquele primeiro regime.
No ano de 2011, mantendo-se integrado no regime da contabilidade organizada, apresentou um volume de negócios no montante de € 112.184,85, mas porque não exerceu a opção pelo regime de contabilidade, a AT veio a determinar o enquadramento no regime simplificado, a partir do ano de 2012, e a subsequente a liquidação de IRS do ano de 2012, na quantia de € 13.571,82, ora impugnada.
Ora, considerando o referido período mínimo de permanência de três anos, quer no regime geral da contabilidade, quer no regime simplificado de tributação e considerando que, como igualmente pondera o MP, o sujeito passivo não tinha que efectuar qualquer declaração de opção pelo regime de contabilidade organizada em relação a 2012 (pois que estava então a decorrer o período mínimo de anos previsto no nº 5 do art. 28º), só pode concluir-se que pela ilegalidade do reenquadramento (operado pela AT) do sujeito passivo no regime simplificado, a partir do ano de 2012.- sublinhado nosso.
Aliás, e considerando até a actual redacção do nº 5 do art. 28º do CIRS, também não se vê que, no essencial, a interpretação sustentada pela recorrente haja obtido acolhimento por parte da invocada jurisprudência.
Em suma, tendo a AT procedido, oficiosamente, relativamente ao IRS de 2012, à determinação dos questionados rendimentos pelo regime simplificado, a liquidação sindicada sofre de vício de violação de lei, como bem se entendeu na sentença recorrida, que deve, assim, ser confirmada.”
Enfim, dada a similitude do presente caso – dá-se a coincidência de ser o mesmo exercício – 2012- e de o triénio que estava em curso ainda não se ter esgotado- tendemos a sufragar o mesmo entendimento à luz do qual improcedem as Conclusões do recurso.

*

3.- DECISÃO

Nesta conformidade, acordam, em conferência, os Juízes da Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal em negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida com a antecedente fundamentação.

Custas pela recorrente.

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Lisboa, 5 de Fevereiro de 2020. - José Gomes Correia (relator) - Joaquim Condesso (vencido conforme voto que anexo). - Paulo Antunes.
VOTO DE VENCIDO
X
Votei vencido o presente acórdão pelas razões que exponho infra.
Do exame da matéria de facto provada, estruturada pelo Tribunal "a quo", retira-se a conclusão de que o impugnante marido (ora recorrido) não efectuou a opção de determinação da matéria colectável, em sede de I.R.S., rendimentos de categoria B, pelo regime de contabilidade organizada, nomeadamente, na declaração de início de actividade (em 2001 - cfr.nºs.1, 2 e 3 da matéria de facto provada), antes tendo ficado, sucessivamente, enquadrado no regime de contabilidade organizada desde então, por obrigação legal.
Mais se retira do probatório que no exercício de 2011, o impugnante A………… ficou enquadrado, para efeitos de tributação em I.R.S., no regime de contabilidade organizada. Apesar disso, o volume de negócios respeitante ao total das vendas e prestações de serviços foi de € 148.881,83, resultante da sua actividade nesse ano. Por outro lado, no primeiro trimestre de 2012, o impugnante não declarou à Administração Fiscal pretender ser tributado pelo regime de contabilidade organizada (cfr.nºs.3 a 5 da factualidade provada).
Estamos face a situação em que o sujeito passivo de imposto é incluído por força da lei no regime de contabilidade organizada, cessando tal inclusão logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado, como foi o caso face ao ano de 2012 (em virtude de, em 2011, ter um volume de vendas inferior a € 150.000,00), ao abrigo do art°.28, n°.2, do C.I.R.S., na redacção em vigor em 2011/12.
Ainda, e contrariamente à tese que fez vencimento, no que diz respeito à exegese do citado art°.28, do C.I.R.S., defende o signatário, com apoio na doutrina, que tal normativo consagra um regime de opção pela contabilidade organizada e não inversamente, uma opção pelo regime simplificado. Ou seja, para os sujeitos passivos que tenham volumes de negócios que não excedam os limites consagrados no nº.2, o regime-regra é o regime simplificado, tendo o regime de contabilidade organizada aplicação no caso de haver declaração expressa de opção nesse sentido pelo sujeito passivo. Se o sujeito passivo nada disser, fica enquadrado no regime simplificado (cfr. José Guilherme Xavier Basto, I.R.S. Incidência Real e Determinação dos Rendimentos Líquidos, Coimbra Editora, 2007, pág.177 e 178).
Em síntese, da exegese da norma pode concluir-se que, verificando-se uma expressa opção pelo regime de contabilidade organizada do sujeito passivo, esta mantém-se válida por um período de três exercícios, susceptível de renovação e só a inclusão automática no regime geral é que não se encontra sujeita àquela regra de validade por três exercícios, cessando logo que se verifiquem os pressupostos legais para a aplicação do regime simplificado.
Revertendo ao caso dos autos, não tendo o impugnante e ora recorrido, em algum momento, efectuado uma expressa opção pelo regime de contabilidade organizada, como método de determinação da matéria colectável, em sede de I.R.S., rendimentos de categoria B, não releva o dito período de três anos de permanência, susceptível de renovação, consagrado no nº.5, do artº.28, do C.I.R.S., na redacção aplicável. Pelo contrário, a aplicação do regime de contabilidade organizada cessou quando se verificaram os pressupostos legais de emprego do regime simplificado, portanto, em 2012, atento o volume de vendas que teve no ano anterior, tudo por força da aplicação do nº.2 do preceito, norma que consagra o regime-regra, conforme supra explanado.
Donde, há que concluir, discordando da posição que fez vencimento, que o apuramento da matéria colectável e a consequente liquidação identificadas nos nºs.8 e 9 do probatório não padecem de qualquer vício de violação de lei, contrariamente ao decidido pelo Tribunal ʺa quo".
Com estes pressupostos, pugnava pelo provimento do recurso e a revogação da decisão recorrida, com as legais consequências.
X
Lisboa, 5 de Fevereiro de 2020
O Juiz Conselheiro
(Joaquim Manuel Charneca Condesso)