Acórdãos STA

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0999/13
Data do Acordão:07/03/2013
Tribunal:2 SECÇÃO
Relator:ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores:RECURSO JUDICIAL
MÉTODOS INDIRECTOS
PROVA TESTEMUNHAL
INQUIRIÇÃO DE TESTEMUNHAS
RESIDÊNCIA NO ESTRANGEIRO
Sumário:Em recurso judicial da decisão de fixação da matéria tributável para efeitos de IRS por métodos indirectos nos termos do artigo 89.º-A da LGT, no qual o recorrente pretenda a inquirição das testemunhas residentes no estrangeiro fora do tribunal tributário, deve tal forma de inquirição ser logo requerida na petição inicial de recurso, por forma a que as diligências que o Tribunal terá de empreender junto das autoridades competentes com vista à respectiva realização não ponham em causa a celeridade que o legislador pretendeu imprimir a este meio processual, no qual os elementos de prova legalmente previstos como admissíveis têm logo de ser juntos com a petição inicial de recurso e a decisão deve ser tomada em 90 dias contados da data da apresentação do requerimento inicial.
Nº Convencional:JSTA00068330
Nº do Documento:SA2201307030999
Data de Entrada:06/03/2013
Recorrente:A.........
Recorrido 1:AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REC JURISDICIONAL
Objecto:SENT TAF LISBOA
Decisão:NEGA PROVIMENTO
Área Temática 1:DIR PROC TRIBUT CONT
Legislação Nacional:LGT98 ART89-A N8.
CPPTRIB99 ART146-B N3 ART118 ART119.
Jurisprudência Nacional:AC STA PROC0590/07 DE 2007/11/07.; AC STA PROC0549/10 DE 2010/07/14.; AC TC N28 PROC646/06 DE 2006/12/12.
Aditamento:
Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:
- Relatório -
1 – A…………, com os sinais dos autos, recorre para este Supremo Tribunal do despacho proferido pela Meritíssima Juíza do Tribunal Tributário de Lisboa em 9 de Abril de 2013 (a fls. 766 e 767 dos autos) que lhe indeferiu o requerimento de fls. 761 a 765 dos autos em que solicitava que quatro das testemunhas por si arroladas na petição inicial de recurso fossem inquiridas por teleconferência, ou, alternativamente, por carta rogatória ou carta precatória uma vez que se trata de pessoas residentes em Espanha.
A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões:
I) O presente recurso deve subir de imediato, por a respectiva apreciação diferida lhe retirar totalmente o efeito útil, na medida em que implicará a deslocação a Portugal de alguma(s) das testemunhas arroladas e residentes no estrangeiro – cfr. artigo 285.º, n.º 2, do CPPT;
II) O douto Tribunal “a quo” entendeu que o pedido de inquirição das testemunhas estrangeiras arroladas na PI deveria ter sido efectuado com a apresentação da PI;
III) No entanto, os artigos 119.º e 118.º, n.º 3, ambos do CPPT, apenas determinam que as testemunhas devem ser arroladas com a PI;
IV) O artigo 119.º do CPPT não contém qualquer disposição específica relativa à inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro;
V) Existindo norma expressa no CPC que regula especificamente a inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro – como o faz o artigo 623.º, n.º 4, do CPC -, é esta norma que se deve aplicar, como subsidiária, por determinação do artigo 2.º, alínea e), do CPPT;
VI) Consequentemente, o requerimento fundamentado a que o artigo 119.º do CPPT faz referência apenas se aplica às testemunhas que residam fora da área de jurisdição do Tribunal Tributário, mas em território português;
VII) As testemunhas deverão, pois, ser inquiridas por teleconferência;
VIII) O douto tribunal “a quo” entendeu igualmente que após a Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, o artigo 119.º deixou de permitir “deprecadas para inquirição de testemunhas como era admitido face à redacção inicial do artigo 119.º do CPPT”;
IX) Contudo, apesar de a inquirição por carta precatória não estar prevista no artigo 119.º do CPPT, isso não impede o Tribunal “a quo” de determinar a expedição para consulado português que não disponha de meios técnicos para audição por teleconferência que permitam a realização da teleconferência, para inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro, pois a tal obriga o princípio do inquisitório – cfr. acórdão do TCAS proferido a 18 de Maio de 2010, no âmbito do processo n.º 02222/08;
X) O douto Tribunal “a quo” decidiu, ainda, que “é manifesto que as diligências pretendidas (de inquirição das testemunhas por teleconferência, carta rogatória ou carta precatória) são incompatíveis com a urgência exigida à presente forma processual (cf. artigo 146.º-D, do CPPT), pois a respectiva concretização arrastaria a tramitação dos autos por um período longo, que as regras da experiência ditam ser incompatível com a urgência imposta pela lei e natureza da presente acção”;
XI) Contudo, tal incompatibilidade é meramente aparente, pois a natureza urgente de um processo nunca poderá determinar que não seja feita a necessária prova, em particular nos casos em que, como sucede no presente, existe previsão normativa para a realização nos termos requeridos pela recorrente, devendo as testemunhas arroladas residentes no estrangeiro ser inquiridas por teleconferência e, mediante a impossibilidade de as ouvir por essa via, através de carta rogatória ou por carta precatória.
XII) O douto despacho reflecte um entendimento que é, de todo, inadmissível num Estado de Direito como é o da República Portuguesa, pois equivale a dizer que a inquirição de testemunhas residentes no estrangeiro – seja por teleconferência, seja por carta rogatória ou por carta precatória – é sempre inadmissível em processos urgentes, de recurso da decisão de aplicação de métodos indirectos (apresentada por determinação do artigo 89.º-A, n.º 7, da LGT);
XIII) Dito de outra forma, o douto Tribunal “a quo” entende que os sujeitos passivos de imposto, para mais figurando no cadastro fiscal como não residentes em Portugal para efeitos de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, que tenham sido alvo de um processo de inspecção tributária por manifestações de riqueza apenas podem pretender inquirir as testemunhas residentes no estrangeiro se as puderem trazer ao Tribunal Tributário para a respectiva inquirição;
XIV) O douto despacho coarcta, pois, de forma incompreensível e inadmissível os direitos de defesa da Recorrente, pois os factos de que as testemunhas têm conhecimento dizem respeito à residência da Recorrente em Espanha no exercício de 2008 e à realização de diligências prévias à fixação definitiva naquele país;
XV) Não existe no presente caso outra forma de demonstrar ao Tribunal “a quo” os factos constantes da PI que não seja através da inquirição das referidas testemunhas;
XVI) As referidas testemunhas são de nacionalidade e têm residência estrangeira, não falam português, têm uma vida profissional activa, e não lhes é possível – pelo menos a todas – a deslocação a Portugal durante três dias (o dia anterior à inquirição das testemunhas, o(s) dia(s) da própria inquirição e o dia subsequente), a qual seria muitíssimo onerosa, apenas lhes deixando, na melhor das hipóteses, como dias de trabalho, na semana em causa, a segunda feira (dia 6 de Maio) e a sexta-feira (dia 10 de Maio);
XVII) A natureza urgente do processo não pode prejudicar a prova indispensável nem pode determinar que esta se torne de tal maneira onerosa que torne praticamente impossível a sua produção pela parte que a apresentou;
XVIII) O princípio do inquisitório – também aplicável aos processos urgentes – determina que o Tribunal pugne pela descoberta da verdade material, sopesando os actos que de acordo com o princípio da proporcionalidade devam ou não ser admitidos em juízo;
XIX) A relevância da natureza do processo urgente – a qual é, naturalmente, benéfica para a Recorrente – não pode prevalecer sobre o princípio do inquisitório e sobre a descoberta da verdade material;
XX) Ao perfilhar o referido entendimento o douto Tribunal “a quo” tornou a prova de tal maneira onerosa para a Recorrente, a qual arrolou testemunhas residentes no estrangeiro, que a impossibilitam de produzir a prova na sua plenitude, tendo, consequentemente, o douto despacho recorrido violado o artigo 623.º, n.º 4, do CPC, “ex vi” do artigo 2.º, alínea e), do CPPT, dos princípios do inquisitório (da descoberta da verdade material, previsto no artigo 13.º, n.º1, do CPPT), da proporcionalidade e, ainda, do acesso a uma tutela jurisdicional efectiva, previsto no artigo 20.º n.º 1, da CRP;
XXI) Nos termos do artigo 201.º, n.º 1, do CPC, subsidiariamente aplicável por força do disposto no artigo 2.º, alínea e), do CPPT, o despacho proferido pelo douto Tribunal “a quo” é susceptível de influenciar muito negativamente o exame e a decisão da causa, pelo que deve ser declarado nulo;
XXII) Declaração que ora se requer ao douto Tribunal “ad quem”, ordenando, em consequência ao Tribunal “a quo” a necessária inquirição das testemunhas por teleconferência.
Nestes termos, e nos melhores de Direito, que V.ªs Ex.ªs muy doutamente suprirão, se requer a este douto Supremo Tribunal Administrativo que (i) declare a nulidade do despacho do Tribunal “a quo” que indeferiu a inquirição das testemunhas arroladas residentes no estrangeiro através de teleconferência impedindo o exercício pleno dos direitos de defesa da ora Recorrente, derivada da susceptibilidade de tal despacho influir no exame e na decisão da causa e que (ii) determine a emissão pelo douto Tribunal “a quo” de novo despacho que admita a inquirição das testemunhas residentes no estrangeiro por teleconferência.

2 – Contra-alegou a Autoridade Tributária e Aduaneira, concluindo nos seguintes termos:
1. Não merece reparo o despacho judicial proferido pelo tribunal “a quo” ao ter decidido que foi intempestivamente apresentado pela Recorrente o seu requerimento de produção de prova testemunhal por videoconferência ou, subsidiariamente, por carta rogatória ou carta precatória em Espanha;
2. Desde logo porque o entendimento vertido na decisão interlocutória em causa está em sintonia com a melhor Doutrina produzida sobre esta matéria, a qual opina que o requerimento probatório deve ser feito na petição inicial em virtude de não se prever qualquer intervenção ulterior no processo entre o momento em que é apresentada a petição e o da marcação da realização das diligências;
3. Não é admitida, sem mais, a aplicação directa do artigo 623.º do CPC (preceito pensado para a forma de processo comum ordinário no âmbito do processo civil – artigo 461.º daquele corpo legal) ao presente processo;
4. Antes se impõe um exercício de adaptação do ali disposto para um processo judicial tributário de natureza urgente, como é o caso vertente, em que as intervenções admitidas são menores do que as estabelecidas para as partes no processo comum ordinário;
5. Assim sendo e atenta a natureza urgente do processo, cabia à Recorrente ter plasmado desde logo no seu articulado inicial não só a indicação das testemunhas, como também a forma (ou formas) pela qual a produção daquela prova deveria ser feita (se por teleconferência, se por carta rogatória ou precatória), o que não sucedeu;
6. Em segundo lugar, a Jurisprudência invocada pela Recorrente, corporizada no acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul proferido a 2010-05-18 no âmbito do processo n.º 02222/08 (referente a um processo de execução fiscal), para além de ser a única detetada sobre esta matéria, não é susceptível de ser aplicada ao caso vertente, atenta a distinta natureza dos processos em causa;
7. Ainda que por hipótese académica se conclua pela tempestividade do pedido formulado pela Recorrente, não é legalmente admissível a aplicação supletiva do artigo 623.º do CPC ao caso vertente em face da legislação extravagante a que importa recorrer para o efectivo funcionamento daquele artigo;
8. Com efeito, em matéria de inquirição de testemunhas por teleconferência em tribunais localizados em estados Membros da União Europeia é aplicável o regulamento n.º 1.206/2001, do Conselho, de 2001-05-28, o qual veio instituir um mecanismo de cooperação entre tribunais dos Estados-Membros destinado a harmonizar, simplificar e desburocratizar a comunicação entre instâncias judiciais localizadas em diferentes países;
9. Contudo, nos termos do artigo 1.º do Regulamento, o seu âmbito de aplicação cinge-se a matéria civil ou comercial, o que não se verifica nos presentes autos;
10. Por seu turno, em matéria de carta rogatória com vista à inquirição das testemunhas residentes em Espanha é aplicável a Convenção Relativa ao Processo Civil (vulgo Convenção de Haia de 1954), aprovada por via do Decreto-Lei n.º 47.097, de 1966-07-14;
11. Porém, à semelhança do que sucede com o Regulamento n.º 1.206/2001, também a Convenção de Haia de 1954 cinge a sua aplicação a matéria civil ou comercial;
12. De todo o modo, as diligências probatórias requeridas mostram-se incompatíveis com a natureza urgente do processo, ainda que seja inegável a evolução registada nas últimas décadas no que tange à rapidez, acessibilidade e variedade das telecomunicações;
13. A inquirição das testemunhas, por teleconferência, em tribunais espanhóis, levanta problemas de ordem convencional e prática que previsivelmente frustrariam a urgência inerente ao processo, designadamente:
a. O facto de se desconhecer se os tribunais de Madrid e de Alicante dispõem de equipamento adequado, de agenda e de prática suficiente no que toca à realização de videoconferência entre Portugal e Espanha;
b. A diferença horária entre Portugal e Espanha conjugada com o facto dos tribunais espanhóis encerrarem os seus serviços ao público a partir das 14 horas, tornando extremamente difícil o agendamento comum (entre o tribunal “a quo” e os tribunais espanhóis) de sucessivos períodos da manhã para a realização das inquirições; e
c. A circunstância de se desconhecerem os custos associados a tais inquirições e que deverão ser suportados pela autoridade que emite o pedido;
14. Ainda que por hipótese académica se conclua pela aplicação do Regulamento n.º 1.206/2001, do Conselho, de 2001-05-28, ao caso vertente, importa não esquecer que o seu artigo 10.º / 1 confere aos tribunais espanhóis a faculdade de executarem o pedido no prazo de 90 dias, ou seja, precisamente o prazo deverá ser proferida uma decisão nos presentes autos e que se iniciou com a apresentação da p.i. (artigo 146.º-D/2 do CPPT);
15. A produção de prova testemunhal em causa não assume natureza imprescindível, porquanto o facto a provar (i.e., a demonstração da data em que a Recorrente fixou residência em Espanha) é susceptível de ser demonstrado por prova documental mais relevante e inequívoca dessa qualidade;
16. Conclui-se então que o despacho recorrido fez uma correta interpretação e aplicação da lei, motivo pelo qual o mesmo deve ser mantido na ordem jurídica.
Termos em que, por todo o exposto supra e sempre com o douto suprimento de V. Exas., deve ser negado provimento ao recurso interposto, com todas as legais consequências.

3 - O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto junto deste Tribunal emitiu parecer nos seguintes termos:
(…)
A referida inquirição foi indeferida face à data em que o requerimento para depoimento por videoconferência de testemunhas fora da área do tribunal tributário foi apresentado, encontrando-se já designada data para a inquirição de testemunhas no tribunal recorrido.
O processo no caso aplicável resulta do previsto no n.º 7 do artigo 89.º-A da LGT que remete para o art. 146.º-B do CPPT.
É certo que no caso se admitiu a aplicação do previsto no art.119.º do CPPT, o que dentro das adaptações possíveis se entende.
Contudo, tal como defende o exmº Conselheiro Jorge Lopes de Sousa em caso semelhante não é admitir um requerimento desse tipo deve ser formulado na petição de impugnação ou na contestação, o que é de entender também quanto ao recurso que foi apresentado da decisão de tributação por métodos indirectos.
Aliás, no art. 119.º do CPPT divergiu-se em aspectos significativos do que se encontra previsto no CPC, consagrando um regime mais apertado do que aquele que em geral se encontra previsto para que se proceda à inquirição de testemunhas por videoconferência.
Mesmo segundo o CPC, é ainda em data anterior à designação da audiência de julgamento que se tem de proceder a uma indicação das provas que se pretende que sejam produzidas – tal o que se encontra previsto no art. 512.º do CPC.
Acresce que, tendo sido requerida a inquirição de testemunhas por videoconferência numa data em que se encontrava já designada a sua inquirição no tribunal, e residindo as mesmas em Espanha, não seria muito onerosa a sua deslocação ao referido tribunal.
3. Concluindo, parece que o recurso é de improceder, sendo de manter o decidido, por a aplicação subsidiária da referida norma do CPC não ser ao caso de aplicar, com fundamento no previsto no arts. 7 do art. 89.º-A da LGT, e 146.º-B do CPPT.
Ainda que, admitindo a aplicação por adaptação do previsto no art. 119.º do CPPT, bem se decidiu ao não se admitir a inquirição de testemunhas no estrangeiro por videoconferência, e residindo as mesmas em Espanha, não sendo muito onerosa a sua deslocação ao tribunal recorrido em que se encontrava já designada data para tal efeito.


Com dispensa dos vistos legais, dada a natureza urgente do processo, vêm os autos à conferência.
- Fundamentação -
4 – Questões a decidir
São as de saber se, como alegado, é nulo o despacho recorrido de indeferimento da inquirição de testemunhas por teleconferência ou, caso tal não seja possível, por carta precatória ou rogatória, porquanto susceptível de influenciar muito negativamente o exame e a decisão da causa (artigo 201.º, n.º 1 do Código de Processo civil, aplicável subsidiariamente ex vi da alínea e) do artigo 2.º do CPPT) e se o mesmo cometeu erro de direito ao decidir como decidiu, com fundamento na extemporaneidade do pedido e do carácter urgente do processo.

5 – Apreciando
5.1 Do despacho recorrido
É do seguinte teor o despacho recorrido (fls. 766 e 767 dos autos):
«Vem a Requerente pedir, a fls. 837 e segs. dos autos, que as testemunhas que indicou sejam inquiridas em Espanha através de teleconferência, carta rogatória ou carta precatória, alegando para o efeito em síntese que a sua deslocação a Portugal lhes causaria grande transtorno pessoal assim como custos inerentes à deslocação internacional.
O pedido de inquirição de testemunhas por teleconferência, assim como o pedido fundamentado da respectiva notificação, deve ser formulado com a PI (cf. art. 119.º, n.ºs 1, 2 e 4, do CPPT) desde logo porque a lei não prevê qualquer intervenção da parte no processo entre a PI e a diligência de inquirição de testemunhas.
Por outro lado, após as alterações introduzidas na lei processual tributária através da Lei n.º 1572001, de 5 de Junho, não poderá haver deprecadas para inquirição de testemunhas como era admitido face à redacção inicial do art. 119.º do CPPT.
Ainda que como é referido no requerimento em apreço, a PI tenha sido assinada pela Requerente, a ilustre mandatária juntou aos autos procuração a fls. 102 e interveio nos autos duas vezes no processo (cf. requerimento de fls. 786 e 819 e segs.), sem que nada tivesse vindo dizer a este respeito.
Não existe assim qualquer razão fundada para que o requerimento em apreço só agora tenha sido feito.
Por outro lado, e ainda que assim não se entendesse, é manifesto que as diligências pretendidas são incompatíveis com a urgência exigida à presente forma processual (cf. art. 146.º-D, do CPPT), pois a respectiva concretização arrastaria a tramitação dos autos por um período longo, que as regras da experiência ditam ser incompatível com a urgência imposta pela lei e natureza da presente acção.
Pelo que indefiro o requerido.
Notifique.»

O despacho recorrido, supra transcrito, foi proferido em recurso judicial de decisão da fixação da matéria colectável de IRS por métodos indirectos nos termos do artigo 89.º-A da Lei Geral Tributária (LGT), em razão do facto de no ano de 2008 a ora recorrente ter feito suprimentos a três sociedades no valor de mais de 2 milhões de euros sem que a sua declaração de rendimentos suporte, nos termos legais, tais manifestações de fortuna.
Por força do disposto no n.º 8 do artigo 89.º-A da LGT a este recurso é aplicável, com as necessárias adaptações, a tramitação prevista no artigo 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário.
Dispõe o n.º 3 do artigo 146.º-B do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), que rege sobre os requisitos da petição de recurso, que: «A petição referida no número anterior não obedece a formalidade especial, não tem de ser subscrita por advogado e deve ser acompanhada dos respectivos elementos de prova, que devem revestir natureza exclusivamente documental» (sublinhados nossos).
Ora, em razão da restrição probatória constante da parte final do n.º 3 do artigo 146.º-B do CPPT, o diploma não prevê quaisquer normas específicas sobre a prova testemunhal directamente aplicáveis a este meio processual, pois que, na perspectiva do legislador, tal meio de prova é inadmissível.
É, porém, sabido, que a restrição probatória constante da parte final deste preceito legal tem sido julgada materialmente inconstitucional por este Supremo Tribunal por violação do direito a um processo equitativo (artigo 20.º, n.º 4 da Constituição da República), se e quando a prova documental for insuficiente para o contribuinte demonstrar os factos que, na sua perspectiva, suportam o direito ou o interesse que visa defender com recurso ao tribunal (cfr. os Acórdãos deste STA de 7 de Novembro de 2007, rec. n.º 590/07, e de 14 de Julho de 2010, rec. n.º 549/10) e também pelo Tribunal Constitucional em processos de fiscalização concreta (cfr. Acórdãos n.º 28 de Novembro de 2006, rec. n.º 646/2006 e de 12 de Dezembro de 2006, rec. n.º 681/06) em casos em que os factos alegados não podem ser provados documentalmente, sendo, pois, indispensável o recurso à prova testemunhal.
Daí que esta deva ser admitida nos casos em que se revele indispensável, havendo que recorrer em primeira linha às do CPPT relativas à prova testemunhal no processo de impugnação judicial – artigos 118.º e 119.º do CPPT – aplicando-as a este recurso judicial com as necessárias adaptações, adaptações estas postuladas pela natureza urgente do processo e no qual a decisão judicial deve ser proferida no prazo de 90 dias a contar da data de apresentação do requerimento inicial (cfr. o disposto no artigo 146.º-D do CPPT).
Entendemos, pois, que em processos, como o dos autos, em que se pretenda a inquirição das testemunhas residentes no estrangeiro por teleconferência (ou por carta precatória ou rogatória, admitindo que tais formas de inquirição são ainda admissíveis por via da legislação processual civil subsidiariamente aplicável, o que se afigura duvidoso), deve tal forma de inquirição ser logo requerida na petição inicial de recurso, por forma a que as diligências que o Tribunal terá de empreender junto das autoridades competentes com vista à respectiva realização não ponham em causa a celeridade que o legislador pretendeu imprimir a este meio processual, no qual mesmo os elementos de prova legalmente previstos como admissíveis têm logo de ser juntos com a petição inicial de recurso.
Tal ónus não parece nem desproporcionado, nem violador do princípio da tutela jurisdicional efectiva, antes se julga que esta solução jurisprudencial é a que melhor equilibra os interesses em jogo, não vedando em absoluto a inquirição no estrangeiro de testemunhas aí residentes, desde que tal seja requerido a tempo de tais diligências não comprometerem irremediavelmente a celeridade processual expressamente pretendida pelo legislador.
Pelo exposto, se conclui que o recurso não merece provimento, nada havendo a apontar ao despacho recorrido, que bem decidiu, não sendo nulo nem cometendo erro de direito.

- Decisão -
6 - Termos em que, face ao exposto, acordam os juízes da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo em negar provimento ao recurso, confirmando o despacho recorrido.

Custas pela recorrente.

Lisboa, 3 de Julho de 2013. - Isabel Marques da Silva (relatora) - Pedro Delgado - Valente Torrão.