Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0999/16
Data do Acordão:09/22/2016
Tribunal:1 SECÇÃO
Relator:ALBERTO AUGUSTO OLIVEIRA
Descritores:ASILO
AUTORIZAÇÃO DE RESIDÊNCIA
APRECIAÇÃO PRELIMINAR
REVISTA
Sumário:Não é de admitir revista se a decisão do acórdão recorrido, em linha com a da 1ª instância, se apresenta bem sustentada e a problemática trazida ao recurso não revela complexidade ou relevo de importância fundamental.
Nº Convencional:JSTA000P20922
Nº do Documento:SA1201609220999
Data de Entrada:09/05/2016
Recorrente:A...
Recorrido 1:SERVIÇO DE ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS
Votação:UNANIMIDADE
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Formação de Apreciação Preliminar da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:

1.

1.1. A……….., cidadão natural do Estado do Gana, intentou contra o Ministério da Administração Interna – Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) – pedido de anulação da decisão da Directora-Geral Adjunta do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, de 18.04.2007, de recusa do seu pedido de asilo e de não admissão do pedido para efeitos de concessão de autorização de residência por razões humanitárias.

1.2. O Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, por acórdão de 18.3.2010 (fls. 177/194), julgou improcedente a acção.

1.3. O Tribunal Central Administrativo Norte, por acórdão de 08.04.2016 (fls. 292/329), negou provimento ao recurso.

1.4. É desse acórdão que o Autor vem, ao abrigo do artigo 150.º do CPTA, interpor recurso de revista.

Cumpre apreciar e decidir.

2.

2.1. Tem-se em atenção a factualidade considerada no acórdão recorrido.

2.2. O artigo 150.º, n.º 1, do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, «excepcionalmente», recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo «quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental» ou «quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito».
A jurisprudência deste STA, interpretando o comando legal, tem reiteradamente sublinhado a excepcionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser admitido nos estritos limites fixados neste preceito. Trata-se, efectivamente, não de um recurso ordinário de revista, mas antes, como de resto o legislador cuidou de sublinhar na Exposição de Motivos das Propostas de Lei nºs 92/VIII e 93/VIII, de uma «válvula de segurança do sistema» que apenas deve ser accionada naqueles precisos termos.

2.3. As instâncias decidiram, de forma convergente, que o pedido do recorrente era improcedente.
O recorrente imputa múltiplos vícios ao acórdão recorrido.
Vejamos.

Desde logo, vícios relacionados com a matéria de facto, por não terem sido considerados os vícios que suscitara quanto ao acórdão do TAF no respeitante à produção e apreciação de prova.
Neste segmento, deve notar-se que o acórdão recorrido considerou que «em relação aos apontados erros ou inexactidões, na factualidade apurada, a existirem, eles não têm a menor relevância para a decisão aqui em causa, já que não interferem na existência ou ocorrência dos pressupostos para a pretendida atribuição do pedido de asilo ou de autorização de residência por razões humanitárias»
Ora, para se estar perante questão de fundamental importância seria necessário, pelo menos, que se pudesse concluir, contra o acórdão, que os erros e inexactidões eram de forma tal que, ao contrário do julgado, interferiam na existência ou ocorrência dos pressupostos para o deferimento dos pedidos formulados.
Questiona-se o recorrente: «qual a factualidade, em concreto, a que o douto acórdão se refere e que não justifica a produção de prova sobre a mesma?»
A resposta será a de que haverá de ter-se em atenção, naturalmente, que o acórdão se reportou aos erros que eram apontados nas conclusões das respectivas alegações de recurso, sendo que o acórdão reproduziu todas essas conclusões (apenas lhes mudando a numeração).
Por isso, não aparece como razoável a alegação, com que culmina o enunciado da sua discordância, de que existe manifesta omissão de pronúncia.
As dificuldades de aceitação da apreciação do acórdão e a discordância directa sobre essa apreciação não são razão de nulidade.

Há, igualmente, uma alegação de divergência quanto à apreciação que o acórdão faz sobre o seu comportamento.
Ora, a ilação do acórdão, em linha com a do TAF, de que o seu comportamento denotaria incongruências e contradições, encontra-se, no essencial, fora do alcance de sindicância em revista (artigo 150.º, 4, do CPTA).
Apenas seria alcançável em razão de assentar em elementos que juridicamente não poderiam ser considerados.
Mas há que ver que já o acórdão do TAF examinara o comportamento do ora recorrente e respondera às observações que o mesmo fizera sobre as razões do seu comportamento. Esse exame apresenta-se sustentado e foi o que o acórdão coonestou.

Depois, sintetizando um conjunto de divergências, sustenta o recorrente que se está perante manifesta e provada violação do princípio da tutela jurisdicional efectiva.
Retenha-se o final do acórdão recorrido:
«Em suma:
- A posição assumida pelo Autor, aqui Recorrente, denota claras incongruências e contradições, o que não torna credível e convincente o relato efectuado aquando do seu pedido de asilo;
- acresce que o pedido de asilo foi apresentado pelo Autor muito para além do prazo previsto no art° 110 da Lei 15/98, de 26/03 - prazo esse de oito dias a partir da data de entrada em território nacional - sem que tenha sido apresentada justificação válida e credível;
- já no que à invocação do princípio da dúvida diz respeito, a sua aplicação pressupõe que a versão dos factos apresentada pelo requerente seja credível, coerente e consistente, o que, sublinhe-se, não se verifica no caso em apreço;
- e, em matéria de aplicação do princípio do non-refoulement, ela exige que se mostrem verificados os requisitos do direito de asilo ou do direito à autorização de residência, o que, como bem explanado no acórdão recorrido também não sucede;
- acresce que os relatos apresentados pelo Autor, para além de, como vimos, não serem consistentes, coerentes e credíveis, não apontam para uma situação de sistemática violação de direitos humanos no seu país que gere na generalidade dos residentes um sentimento de grave insegurança, já que as suas declarações se referiram, única e exclusivamente, ao que supostamente acontecia com alguns dos membros da associação a que alegadamente pertencia;
- também neste ponto o acto impugnado fez uma adequada interpretação e aplicação do direito ao considerar que não se mostram verificados os requisitos para seja concedido ao Recorrente o direito de residência por razões humanitárias;
- e, se tal acto interpretou e aplicou bem o direito, ao considerar não se mostrarem verificados os pressupostos para ser concedido ao Autor o direito de asilo ou de residência por razões humanitárias, a decisão judicial que o manteve tem de ser confirmada na ordem jurídica, já que também proferida com respeito pelos princípios, normas e trâmites legalmente estabelecidos».

O relato feito faz pressentir que não houve falta de possibilidade de intervenção do ora recorrente perante os tribunais, pedindo a sua decisão, e que eles discutiram, apreciaram e resolveram o que lhes era apresentado, embora essa decisão não corresponda à satisfação do que pedira.
Há um aspecto, que é aflorado pelo recorrente, quanto ao tempo de decisão. Mas esse não é elemento que possa pôr em causa a bondade intrínseca das apreciações feitas, e é só dessas que se pode cuidar no presente recurso.

Nestes termos, o recurso não revela haver clara necessidade da sua admissão para melhor aplicação do direito e a problemática colocada, tendo sido enfrentada do modo indicado, não se apresenta já como de importância fundamental.

3. Pelo exposto, não se admite a revista.
Sem custas.
Lisboa, 22 de Setembro de 2016. – Alberto Augusto Oliveira (relator) – Vítor Gomes – São Pedro.